Acerca de mim

A minha foto
Porto, Porto, Portugal
Rua de Santos Pousada, 441, DE Telefone: 225191703; Fax: 225191701; E-mail: cabecaisdecarvalho@gmail.com

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Demora na Realização da Justiça num Processo de Regulação do Poder Paternal e a Responsabilidade Civil do Estado - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/03/2011

"Acórdãos STJ
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
88/2002.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ORLANDO AFONSO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
FUNÇÃO JURISDICIONAL
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ATRASO PROCESSUAL
PRAZO RAZOÁVEL
REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE

Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 23-03-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
Doutrina: -Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 3ª ed., pag.500 e segs..
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 494.º, 496.º, Nº3, 563.º
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 264.º, 268.º, 506.º, 660.º, Nº2, 668.º, Nº1, AL. D), 690.º, Nº1.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 20.º, Nº4
Legislação Estrangeira: CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM (CEDH): - ARTIGO 6.º
Jurisprudência Internacional: TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM:
- ACÓRDÃO BARAONA, A 122, PAG.18, § 46; ACÓRDÃOS PAILLOT E RICHARD, AMBOS DE 22/4/98, R98, §§ 57, 54 RESPECTIVAMENTE

Sumário :
I - Exigindo o respeito pelo prazo razoável, a CEDH sublinha a importância que atribui a uma justiça administrada sem atrasos que venham a comprometer a sua eficácia e credibilidade.
II - A determinação da razoabilidade do prazo não pode ter um tratamento dogmático, requerendo o exame da situação concreta, onde se ponderem todas as circunstâncias inerentes apreciadas globalmente.
III - O Estado é apenas responsável pelo excesso de prazo razoável nos estritos limites em que a administração da justiça, por actos imputáveis aos seus agentes, ou por quaisquer outras causas de tipo organizacional, não se realizou em tempo devido, e não por excessos temporais provocados pelo comportamento das partes no decorrer do processo.
IV – Não tendo ficado provado que os danos não patrimoniais se tivessem protelado no tempo, a omissão de decisão judicial em prazo razoável ao não repor a situação de visitas do menor ao pai com a brevidade que se impunha foi causa adequada dos danos morais por este sofridos no período temporal em que tal ocorreu.
V - O facto de a lei, através da remissão feita no art.496ºnº3, para as circunstâncias mencionadas no art.494º do CC, ter mandado atender, na fixação da indemnização, quer à culpa, quer às demais circunstâncias do caso, significa que aquela reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza mista: visa compensar, de algum modo, os danos sofridos pelo lesado; e tem por escopo a reprovação, no plano civilístico, a conduta do agente.

Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça:

A) Relatório:

Pela 5ª vara cível do Tribunal Judicial da comarca de Lisboa corre processo comum, na forma ordinária, em que é A. AA, identificado nos autos, e R. Estado Português, pedindo aquele a condenação deste no pagamento da quantia de 1.209.495,11 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação, bem como quantia a liquidar posteriormente, como indemnização de danos futuros, por anormal funcionamento do processo, erro judiciário, e ultrapassagem do prazo razoável em processo de regulação do poder paternal.
O R. contestou pedindo que a acção fosse julgada improcedente, por não provada e, consequentemente fosse absolvido do pedido e o A. condenado como litigante de má fé.
Replicou o A invocando a litigância de má fé do R.
Treplicou o R. concluindo como na contestação.
O A. apresentou dois articulados supervenientes tendo o primeiro sido admitido e o segundo sido admitido em parte.
Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais, conforme da acta consta, tendo a acção sido julgada improcedente, por não provada e o R sido absolvido do pedido.
Inconformado com esta decisão dela recorreu o A para o Tribunal da Relação de Lisboa tendo, em conferência, sido negado provimento ao agravo interposto e concedido provimento parcial à apelação condenando-se o R a pagar ao A., a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de 5.000,00 €, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até efectivo pagamento. No mais confirmou-se a sentença proferida em 1ª instância.

Deste acórdão recorre, agora, o A alegando, em conclusão, o seguinte:

1ª Verifica-se nulidade do aresto recorrido, nos termos do art668°n° 1 d) do Código do Processo Civil (CPC), por não ter julgado da extemporaneidade ou não da contestação conforme ac. do Sr. Presidente do TRL de 28/04/2003.
2ª O prazo razoável violado não foi apenas o que mediou entre o momento de incumprimento do regime de visitas por parte da mãe do menor, até o tribunal providenciar pelo restabelecimento dessas visitas, mas também o tempo que mediou entre o início do processo e o seu término ou, pelo menos, até o último facto alegado no segundo articulado superveniente.
3ª Daí que o prazo violado não começa em 01/06/2000, mas logo com o incumprimento da mãe que dá origem ao Apenso F e termina não em 02/08/2001 mas ainda continua.
4ª Por isso, o "quantum" indemnizatório tem necessariamente de reportar-se não só a todo o tempo em que o prazo razoável foi incumprido, como também, e sobretudo, às consequências da violação do prazo razoável e que constam a págs. 36 "in fine" e 37 do aresto recorrido ou seja, tal violação conferiu à mãe do menor o tempo necessário para efectuar uma eficaz "alienação parental" com a consequência do menor vir a recusar as visitas provisoriamente fixadas pelo tribunal.
5ª Houve violação dos arts.264°; 268° e 506° do CPC, pois foi mal interpretado o pedido da acção e suas consequências, bem como não se valoraram os articulados supervenientes.
6ª Verificou-se também erro na interpretação/ aplicação dos arts.494º/496º; 562°; 563° e 564° do Código Civil (CC).
7ª Quanto ao art.494º do CC, porque foi aplicado por remissão do art.496°n° 3 do CC, apenas se pode atentar aos seus critérios e não permitindo-se uma fixação da indemnização em montante inferior à dos danos causados, e tendo acontecido no caso "sub Júdice" que tais critérios não foram sequer ajuizados e valorados.
8ª A aplicação do art.496º do CC pressupõe (obriga) a que se avalizem os danos morais conforme o A. (ou o R. em reconvenção), os alegou e provou, conforme págs. 22 do aresto recorrido, o que não aconteceu.
9ª A gravidade a que se refere o art.496º do CC deve ser apreciada objectivamente, o que implica também que se avaliem todos os danos um a um em concreto.
10ª Não se verificou uma concatenação e conjugação dos arts.562º /563º do CC, que implica após avaliarem-se quais os danos (o que já fora feito anteriormente na 1ª instância), se lhes atribua um valor monetário.
11ª Valor este a fixar nos termos do art.564° do CC, o que não aconteceu.
12ª Bem como não se consideraram os danos futuros, oportunamente requeridos na p. i., pelo que se verifica nulidade nos termos do art.668°n° 1 d) do CPC.
13ª O "quantum" indemnizatório fixado é, assim, irrisório face aos danos causados pela violação do prazo razoável e anormal funcionamento da justiça.

Contra-alegou a Digna Magistrada do Ministério Público, em representação do R., pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.
O Tribunal da relação proferiu acórdão infirmando os vícios invocados pelo recorrente.

Tudo visto,
Cumpre decidir:

B) Os Factos:

São os seguintes os factos dados como provados pelas instâncias:

1- No processo n.º 9233 – B/1994, do 1º Juízo 1º Secção do Tribunal de Família de Lisboa, em 19/10/94, foi homologado o acordo de regulação de poder paternal, celebrado entre o autor e BB, relativa ao menor CC, pelo qual, em síntese:
1º - O menor fica confiado à guarda e cuidados da mãe que sobre ele exercerá o poder paternal;
5º - Nos três primeiros meses após homologação deste acordo o pai terá consigo o menor, uma vez por semana, das 18:00 horas às 20.00h, em todas as quartas feiras, sem prejuízo de ser fixado outro dia por acordo, …
6º - A partir do 4º mês, o menor ficará ao cuidado do pai uma vez por semana, no período das 12:00 horas de sábado até às 12:00 horas…, o pai poderá optar por fins de semana alternados, entre as 14:00 horas de sexta e as 14:00 horas de domingo devendo dar conhecimento antecipado à mãe…
7º- O menor passará a época de Natal com a mãe até aos 8 anos e a partir dessa idade, passará essa época alternadamente com a mãe e com o pai.
8º- O menor passará a época da Páscoa – desde Sexta-feira Santa ao final do Domingo de Páscoa – alternadamente, com a mãe e com o pai, desde o início do acordo…
9º- O menor passará com cada um dos progenitores o período de férias laborais destes, no máximo anual de 30 dias… seguidos ou interpolados. Se houver coincidência de férias o período será dividido ao meio…
10º- O menor passará com cada um dos pais o dia de aniversário deste, e no dia do seu aniversário, almoçará com um e jantará com outro” (fls. 813 a 816). - (alínea A) dos Factos Assentes doravante FA)
2 - No apenso c) do processo referido (9233-C/94) em 18.12.95, foi alterado por acordo, o Regime de Regulação do Exercício do Poder Paternal, em termos da cláusula 6 do regime referido em A) supra, passou a ter a seguinte redacção:
6ª O pai terá consigo o menor dois fins-de-semana por mês, um deles entre as 16:30h de sexta-feira e as 16:30 horas de segunda-feira e, outro, entre as 16.30 de sexta-feira e as 16:30h de terça-feira”.
Acordo homologado por sentença. (fls. 849 e 850) - (al. A1 dos FA)
3 - Por a mãe do menor não o ter entregue ao autor, no período de férias que se iniciou a 15.07.99, este requereu ao tribunal, 19.07.99, a “entrega judicial” do menor dando origem ao apenso E do processo 9233/94, que seguiu como incidente de incumprimento.
Em consequência, por despacho de 20/07/99, ordenou o tribunal a notificação imediata da mãe para, no prazo de 24 horas, fazer a entrega do filho ao pai para gozo do período de férias. (fls.18) - (al. B) dos FA)
4 - Em 03/08/99, a mãe do menor, BB, deduziu alteração do regime de regulação do exercício do poder paternal fixada, alegando que o menor se havia recusado a ir passar férias com o pai e que o menor contou que o pai o obrigava a fazer brincadeiras com ele, de que não gostava, estando ambos nus, o pai obrigava-o a fazer de cavaleiro e ele de cavalo e fazia-o passar por debaixo das pernas, deitava-se em cima dele, imobilizando-o no chão, dormia com o pai, ambos nus e o pai manuseava o pénis apontando-o na sua direcção; que o menor demonstrava alteração de comportamento, mostrava sofrimento, desde que regressara das férias da Páscoa de 99, invocou risco para o menor e requereu se ordenasse a suspensão dos contactos do pai com o menor até se esclarecer os factos ocorridos. (fls. 20 a 30, 265 a 275). - (al. C) dos FA)
5 - Por despacho de 4.08.99, foi ordenada a realização de inquérito ao IRS sobre os factos alegados e a notificação do requerido, ora Autor, para alegar nos termos do art.º 182º, n.º 3, OTM (fls. 283). - (al. C1) dos FA)
6 - O ora Autor alegou, em 12/08/99, impugnando, no essencial os factos e invocou o carácter ignóbil e manipulador da requerente e a sua falta de escrúpulos e a sua anomalia psíquica e concluiu pelo indeferimento da pretensão da suspensão do regime de visitas e requereu a realização de exames periciais sobre o estado mental, social e moral das partes. (fls. 285 e seg.). - (al. C2 dos FA)
7 - Paralelamente, no apenso E do processo 9233/99 – referido em B supra – a mãe do menor respondeu, em 23.08.1999, remetendo no essencial para o requerimento referido em C), concluindo pela suspensão do regime de visitas ao pai. (fls. 114 a 118). - (al. D) dos FA).
8 - Em 21/09/99, foi proferido despacho no apenso E), no qual, invocando que a situação de incumprimento do regime de regulação do poder paternal ai alegado estava directamente ligado com os fundamentos do pedido de alteração do regime do poder paternal deduzido no apenso F e, por isso, decidiu que os autos apensos E) – incumprimento invocado pelo pai em 19/07/99 – aguardassem a prolação de decisão naquele apenso F (da alteração do regime de R.P.P.) – fls. 121. - (al. E) dos FA)
9 - Em consequência, em 27/9/99, no apenso E), o ora Autor requereu que se mantivesse o regime de visitas estabelecido, invocando o tempo que irá demorar a decisão do apenso F, que inviabiliza que o menor e o ora Autor convivam, com as consequências e sequelas dai advenientes para ambos (fls. 122 e verso) - (al. F) dos FA)
10 - A este requerimento, foi proferido despacho no qual se decidiu “nada altera ao despacho de fls. 49 e v (referido em E) supra) aliás transitado em julgado”; despacho esse datado de 02/12/1999. – Fls. 123 - (al. G) dos FA)
11 - Em 07/09/99, foi proferido despacho no apenso F, insistindo com o IRS para a realização dos inquéritos, com nota de urgência (fls. 320). - (al. H) dos FA)
12 - Em 16/09/99 o IRS juntou aos autos (apenso F) relatórios sociais realizados ao ora Autor e mãe do menor; nesse relatório à mãe do menor era dada nota da grande ansiedade da mãe em relação ao convívio do menor com o pai e era proposta avaliação mais especializada por instituição vocacionada par o efeito. E quanto ao ora Autor, dava conta da referência deste à dificuldade em conseguir conviver com o menor, responsabilizando a mãe; era também proposta uma avaliação mais profunda por instituição vocacionada para o efeito – fls. 322 a 328. - (al. I) dos FA)
13 - Em 27/09/99, o ora Autor, notificado dos relatórios do IRS, impugna que a requerente, mãe do menor, resida com os pais e impugna que tenha afirmado que a referida tem uma atitude super protectora, afirma que a mãe residirá em Peniche durante a semana e, aos fins de semana, em Sintra; sugere que o tribunal oficie à entidade empregadora e ouça testemunhas a apresentar pelo ora Autor – 330 e verso. - (al. J) dos FA)

