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terça-feira, 28 de junho de 2011

CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO, REFORMA, INVALIDEZ, TRABALHADOR - Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra - 07/06/2011

Acórdãos TRC
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
263/10.3TTGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA
Descritores: CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO
REFORMA
INVALIDEZ
TRABALHADOR

Data do Acordão: 02-06-2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DA GUARDA
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 343º, AL. C) DO CT/2009; DEC.LEI Nº 187/2007, DE 10/05

Sumário: I – Para efeitos de reforma, a invalidez, tout court, sempre foi o que hoje é a invalidez relativa, ou seja, o que o Dec. Lei nº 187/2007 acrescentou não foi a invalidez relativa, mas a invalidez absoluta.
II – Efectivamente, o que mudou foi a consagração de um regime mais favorável para o que hoje, e como novidade, se chama invalidez absoluta (fixação de um prazo de garantia mais baixo, não aplicação do factor de sustentabilidade, no momento da conversão da pensão por invalidez em velhice e a fixação de uma regra mais favorável nos, assim chamados, mínimos sociais).

III – O artº 343º, al. c) do CT/2009 refere-se a qualquer reforma, por velhice ou (a qualquer reforma) por invalidez e, invocada a reforma, determina a caducidade do contrato.


Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra:

1 – Relatório

1.1 – O processo

A... intentou a presente acção comum e, demandando a sociedade B..., S.A., pediu que seja (a) declarada a ilicitude do despedimento da autora e que a ré não podia considerar cessado o contrato de trabalho por caducidade e que a mesma seja condenada (b) a reintegrar a autora no seu posto de trabalho, sem prejuízo de esta poder vir a optar pela indemnização de antiguidade; (c) a pagar a quantia de €710,33 a título de férias não gozadas; (d) a quantia de €350,30, a título de retribuição proporcional de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal pelo trabalho prestado em 2009 e (e) a pagar os juros à taxa legal sobre todas as importâncias reclamadas, desde o seu vencimento e até integral pagamento.


A autora, fundamentando a pretensão, diz que trabalhou para a ré, de 21 de Outubro de 2008 até 11 de Junho de 2010, desempenhando funções correspondentes à categoria de operadora principal, nas caixas existentes na frente de loja e auferindo a retribuição mensal ilíquida de €710,31, acrescida do subsídio de alimentação. Acrescenta que entrou de baixa médica por doença natural em 2.03.2009 e, em 12.03. 2010, na sequência de uma junta médica da Segurança Social, foi reformada por invalidez relativa, embora mantendo embora uma capacidade de trabalho de um terço. A autora defende que tem condições para continuar a desempenhar as suas funções, embora eventualmente com redução parcial do horário, mas, a 11.06.2010, recebeu da ré a carta onde lhe comunicava considerar cessado o contrato de trabalho, por caducidade, com efeitos a 1.06.2010. Diz que, a 23.06.2010, remeteu à ré uma carta a comunicar o facto de se manter com uma capacidade de trabalho de um terço e solicitando a atribuição de funções e horário de trabalho compatíveis com a sua condição, mas a ré nem respondeu. Considera-se, por isso, ilicitamente despedida e deve ser reintegrada, além de ter direito a receber as prestações vencidas desde o despedimento e outros créditos que enumera.


Realizada a audiência de partes, a ré contestou. Diz que a autora, no decurso da baixa médica e atenta a natureza da doença em questão, terá diligenciado por passar à situação de reforma por invalidez, mas desse procedimento a ré apenas tomou conhecimento da decisão de deferimento de pensão de invalidez, por comunicação, datada de 21 de Maio de 2010, do CNP, que informava o deferimento da pensão por invalidez e da data de início reportada a 12.03.2010 e não distinguindo se era invalidez absoluta ou relativa. Acrescenta que, nos termos legais, tendo tido conhecimento de passagem de um trabalhador à situação de aposentado, comunicou à autora a caducidade do contrato de trabalho, ou seja, não a impediu de voltar ao trabalho, porquanto a mesma se encontra em situação de aposentada.


O processo prosseguiu com o saneamento tabelar, a realização da audiência de julgamento e a fixação, sem reclamações, da matéria de facto apurada.


Conclusos os autos, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e decidiu “A) condenar a ré a pagar à autora a quantia de 21,41 € de juros moratórios respeitantes ao subsídio de férias vencido em 2009; B) absolver a ré de tudo o demais pedido”.