14 - Sobre este requerimento do ora Autor, recaiu despacho, em 02/12/99, no qual se diz, invocando os art.º 182º, n.º 4 da OTM, que oportunamente o requerido requererá as diligências de prova que tiver por conveniente”, e designou para uma conferência de pai, o dia 17/12/99. – fls. 331 - (al. L) dos FA)
15 - Em 17.12.99, teve lugar uma conferência de pais, não tendo sido alcançado acordo e, em consequência, deu-se o prazo de 15 dias para as partes alegarem e juntarem os meios de prova e, ordenou-se se oficiasse ao departamento de Pedopsiquiatria do Hospital D.ª Estefânia, requisitando-se o estudo de dinâmica relacional entre a requerente e o requerido e cada um destes com o menor e ordenou se requisitasse ao IML Lisboa exame à requerente e ao requerido, na perspectiva psiquiátrica – psicológica, devendo ser enviada cópia do requerimento inicial. – fls. 334 a 336 - (al. M) dos FA)
16 - Em 23/12/99, o ora A., invocando o lapso tempo que se previa para a decisão final e que a confirmação de ausência de contactos entre pai e filho teria sequelas para ambos, requereu que se estabelecesse um regime provisório de visitas, a realizar na presença de alguém indicado pela mãe, ou agente da PSP qualificado, devendo evitar-se as visitas no IRS, pela falta de intimidade que acarreta. – fls. 347 e verso - (al. N) dos FA)
17 - Este requerimento foi indeferido, por decisão de 24/02/00. – fls. 398 e verso - (al. O) dos FA)
18 - Deste despacho o ora autor interpôs recurso (fls. 401) que veio a manter a decisão. - (al. P) dos FA)
19 - Entretanto, em 06/01/2000, o IML Lisboa, informou o processo que os exames periciais aos pais do menor seriam realizados no Hospital de Santa Maria e solicitava que os autos do processo ou correspondência futura fossem remetidos directamente àquele hospital. – fls. 353 - (al. Q) dos FA)
20 - Em 20/04/2000, os peritos designados pelo H. St.ª Maria marcaram o exame ao ora A para 27/04/0000 e solicitavam o envio de fotocópia ou do processo para poderem responder aos quesitos. – fls. 418 a 419 - (al. R) dos FA)
21 - Em 09/05/2000, o ora Autor em requerimento ao juiz do processo, comunicando-lhe que irá promover processo disciplinar e judicial contra ele (sic), por ter autorizado a consulta dos autos a advogado dos seus pais – fls. 424 e 425 - (al. S) dos FA)
22 - O juiz titular do processo, em consequência, deduziu pedido de escusa (fls. 431 e verso) o qual foi deferido em 26/05/2000. – fls. 444 - (al. T) dos FA)
23 - Entretanto, o Autor não havia sido notificado da data do exame pericial no H. Stª. Maria, a 31/05/2000, tendo sido lavrada cota a fls. 450, a justificar essa não notificação com a circunstância de o processo estar a ser decidido quanto a um pedido de escusa do Juiz. - (al. U) dos FA)
24 - Em 01/06/2000, foi junto aos autos relatório de avaliação pedopsiquiatrica efectuado ao menor, no qual, em síntese, se informa que não surgiram aspectos nem sintomas ligados a quaisquer eventuais traumatismos de âmbito sexual, …que revela traços depressivos, para o que terão contribuído as experiências traumáticas da disputa familiar… e vivências de carência afectiva precoces.
Sugere:
a) Que a criança continue com a mãe;
b) Acompanhamento psicoterapêutico regular e intervenção simultânea junto da mãe;
c) Retoma dos períodos de convívio entre a criança e o pai visando ultrapassar situações de impasse, que se realize sempre na presença de outro adulto da confiança da criança e de ambos os pais, nomeado pelo tribunal e sob sua vigilância.
d) O menor e o pai deverão gozar um fim-de-semana quinzenalmente com período de convívio também extensivo à família paterna, mas sempre com a mediação e presença desse adulto nomeado e enviado para o efeito.
Recomenda que fiquem suspensas as autorizações para estadias mais prolongadas, nomeadamente férias. - (al. V) dos FA)
25 - Em consequência, em 16/06/2000, a curadora de menores, promoveu que se notificassem os progenitores para indicarem pessoa da sua confiança para acompanhar o menor nas visitas ao pai, e promoveu a marcação de consultas de acompanhamento psicoterapêutico; e promoveu que se fixe que o convívio entre o menor e o pai seja retomado quinzenalmente aos sábados e domingos, podendo acompanhar o pai a casa dos avós paternos, desde as 10 horas de sábado às 19 horas de domingo que a execução desse regime provisório deverá ter lugar logo que obtida resposta dos progenitores sobre pessoa de confiança. – fls. 447 e verso - (al. X) dos FA)-
26 - A promoção foi deferida quanto à auscultação dos progenitores para indicar pessoa de confiança. – fls. 453 - (al. Z) dos FA)
27 - Em Julho de 2000, o ora Autor apresentou requerimento no qual reitera que era falsa a alegada ”pedofilia” e considera que o relatório é contraditório, que se deveria retomar o regime de visitas já fixado, que na prática seria impossível dar cumprimento à promoção sobre o regime de visitas proposto, porque pressupõe o acompanhamento de terceiro em 2 fins de semana mês, sendo um deles à terra dos avós; conclui pedindo:
a) se regresse ao regime de visitas normal;
b) subsidiariamente, se fixe visitas desde as 16 horas de sexta-feira até as 20 horas de domingo, de 3 em 3 semanas;
c) subsidiariamente, aceita o regime promovido.
Indica duas pessoas para o acompanharem nas visitas. – fls. 464 a 466 – (al. AA9 dos FA)
28 - A mãe do menor notificada do despacho referido em Z), apresentou requerimento no qual questionava se o processo corria em férias (fls. 467), o que levou ao despacho de 27/07/2000 onde se afirma que o processo corre em férias se a sua demora puder causar prejuízo ao menor. - fls. 469 - (al. AB) dos FA)
29 - A mãe do menor interpôs recurso do despacho referido em Z) supra. – fls. 463 - (al. AC dos FA)
30 - Em Setembro de 2000, a mãe do menor informa o tribunal que o menor deixará de comparecer às consultas, por não confiar nos técnicos e requer a indicação de outros técnicos. – fls. 512 a 513 - (al. AD) dos FA)
31 - Em 03/10/2000, o H St.ª Maria, oficia ao processo informando que o exame ao ora Autor ficava marcado para 11/10/2000, às 10 horas (fls.515) e requeria o envio do processo. fls. 518 - (al. AE) dos FA)
32 - Não foi o Autor notificado para comparecer nesta data. - (al. AF) dos FA)
33 - Em 19/10/2000, o tribunal solicitou ao H. St.ª Maria a marcação de novo exame ao ora Autor, pedindo “…antecedência bastante, a fim de efectuar a respectiva notificação…” – fls. 521 - (al. AG) dos FA)
34 - Em 19/10/2000, o departamento de pedopsiquiatria informou que o menor faltou à consulta de 09/10/2000. – fls. 524 - (al. AH) dos FA).
35 - Em 28/11/2000, o H. St.ª Maria informa que o exame à mãe do menor está marcado para 12/12/2000. – fls. 529 - (al. AI) dos FA)
36 - Em 22/12/2000, o H. St.ª Maria informou que a mãe do menor não compareceu ao exame. – Fls. 539 - (al. AJ dos FA)
37 - Em 30/03/2001 (e não 30.10.2001 como por lapso se escreveu), o M.P. promoveu um regime provisório de visitas, no qual, em síntese:
a) uma vez por semana o pai poderá almoçar com o filho indo buscá-lo ao estabelecimento de ensino…;
b) aos domingos de quinze em quinze dias, o pai poderá ter o filho na sua companhia, entre as 11horas e as 19 horas indo buscá-lo a casa;
c) volvidos 3 meses em cada sexta-feira subsequente ao domingo que o menor passa com o pai, pode este jantar com o filho indo buscá-lo à escola e entregá-lo a casa ás 21.30 horas;
d) no 1º fim-de-semana do próximo mês de Agosto o pai pode ter o filho na sua companhia, indo buscá-lo pelas 15 horas de sexta-feira e entregá-lo às 21:30 de terça-feira;
e) a mãe deve proporcionar ao menor contacto telefónico com o pai pelo menos 3 vezes por semana. – fls 570 a 573 - (al. Al ds FA)
38 - Em 30/03/2001, o ora Autor requereu que fosse notificado de 100 folhas que terão ocorrido nos autos e requereu exequibilidade do despacho de fls. 227 “…(mencionado em Z), por referência a X) supra). – fls. 579 - (al. AM) dos FA)
39 - Em 18/05/2001, o H. St.ª Maria marcou exame ao requerido, ora Autor, para 20/06/2001 (fls. 590); o que foi notificado ao ora Autor em 24/05/2001. – fls. 592 - (al. AN) dos FA)
40 - Em 24/05/2001, é remetida notificação ao ora Autor, a informar do que se havia processado nos autos, como havia requerido em 30/03/2001 (mencionado em AM),
- recebido o requerimento de recurso referido em AC);
- Requerimento da mãe do menor referido em AB);
- promoção do M.P., referido em AC);
- e, despacho, onde, entre outras coisa, se ordenava a notificação da promoção mencionada em AL) para que as parte se pronunciassem (fls. 606 a 608), querendo. - (al. AN1 dos FA)
41 - Em consequência, o Autor apresentou requerimento, em 12/07/2001 no qual, em síntese, e entre outras coisas, diz que o despacho de fls. 233 (mencionado em Z)) fixou regime provisório de visitas, condicionado à escolha de acompanhante, o que foi feito, requerendo que fosse implementado. – fls. 614 a 615 verso - (al. AO) dos FA)
42 - Em 17/07/2001, a mãe do menor requereu a informação se o processo corre ou não em férias. – fls. 616 - (al. AP) dos FA)
43 - A que o Autor responde em 30/07/2001. fls. 624 - (al. AQ) dos FA)
44 - Em 02/08/2001, é proferido despacho, no qual, em síntese, se afirma que “nada há de concreto nos autos que possa objectivamente fundar uma proibição de visitas, de contactos e de convívio com o seu pai, situação profundamente lesiva dos interesses do menor “ … “Há que pôr fim a esta situação e criar um ambiente de são convívio e respeito pelos interesses desta criança, direitos esses que a progenitora deverá compreender e cumprir sob pena de o tribunal ter de determinar a execução das respectivas decisões através de meios coercivos, em si mesmo dolorosos para o menor…” e, nos termos do art.º 157º da OTM, determinou um regime de visitas que em síntese:
a) o convívio entre o menor e o seu pai será retomado em 11/08/2001;
b) passará fins-de-semana alternados com o pai entre as 10 horas de sábado e as 18 horas de domingo podendo levar o menor a casa dos avós paternos nesse período.
c) Nesse período, far-se-á acompanhar nas suas deslocações a casa da mãe para ir buscar e levar o menor, do casal DD e EE.
Prevendo dificuldade no cumprimento, foi desde logo ordenado que se oficiasse à PSP para o caso de necessidade de intervir na entrega do menor a seu pai, enviando-se cópia da decisão por ofício confidencial.

Determina a notificação da equipa de pedopsiquiatria para agendar consultas de acompanhamento do menor.
Reitera a necessidade de realização de relatórios do IRS. – fls. 627 a 629 - (al. AR) dos FA).
45 - Esse despacho foi notificado às partes e ao comando metropolitano da PSP (fls. 630, 631 e 636), ao IRS (fls. 638) e ao departamento de pedopsiquiatria (fls. 637) - (al. AR1)dos FA)
46. Em 09/08/2001, a mãe do menor interpôs recurso da decisão referida em AR). – fls. 655 - (al. AS) dos FA)
47 - Em 18/08/2001, o ora Autor apresentou requerimento no qual dá nota de muitos transtornos que o regime de visitas fixado lhe acarreta, por residir em Barrancos e requer que se altere o regime de visitas em termos de ser a mãe do menor a entregar e buscar o menor em Barrancos (fls. 661 e 662), e juntou cópia de requerimento que dá nota de a mãe do menor não o ter entregue em 10/08/2001 e que a PSP nada sabia do despacho (referido em AR)). – fls. 663 e 664 - (al. AT) dos F)
48 - O ora Autor foi notificado para comparecer em conferência no IRS a 16/08/2001 - (al. AU) dos FA)
49 - Em 24/08/2001, o IRS diz que a mãe do menor não compareceu às entrevistas – fls. 694 - (al. AV) dos FA)
50 - Após vários requerimentos das partes, a apresentação de alegações e contra alegações, em 24/09/2001, a mãe do menor propõe diferente regime de visitas, consistente em almoços em locais públicos, entre o menor e o pai, aos sábados e domingos, de 15 em 15 dias. – fls. 737 a 739 - (al. AZ) dos FA)
51 - Em 29/10/2001, o processo é concluso ao juiz e foi junto requerimento em 05/03/2002. – fls. 765 a 766 - (al. BA) dos FA)
52 - A que o ora Autor se opôs, por requerimento de 02/10/2001. – fls. 755 - (al. BB) dos FA)
53 - Paralelamente, os avós paternos requereram a fixação de regime de visitas para eles próprios em 12/01/2000. – fls. 356 a 357 - (al. BC) dos FA)
54 - O que foi indeferido. – fls. 398 verso a 399 - (al. BD) dos FA)
55 - E os avós paternos recorreram e sugeriram a criação de um apenso autónomo. - fls. 403 - (al. BE) dos FA)
56 - Foi indeferida a criação de apenso autónomo. – fls. 405 e verso - (al. BF dos FA)
57 - O menor, CC, nasceu a 24/11/1993, mostra-se registado como filho do A. e de BB, sendo avós paternos, CC e FF (fls. 1760). - (al. BF´ dos FA)
58 - O A. e a BB contraíram casamento sem convenção antenupcial, em 13/12/1992 o qual foi dissolvido por divórcio decretado em 19/3/96 (fls. 1761). - (al. BG) dos FA)
59 - Sob o nº 29/02, correm termos na 3ª Secção desta 5ª Vara Cível uns autos de acção declarativa, com forma ordinária, em que são autores CC e mulher, FF (pais do A. e avós do menor) e réu o Estado Português, na qual é pedida indemnização de 750.000 €, por danos não patrimoniais, alegadamente causados por conduta dos órgãos da Administração Judiciária. Acção intentada em 21/02/02. É mandatário dos ali AA., o aqui autor (fls. 1763 e segts.) - (al. BH) dos F)
60 - Em 05 de Julho de 2002, tem lugar uma conferência de pais, no âmbito do apenso F do processo referido, na qual o ora A. dá a conhecer que a partir de Agosto de 2001 passou a residir em Barrancos; que não se importava que o convívio com o seu filho passasse a ter lugar quinzenalmente, às Segundas-Feiras, sob supervisão do IRS, podendo manter-se o regime para além de 15 de Setembro…. Mais afirmou achar desnecessária a intervenção dos Serviços de Mediação Familiar… “que não está disposto a chegar a qualquer acordo com a requerente, porque isso poderia prejudicar os processos cíveis que intentou, e tanto mais que, existem também processos crime entre ambos a correr termos no tribunal criminal…”. Aceita o despacho que vier a ser proferido sobre as visitas.
Nessa sequência veio a ser regulado o regime de visitas, nos seguintes termos, em síntese:
- O pai pode estar com o filho, às Segundas-Feiras de 15 em 15 dias, entregando a mãe para o efeito o menor às 12.30 horas na porta do restaurante “Arcos de Valdevez” … e aí o recolhendo às 15.00 horas do mesmo dia; caso o restaurante esteja fechado, entregará o menor à porta do escritório do requerido.
- A partir de Setembro, o pai poderá vir buscar o menor ao externato no fim das actividades escolares da manhã e entregá-lo até às 15.00 horas.
- Os contactos são supervisionados e acompanhados por técnico do IRS de forma discreta, de modo a não traumatizar o menor e humilhar o pai. (fls. 1781 e segts.). - (al. BI) dos FA)
61 - A solicitação do Sr. Dr. GG, advogado, na qualidade de mandatário de CC e de FF, foi-lhe confiado o processo 9233/94, em 03/03/2000, concretamente, os apensos A, B, C, D, E, F, G e H. (fls. 1803 e 1804). - (al. BI’) dos FA)
62 - Por despacho de 18/06/02, foi constatado não ter sido realizado exame à requerente e ordenou-se a sua realização urgente.
Foi também ordenada a realização de novos inquéritos sociais aos pais do menor.
Igualmente, foi marcada a realização de uma conferência de pais, para 05/07/02, a qual teve lugar – conforme mencionado em BH) supra. (fls. 1813 e segts.) - (al. BJ) dos FA)
63 - Em 02/07/02, as Exmas. Peritas, Psicóloga Clínica e Médica Pedopsiquiatra, vieram apresentar esclarecimentos às invocadas (pelas partes) contradições ao relatório de 15/5/00, referido em V). (fls. 1816 a 1825). - (al. BL) os FA)
64 - Em 17/7/02, o A. apresentou requerimento onde dá nota de que, apesar de o menor ter comparecido ao encontro, não foi possível que o almoço entre ambos se realizasse, por o menor ter invocado ter pressa de fazer um trabalho; diz que o menor apresenta ar desleixado; sugere que o IRS investigue se o menor “sofreu lavagem cerebral contra o pai”; sugere que até ao início das aulas, os contactos com o pai sejam substituídos por acção a levar a efeito pelo IRS, para “contra-lavagem cerebral” ao menor. (fls. 1831 e segts.). - (al. BM) dos FA)
65 - Em 26/09/02, é proferido despacho no qual, entre outras decisões, se ordena que nas férias escolares do menor, o contacto com o pai, decidido em 05/07/02, se faça nas instalações do IRS; e ordenada a realização de exames, sugeridos pelos Srs. peritos, à mãe (fls. 1835 e segts.). - (al. BN) dos FA)
66 - Em 03/10/02 foi elaborado relatório social à mãe do menor, no qual é dado nota de não ter sido possível recolher informação que clarificasse a situação socio-económica da mãe do menor; é dada nota de que a mãe do menor continua a defender a suspensão do convívio do menor com o pai. - (al. BO) dos FA)
67 - O ora A., notificado desse relatório requereu ”… urgência na finalização dos autos, com marcação da respectiva audiência de julgamento”. (fls. 1342). - (al. BP) dos FA)
68 - Em 21/10/02, foi proferido despacho, entre outros, a ordenar que as visitas do pai no externato se processem sem a presença da mãe e que o menor seja entregue por um responsável pelo externato. (fls. 1844 e segts.). - (al. BQ) dos FA)
69 - Em 03/12/2002, o ora A. dirige requerimento nos autos, onde informa que a visita de 18/12/02 não se realizou por a mãe do menor ter informado que o menor estava doente; e, que a visita de 02/12/02 não se realizou por o menor se ter recusado a acompanhar o pai; sugere que as visitas se realizem nas instalações do IRS no Palácio da Justiça a partir de 16/12/02, devendo a mãe do menor entregá-lo às 16.30 horas. (fls. 1849). - (al. BR) dos FA)
70 - Por despacho de 24/01/03, foi essa modalidade de contactos entre o menor e o pai deferida. (fls. 1850).- (al. BS) dos FA)
71. Em 14/03/03, é proferido despacho, onde se constata que a mãe do menor não cumpre, reiteradamente, a decisão de entrega do menor no IRS, no Palácio da Justiça, para contactos com o pai e, em consequência:
a) – ordena a extracção de certidão para entrega ao M.P. para efeitos criminais;
b) – condena a mãe como litigante de má fé.
c) - reitera o regime de contactos. (fls. 1851 e segts.) - (al. BT) dos FA)
72 - Em 29/04/03, é proferido novo despacho a condenar novamente a mãe do menor como litigante de má-fé (em 20 Uc de multa); ordena nova extracção de certidões para efeitos criminais contra a mãe do menor; marca o dia 15/05/03, pelas 14:30, para julgamento. (fls. 1859 e segts.) – (al. BU) dos FA)
73 - Antes da realização desse julgamento, a mãe do menor deduziu incidente de suspeição contra o Juiz do processo (fls. 1864 e segts.), o qual veio a ser indeferido (fls. 1376). - (al. BV) dos FA)
74 - Entretanto, em 19/08/03, realizou-se conferência de pais, na qual ambos acordaram que até ao final das férias escolares, as duas visitas quinzenais que faltavam, teriam lugar nas instalações do IRS, às Segundas-Feiras, entre as 14.00h e as 16.30 horas. (fls. 1867). - (al. BX) dos FA)
75 - Em 29/4/05, foi proferida sentença de regulação do poder paternal onde:
a) – Se julgou improcedente a pretensão da mãe.
b) – Permitiu-se que o pai possa contactar com o filho nas instalações do IRS, nos termos já fixados, com o aditamento de que o menor deverá permanecer em espaço adequado e apenas acompanhado pelo pai e técnicos do IRS, em condições de privacidade por um período mínimo de 10 minutos; e só decorrido esse período e se o menor manifestar tal vontade, deverá ser entregue a quem o acompanhou. (fls. 1398 e segts.). - (al. BZ) dos FA)
76 - Dessa sentença foi interposto recurso, o qual veio a ser decidido em 04/05/06, transitado em julgado e que no essencial, manteve o regime de visitas da sentença (fls. 1525 a 1567).- (al. CA) dos FA)
77 - Em 26/08/03, na sequência da decisão referida em BX), o A. informou o processo de que a visita de 25/08, não se havia realizado, dizendo que o menor se recusou a ficar nas instalações e o técnico do IRS ter afirmado que não o podia abrigar a permanecer pela força. (fls. 1869). - (al. CB) dos FA)
78 - Em 10/02/04, o A. deu a conhecer que a visita de 09/02/04 não se realizou, por nova recusa do menor e, requer urgência na marcação de julgamento. (fls. 1870). – (al. CC) dos FA)
79 - Foi proferido despacho em 09/03/04, a, entre outros, comunicar que se mantinha o regime de visitas. (fls. 1872). - (al. CD) dos FA)
80 - Em 24/06/04, o A. apresenta requerimento no processo no qual alega ocorrência que terá tido lugar em visita nas instalações do IRS e requer que a mãe deixe de estar presente nas visitas, ou que nessas estejam elementos da policia; Mais dá a conhecer que a visita de 28/06/04 não se realizou por recusa do menor. (fls. 1873 e segts.). - (al. CE) dos FA)
81 - Em 14/07/04, foi proferido despacho em que se ordena que a mãe se devia ausentar do espaço físico onde decorressem as visitas, entre o menor e o pai, nas instalações do IRS, nele apenas podendo permanecer o pai, o menor e os técnicos do IRS. (fls. 1877 e segts.) - (al. CF) dos FA)
82 - Em 28/07/04, O A. deu informação que a visita de 26/07/04 não se havia concretizado, por recusa do menor; dá nota que o IRS ainda não teria sido notificado de tal decisão. (fls. 1879 e segts.). - (al. CG) dos FA)
83 - Em 08/09/04, o A. deu a conhecer ao processo que a visita de 6/9/04 não se concretizou por o menor se ter recusado a estar com o pai e o técnico do IRS não ter insistido com o menor.
Em 22/09/04, o A. deu informação que a visita não se realizou, pela razão de o menor se ter recusado a entrar nas instalações do IRS.
Em 06/10/04, deu a conhecer que a visita de 04/10/04 não se realizou por as instalações do Palácio da Justiça estarem fechadas.
Em 19/10/04, o A. deu a conhecer que a visita não se realizou por recusa do menor. (fls. 1880 a 1884).
Em 02/11/04, 16/11/04, 08/03/05, o A. deu informação ao processo de que as visitas não se realizaram por recusa do menor. (fls. 1885 a 1887).
Em 18/05/05, o A. dá a conhecer que a visita de 16/05/05 não se realizou por o menor se ter recusado estar com o pai e o técnico do IRS ter dito que não o pode obrigar pela força (fls. 1888 a 1889). - (al. CH) dos FA)
84 - Em 28/06/05, o A. deu a conhecer que a visita de 27/06/05 não se realizou. (fls. 1890). - (al. CI) dos FA)
85 - Por despacho de 11/07/05, foi decidido manter a decisão da sentença mencionada em BZ) – contacto mínimo de 10 minutos do pai e menor – com recurso, se necessário “à contenção física do menor”, com recurso à autoridade policial, que o Sr. técnico do IRS diligenciará (fls. 1892 a 1894).
Decisão esta que veio a ser revogada pelo Acórdão da Relação de Lisboa (ponto VIII do acórdão). - (al. CJ) dos FA)
86 - Em 09/08/05, o A. deu a conhecer que a visita de 08/08/05 não se concretizou por o menor se ter recusado a entrar nas instalações do IRS. (fls. 1900). - (al. CL) dos FA)
87 - Em 30/12/05, o A. deu a conhecer que a visita de 29/12/05 não se realizou.
O A. reiterou essas informações com a não realização das visitas em 13/01/06, 27/01/06, 10/02/06, 24/02/06, 10/03/06, 24/03/06, 07/04/06, 21/04/06 e 05/05/06. (fls. 1901 a 1920). - (al. CM) dos FA)
88 - Em 19/05/06, 02/06/06, 16/06/06, 30/06/06, 14/07/06, 28/07/06, 11/08/06, 25/08/06, o A. informou o processo que as visitas não se realizaram. (fls. 1911 a 1918). – (al. CN) dos FA)
89 - Em 08/09/06, o A. fez requerimento ao processo, requerendo se “obrigue” o IRS a cumprir o decidido no Ac. do Tribunal da Relação: que se empenhasse na concretização das visitas. (fls. 1919). – (al. CO) dos FA)
90 - Em 07/09/06, foi proferido despacho pelo qual se notificou o IRS para que informasse “como têm decorrido as visitas do requerido ao filho…” (fls. 1921). – (al. CP) dos FA)
91 - Em 25/09/06, em 06/10/06, em 20/10/06 e 03/11/06, o A. informa que as visitas não se têm realizado e que aguarda que o tribunal decida se aceita as Sextas-Feiras para as visitas. (fls. 1925 a 1928). - (al. CQ) dos FA)
92 - Por decisão de 27/10/06, foi decidido alterar as visitas quinzenais para as Sextas-Feiras (fls. 1931). – (al. CR) dos FA)
93 - Em 17/10/06, o IRS informou o processo, conforme fls. 1806 a 1807, no qual, em síntese, diz que o menor tem comparecido com a mãe e ou avós; e o pai tem comparecido; que o pai não tem tomado iniciativa de se dirigir ou interagir com o filho; a mãe tem mantido a sua presença, e, quando abandona o local o menor acompanha-a. - (al. CS) dos FA)
94 – O afastamento do menor causou ao A. grande tristeza e frustração - Resposta o ponto 1º da Base Instrutória, doravante, B.I.
95 - Consubstanciado num quadro depressivo crónico. - Resp. ao 2º da B.I.
96 - O autor tem sido regularmente seguido em psiquiatria - Resp. ao 3º da B.I.
97 - Apresenta grande desinteresse pela vida, falta de sociabilidade, isolando-se de modo obsessiva. - Resp. ao 4º da B.I.
98 - E sofre de insónias permanentes. - Resp. ao 5º da B.I.
99 - Tem comportamento instável e emotivo. - Resp. ao 7º da B.I.
100 - O autor perdeu alguma capacidade de trabalho. - Resp. ao 8º da B.I.
101 - Era anteriormente um homem saudável, sociável, com bom relacionamento, convívio social, alegre e muito trabalhador. - Resp. ao 9º da B.I.
102 - Ao autor foi proposto prestar serviços em Angola, como consultor jurídico, sendo o local de prestação de serviços em Luanda, onde se teria de deslocar mensalmente durante alguns dias e onde iria auferir cerca de 1200 contos mensais. - Resp. aos 10º, 11º e 12º da B.I.
Pode ainda ter-se como provado, em face da certidão junta aos autos, designadamente a fls. 453, que:
103 - O despacho referido supra, sob o nº 26, tem o seguinte teor: “Fls. 227: Deferido”, sendo que a fls. 227 e verso consta, como se vê do ora certificado a fls. 447 e verso, a promoção descrita acima sob o nº 25.