1.2 O recurso

Inconformada com o decido, a autora apelou. Termina o seu recurso com a formulação das seguintes Conclusões:

[…]


A recorrida contra-alegou.

[…]


O recurso foi recebido e, nesta Relação, o Ministério Público emitiu Parecer, onde entende que o contrato só caduca se o trabalhador estiver impossibilitado de exercer todas as actividades incluídas na sua categoria profissional e, por isso, acompanha o alegado pela recorrente e defende a procedência da apelação.


A recorrida respondeu ao Parecer, discordando e renovando argumentos anteriores.


Foram dispensados os Vistos e cumpre apreciar o recurso.


1.3 Objecto do recurso

Definido pelas conclusões da recorrente, o objecto da apelação é saber se a interpretação feita pela 1.ª instância se revela correcta, concretamente se a reforma por invalidez, sendo esta relativa, implica, ainda assim, a caducidade do contrato de trabalho. Ou, se quisermos usar a pergunta da recorrente, “a caducidade do contrato de trabalho com fundamento na reforma do trabalhador por invalidez opera independentemente do grau de incapacidade?”



2. Fundamentação

2.1 Fundamentação de facto

Não havendo qualquer oposição à matéria de facto que a 1.ª instância fixou, transcrevemos (para melhor compreensão da decisão) os aludidos factos:

[…]


2.2 Aplicação do direito

Definido o objecto do recurso e enumerados os factos fixados pelo tribunal de 1.ª instância, cumpre apreciar a questão jurídica que motiva esta apelação.


Aplicando o direito, a decisão da 1.ª instância, reflecte do seguinte modo:

“Enunciando princípios gerais quanto ao emprego de trabalhador com capacidade de trabalho reduzida, o nº 1 do artigo 84º do actual Código do Trabalho dispõe que o empregador deve facilitar o emprego a trabalhador com capacidade de trabalho reduzida, proporcionando-lhe adequadas condições de trabalho, nomeadamente a adaptação do posto de trabalho, retribuição e promovendo ou auxiliando acções de formação e aperfeiçoamento profissional apropriadas. Na falta de concretização dos referidos princípios gerais – que, aliás, mais se apresentam como desideratos respeitantes à empregabilidade dos trabalhadores com capacidade reduzida do que à reconversão daqueles que viram diminuída a sua capacidade no decurso da sua prestação de trabalho – não se colhe deste preceito qualquer comando directamente aplicável à situação que nos ocupa. Do também invocado artigo 343º alínea c) do Código do Trabalho – que prevê a caducidade do contrato de trabalho nos casos de reforma do trabalhador por velhice ou invalidez – também não se vislumbra que se possam extrair directamente argumentos no sentido da sindicabilidade da pretensão da autora. Na verdade, uma interpretação literal do preceito conduz-nos no sentido inverso, isto é, se a lei não distingue entre invalidez absoluta e relativa, também o intérprete o não deverá fazer.


Por sua vez, definindo o que deve, para efeitos de atribuição de prestações da Segurança Social, entender-se por invalidez relativa (…) Seja como for, não podemos abstrair-nos de que a Segurança Social atribuiu à trabalhadora ora autora uma pensão por invalidez, sendo certo que, na comunicação feita à entidade patronal pela mesma entidade oficial apenas se referia singelamente “pensão de invalidez”, nada se dizendo sobre a se esta era absoluta ou relativa. Por outro lado, a autora não logrou provar que pudesse continuar a ocupar o mesmo posto de trabalho apenas com redução de horário, como alegou no artigo 9º da sua contestação, provando-se apenas que a demandante tem uma capacidade restante que lhe permite exercer funções em que não seja necessário pegar em pesos ou transportá-los – requisitos que não se verificam relativamente à categoria profissional de operadora principal de caixa, que exercia anteriormente à declaração da situação de invalidez relativa. Acresce que, para os casos de doença natural, como o presente, a lei não impõe às entidades patronais o dever jurídico de proporcionarem aos trabalhadores afectados por incapacidades parciais a respectiva ocupação em funções compatíveis, como o faz no nº 3 do artigo 283º do Código do Trabalho e nos artigos 154º e seguintes da Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro. Reconhece-se que, no actual regime, os interesses dos trabalhadores afectados por doença natural parcialmente incapacitante não se encontrarão verdadeiramente assegurados, na medida em que efectivamente exista distinção entre a invalidez absoluta e a invalidez relativa ao nível do cálculo da pensão de invalidez.