C) O Direito:


Delimitando o “thema decidendum”: invoca o recorrente a nulidade do acórdão recorrido nos termos do art.668ºnº1 do CPC, por não ter julgado da extemporaneidade ou não da contestação e inconsideração dos danos futuros; discorda do quamtum indemnizatório arbitrado; violação dos arts.264º, 268º e 506º todos do CPC; erro na interpretação e aplicação dos arts.494º, 496º, 563º e 564º do CC.

A primeira questão trazida à apreciação deste Supremo Tribunal de Justiça prende-se com a invocada omissão de pronúncia por o Tribunal da Relação não ter considerado a extemporaneidade da contestação e a existência de danos futuros.
O vício a que se reporta a alínea d) do nº1 do art.668º do CPC, como é jurisprudência corrente, traduz-se no incumprimento por parte do Tribunal, do dever prescrito no nº2 do art.660º do mesmo código, não havendo omissão de pronúncia, mesmo que se não tome conhecimento de todos os argumentos apresentados, desde que se apreciem os problemas fundamentais e necessários à justa decisão da lide.
Verifica-se do texto do acórdão recorrido que o Tribunal da Relação tomou conhecimento de todas as questões suscitadas pelo recorrente em sede de agravo como se alcança das pags.2007, 2009 e 2010 do aresto recorrido e que se reportam às irregularidades e nulidades da contestação já que a questão da extemporaneidade desta ficou definitivamente resolvida, não voltando a ser objecto de impugnação ao nível da 2ª instância, não podendo o recorrente ressuscitá-la no STJ. No que aos danos futuros tange não foram os mesmos reclamados nas conclusões das alegações da apelação do recorrente. O âmbito do recurso determina-se em face das conclusões da alegação do recorrente pelo que só abrange as questões aí contidas, como resultado do disposto no art.690ºnº1 do CPC. Não pode, pois, falar-se em omissão de pronúncia.
Não está em causa qualquer erro de interpretação dos arts.264º, 268º e 506º do CPC. O Tribunal “a quo” apercebeu-se perfeitamente do pedido e da causa de pedir formulados pelo A. o que entendeu é que o mesmo não era procedente na sua totalidade, valorando-os de forma diversa. E essa valoração não constitui nenhuma violação das normas processuais invocadas mas integra-se no âmago da questão substantiva em apreço.

Analisemos agora a questão substantiva trazida à nossa apreciação pelo recorrente.
Ficou provado e o Tribunal da Relação reconhece-o, que no decorrer do processo de alteração da regulação do poder paternal, houve violação do prazo razoável a que se referem os arts.6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e 20ºnº4 da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Na verdade resulta da prova produzida:
Que a privação do convívio entre o A e o seu filho se iniciou em 15/7/99 tendo havido um subsequente pedido de alteração de regulação do poder paternal;
Que o A requereu, sem êxito, em 27/9/99, a manutenção do regime de visitas antes fixado e em 23/12/99 o estabelecimento de um regime provisório de visitas, a realizar na presença de pessoa indicada pela mãe ou de agente da PSP;
Que em 1/6/2000, foi junto aos autos relatório de avaliação pedopsiquiátrica efectuado ao menor no qual se sugere, entre outros pontos, a retoma dos períodos de convívio entre a criança e o pai, convívio esse a realizar sempre na presença de outro adulto…nomeado pelo Tribunal;
Que em 16/6/2000 houve promoção do MºPº no sentido da notificação dos progenitores para indicarem pessoa da sua confiança para acompanhar o menor nas visitas ao pai e da fixação destas com periodicidade quinzenal
Que esta promoção foi objecto de despacho judicial de deferimento em 14/7/2000;
Que na sequência deste despacho, veio o A, em Julho do mesmo ano, apresentar requerimento onde indicou pessoas para acompanharem as visitas, tendo a mãe apresentado, por seu turno requerimento questionando se o processo correria termos em férias;
Que nenhuma outra decisão foi proferida para implementação do que fora promovido pelo MºPº e deferido pelo despacho supra mencionado, sendo certo que o A requereu, em vão, por duas vezes, em 30/3/2001 e em 12/7/2001, que o dito despacho fosse implementado;
Que em 30/3/2001 de novo o MºPº promove a fixação de regime provisório de visitas;
Que nenhuma decisão judicial foi proferida em apreciação desta segunda promoção no sentido do restabelecimento das visitas entre pai e filho, sendo em 2/8/2001 emitido despacho que fixou novo regime provisório de visitas.
Só passado mais de um ano sobre o conhecimento do resultado do exame feito ao menor foi proferida decisão evidenciando a inexistência de qualquer razão para a manutenção da proibição de visitas e ordenando o recomeço destas.
A causa deve ser examinada num prazo razoável, elemento essencial para uma boa administração da justiça. Exigindo o respeito pelo prazo razoável, a CEDH sublinha a importância que atribui a uma justiça administrada sem atrasos que venham a comprometer a sua eficácia e credibilidade.
A Convenção, porém, não determina qual seja o prazo razoável. A determinação da razoabilidade do prazo não pode ter um tratamento dogmático, requerendo o exame da situação concreta, onde se ponderem todas as circunstâncias inerentes apreciadas globalmente (Cf. Tribunal Europeu dos Direitos do Homem: Ac.Baraona, A 122, pag.18, § 46; Acs. Paillot e Richard, ambos de 22/4/98, R98, §§ 57, 54 respectivamente), e entre elas o interesse da causa para o demandante.
É evidente que num processo de regulação do poder paternal a prolação de um despacho de regulamentação provisória das visitas do menor ao cônjuge com o qual não habita diariamente, por um período superior a um ano, viola os interesses do menor em primeira linha e, in casu, do pai que se vê, ele também privado do convívio do filho.
Nessa medida excedeu-se o prazo razoável no período indicado na matéria de facto e que em cima referenciado ficou.
A verificação e reconhecimento do excesso de prazo razoável não tem, contudo, a amplitude pretendida pelo recorrente.
O recorrente confunde (ou pretende confundir) a responsabilidade dos pais em matéria de regulação do poder paternal com a eventual responsabilidade do Estado por atrasos na administração da justiça.
Um processo de jurisdição voluntária, como o é o do caso vertente, por natureza é um processo que se prolonga no tempo dadas as vicissitudes que o mesmo encerra para as quais contribuem, em grau não despiciendo, o comportamento (processual) de requerentes e requeridos.
O Estado é apenas responsável pelo excesso de prazo razoável nos estritos limites em que a administração da justiça, por actos imputáveis aos seus agentes, ou por quaisquer outras causas de tipo organizacional, não se realizou em tempo devido, e não por excessos temporais provocados pelo comportamento das partes no decorrer do processo, nomeadamente o resultante do incumprimento de decisões judiciais.
Não pode, por isso, o recorrente, pretender que, independentemente de qualquer atraso ou omissão na administração da justiça, o Estado Português seja o responsável último pelos danos advindos do desentendimento existente entre pai e mãe que conduziram ao processo de regulação do poder paternal.
Se é certo que o A sofreu danos morais derivados da ausência de contactos com o menor, a responsabilidade civil extracontratual do Estado Português, no caso subjudice, é, tão-só, a que deriva da violação do direito à obtenção de justiça em prazo razoável no período supra referido e não o que medeia entre o “terminus ad quem” e o “terminus a quo” do processo.
Tudo o que ocorreu desde o início do processo até à junção do relatório de avaliação pedopsiquiátrica do menor (incluindo os exames periciais aos progenitores que o recorrente requereu e pôs em causa na apelação) decorreu dentro do normal funcionamento da justiça, tal como os actos posteriores ao reatamento do regime de visitas ocorreram sem violação de prazo razoável. Se ex ante e ex post o reatamento do regime de visitas, ocorreram incumprimentos ou dilações processuais que tenham impedido o normal relacionamento do menor com o pai, tais situações ficaram-se a dever ao uso que as partes fizeram do processo e não ao funcionamento do Tribunal e, por tal, não ao Estado.
Não é admissível que as partes, afastando a sua própria responsabilidade na lentidão dos processos, com intermináveis litigâncias, como sucede normalmente nos casos de regulação do poder paternal, venham, exclusivamente, culpabilizar o Tribunal pela degradação do relacionamento com os filhos ou pelos incumprimentos que ambos geram, pretendendo ser ressarcidos pelo Estado por todo um conjunto de danos de que elas próprias são as responsáveis.

O afastamento do filho, como se diz no acórdão recorrido, causou ao A. danos não patrimoniais.
O art.563º do CC diz que “A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. No entender de Antunes Varela “para que um dano seja reparável pelo autor do facto, é necessário que o facto tenha actuado como condição do dano. Mas não basta a relação de condicionalidade concreta entre o facto e o dano. È preciso ainda que, em abstracto, o facto seja uma causa adequada desse dano”.
A omissão de decisão judicial em prazo razoável ao não repor a situação de visitas do menor ao pai com a brevidade que se impunha foi causa adequada dos danos morais por este sofridos no período temporal em que tal ocorreu não tendo ficado demonstrado que tais danos se tivessem protelado no tempo devidos à mesma causa.
É possível que o comportamento psíquico, social e laboral do A tenha se ressentido, nos termos descritos em sede de facto, com a erosão provocada pela situação familiar decorrente do processo de regulação do poder paternal, só que os danos morais daí advenientes não podem ser, na sua totalidade, atribuídos à referida omissão já que antes do período de não cumprimento do prazo razoável por parte do Tribunal a situação já existia e se manteve depois da decisão proferida, por motivos não imputáveis ao mesmo Tribunal.
Não ficou provada a existência de danos futuros cujo nexo de causalidade seja o pretendido pelo A.
Por isso, o quantum indemnizatório encontrado pelo Tribunal da Relação, nos termos dos arts.494º e 496º do CC, não nos merece censura.
Na verdade não procede a tese do recorrente quanto à interpretação do art.496ºnº3 do CC que conduziria, na prática, à impossibilidade de recurso à equidade ficando o Tribunal adstrito ao pedido formulado pelo A., condenando ou absolvendo in totum, como de lege saturae se tratasse.
O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais, diz Antunes Varela (in Das Obrigações em Geral, vol. I, 3ª ed., pag.500 e segs.), deve ser calculado em qualquer caso segundo critérios de equidade. O facto de a lei, através da remissão feita no art.496ºnº3, para as circunstâncias mencionadas no art.494º do CC, ter mandado atender, na fixação da indemnização, quer à culpa, quer às demais circunstâncias do caso, significa que aquela reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza mista: por um lado visa compensar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pelo lesado; por outro tem por escopo a reprovação, no plano civilístico, a conduta do agente.
Daí que não esteja vedado ao Tribunal fixar um montante indemnizatório inferior ao valor dos danos sofridos o qual nem sempre se compagina com o valor peticionado, só não o podendo fazer, no entender de Pereira Coelho, em caso de dolo do autor da lesão.
O Tribunal recorrido não só aplicou o direito numa correcta interpretação dos artigos acima mencionados como teve em atenção, conforme o já exposto supra, o nexo de causalidade existente entre os danos provados do A. e o facto constitutivo da responsabilidade do R, nos termos do art.563º do CC.
Não pode, pois, o recurso deixar de improceder.

Nesta conformidade, por todo o exposto, acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça, em negar revista, confirmando a douta decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 23 de Março de 2011

Orlando Afonso (Relator)
Cunha Barboso
Távora Victor"

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4f821cb6e641a62b8025785e003d62ad?OpenDocument&Highlight=0,indemniza%C3%A7%C3%A3o,div%C3%B3rcio

Seminário UIA - The Business of Law and the Profession of Law

"A UIA - União Internacional dos Advogados, organiza o Seminário "The Business of Law and the Profession of Law", que terá lugar no Palácio da Bolsa, no Porto, nos dias 15 e 16 de Abril de 2011.

Durante a última década, a natureza da profissão de advogado foi radicalmente modificada por factores externos, como a tecnologia e a globalização. A prática da lei, que historicamente tem sido considerada uma "profissão", agora é mais encarada como um "negócio".

O seminário tem o intuito de discutir de que forma a lei se tornou mais num negócio e menos numa profissão, concentrando-se por um lado nos grandes desafios para os valores fundamentais da profissão, como o sigilo profissional, a independência, a formação e as restrições à entrada; por outro no impacto da tecnologia sobre a prestação de serviços jurídicos e no dia-a-dia da advocacia; e ainda o papel que as associações profissionais podem desempenhar nestes novos desafios."

http://www.oa.pt/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?idc=31632&ida=108710

Mais informações disponíveis em http://seminaires.uianet.org/en/the-business-of-law-and-the-profession-of-law/home164/

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Diuturnidade e a sua obrigatoriedade - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - 18/11/1991

"
Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
9110355
Nº Convencional: JTRP00003727
Relator: JOSE CORREIA
Descritores: DIUTURNIDADE

Nº do Documento: RP199111189110355
Data do Acordão: 18-11-1991
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1

Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA.
Área Temática: DIR TRAB - CONTRAT INDIV TRAB.
Legislação Nacional: PRT IN BTE N46/83 DE 1983/12/15 BVI.
PRT IN BTE N21/76 DE 1976/11/15 BXVI.
PRT IN BTE N26/79 DE 1979/07/15 BVI.

Sumário: I - As diuturnidades terão de ser pagas aos trabalhadores, ainda que estes estejam a auferir ordenados superiores aos estipulados administrativamente, se acrescem a estes ordenados, nos termos das Portarias aplicáveis."

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/c42f0fa9b6d0884e8025686b0066348a?OpenDocument&Highlight=0,diuturnidade

Diuturnidade - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - 09/05/1984

Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
0003488
Nº Convencional: JTRL00029239
Relator: PEDRO MACEDO
Descritores: DIUTURNIDADE
NATUREZA JURÍDICA
ANTIGUIDADE
PRÉMIO
SUCESSÃO DE ENTIDADE PATRONAL

Nº do Documento: RL198405090003488
Data do Acordão: 09-05-1984
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: CJ 1984 TIII PAG216
Texto Integral: N
Privacidade: 1

Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: ALTERADA A DECISÃO.
Área Temática: DIR TRAB - CONTRAT INDIV TRAB / REG COL TRAB.
Legislação Nacional: CCT IN BTE N22/76 CLAUS23.
PRT IN BTE N16/80 BVI.

Sumário:
I - O prémio de antiguidade representa um incentivo para o trabalhador permanecer ao serviço da entidade patronal.
II - A diuturnidade em sentido restrito é uma compensação para o trabalhador que não vê à sua frente uma carreira que lhe permita o acesso a categorias profissionais mais elevadas; surge ainda como alternativa quando se não reconhecem qualidades de chefia e o nível seguinte exija essa característica.
III - Assim, o prémio de antiguidade é pago ao trabalhador enquanto se mantiver ao serviço da mesma empresa.
As diuturnidades devem ser pagas ainda que o trabalhador mude de entidade patronal.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/2246a6c85cf8a8e5802568030003e057?OpenDocument&Highlight=0,diuturnidade

terça-feira, 5 de abril de 2011

Diuturnidade - Direito à Remuneração - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - 27/04/1981

Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0000843
Nº Convencional: JTRP00018545
Relator: SALVIANO DE SOUSA
Descritores: DIUTURNIDADE
SUCESSÃO DE LEIS NO TEMPO
DIREITO À REMUNERAÇÃO
EXTINÇÃO DE DIREITOS

Nº do Documento: RP198104270000843
Data do Acordão: 27-04-1981
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: CJ 1981 TII PAG150
Texto Integral: N
Privacidade: 1

Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Área Temática: DIR TRAB - CONTRAT INDIV TRAB.
Legislação Nacional: DL 440/79 DE 1979/11/06 ART4.
LCT69 ART82 ART94.
Jurisprudência Nacional: AC RP DE 1979/04/30 IN CJ PAG523.
AC RP DE 1979/06/11 IN CJ PAG1038.

Sumário: I - O recebimento das diuturnidades constitue um direito de exercício instantâneo, que logo se incorpora no valor da retribuição do trabalho.
II - Por isso, se um novo diploma actualizador de salários não conferir o direito a diuturnidades ou ressalvar o direito às mesmas, deve entender-se que tal direito se extinguiu.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/08769ea56dfd2ffc8025686b0066d780?OpenDocument&Highlight=0,diuturnidade

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Trabalho Suplementar - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - 07/03/2001

"Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
0013564
Nº Convencional: JTRL00030785
Relator: PEREIRA RODRIGUES
Descritores: TRABALHO SUPLEMENTAR
ÓNUS DA PROVA
TRABALHADOR

Nº do Documento: RL200103070013564
Data do Acordão: 07-03-2001
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1

Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: DIR TRAB.
Legislação Nacional: CCIV66 ART341 ART342 N1 ART1152. DL421/83 DE 1983/12/02 ART7 N4.
Jurisprudência Nacional: AC STJ DE 1992/06/17 IN BMJ N418 PAG648. AC STJ DE 1994/12/16 IN BMJ N442 PAG105.

Sumário:

I - Cabe ao trabalhador não só alegar, como o ónus da prova quer da prestação de trabalho suplementar, como também da prévia e expressa determinação da entidade patronal na realização desse trabalho prestado fora do horário de trabalho.
II - Essa prévia e expressa autorização ou determinação da entidade patronal constitui um facto positivo, observável ou perceptível através dos sentidos que o trabalhador tem de provar.
III - Não basta, pois, que o trabalhador preste trabalho para além do seu horário para, sem mais, nascer na sua esfera jurídica o direito à respectiva remuneração.
IV - O que significa que é elemento constitutivo do direito à remuneração por trabalho suplementar que este tenha sido prévia e expressamente determinado pela entidade patronal, incumbindo-lhe fazer essa prova, como trabalhador."

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/8c1cfb76ec95cf1580256acb0038a18c?OpenDocument&Highlight=0,trabalho,suplementar

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Administrador deixa CTT após suspeitas sobre falsificação de currículo - Economia - PUBLICO.PT

Administrador deixa CTT após suspeitas sobre falsificação de currículo - Economia - PUBLICO.PT

Parecer da Procuradoria Geral da República - Remuneração / Opção de Remuneração

Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00000689
Parecer: P000521994
Nº do Documento: PPA19950817005200
Descritores: REMUNERAÇÃO
AUTARCA
ESTATUTO
ELEITO LOCAL
PRESIDENTE DE CÂMARA
VEREADOR EM REGIME DE PERMANÊNCIA
VEREADOR A TEMPO INTEIRO
VEREADOR A TEMPO PARCIAL
ACUMULAÇÃO
INCOMPATIBILIDADE
ACTIVIDADE
ACTICIDADE PROFISSIONAL
ACTIVIDADE PRIVADA
OPÇÃO DE VENCIMENTO
CARGO POLÍTICO
PROFISSÃO LIBERAL
Informação Administrativa
Livro: 00
Pedido: 20-09-1994
Data de Distribuição: 29-09-1994
Relator: LUIS DA SILVEIRA
Sessões: 00
Data da Votação: 17-08-1995
Tipo de Votação: MAIORIA COM 3 VOT VENC
Sigla do Departamento 1: MPLAT
Entidades do Departamento 1: SE DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL E DO ORDENAÇÃO DO TERRITORIO
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 12-10-1995

Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: DR 960918
Nº do Jornal Oficial: 217
Nº da Página do Jornal Oficial: 13136
Indicação 2: ASSESSOR: MOTA
Informação Jurídica
Área Temática: DIR ADM / ADM PUBL.
Ref. Pareceres: P001001982
P000231991
P000951986
P001161988
P001891983
P000541990
P000281992
P000321993
P000411989
P000271990
*CONT
REFCONT
Legislação: CONST76 ART269 N4 N5.; L 44/77 DE 1977/06/23 ART1 ART2 ART3.; PORT 309/78 DE 1978/06/09.; L 9/81 DE 1981/06/26 ART3 N1 A N2 ART4 N1.; L 9/90 DE 1990/03/01 ART1 N1 I ART2 ART4 N6.; L 56/90 DE 1990/09/05.; L 64/93 DE 1993/08/28 ART6 N1.; L 29/87 DE 1987/06/30 ART2 N1 A ART3 N1 ART7 N1 N2 ART8 ART13 N1 ART26 N2.; DL 413/93 DE 1993/12/23 ART2 N2.; DL 427/89 DE 1989 DE 1989/12/07 ART32 N2.
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
* CONT REFPAR p000901976 p000041988 p000731991 p000431993

Conclusões
Conclusões: 1º - O nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93, de 28 de Agosto, revogou tacitamente o nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho;
2º - Os presidentes de câmaras municipais podem acumular as respectivas funções autárquicas com outras funções públicas - salvo se estas últimas corresponderem a cargos políticos (artigos 1º e 4º, nº 1, da Lei nº 64/93), ou a cargos ou actividades profissionais relativamente aos quais outras leis estabelecerem incompatibilidades ou impedimentos de acumulação com aquelas funções autárquicas (artigo 6º, nº 2 da mesma Lei);
3º - Os presidentes de câmaras municipais podem acumular as respectivas funções autárquicas com actividades privadas;
4º - Os presidentes de câmaras municipais não podem optar pela remuneração que auferiam enquanto funcionários públicos;
5º - Os eleitos locais que exerçam funções autárquicas em regime de permanência, a tempo inteiro, e que acumulem com actividade privada remunerada, de carácter regular, só têm direito a perceber 50% da remuneração normal correspondente àquelas funções;
6º - Os eleitos locais que exerçam funções autárquicas em regime de permanência, e que acumulem com actividade privada remunerada, de natureza não permanente nem regular, têm direito a receber por inteiro a remuneração correspondente àquelas funções;
7º - Os eleitos locais que exerçam funções autárquicas em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, e que acumulem com actividade privada, permanente e regular, não remunerada, apenas têm direito a perceber 50% da remuneração normal correspondente àquelas funções.

Texto Integral
Texto Integral: Senhor Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território,

Excelência:





1

1.1. Por despacho de 13 de Setembro de 1994, solicitou Vossa Excelência a emissão de parecer por este corpo consultivo acerca do problema da remuneração a que têm direito os autarcas em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, que acumulem com uma actividade privada não remunerada.

Esse despacho foi proferido sobre uma Informação da Direcção-Geral da Administração Autárquica (1) na qual se dava conta de se terem suscitado opiniões divergentes sobre o assunto, não só no seio desse organismo, como, ainda, posteriormente, entre a Auditoria Jurídica do Ministério e a Câmara Municipal de Baião.



2.2. Mais tarde, decidiu Vossa Excelência, por despacho de 28 de Novembro de 1994, ouvir também este Conselho Consultivo acerca de uma série de questões que têm surgido em matéria de estatuto dos eleitos locais e das quais a acima referida faz também parte.

Dessas questões, umas reportam-se ao instituto das incompatibilidades, outras respeitam ao regime de remunerações.

Elas são, em síntese, as seguintes:

Questões relativas a incompatibilidades

a) O nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93, de 28 de Agosto, revogou tacitamente o nº 1 do artigo 3º do Estatuto dos Eleitos Locais (Lei nº 29/87, de 3o de Junho)?

b) Pode um presidente de câmara acumular as respectivas funções autárquicas com outras funções públicas?

c) Pode um presidente de câmara acumular as respectivas funções autárquicas com actividades privadas?

Questões relativas a remunerações

d) Pode um presidente de câmara optar pelo vencimento ou remuneração que auferia, antes de ser eleito, enquanto funcionário público?

e) Um eleito local em regime de permanência, a tempo inteiro, pode exercer actividade privada, remunerada, por forma regular, continuando a perceber 100% do valor da remuneração devida pelo exercício das funções autárquicas?

f) Um eleito local em regime de permanência pode exercer actividade privada remunerada, por forma não regular ou não permanente, mantendo a percepção de 100% da remuneração base correspondente às funções autárquicas?

g) Um eleito local em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, pode acumular com actividade privada, não remunerada, sem dedução de 50% do valor base da remuneração relativa às suas funções autárquicas?

Cumpre, pois,formular parecer, abordando sucessivamente os problemas acabados de enunciar (2).



2

2.1. Como ponto de partida para a apreciação da primeira questão, justifica-se enquadrar os preceitos em causa - nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87 (3) de 30 de Junho, e nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93 (4), de 26 de Agosto - no instituto das incompatibilidades e situá-los na evolução do regime jurídico aplicável na matéria.



2.2. A incompatibilidade pode caracterizar-se como a "impossibilidade legal do desempenho de certas funções por indivíduo que exerça determinada actividade ou se encontre em alguma das situações, públicas ou privadas, enumeradas pela lei" (5).

Ela representa, pois, um "limite à acumulação", entendida esta como o "exercício simultâneo de mais de um cargo ou lugar público ou privado" (6).

O estabelecimento de incompatibilidades tem dois objectivos principais: o de assegurar a imparcialidade das pessoas a que se aplicam e o de garantir a sua adequada dedicação às funções públicas que estão incumbidas de exercer.

Disse-o o deputado Alberto Martins, por ocasião da discussão dos projectos que deram origem à Lei nº 9/90, ao afirmar que com as incompatibilidades neles previstas se pretendia "criar condições à realização da justiça, imparcialidade e dedicação no exercício dos cargos públicos e nesta vertente garantir o princípio da igualdade dos cidadãos face à Administração Pública e aos órgãos de soberania" (7).

Confirmam-no Vital Moreira e Gomes Canotilho, quando declaram que as incompatibilidades têm por objectivo "garantir não só o princípio da imparcialidade da Administração mas também o princípio da eficiência (boa administração). Trata-se de impedir o exercício de actividades privadas que, pela sua natureza ou pelo empenhamento que exijam, possam conflituar com a dedicação ao interesse público ou com o próprio cumprimento dos horários e tarefas da função pública" (8).

E em sentido análogo se expressou este Conselho, quando, no parecer nº 100/82, de 27 de Julho de 1982, vincou que através das incompatibilidades se tem em vista "proteger a independência das funções, e, do mesmo passo, manter na acção administrativa a normalidade, objectividade e serenidade que lhe deve imprimir o cariz indiscutível do interesse geral e que mais não é que a afloração, no Estado democrático de direito, do princípio segundo o qual os agentes públicos não devem encontrar-se em situação de comprometer o interesse próprio de natureza pessoal, e o interesse do Estado e dos entes públicos que representam e lhes cumpre defender" (9).



2.3. Tão ponderosos são estes valores que já a Constituição de 1933, no seu artigo 27º (última versão), dispunha que:

"Art. 27º. Não é permitido acumular, salvo nas condições previstas na lei, empregos do Estado ou das autarquias locais, ou daquele e destas.

§ único. O regime das incompatibilidades, quer de cargos públicos, quer destes com o exercício de outras profissões, será definido em lei especial".

Em execução deste preceito constitucional, o Código Administrativo dispunha que:

"Artigo 75º

(Incompatibilidades. Acumulação)

As funções de presidente e vice-presidente da Câmara, quando remuneradas por meio de ordenados (10), são incompatíveis com o exercício de qualquer outra função pública retribuída e com a advocacia.

§1º O Conselho de Ministros poderá permitir a acumulação de funções com outras para cujo exercício independente não esteja fixada retribuição bastante.

......................................................................................".



2.4. A Constituição de 1976 não deixou de consagrar também princípios gerais sobre esta matéria.

Eles constam do respectivo artigo 269º (originário artigo 270º), cujos nºs 4 e 5 são do seguinte teor:

"4. Não é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos, salvo nos casos expressamente admitidos por lei.

5. A lei determina as incompatibilidades entre o exercício de empregos ou cargos públicos e o de outras actividades".



2.5. No seguimento desta regra da actual Lei Fundamental, o legislador ordinário publicou, sucessivamente, diversas normas destinadas a especificar as incompatibilidades relativas aos autarcas.

Assim é que logo a Lei nº 44/77, de 23 de Junho, prescreveu, no seu artigo 1º:

"Artigo 1º

Incompatibilidades

As funções de presidente da Câmara, de comissão administrativa ou de vereador em regime de permanência são incompatíveis com a actividade de agente ou funcionário do Estado, de pessoa colectiva de direito público e de empresa nacionalizada."

Tendo surgido dúvidas acerca da aplicação deste preceito, veio a ser publicada a Portaria nº 309/78, de 9 de Junho, cujos dois primeiros números estabeleciam que:

"1- O exercício de cargos municipais não é incompatível com o exercício de profissões liberais, salvo nos casos em que o respectivo estatuto profissional o proíba.

2- O exercício em exclusivo das funções de presidente da câmara é incompatível com qualquer outra actividade, quer esta se exerça dentro ou fora das horas normais de serviço".

O artigo 1º da Lei nº 44/77 veio, mais tarde, a ser reproduzido no nº 1 do artigo 4º da Lei nº 9/81, de 26 de Junho - diploma que, apesar de respeitar especificamente às "Remunerações e abonos dos eleitos locais", incluíu também um preceito relativo a incompatibilidades, por se entender que se tratava de dois aspectos interligados do respectivo estatuto.

O Estatuto dos Eleitos Locais (Lei nº 29/87, de 30 de Junho) não podia, naturalmente, ter deixado de se ocupar directamente desta questão.

Fê-lo, aliás, em termos formalmente algo diversos do regime antes vigente, mas mantendo-o, afinal, na sua essência:



"Artigo 3º

Incompatibilidades

1. Sem prejuízo do disposto em legislação especial, as funções desempenhadas pelos eleitos locais em regime de permanência são incompatíveis com a actividade de agentes ou funcionários da administração central, regional ou local ou com o exercício da actividade de pessoa colectiva de direito público (sic) ou trabalhador de empresa pública ou nacionalizada.

2. .............................................................................................".

A expressão "eleitos locais em regime de permanência", neste preceito utilizada, compreende os presidentes das câmaras municipais, por força da al. a) do nº 1 do artigo 2º da Lei em causa.

Merece anotação, de todo o modo, no confronto com o direito anterior, a definição de incompatibilidade também em relação à situação de trabalhador de empresa pública, bem como a menção respeitante a agente ou funcionário da "administração central, regional ou local", fórmula mais abrangente que a de "agente ou funcionário do Estado". Esta última modificação da letra da lei não significa, todavia, alteração de monta em termos de estatuição, pois que a expressão "pessoa colectiva de direito público", já constante da lei anterior, acabava, na prática, por abarcar as pessoas jurídicas que encabeçam a "administração central, regional ou local".

Em 1990, a Assembleia da República decidiu legislar, globalmente, sobre as incompatibilidades relativas aos cargos políticos e altos cargos públicos.

Emanou, assim, a Lei nº 9/90, de 1 de Março, que integrou nos cargos políticos e altos cargos públicos os de "presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais" (al. i) do nº 1 do artigo 1º) (11).

Aos citados cargos autárquicos (tal como aos demais cargos políticos e altos cargos públicos) passaram a aplicar-se as incompatibilidades definidas no artigo 2º da dita Lei, do seguinte teor:



"Artigo 2º

Incompatibilidades

A titularidade dos cargos enumerados no artigo antecedente implica, durante a sua pendência, para além das previstas na Constituição, as seguintes incompatibilidades:

a) O exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo e o exercício de actividades de representação profissional;

b) A integração em corpos sociais de empresas ou sociedades concessionárias de serviços públicos, instituições de crédito ou parabancárias, seguradoras, sociedades imobiliárias ou quaisquer outras empresas intervenientes em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público;

c) O desempenho de funções em órgão executivo de fundação subsidiada pelo Estado;

d) A detenção de partes sociais de valor superior a 10% em empresas que participem em concursos públicos de fornecimento de bens ou serviços no exercício de actividade de comércio ou indústria, em contratos com o Estado e outras pessoas colectivas de direito público."

Em moldes sistematicamente discutíveis, a Lei nº 9/90 (12) tornou extensivas aos vereadores a tempo parcial algumas das incompatibilidades nela mesma previstas.

O dito vício sistemático apresenta-se com uma dupla face.

Por um lado, assim se estabeleceram certas incompatibilidades para um cargo - o de vereador a tempo parcial - que, em rigor, pareceria alheio ao diploma em análise, por não se enquadrar nos "cargos políticos e altos cargos públicos" nele enumerados e aos quais ele, de acordo com a sua própria epígrafe, se pretendera aplicar.

Por outro lado, tal estipulação de incompatibilidades parcelares veio a ser inserida num preceito que, em princípio, se destinava a consagrar excepções ao regime geral de incompatibilidades constante do anterior artigo 2º.

Lê-se, com efeito, no artigo 4º da Lei mencionada:



"Artigo 4º

Excepção

........................................................................................

6. Os vereadores em regime de meio tempo encontram-se sujeitos às incompatibilidades previstas na presente lei, com as seguintes excepções:

a) Não são aplicáveis as incompatibilidades previstas na alínea a) do artigo 2º e no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho;

b) É admissível a participação de vereadores em regime de meio tempo em órgãos sociais de empresa que prossiga fins de reconhecido interesse público local em que a respectiva autarquia ou associação de municípios participe e a remuneração percebida no exercício de tais cargos acumulada com a de vereador a tempo parcial não exceda a de vereador a tempo inteiro".



2.6. Uma questão que se poderia, eventualmente, pôr, seria a de saber se o artigo 2º da Lei nº 9/90 não teria revogado o artigo 3º, nº 1, da Lei nº 29/87.

E isto na medida em que - embora reproduzindo na essência o regime de incompatibilidades dos eleitos locais constante da Lei nº 29/87 - a Lei nº 9/90 passou a regular, em geral, o regime de incompatibilidades e impedimentos de todos os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.

O sistema da Lei nº 9/90 teria, assim, absorvido o da lei anterior, a ele se substituindo.

Não parece, todavia, que este ponto de vista fosse correcto.

É que cada um dos diplomas legais em causa aborda o instituto das incompatibilidades sob duas perspectivas diversas: a Lei nº 29/87, regula-o enquanto relativo, especificamente, aos eleitos locais; a Lei nº 9/90, fá-lo a respeito dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, em geral.

Assim, nem seria de afastar a possibilidade de o legislador vir a revogar (13) a lei geral relativa às incompatibilidades de titulares de cargos políticos ou altos cargos públicos, ou dela excluir os autarcas, sem que isso significasse a eliminação das incompatibilidades consignadas na Lei nº 29/87. É que, nesta, elas foram estabelecidas com referência aos eleitos locais, enquanto tais.

Esta asserção pode ser confirmada, ainda, pelo princípio de que a lei geral (aqui a aplicável aos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos) não revoga, como regra, a lei especial (no caso a correspondente aos eleitos locais).

E não é patente da Lei nº 9/90 que esta tenha tido em mira operar uma "revogação de sistema" em relação à lei especial anterior reguladora do estatuto dos eleitos locais.

O próprio legislador não deixou, aliás, de revelar ter também sido este o seu entendimento.

Basta, para tanto, recordar o teor da al. a) do nº 6 do artigo 4º da Lei nº 9/90, em que se estipulou que aos vereadores em regime de meio tempo "não são aplicáveis as incompatibilidades previstas na alínea a) do artigo 2º e no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho".

Com efeito, a última parte deste preceito não faria sentido se precisamente não se entendesse que, mesmo após a emanação da Lei nº 9/90, continuaria em vigor o regime de incompatibilidades definido na Lei nº 29/87.

Esta interpretação já encontrou, de resto, reflexo na doutrina deste corpo consultivo (14).



2.7. Desta linha de evolução legislativa em matéria de incompatibilidades dos eleitos locais veio a afastar-se decididamente a Lei nº 64/93.

Apesar de caracterizar "o presidente e o vereador a tempo inteiro das câmaras municipais" como titulares de cargos políticos (al. h) do art. 2º), este diploma contém um preceito específico sob a epígrafe "Autarcas", do seguinte teor:





"Artigo 6º

Autarcas

1 - Os presidentes e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, podem exercer outras actividades, devendo comunicá-las, quando de exercício continuado, quanto à sua natureza e identificação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, na primeira reunião desta a seguir ao início do mandato ou previamente à entrada em funções nas actividades não autárquicas.

2 - O disposto no número anterior não revoga os regimes de incompatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais."

Embora não o diga expressamente, este preceito respeita claramente a matéria de incompatibilidades - quase se diria: de "não - incompatibilidades" (15).

E acaba por aplicar-se a todos e quaisquer "presidentes e vereadores de câmaras principais, mesmo em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial" - embora estes últimos não caibam na noção de titulares de cargos políticos, tal como definida no artigo 2º.



2.8. Põe-se, pois, a questão de saber se a norma do nº 1 do transcrito artigo 6º revogou ou não a do nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87.

Que o não fez expressamente, resulta patente.

Mas afigura-se que operou, na verdade, tacitamente, tal revogação.

A sua estatuição é, no âmbito da respectiva previsão, contrária à mencionada norma do Estatuto dos Eleitos Locais: enquanto esta última consagrava uma regra de incompatibilidade para os autarcas em regime de permanência, o preceito ora em causa estipula um regime permissivo, quanto ao exercício de "outras actividades", no tocante aos membros das câmaras municipais.
E não parece valer, aqui, a argumentação acima expendida, a propósito do confronto entre as Leis nºs 29/87 e 9/90.

É que, por um lado, os preceitos dos artigos 3º, nº 1 e 6º, nº 1, de cada uma das Leis ora em causa, respectivamente, não são compatíveis, antes se contradizem, na parte em que as correspondentes previsões coincidem.

Por outro lado, é a mesma a perspectiva em que as ditas Leis consideram as pessoas a que tais prescrições se aplicam: em ambas, com efeito, elas são tratadas na sua qualidade de membros eleitos de órgãos autárquicos e em nenhuma delas na de titulares de cargos políticos, em geral.

Assim é que o artigo 3º da Lei nº 29/87 faz parte do "Estatuto dos eleitos locais". E o artigo 6º da Lei nº 64/93, embora integrado num diploma que se ocupa, genericamente, do "Regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos", assume, na respectiva economia, uma posição de assinalável autonomia, por se dedicar especificamente à situação dos "autarcas", tal como bem realça a correspondente epígrafe.

Não pode, é certo, perder-se de vista que a liberalização de acumulação com outras actividades estipulada no nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93 acaba por resultar parcialmente limitada pelo teor do subsequente nº 2. Só que esta norma (como mais adiante se desenvolverá, no nº 3.3. deste parecer) define incompatibilidades e impedimentos, não em função de cargos autárquicos, mas de outroa cargos ou actividades profissionais que com eles se pretendesse porventura acumular.

2.9. Que foi esta a decidida intenção do legislador revela-o, aliás, com nitidez, a análise dos trabalhos preparatórios que culminaram na emanação do artigo 6º da Lei nº 64/93.

O Projecto de Lei nº 331/VI, apresentado pelo PSD (16), que esteve na origem deste diploma, continha já um artigo 6º do seguinte teor:

"Art. 6º. Os presidentes e vereadores de câmaras municipais podem exercer outras actividades, desde que autorizadas pela assembleia municipal, mediante deliberação deste órgão e sem prejuízo das disposições legais referentes à imparcialidade a que estão obrigados".

E no respectivo Preâmbulo não deixava de se apontar, como uma das três inovações que, no plano dos princípios, se pretendiam consagrar com o diploma em preparação, "a admissão da acumulação de cargos executivos autárquicos com outra actividade, desde que não haja legislação especial que o proíba e desde que, em face de um processo fundamentado e público, tal seja objecto de uma autorização por parte da respectiva assembleia municipal".

Ao fazer a síntese deste Projecto, o Relatório e Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (17) não deixou de realçar:

"1.3. O exercício legal de outras actividades por parte de presidentes e vereadores de câmaras depende de autorização da assembleia municipal".

Isto é: desde a génese da Lei nº 64/93 transpareceu o propósito de passar a facultar, como princípio, aos membros das câmaras municipais, o exercício de outras actividades, desde que autorizado pela correspondente assembleia municipal.



2.10. Esta orientação sofreu, contudo, uma importante inflexão, por virtude da apresentação, por alguns deputados do PSD, duma proposta de substituição do artigo 6º em causa (18).

Nessa proposta, cindia-se o citado preceito em dois números, no primeiro dos quais se abandonava o sistema de autorização da assembleia municipal para legitimar a acumulação de outras actividades por parte dos membros das câmaras, passando estes a ter apenas de fazer a tal respeito uma comunicação ao Tribunal Constitucional e àquele órgão concelhio, desde que se tratasse de actividades de exercício continuado.



2.11. A aludida proposta veio a constar do texto elaborado pela Comissão e tornou-se na versão definitiva do nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93, depois de terem sido rejeitados dois requerimentos de avocação dessa norma pelo Plenário.

Quanto ao nº 2 do artigo 6º, a respectiva versão definitiva resultou também, com alguns aperfeiçoamentos de redacção, da proposta de substituição acima mencionada.



2.12. O objectivo assim detectado para a regra em questão ressalta, ademais, confirmado, por contraposição, se se atentar em declarações produzidas por deputados dos partidos da oposição, a fundamentar os pedidos de avocação da mesma pelo Plenário.

De entre elas, salientam-se as do deputado António Filipe (PCP) (19):

"O artigo 6º do texto aprovado em comissão...tem como objectivo isentar os presidentes e os vereadores das câmaras municipais da sujeição ao regime de incompatibilidades que recai sobre os titulares de cargos políticos.

.................................................................................................

Assim, não se trata já de uma lei sobre incompatibilidades, mas de uma lei sobre compatibilidades dos presidentes e vereadores das câmaras municipais".

E, também, as do deputado Alberto Costa (PS) (20):

"...a solução que é prevista consagra, para os presidentes da câmara e veradores, mesmo em regime de permanência e a tempo inteiro, um regime de excepção que os singulariza em relação ao conjunto de titulares de cargos políticos e altos cargos públicos abrangidos por este diploma, isentando-os das regras sobre incompatibilidades que passam a valer para os demais".



2.13. O nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93 revogou, pois, o nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87.

Operou-se, assim, um corte radical em relação à evolução legislativa anterior respeitante ao regime de exercício de funções dos membros das câmaras municipais.

A estes autarcas, o legislador de 1993 passou a aplicar um regime do tipo que é tradicional nomeadamente em França, decorrente da ideia de que a assunção dum mandato de eleito local corresponde a uma actividade a que as pessoas se devotam por vocação, e em princípio sem terem de abandonar as suas profissões próprias.

Esta concepção é bem retratada, p. e, por Jean-Marie Becet (21), quando discorre:

"lorsqu' un certain seuil de responsabilité est atteint, l'activité de l'élu est si absorbante qu'elle tend à devenir exclusive et donc incompatible avec la poursuite d'une activité proféssionelle quelle qu'elle soit. Certains États européens ont résolu ce problème par la "fonctionarisation" de certaines fonctions executives locales. Mais cette modalité est trop contraire à la tradition française pour qu'elle puisse être envisagée: en France, le mandat d'élu local n'est nullement consideré comme un métier mais comme une vocation même lorsqu'il demande une disponibilité de tous les instants".

Por isso é que, aliás, mesmo a recente Lei francesa nº 92-108, de 3 de Fevereiro de 1992, apesar de pretender corresponder à natureza cada vez mais absorvente de muitos cargos de autarcas, persistiu em não definir quaisquer incompatibilidades, limitando-se a aumentar o acervo de garantias sociais e dispensas de trabalho nas respectivas ocupações profissionais de que podem beneficiar.



3

3.1. Do que atrás fica dito decorre já, implicitamente, a resposta a dar à segunda questão suscitada - ou seja, a de saber se um presidente de câmara pode, hoje, acumular as respectivas funções autárquicas com outras funções públicas (22).

Na verdade, o inovador regime permissivo constante do nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93 utiliza uma fórmula o mais ampla possível: "podem exercer outras actividades".

Nela se não contém qualquer distinção entre actividades de natureza pública ou privada - a ambas abrangendo, pois.

Por outro lado, o termo "actividades" corresponde a conceito de assinalável extensão, compreendendo tanto tarefas pontuais ou esporádicas, como , também, actuações de tipo regular e duradouro.
Que o propósito do legislador foi o de consignar, na regra em apreciação, uma permissão de relevante amplitude pode deduzir-se, de resto, da contraposição com o conceito de "função" utilizado no nº 1 do artigo 7º para definir as incompatibilidades de titulares de altos cargos públicos. Estas, sim, são apenas as actividades de índole permanente, regular, habitual.

A interpretação aqui sustentada surge corroborada, de resto, pela parte final da prescrição legal em referência.

Nela se impõe, com efeito, a comunicação, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, das ditas actividades, "quando de exercício continuado". Assim fica implicitamente reconhecido que até as actividades de exercício continuado podem ser acumuladas com as funções de presidente e vereador de câmara municipal. As restantes também o podem ser, por maioria de razão, nem sequer sendo necessário, a seu respeito, efectuar qualquer comunicação (23).



3.2. - De tudo o que fica exposto é legítimo concluir que não será de acolher o eventual entendimento segundo o qual a relevância dos artigos 4º e 6º da Lei nº 64/93 se processasse em dois momentos sucessivos, abrangendo o primeiro as próprios presidentes e vereadores a tempo inteiro, enquanto titulares de órgãos políticos. E, isso, em termos de o artigo 4º ter começado por aplicar àqueles autarcas o regime de exclusividade, revogando assim o artigo 3º da Lei nº 29/87; e de o subsequente artigo 6º ter vindo atenuar esse regime restritivo, mas permitindo apenas aos mesmos eleitos locais a acumulação com actividades privadas, como era tradicional.

Este ponto de vista não se afigura sustentável, desde logo porque os citados artigos 4º e 6º, embora, necessariamente, em posições sistemáticas diferentes dentro da economia da Lei nº 64/93, assumiram eficácia jurídica simultânea. Ora, sendo assim, a estatuição do artigo 4º, enquanto norma geral aplicável aos cargos políticos, cede naturalmente o passo, no tocante à definição das incompatibilidades dos autarcas, à regra especial a estes destinada e constante do artigo 6º.



3.3. Eventual limitação ao mencionado sistema permissivo apenas poderá resultar de eventuais incompatibilidades reportadas, não às funções de eleitos locais, mas aos cargos que com estes porventura se pretendesse acumular.

Assim se arredarão, desde logo, as hipóteses mais extremas e gritantes de acumulação que a pura literalidade do nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93 poderia parecer admitir.

Estão nesse caso, desde logo, os cargos políticos, que, porque têm de ser exercidos em exclusividade, por força do artigo 4º nº 1 do mesmo diploma legal, não podem ser acumulados com quaisquer funções de eleitos locais .

E releva também, sob a mesma perspectiva, o nº 2 do já citado artigo 6º, do seguinte teor:

"2 - O disposto no número anterior não revoga os regimes de incmpatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais".

Esta regra não é susceptível de ser interpretada no sentido de remeter para a norma do artigo 3º do Estatuto dos Eleitos Locais, recuperado assim as incompatibilidades aí definidas.

É que, como se apontou, os "cargos ou actividades profissionais" aí mencionados não podem abranger, sequer em parte, as próprias funções autárquicas.

A mencionada expressão reporta-se, sim, a incompatibilidades e impedimentos relativos a outras actividades, públicas ou privadas, que com as funções autárquicas se pretendessem porventura acumular.

Os antecedentes históricos e os trabalhos preparatórios respeitantes a essa norma revelam, com suficiente clareza, que assim é.

De entre os cargos públicos abrangidos pelo citado nº 2 sobressaem, desde logo, os do pessoal dirigente, que, por força do artigo 9º, nº 1, do Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, exerce funções (salvo algumas excepções expressamente ressalvadas) em regime de exclusividade.

Mas outras funções ainda, no âmbito do sector público, estão também compreendidas no preceito em apreciação. Refiram-se, por todas, as dos docentes de ensino universitário e que ensinam em regime de dedicação exclusiva, nos termos do artigo 70º do Estatuto da Carreira Docente Universitário, aprovado pelo Decreto-Lei nº 448/79, de 17 de Setembro, na redacção dada pela Lei nº 6/87, de 27 de Janeiro.





4

4.1. O já transcrito e analisado nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93 permite igualmente dar resposta à terceira pergunta relativa a incompatibilidades constante da consulta que originou o presente parecer-qual seja a de saber se o presidente duma câmara municipal pode, presentemente, exercer, em acumulação, "funções privadas".

Com efeito, já se observou que, nos termos da aludida regra geral, tais autarcas podem exercer "outras actividades".

Não se operando qualquer distinção a propósito da noção de "outras actividades", é evidente que esta compreende tanto as de natureza pública como as de carácter privado.

E também houve já oportunidade de realçar que, dada a sua extensão tão abrangente, o vocábulo "actividades" se revela aplicável, tanto a tarefas de índole duradoura, permanente, habitual ("funções", nos termos dos artigos 4º e 7º da Lei em causa), como às meramente esporádicas ou pontuais.

Nestas actividades privadas englobam-se, naturalmente, quer as exercidas por conta de outrem, quer as levadas a cabo no âmbito de trabalho independente ou profissão liberal.

Também aqui - porque tão-pouco a lei distingue no tocante às actividades privadas - haverá que, por obediência à norma em apreciação, comunicá-las, ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal, desde que as mesmas sejam "de exercício continuado".



4.2. Possível restrição a este regime de cumulabilidade poderá contudo decorrer da eventual existência de leis que consagrem incompatibilidades ou impedimentos ao exercício, em acumulação com funções autárquicas, de certos "cargos ou actividades profissionais" do sector privado.

Isto, por força do nº 2 do mesmo artigo 6º da Lei nº 64/93, em moldes paralelos aos já mencionados no que concerne à cumulabilidade com actividades de natureza pública.

Assim, essas possíveis incompatibilidades ou impedimentos hão-de estar consignados, não em relação às funções autárquicas, mas sim às actividades privadas de cuja cumulabilidade com elas se pretenda ajuizar.

Um caso típico deste género é o que se refere ao exercício da advocacia, que é incompatível com as funções de presidente de câmara municipal, nos termos do artigo 69º, nº 1, alínea f) do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto-Lei nº 84/84, de 16 de Março (24).



5

5.1. Passando agora às questões postas relativas ao regime remuneratório, pretende-se saber se um presidente de câmara pode optar pelo vencimento ou remuneração que auferia, como funcionário público, antes de tomar posse desse cargo autárquico.



5.2. Numa primeira aproximação, é de atentar em que semelhante opção se não encontra expressamente prevista na já citada Lei nº 29/87 (Estatuto dos Eleitos Locais), designadamente nos preceitos (artigos 6º e 7º) que regulam as remunerações dos eleitos locais em regime de permanência, nos quais se integram os presidentes de câmara.

Ora, deve entender-se, como princípio, que a faculdade de exercer uma tal opção terá de resultar claramente da lei.



5.3. Este ponto de vista surge reforçado se se observar que, em matéria de segurança social, a Lei nº 29/87 (artigo 13º, nº 1) permite expressamente aos eleitos locais em regime de permanência optar pelo "regime da sua actividade profissional".

Ora, se o legislador tivesse querido facultar a mesma opção no concernente a remunerações, seria natural, pois, que houvesse procedido em termos análogos.

O facto de o não haver feito indicia propósito diverso.



5.4. Não pode, todavia, olvidar-se uma norma do mesmo Estatuto dos Eleitos Locais que parece apontar no sentido contrário ao da solução assim sugerida.

Trata-se do nº 2 do artigo 7º, que, a respeito da composição da remuneração dos eleitos locais em regime de permanência, dispõe que:

"2. Para determinação do montante da remuneração, sempre que ocorra a opção legalmente prevista, são considerados os vencimentos, diuturnidades, subsídios, prémios, emolumentos, gratificações e outros abonos, desde que sejam permanentes, de quantitativo certo e atribuídos genericamente aos trabalhadores da categoria optante".

Ao reportar-se a "opção legalmente prevista", esta regra inculca, implicitamente, a viabilidade legal de tal escolha da remuneração de base por parte dos autarcas em causa.


5.5. Não se afigura, porém, que esta eventual dúvida possa persistir.

E isso, desde logo, porque o artigo 26º do mesmo diploma, no seu nº 2, estipula que:

"2- O nº 2 do artigo 3º da Lei nº 9/81, de 26 de Junho, fica revogado com a realização das próximas eleições gerais autárquicas".

Ora, esse nº 2 do artigo 3º da Lei nº 9/81 era, neste diploma geral regulador (antes da Lei nº 29/87) das remunerações e abonos dos eleitos locais, precisamente a norma correspondente à do nº 2 do artigo 7º do Estatuto dos Eleitos Locais.

Ou seja: mesmo no domínio da Lei nº 29/87 a opção em causa teve existência precária, deixando de se aplicar após a realização das primeiras eleições autárquicas efectuadas depois da sua publicação.

Apenas se pretendeu, assim, não retirar um direito (a dita opção) aos autarcas em funções.



5.6. Aliás, tanto a evolução legislativa que culminou na Lei nº 29/87, como, também, os próprios trabalhos preparatórios deste diploma, revelam, com suficiente segurança, o intento de não permitir aos autarcas, a partir das primeiras eleições posteriores à respectiva publicação, a opção pela remuneração correspondente às funções que antes exerciam.

Com efeito, tal opção era claramente admitida pela Lei nº 44/77, cujo artigo 3º dispunha que:

"Artigo 3º

(Regime de remuneração dos presidentes e vereadores)

1. Os presidentes das câmaras, de comissões administrativas e os vereadores em regime de permanência terão direito aos subsídios fixados na tabela anexa a este diploma, atribuídos do seguinte modo:

a) Aqueles que exerçam exclusivamente as suas funções autárquicas perceberão a totalidade de subsídios ou optarão pela outra remuneração a que tenham direito;

..............................................................................................".

Este diploma veio a ser revogado pela Lei nº 9/81, cujo artigo 3º, nº 1, alínea a) reproduziu, todavia, textualmente, a norma da alínea acabada de transcrever.

Por seu turno, o nº 2 do mesmo preceito, já acima referido, estabeleceu regras relativas ao cálculo do montante do subsídio a auferir pelos autarcas que tivessem efectuado a opção permitida no número antecedente.

A Lei nº 29/87 veio, enfim, revogar a Lei nº 9/81, "salvo o nº 2 do artigo 3º".

Deste modo, foi abolida, por esta disposição revogatória, a faculdade de opção constante do nº 1 do artigo 3º da Lei nº 9/81 - com a ressalva de eficácia temporária já acima apontada.



5.7. As vicissitudes ocorridas na preparação da Lei nº 29/87 confirmam ter sido esta a deliberada intenção do legislador de que emanou.

Na verdade, o Projecto de Lei nº 403/IV (25), apresentado pelos cinco partidos com expressão parlamentar (e que deu origem ao mencionado diploma legal), continha no respectivo artigo 6º, relativo às remunerações dos eleitos locais em regime de permanência, um nº 4 do teor seguinte:

"4- Os eleitos locais em regime de permanência que exerçam exclusivamente as suas funções autárquicas podem optar pelas remunerações a que tinham direito na sua actividade profissional".

A questão não terá sido pacífica no âmbito do Grupo de Trabalho que, constituído no seio da Comissão Parlamentar da Administração Interna e Poder Local, elaborou o Projecto de Lei citado.

Na realidade, quando o mesmo foi discutido em Plenário, a deputada Helena Torres Marques (PS) não deixou de, na sua intervenção, precisar que (26):

"Um outro aspecto que votámos vencidos tem a ver com a dedicação exclusiva e a não possibilidade de opção por um rendimento diferente daquele que é auferido pelo presidente da Câmara. Entende o PS que, por uma razão de independência e autonomia, em nenhum cargo político deve ser possível optar pelo vencimento que se aufere numa actividade privada ou numa empresa pública.

As soluções (sic) políticas representam uma opção global de vida e nessa opção global também deve estar o vencimento. Nesse sentido apresentámos uma proposta em relação aos deputados e aos autarcas, proposta essa que não mereceu vencimento".

Devem ter sido razões desta natureza que levaram, aquando da votação do citado Projecto de Lei na especialidade, o Plenário da Assembleia da República a rejeitar o supratranscrito nº 4 do seu artigo 6º (27).

É curioso notar, aliás, que, apesar desta rejeição, a alínea a) do nº 1 do artigo em questão ainda foi votada, na especialidade, com a seguinte redacção:

"a) Aqueles que exerçam exclusivamente as suas funções autárquicas receberão a totalidade das remunerações previstas nos nºs 1 e 3 do artigo anterior, ou por que tenham optado nos termos do nº 4 do mesmo artigo;"

A parte final desta alínea não consta, porém, do texto publicado da Lei nº 29/87 - decerto por a comissão de redacção da Assembleia da República se ter apercebido da necessidade da sua eliminação, face à rejeição do primitivo nº 4 do anterior artigo.



5.8. Quer os trabalhos preparatórios da Lei nº 29/87, quer a expressa revogação, por esta, da Lei nº 9/81 (com ressalva, temporária, do nº 2 do seu artigo 3º), patenteiam que o legislador de 1987 teve em mira abolir a faculdade de opção, pelos autarcas em regime de permanência, em relação às remunerações que auferiam nas suas actividades profissionais anteriores - quebrando assim a tradição existente nesta matéria.

Que da entrada em vigor da Lei nº 29/87 iria resultar o desaparecimento da possibilidade da opção em causa revela-o até a discussão surgida, no termo da apreciação do Projecto de Lei nº 403/IV, tendente a eximir desse regime os autarcas em funções, que decerto com ele não teriam podido contar.

Foi essa discussão que deu origem, aliás, ao já transcrito nº 2 do artigo 26º da Lei nº 29/87.



5.9. Este Conselho já teve, de resto, oportunidade de se expressar neste mesmo sentido.

Disse-o, em particular, no Parecer nº 189/83, (28) (complementar), de 7 de Dezembro de 1988, em cujo nº 5 se pode ler, designadamente:

"E, como a Lei nº 29/87 não possibilita a opção entre o "vencimento" que fixa e o do lugar de origem, ...etc.

E, mais adiante:

"Tão pouco interessará discutir o sentido a atribuir ao nº 2 do artigo 7º, que continua a falar de "opção legalmente prevista", depois de se ter proibido a opção, ao eliminar-se o nº 4 do artigo 6º do Projecto de Lei nº 403/IV".



5.10. Sendo assim, qual, afinal, o sentido e relevância do actual nº 2 do artigo 7º da Lei nº 29/87, já antes mencionado e transcrito?

Muito apesar de, como princípio, se dever pressupor que o legislador escolheu soluções adequadas, e não incongruentes nem inúteis, não parece que essa posição se possa aqui sustentar.

A manutenção deste preceito no texto final da Lei nº 29/87 deve ter-se ficado a dever a desatenção do legislador (29).

Com efeito, a Lei nº 29/87 não só deixou de admitir a opção aí referida, como limitou expressamente a eficácia temporal do nº 2 do artigo 3º da anterior Lei nº 9/81 - preceito de conteúdo praticamente idêntico ao do que ora se aprecia.

De todo o modo, sempre ele teria deixado de poder ter qualquer relevância após as primeiras eleições autárquicas posteriores à publicação da Lei nº 29/87.



6

6.1. A abordagem das restantes três questões suscitadas aconselha que se exponha sinteticamente a evolução legislativa, no âmbito da Constituição vigente, do regime das remunerações dos eleitos locais.

A Lei nº 44/77, respeitante apenas aos autarcas municipais, reconheceu aos presidentes das câmaras e de comissões administrativas e aos vereadores em regime de permanência o direito a receber um subsídio mensal, acrescido de dois subsídios extraordinários, nos meses de Junho e Dezembro (artigo 2º).

Nos termos do nº 1 do subsequente artigo 3º, este subsídio era atribuído do modo seguinte:

"a) Aqueles que exerçam exclusivamente as suas funções autárquicas perceberão a totalidade do subsídio ou optarão pela outra remuneração a que tenham direito;

b) Aqueles que exerçam uma profissão liberal, no caso em que o respectivo estatuto profissional permita a acumulação, ou qualquer actividade privada perceberão 50/100 do subsídio, sem prejuízo da totalidade das regalias sociais a que tenham direito;

c) Aqueles que exerçam uma actividade política num órgão de soberania, pertençam à administração de qualquer pessoa colectiva de direito público ou empresa nacionalizada terão a faculdade de optar por uma das duas remunerações".

O nº 2 do mesmo preceito acrescentava que os autarcas mencionados no número antecedente que não optassem pelo exclusivo exercício das suas funções teriam de assegurar a resolução dos assuntos municipais da sua competência no "decurso de parte do período de expediente público".

As alíneas b) e c) do nº 1 contemplavam hipóteses de cumulação, respectivamente com actividades de natureza privada e pública.

Poder-se-ia, mesmo, duvidar do cabimento da última dessas regras, face às incompatibilidades consagradas no artigo 1º da Lei em causa e já antes apreciadas.

A sua adopção pode, de todo o modo, explicar-se pelo facto de, no momento da publicação dessa Lei, se encontrarem em funções - porque antes dela não feridos de incompatibilidade - autarcas abrangidos pela dita alínea c).

Aliás, as previsões do artigo 1º e dessa alínea c) não são integralmente coincidentes.

Em 1981, foi emanada a Lei nº 9/81, de 26 de Junho, tendo por objectivo regular as remunerações e abonos dos "eleitos locais", em geral.

Conquanto este diploma haja revogado a Lei nº 44/77 (30), no nº 1 do seu artigo 3º reproduziu-se, quase integralmente, o regime de remuneração dos membros das câmaras municipais naquela estabelecido (31).

Em 1987, veio a ser publicado o Estatuto dos Eleitos Locais - Lei nº 29/87, de 3 de Junho - que revogou (artigo 26º) a Lei nº 9/81, com a ressalva de eficácia temporária já antes indicada, relativa ao nº 2 do respectivo artigo 3º.

O regime remuneratório dos eleitos locais em regime de permanência - que compreendem, como acima referido, os presidentes das câmaras municipais e os vereadores em número e nas condições previstas na lei (artigo 2º, nº 1) - mantém-se, na essência, muito similar ao dos diplomas anteriores reguladores da matéria.

Com efeito, o artigo 7º da Lei nº 29/87 prescreve que:



"Artigo 7º

Regime de remuneração dos eleitos locais em

regime de permanência

1- As remunerações fixadas no artigo anterior são atribuídas do seguinte modo:

a) Aqueles que exerçam exclusivamente as suas funções autárquicas recebem a totalidade das remunerações previstas nos nºs 2 e 3 do artigo anterior;

b) Aqueles que exerçam uma profissão liberal, quando o respectivo estatuto profissional permitir a acumulação ou qualquer actividade privada perceberão 50% do valor base da remuneração, sem prejuízo da totalidade das regalias sociais a que tenham direito."

Confrontando este regime com o da Lei nº 9/81, verifica-se, designadamente, que:

- os abonos mensais dos eleitos em questão passam a ser caracterizados como remuneração (artigo 6º), restando a qualificação de subsídio extraordinário para os auferidos em Junho e Novembro;

- deixou de existir, como antes se realçou, a faculdade de opção pela remuneração do cargo profissional anterior;

- foi eliminada a possibilidade de opção pela remuneração correspondente a outra função pública exercida em acumulação (32).

Mas a Lei nº 29/87 acrescenta uma regra aplicável às remunerações dos vereadores em regime de meio tempo, situação entretanto consagrada pelo Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março (artigo 45º, nº 2).

Trata-se do artigo 8º, que dispõe:



"Artigo 8º

Remuneração dos vereadores em regime de meio tempo

Os vereadores em regime de meio tempo têm direito a metade das remunerações e subsídios fixados no nº 3 do artigo 6º."

A apreciação desta evolução legislativa justifica uma observação e exige uma tomada de posição acerca da vigência ou não da Lei nº 29/87, na sua integralidade, no tocante às remunerações dos eleitos locais.



6.2. A observação é a de que a grande similitude entre os regimes remuneratórios das sucessivas leis sobre a matéria legitima que, para interpretação do sistema actual, se recorra aos trabalhos preparatórios da Lei nº 44/77, que desencadeou este movimento legislativo.

Isto é tanto mais relevante quanto dos trabalhos preparatórios das Leis nºs 9/81 e 29/87 pouco de interesse se colhe que possa elucidar sobre a questão.

Ora na Proposta de Lei nº 44-I (33) previa-se que as funções de presidente de câmara ou de comissão administrativa municipal seriam, em princípio, incompatíveis com o exercício de qualquer função pública remunerada, de profissão liberal ou outra actividade (artigo 3º, nº 1). No subsequente nº 2 admitia-se, contudo, que a assembleia municipal pudesse autorizar tal acumulação.

Dado que a 11ª Comissão da Assembleia da República, no texto que apresentou ao Plenário, restringia a incompatibilidade em causa apenas ao concernente a outras funções de índole pública, estabeleceu-se, naquele, discussão acerca dos méritos e deméritos de tal solução.

Houve quem a criticasse, como o PCP, em cuja declaração de voto, lida pelo deputado Lino Lima, se ponderou (34):

"3º Também merece ao PCP sérias reservas que seja permitido aos presidentes das câmaras e aos vereadores em regime de permanência o exercício, em acumulação, de actividades privadas. Julgamos, por um lado, que os presidentes das câmaras e os vereadores em regime de permanência deveriam dedicar-se em pleno à actividade municipal para que foram eleitos e designados; e, por outro, tememos - e a experiência do passado dá-nos razão - que o exercício da actividade privada por parte dos presidentes das câmaras e dos vereadores em regime de permanência lhes facilite situações de privilégio e favor que, além de serem imorais, desprestigiam o poder local e, consequentemente, o poder democrático;"

Mas o texto da 11º Comissão encontrou, por seu turno, defensores, a ponto de ter vindo, a final, a vingar.

De entre estes, distinguiram-se as vozes de Moura Guedes (PSD) (35):

"Nós, sociais-democratas, consideramos como importantes, para o futuro e a viabilidade da democracia local no nosso país, a compatibilização da actividade privada com a gestão municipal, sem uma absurda burocratização do presidente da câmara, em termos de horário de trabalho ou noutros aspectos.
............................................................................................

Aceitámos, em contrapartida, a redução para metade dos vencimentos daqueles dos presidentes das Câmaras que venham a optar pelo livre e simultâneo exercício de uma profissão liberal ou de outra actividade privada. Parece-nos de certo modo aceitável que se fixe essa redução, numa linha de procura de uma maior igualação de situações reais, em termos de rendimento, que nunca poderia passar, como na disposição aprovada aliás não passa, por quaisquer medidas de restrição à liberdade da iniciativa privada e ao justo prémio do esforço e da capacidade pessoal".

E, ainda, de Godinho de Matos (PS) (36):

"...pensamos que é lícito e legítimo que se admita que um médico, um farmacêutico, um pequeno industrial, um pequeno comerciante ou um veterinário possam desenvolver a sua actividade em simultâneo com a gestão de uma câmara. Mas exigindo-se, sim, nesses casos, que esse indivíduo que acumula, portanto, dois tipos de actividade: a política e a pública, na gestão da câmara, e a privada, pessoal, no exercício da sua profissão, só possa receber, nesse caso, metade do vencimento que lhe caberia como responsável pela gestão da câmara".



6.3.1. A tomada de posição que se torna necessária respeita a saber se se mantém ou não em vigor a alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87.

Há, na verdade, quem considere que esta norma foi revogada pela Lei nº 9/90.

Já se mencionou, com efeito, que a Lei nº 9/90 qualifica como titulares de cargos políticos os de "presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais" (artigo 1º, nº 1, alínea i)).

Ora o artigo 2º dessa Lei declara incompatível com a titularidade de tais cargos "o exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo e o exercício de actividades de representação profissional" (alínea a)).

Visto que a expressão "actividades profissionais" tem generalizadamente sido reportada a actividades privadas de carácter regular e habitual (37), argumenta-se que, por força desta incompatibilidade criada pela Lei nº 9/90, teria deixado de ter aplicabilidade o regime remuneratório previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87, porque relativo à acumulação de funções de eleitos locais em regime de permanência com profissão liberal ou outra actividade privada.

E nem a abolição desta incompatibilidade por força do artigo 6º da Lei nº 64/93 teria vindo alterar tal situação, pois que a revogação da lei revogatória não implica, como regra, a repristinação da lei revogada.



6.3.2. Esta interpretação não merece, todavia, acolhimento.

O artigo 7º da Lei nº 29/87 e o artigo 2º da Lei nº 9/90 têm objectos diversos e assentam em perspectivas diferentes também - aliás denunciadas nas suas próprias epígrafes.

O primeiro, ocupa-se do regime de remuneração dos autarcas em regime de permanência.

O segundo, define incompatibilidades de titulares de cargos políticos, entre os quais os de presidentes e vereadores a tempo inteiro de câmaras municipais.

O facto de haver coincidência entre os universos pessoais abrangidos por estas duas normas (38) apenas teve por consequência que a alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87 houvesse deixado de poder aplicar-se, enquanto vigorou a incompatibilidade resultante da aludida alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90, conjugada com a alínea i) do nº 1 do artigo anterior.

Mas aquela prescrição manteve a virtualidade de voltar a aplicar-se, se e na medida em que viesse de novo a poder ocorrer situação do tipo das contempladas na sua previsão.

E foi o que, na verdade, veio a suceder, quando, por força do artigo 6º da Lei nº 64/93, os autarcas passaram a poder exercer, em acumulação, quaisquer actividades, públicas ou privadas.

Aliás, mal se compreenderia que, voltando a poder verificar-se, para os eleitos locais em regime de permanência, a acumulação com o exercício de actividades privadas, não se lhes aplicasse também de novo, quanto a remunerações, o regime constante do artigo 7º da Lei nº 29/87.

Isto, até porque continuariam válidas as razões que terão estado na base desse regime, detectadas aquando da discussão, na Assembleia da República, da Lei nº 44/77.

Sucede que os trabalhos preparatórios da Lei nº 64/93 não prejudicam esta posição, já que no seu âmbito apenas se tratou do problema da cumulabilidade das funções autárquicas com outras actividades, e não já do modo de, nesses termos, as remunerar.



6.4. Como anotação final, aponte-se apenas que, no tocante aos vereadores a tempo parcial, não se põe sequer a questão da eventual revogação, do artigo 8º da Lei nº 29/87, pela Lei nº 9/90.

É que a incompatibilidade consignada no artigo 2º, alínea a) deste último diploma se reportava apenas a "vereador a tempo inteiro", tal como resultava da sua conjugação com a alínea a) do nº 1 do precedente artigo 1º.



7

7.1. Analisados os dois aspectos prévios constantes do anterior nº 6, estão reunidas as condições para responder à questão consistente em saber se "um eleito local que exerça funções autárquicas, em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, pode exercer actividade privada, em acumulação, sem dedução de 50% do valor base da remuneração devida pelo exercício das referidas funções públicas".



7.2. Não é possível, é certo, desconhecer-se que se pode suscitar ainda um problema de qualificação e enquadramento jurídico.

Mas a verdade é que ele acaba por não ser decisivo para a resposta a dar à aludida pergunta.

Trata-se da caracterização da noção de "eleitos locais em regime de permanência".

Bastante se tem discutido acerca do conteúdo deste conceito, havendo este Conselho já tido a oportunidade, várias vezes, de sobre ele de debruçar (39).

A solução a dar ao problema veio a ser dificultada pela oscilação da nomenclatura utilizada pelo legislador, por vezes no âmbito do mesmo diploma.

Por isso é que, de resto, este corpo consultivo acabou por admitir, no parecer nº 27/90-Comp. (nºs 5.1 a 5.3), aprovado em 10 de Outubro de 1991, que na própria Lei nº 29/87 não é unívoco o significado da expressão "eleitos locais em regime de permanência".

De todo o modo, a forma como a pergunta é apresentada corresponde à mais recente tomada de posição legislativa sobre a matéria, constante do artigo 6º da Lei nº 64/93, o qual se aplica aos "presidentes e vereadores de câmaras municipais, mesmo em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial".

Aqui, pois, a lei acabou por consagrar a posição que, em tese geral, este Conselho vinha defendendo, e segundo a qual a noção de "vereador em regime de permanência" abrange todos os que exercem funções autárquicas de modo regular e permanente. A eles se contrapõem, assim, os que se limitam a participar nas reuniões do órgão autárquico colegial a que pertencem, sendo por isso remunerados apenas por senhas de presença (artigo 10º da Lei nº 29/87).

Na economia da Lei nº 29/87, a perspectiva apresenta-se algo diversa. Pelo menos nos termos gerais e no que respeita a remunerações, o conceito de "eleitos locais em regime de permanência" compreende aí apenas os que exercem funções a tempo inteiro - assim se contrapondo, não só aos que trabalham a meio tempo, como aos que apenas participam nas reuniões do órgão colegial a que pertençam.

É o que decorre, nomeadamente, do confronto entre os nºs 1 e 2 do artigo 2º e entre os artigos 7º e 8º dessa Lei, bem como do teor do nº 1 do respectivo artigo 10º.

De qualquer forma, o que afinal releva para a questão suscitada é a apreciação, separadamente, da posição dos eleitos locais que exercem funções a tempo inteiro e da dos que trabalham a tempo parcial - num e noutro caso com regularidade e permanência, com exclusão dos que apenas participam nas reuniões dos órgãos colegiais correspondentes.



7.3. A situação remuneratória dos vereadores em regime de meio tempo não parece suscitar dúvidas: têm, por força do artigo 8º da Lei nº 29/87, sempre direito a 50% das remunerações e subsídios incluídos no anterior artigo 6º, quer acumulem, quer não, com o exercício duma profissão liberal ou de outra actividade de natureza privada.



7.4. E diverso não se apresenta, afinal, o regime remuneratório aplicável aos que exerçam funções autárquicas a tempo inteiro, em acumulação com uma profissão liberal ou outra actividade privada.

A contraposição entre os artigos 7º e 8º da Lei nº 29/87 revela que, naquele, ao falar-se de "eleitos locais em regime de permanência", se quer significar os que exerçam funções a tempo inteiro.

Ora a alínea b) do nº 1 do dito artigo 7º determina que tais autarcas, desde que acumulem com uma profissão liberal ou outra actividade privada, "perceberão 50% do valor base da remuneração".

A diferença da sua situação em relação à dos autarcas a tempo parcial manifesta-se, sim, na área da segurança social. É que a parte final da mesma norma acrescenta "sem prejuízo da totalidade das regalias sociais a que tenham direito" - ao passo que o tempo parcial só releva em termos proporcionais para efeitos de segurança social.



7.4. Poder-se-á, porventura, suscitar alguma estranheza pelo facto de, assim, acabarem por receber 50% da remuneração relativa às funções autárquicas, quer os eleitos locais em regime de tempo parcial, quer os que trabalhem a tempo inteiro, acumulando com uma profissão liberal ou outra actividade privada.

Mas não parece legítimo duvidar - perante a clara expressão da alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87 - de que foi esse o intuito deliberado do legislador.

E a estreita vizinhança dessa norma com a reguladora da remuneração (também reduzida a metade do normal) dos autarcas a meio tempo revela não poder a este propósito ter ocorrido eventual desatenção ou falha do legislador.

Ter-se-á querido, sobretudo, sem afectar a liberdade do exercício da profissão dos eleitos locais, evitar que a cumulação integral das remunerações de autarcas com os proventos da actividade privada produzisse rendimentos totais demasiado altos, excessivamente discrepantes dos daqueles que só exercessem funções autárquicas.

Recorde-se, a propósito, terem assentado em razões deste tipo as declarações produzidas na Assembleia da República por alguns deputados para justificar regime análogo que veio a ser consagrado na Lei nº 44/77.

Mas também deve ter estado na mente do legislador o intento de - tolerando-a embora - não incentivar propriamente a acumulação em causa. Isto, tendo em conta que tal acumulação, mesmo que não afecte, em rigor, o exercício de funções autárquicas a tempo inteiro, sempre condicionará a dedicação e disponibilidade que as mesmas implicam.



8

8.1. Pretende, ainda, saber-se se um eleito local em regime de permanência pode exercer actividade privada, de forma não regular ou não permanente, remunerada, continuando a receber na integralidade a remuneração correspondente às funções autárquicas.



8.2. À primeira vista, a pura literalidade da alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87 pareceria implicar a solução negativa, na medida em que aí se fala, sem distinguir, de "qualquer actividade privada."



8.3.1. Não se afigura, porém, que esse possível sentido resista ao confronto com os demais elementos relevantes em termos de interpretação das normas.

Antes de mais, e desde logo, a consideração do seu contexto próximo, representado pela noção de "profissão liberal", à qual o legislador atribuíu, na economia da norma em referência, relevância idêntica à da expressão em análise, logo sugere que também esta há-de implicar realidade de natureza semelhante: ou seja, a duma actividade regular e permanente, e não já pontual ou esporádica.



8.3.2. Este argumento não surge, de resto, isolado. Pode corroborá-lo a consideração de vários lugares paralelos daquele preceito, dos quais se podem destacar:

a) O do artigo 4º da Lei nº 64/93, onde, ao definir-se o regime de exclusividade dos cargos políticos, em geral (mais severo, pois, que o aplicável aos autarcas), se estipula que a respectiva titularidade "é incompatível com quaisquer outras funções profissionais, remuneradas ou não". Actividades privadas de natureza não profissional serão, pois, compatíveis com a titularidade de cargos políticos, em nada afectando o seu exercício a remuneração a estes correspondente.

b) O do artigo 6º da mesma Lei, que, no âmbito do sistema de livre cumulabilidade de outras actividades nele consignado para presidentes e vereadores de câmaras municipais, qualquer que seja o seu regime, revela só interessarem de algum modo ao legislador as que sejam de "exercício continuado". Só essas, com efeito, têm de ser comunicadas ao Tribunal Constitucional e à assembleia municipal.

Das de índole esporádica ou pontual desinteressa-se a lei, o que se afigura coerente com o facto de não deverem assumir relevância quanto à remuneração base dos autarcas.

c) Em paralelismo mais remoto, é certo, mas também merecedor de atenção, por ainda se situar no âmbito do sector público, o do artigo 2º, nº 2 do Decreto-Lei nº 413/93, de 23 de Dezembro, que, ao estatuir incompatibilidades e impedimentos para titulares de órgãos, funcionários e agentes da administração, central, regional e local, se reporta, nomeadamente, a actividades "desenvolvidas de forma permanente e habitual".

d) Enfim, o nº 2 do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, ao excluir, do regime geral de necessidade de autorização para acumulação de actividades privadas com o exercício da função pública, "a criação artística e literária e a realização de conferências, palestras, acções de formação de curta duração e outras actividades de idêntica natureza", corrobora a posição geral de abertura do legislador em relação a actividades deste tipo, esporádicas e pontuais.

Da consideração destas várias regras legais resulta possível extrair a conclusão de que o princípio que as enforma é o de que o exercício de actividades privadas esporádicas ou pontuais (não regulares nem permanentes, portanto), não só é compatível com o exercício de cargos políticos, em geral, e autárquicos, em particular, como não assume qualquer relevo em relação à remuneração normal que lhes corresponde.

Recorde-se, de resto, que as declarações produzidas, no âmbito da discussão da proposta de lei que esteve na base da Lei nº 44/77, para justificar a redução da remuneração autárquica em caso de acumulação com actividades privadas solução retomada pela Lei nº 29/87 se centraram sempre em torno de actividades de natureza profissional - regulares e permanentes, portanto.



8.4. Este Conselho também já tem tido oportunidade, por mais de uma vez, de exprimir a doutrina de que o exercício de actividades, ainda que privadas, de carácter pontual ou esporádico, não é incompatível com a titularidade de cargos de natureza pública (40).



9

9.1. Mais duvidosa se apresenta, enfim, a questão de saber se um eleito local "em regime de permanência a tempo inteiro ou parcial, pode exercer em acumulação actividade privada, não remunerada", sem dedução de 50% do valor base da remuneração devida pelo exercício das correspondentes funções autárquicas.



9.2. É que há que reconhecer que pelo menos parte das afirmações produzidas na Assembleia da República aquando da discussão da norma da Lei nº 44/77 a que corresponde a alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87 se centraram no propósito de evitar que, por força da acumulação do exercício de funções autárquicas com actividades privadas, se gerasse um excessivo desequilíbrio entre os rendimentos totais auferidos pelos eleitos locais.

Acresce que a eventual aplicação, em situações destas, da redução prevista no dito preceito do Estatuto dos Eleitos Locais implicaria um resultado que não deixaria de, em termos de justiça material, poder parecer algo incongruente.

E isto em dois sentidos:

- por um lado, os autarcas a tempo inteiro que acumulassem com actividade privada não remunerada acabariam por auferir o mesmo que os autarcas a tempo parcial;

- por outro, eles perceberiam metade das remunerações pagas aos que, trabalhando também a tempo inteiro (ou seja, exercendo funções autárquicas nos mesmos termos que eles), não cumulassem com qualquer actividade privada.



9.3. Pese embora a atenção que estas razões sem dúvida merecem, não se afigura que elas tenham força bastante para impor como legal a solução para que apontariam.

Antes de mais, é indiscutível, e não pode ser ignorado, que a alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87, ao determinar a redução de 50% na remuneração dos autarcas que acumulam com "qualquer actividade privada", o faz sem proceder a qualquer distinção: nesta última expressão cabem, pois, quer actividades remuneradas, quer as que o não sejam.

Este preceito não pode, aliás, ser considerado isoladamente, mas tem de ser interpretado em conjugação com o da alínea a) que imediatamente o precede. Ora, nessa alínea a) se estipula que a "totalidade das remunerações" relativas aos eleitos locais em regime de permanência é auferida por "aqueles que exerçam exclusivamente funções autárquicas". Esse não é, claramente, o caso dos autarcas em questão, já que, exercendo também actividades privadas, ainda que a título gratuito, não desempenham "exclusivamente funções autárquicas".

E nem pode negar-se a existência de razões de fundo capazes de conferir justificação bastante à aplicação dum tal regime de redução remuneratória.

É que, tal como já acima se realçou, o exercício cumulativo de actividades privadas, regulares e permanentes (ainda que não remuneradas), não deixa de afectar a dedicação e disponibilidade com que desejavelmente os eleitos locais devem exercer as funções autárquicas.
9.4.1. Foram razões deste tipo que levaram já este Conselho, no Parecer nº 43/93, de 14 de Julho de 1993, a ponderar que:

"O facto de a actividade exercida pelos eleitos locais (em regime de permanência) não ser remunerada não é decisivo para a sua harmonização com o regime da alínea a) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87; decisivo é que se não trate de actividade profissional, remunerada ou não, com o sentido amplo que este corpo consultivo lhe atribui".

Em conformidade, concluíu-se nesse mesmo parecer:

"1. A expressão "qualquer actividade privada", constante da alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho, tem conotação profissional, equivalente a "actividade profissional privada", a "forma de ganho de vida", tendo, em princípio, como contrapartida, qualquer compensação económica;

2. Têm direito à remuneração prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87 os eleitos locais em regime de permanência que apenas exerçam actividades privadas, remuneradas ou não, que não tenham a conotação profissional referida na conclusão anterior".



9.4.2. Em sentido convergente se pronunciara também, em 1992, a Auditoria Jurídica do MPAT, em parecer homologado por Sua Excelência o Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território (41), ao entender que:

"Os eleitos locais que, cumulativamente com as suas funções autárquicas, exerçam actividade privada não remunerada, recebem, por força da alínea b) do nº 1 do artigo 7º da Lei nº 29/87, de 30-6, apenas 50% do valor de base da remuneração".



Conclusão:



10. Em conclusão:

1º - O nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93, de 28 de Agosto, revogou tacitamente o nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho;

2º - Os presidentes de câmaras municipais podem acumular as respectivas funções autárquicas com outras funções públicas - salvo se estas últimas corresponderem a cargos políticos (artigos 1º e 4º, nº 1, da Lei nº 64/93), ou a cargos ou actividades profissionais relativamente aos quais outras leis estabelecerem incompatibilidades ou impedimentos de acumulação com aquelas funções autárquicas (artigo 6º, nº 2 da mesma Lei);

3º - Os presidentes de câmaras municipais podem acumular as respectivas funções autárquicas com actividades privadas;

4º - Os presidentes de câmaras municipais não podem optar pela remuneração que auferiam enquanto funcionários públicos;

5º - Os eleitos locais que exerçam funções autárquicas em regime de permanência, a tempo inteiro, e que acumulem com actividade privada remunerada, de carácter regular, só têm direito a perceber 50% da remuneração normal correspondente àquelas funções;

6º - Os eleitos locais que exerçam funções autárquicas em regime de permanência, e que acumulem com actividade privada remunerada, de natureza não permanente nem regular, têm direito a receber por inteiro a remuneração correspondente àquelas funções;

7º - Os eleitos locais que exerçam funções autárquicas em regime de permanência, a tempo inteiro ou parcial, e que acumulem com actividade privada, permanente e regular, não remunerada, apenas têm direito a perceber 50% da remuneração normal correspondente àquelas funções.

VOTOS


Eduardo de Melo Lucas Coelho - Vencido no tocante à conclusão 4ª, por acolher uma solução dificilmente harmonizável com a doutrina sumariada nas conclusões 2ª e 3ª.
Com efeito, desde que, como inovação do artigo 6º da Lei nº 64/93, o presidente da câmara passou a poder exercer em acumulação outras funções públicas (e privadas), e a cumular provavelmente as remunerações, ou parte delas, oriundas de ambos os cargos exercidos, mal se compreenderia que, dedicando-se em exclusivo à função autárquica, não pudesse, ao menos, optar pela percepção singular do vencimento de origem.
O artigo 7º, nº 2, da Lei nº 29/87, de 30 de Junho - Estatuto dos Eleitos Locais -, continua a aludir à possibilidade desta opção e semelhante afloração faz todo o sentido quando se tenha em conta que a fonte da opção - correspondente, pode afirmar-se, a um princípio geral de mobilidade na função pública - pode residir, justamente, no estatuto da origem.
Recorde-se apenas, elucidativamente, a norma geral do artigo 7º do Decreto–Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro: "Em todos os casos em que o funcionário passe a exercer transitoriamente funções em lugar ou cargo diferente daquele em que está provido é-lhe reconhecida a faculdade de optar a todo o tempo pelo estatuto remuneratório devido na origem".

(Salvador Pereira Nunes da Costa) - Voto vencido quanto as conclusões 1ª e 2ª, pelos motivos que sinteticamente se enunciam.
I
Face ao disposto no nº 4 do artigo 269º da Constituição, a regra quanto à acumulação de empregos ou cargos públicos é a da proibição, constituindo a não proibição, nos casos expressamente admitidos na lei ordinária, a excepção.
De harmonia com a referida regra, salvaguardando embora o disposto em lei especial, o nº 1 do artigo 3º do Estatuto dos Eleitos Locais estabelece a incompatibilidade, além do mais, das funções dos eleitos locais em regime de permanência e das dos agentes ou funcionários da administração central, regional ou local.
Constitui regime especial no que concerne, além do mais, aos presidentes das câmaras municipais o disposto na alínea h) do artigo 2º e no artigo 4º da Lei nº 64/93, de 28 de Agosto, na medida em que os qualifica de titulares de cargos políticos, e estabelece que exercem as suas funções em regime de exclusividade, em termos de incompatibilidade com quaisquer outras funções profissionais remuneradas ou não ou com a integração em corpos sociais de empresas públicas ou privadas e pessoas colectivas com fins lucrativos, salvo as derivadas do cargo e as exercidas por inerência.
Por força do estatuído no nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93, os presidentes das câmaras municipais, ainda que em regime de permanência, podem exercer outras actividades, e nos termos do nº 2 da mesma disposição, o estatuído no nº 1 não revoga os regimes de incompatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais.
O nº 1 da referida disposição constitui no que concerne aos presidentes das câmaras uma excepção ao estatuído nos nºs 1 e 2 do artigo 4º do mesmo diploma.
Por via dela, os presidentes de câmara podem exercer outras actividades, o que, aliás, já resultava do disposto nos nºs. 2 e 3 do artigo 4º daquele diploma e no nº 1 do artigo 3º do Estatuto dos Eleitos Locais.
A questão de saber quais as actividades excluídas da incompatibilidade pelo nº 1 do artigo 6º da Lei º 64/93 passa pela interpretação do seu nº 2 em conjugação com o nº 1 do artigo 3º do Estatuto dos Eleitos Locais .
A excepção do nº 1 do referido artigo 6º é limitada pelo disposto no seu nº 2, na medida em que prevê a salvaguarda das incompatibilidades e impedimentos previstos noutras leis para o exercício de cargos ou actividades profissionais.
Inexiste fundamento legal para que se interprete aquela limitação em termos de se reportar às incompatibilidades e impedimentos previstos em diplomas diversos do Estatuto dos Eleitos Locais no confronto com a actividade do presidente e vereadores das câmaras municipais.
É que a lei, no caso, não distingue e não se vislumbrem ponderosas razões da distinção, antes pelo contrário.
Ademais, deve o intérprete presumir, na fixação do sentido e alcance da lei, que o legislador adoptou as soluções mais acertadas (artigo 9º, nº 3, do Código Civil.
Não é compreensível que a mesma pessoa possa, a um tempo, com a dedicação e eficácia exigíveis, exercer as funções de presidente de câmara e de funcionário ou agente da administração central, regional ou local, para além de, em situações extremas, poder ser posto em causa o princípio constitucional da autonomia autárquica.
Assim, entendemos que o nº 2 do artigo 6º da Lei nº 64/93 também salvaguarda o estatuído no nº 1 do artigo 3º do Estatuto dos Eleitos Locais.
Nesta perspectiva, entendemos que o nº 1, por do nº 2 do artigo 6º da Lei nº 64/93, não revogou o estatuído no nº 1 do artigo 3º do Estatuto dos Eleitos Locais.
Assim, as funções desempenhadas pelos presidentes de câmaras municipais são incompatíveis com a actividade de agente ou funcionário da administração central, regional ou local.
Trata-se, aliás, de uma interpretação conforme ao estatuído no nº 4 do artigo 269º da Constituição, e harmónica com o estatuído no artigo 7º do Estatuto dos Eleitos Locais, que não prevê a redução de remuneração por virtude de cumulação de funções autárquicas com as próprias do funcionalismo público "lato sensu".
Dir-se-á que o artigo 6º da Lei nº 64/93 visou, fundamentalmente, quanto aos presidentes e vereadores a tempo inteiro das câmaras municipais, esbatendo o regime de incompatibilidades decorrentes do seu estatuto de titulares de cargos políticos, permitir-lhes o exercício de certas actividades privadas por, em regra, não colidiram com a normal gestão municipal (x).
II
Pelo exposto formularia as primeira e segunda conclusões nos termos seguintes:
1ª O nº 1 do artigo 6º da Lei nº 64/93, de 28 de Agosto, não revogou o nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho;
2ª Os presidentes de câmaras municipais não podem acumular as suas funções autárquicas com a actividade de agentes ou funcionários da administração central, regional ou local.

José Manuel Martins de Azambuja Fonseca - Vota em conformidade com o Exmº Colega Dr. Salvador da Costa.
(x) Tratar-se-á, porventura, das actividades a que um Deputado se reportava aquando da discussão da proposta relativa à Lei nº 44/77, quando afirmou: "... que é lícito e legítimo que se admita que um médico, um farmacêutico, um pequeno industrial, um pequeno comerciante ou um veterinário possam desenvolver a sua actividade em simultâneo com a gestão em causa ..." ("Diário da Assembleia da República", de 7 de Maio de 1977, pág. 3606).





1) Informação Técnica, nº 105, de 18 de Agosto de 1994.

2) O parecer reporta-se, naturalmente à lei em vigor. Foi recentemente aprovada na Assembleia da República nova legislação que modificará, em parte, este regime, em especial no tocante a incompatibilidades.

3) Alterada pelas Leis nºs 97/89 e 11/91, respectivamente de 15 de Dezembro de 1989 e 17 de Maio de 1991, mas sem relevância para o aspecto em análise.

4) Modificada pela Lei nº 39-B/94, de 27 de Dezembro, mas sem incidência na questão em causa.

5) Marcello Caetano, "Manual de Direito Administrativo" 10ª ed., 4ª reimpressão, Coimbra, 1991, T. II, pág. 721.

6) João Alfaia , "Acumulação" in "Dicionário Jurídico da Administração Pública", págs. 166, 167.

7) Diário da Assembleia da República, I Série, de 25/11/89, pág. 177.

8) "Constituição da República Portuguesa Anotada", 3ª ed., revista, Coimbra, 1993, pág. 948.

9) Publicado no Diário da República, II Série, de 25/6/83 e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 326, págs. 224 e segs.

10) Era o caso das Câmaras Municipais de Lisboa e Porto e das dos concelhos de 1ª classe e concelhos urbanos de 2ª.

11) Redacção dada pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro - idêntica, aliás, à originária, onde a citada previsão constava da al. h) do nº 1 do art. 1º.

12) Na redacção dada pela Lei nº 56/90.

13) Transitoriamente, decerto, face à obrigação constitucional, que sobre ele continuaria a impender, no sentido de emanar legislação ordinária sobre a matéria.

14) Parecer nº 23/91, aprovado em 20 de Maio de 1993 (espec. nº 2.1.1.3).

15) A ponto de a qualificação dos presidentes e vereadores a tempo inteiro como titulares de "cargos políticos" acabar por assumir relevância apenas no tocante aos "impedimentos" (arts. 8º e 9º) e à situação após a cessação de funções (art. 5º).

16) V. Diário da Assembleia da República, II Série-A, de 17 de Junho de 1993.

17) Diário da Assembleia da República, II Série-A, de 26 de Junho de 1993.

18) Diário da Assembleia da República, II Série-A, de 3 de Julho de 1993.

19) Diário da Assembleia da República, I Série, de 16 de Julho de 1993

20) Ibidem.

21) "Les garanties accordées aux titulaires de mandats locaux", in Rev. Fr. de Dr. Adm., 1992, Nov-Dez, pág. 974.

22) Questão diversa - mas não abordada neste parecer, por não constar da consulta - seria a de saber qual o regime remuneratório aplicável a tal situação de acumulação.

23) Ver no mesmo sentido o Guia do Eleito Local, coordenado por Carlos Morais Gaio, Porto, 1994, vol. 2, pág. 284.

24) V. para a interpretação desta norma: Carvalho Jordão "Presidente de Câmara Municipal - Advocacia", in Revista de Direito Público, ano II, nº 4, 1988, págs. 81-87; bem como os pareceres deste Conselho nºs. 95/86, de 8 de Outubro de 1987 (publicado no DR, 2ª Série de 27 de Abril de 1991) e 116/88, de 21 de Março de 1991.

25) Diário da Assembleia da República, II Série, de 28 de Março de 1987.

26) Diário da Assembleia da República, I Série, de 11 de Abril de 1987, pág. 2670.

27) Diário da Assembleia da República, II Série, de 11 de Abril de 1987, pág. 2680.

28) Diário da Assembleia da República, aprovado em 7 de Dezembro de 1988.

29) Em termos análogos se pronunciou já este Conselho no parecer nº 189/83 (Complementar), já citado.

30) Artigo 18º, nº 1.

31) Apenas na alínea c), onde se lia "pertençam à administração", passou a ler-se "pertençam à administração ou ao quadro".

32) Isto, decerto, por se ter entendido que casos desses teriam deixado de existir, face ao regime de incompatibilidades já vindo do regime anterior e mantido por este Estatuto.

33) Diário da Assembleia da República, Suplemento de 19 de Fevereiro de 1977.

34) Diário da Assembleia da República, de 7 de Maio de 1977, pág. 3603.

35) Diário da Assembleia da República, de 7 de Maio de 1977, pág. 3605.

36) Ibidem, pág. 3606.

37) V., entre outros, os pareceres deste Conselho nº 54/90, de 1 de Outubro de 1990 (DR, II Série, de 16-7-91), 28/92, de 11 de Junho de 1992 e 32/93, de 1 de Julho de 1993.

38) Como adiante melhor se explicitará.

39) V. por todos, os pareceres nºs 189/83-Comp., de 7 de Dezembro de 1988; 41/89, de 12 de Outubro de 1989; 27/90, de 28 de Junho de 199027/90-Comp., de 10 de Outubro de 1991; 23/91, de 20 de Maio de 1993.

40) Ver, nesse sentido, os pareceres nºs 90/76, de 9 de Agosto de 1976, 4/88, de 24 de Março de 1988, 73/91, de 9 de Janeiro de 1992 e 43/93, de 14 de Julho de 1993.

41) Parecer de 23 de Novembro de 1992, homologado por despacho de 9 de Dezembro seguinte (publ. a fls. 31-36 da Revista de Direito Autárquico, Ano 2, nº 1, Março de 1993).


http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf/7fc0bd52c6f5cd5a802568c0003fb410/c6dd853c41f202e680256617004259d9?OpenDocument&Highlight=0,conceito,de,RETRIBUI%C3%87%C3%83O

Pesquisar neste blogue