Porém, a imposição de eventuais deveres às entidades patronais a este nível depende de opção legislativa que, tanto quanto conseguimos vislumbrar, não foi assumida, ficando-se o legislador, quando muito, pelos meros princípios gerais sem directa cogência para o caso concreto (suposto que o “dever de facilitar” previsto no nº 1 do artigo 84º do Código do Trabalho se não restrinja à fase de acesso ao trabalho). Deste modo, não se verifica que a ré tenha despedido ilicitamente a autora, tendo a cessação do contrato de trabalho “sub judice” ocorrido por caducidade, como alegado pela ré.”


Comecemos por adiantar que a decisão da 1.ª instância apreciou e aprofundou todas as razões que podiam fundar o direito invocado pela ora recorrente e, salvo melhor saber, conclui com acerto, denegando a pretensão.


A questão, como já se disse, liga-se à interpretação do disposto na alínea c) do artigo 343.º, do Código do Trabalho de 2009 (CT/2009), o qual, reproduzindo o artigo 387.º do Código anterior, nos diz que “O contrato de trabalho caduca nos termos gerais, nomeadamente: Com a reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez”.


Partindo da dicotomia entre invalidez absoluta e invalidez relativa, ambas previstas no Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, o entendimento da recorrente é que passa a ser exigível a invalidez absoluta para a caducidade do contrato de trabalho. E, podendo cair-se em interpretação semelhante, vários autores referem que “no artigo 348.º do CT/2009 só se autonomizou a reforma por idade, pois a reforma por invalidez constitui uma impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o trabalhador prestar o seu trabalho” (Pedro Romano Martinez, Código do Trabalho Anotado, Almedina, 7.ª edição, 2009, pág. 777).


Não é assim, porém. Melhor dito, percebe-se que não é correcta a interpretação da recorrente, mesmo estando correcta a citação antes feita. A questão fica melhor elucidada com a leitura do preâmbulo do Decreto-lei n.º 187/2007 e com a compreensão do regime anterior: a invalidez, tout court, sempre foi o que hoje é a invalidez relativa, ou seja, o que aquele decreto-lei acrescentou não foi a invalidez relativa, mas a absoluta.


Daí que os comentários que versam sobre a caducidade prevista no Código do Trabalho – e prevista em moldes semelhantes na legislação laboral anterior - tenham em mente uma situação de invalidez, apenas, mas que é, suficientemente, a invalidez relativa.


Diz o preâmbulo: “O presente decreto-lei traz uma outra importante novidade ao nosso ordenamento jurídico. Vem introduzir uma distinção no regime da protecção social[1] na invalidez, entre a invalidez relativa, até aqui objecto de regulamentação anterior, e a invalidez absoluta, situação a merecer pela primeira vez atenção e tratamento especiais”.


A invalidez que agora – por contraposição – se chama relativa, era a invalidez, quando só um conceito havia, e mantém a presunção de permanente, a referência ao terço da remuneração e ao prazo de garantia que já existia (Ilídio das Neves, Dicionário Técnico e Jurídico de Protecção Social, Coimbra Editora, 2001, págs. 418/419); o que mudou foi a consagração de um regime mais favorável para o que hoje, e como novidade, se chama invalidez absoluta (fixação de um prazo de garantia mais baixo, não aplicação do factor de sustentabilidade, no momento da conversão da pensão por invalidez em velhice e a fixação de uma regra mais favorável nos, assim chamados, mínimos sociais).


A pensão de invalidez “normal”, ou seja, a pensão de invalidez relativa não é calculada de forma diferente da (nova) pensão por invalidez “absoluta”, questão que, lateralmente, se equaciona na sentença: pode haver maior compensação do mínimo social (cf. artigos 44.º e 45.º do DL 187/2007) mas, uma e outra, ponderam o tempo contributivo relevante. Porque, repete-se, a pensão de invalidez que existia e consequente reforma por invalidez refere-se à invalidez relativa: a novidade é a absoluta.


A compreensão do que acaba de ser dito afasta, salvo melhor entendimento, a interpretação, feita pela recorrente, da alínea c) do artigo 343.º do CT/2009. As situações de impossibilidade superveniente estão previstas na alínea b), as situações de reforma na alínea c). Dentro das situações de reforma há as por velhice e as por invalidez, mas qualquer que seja a invalidez, desde que, a que o é, em invalidez em concreto, conceda a reforma.


Nem fazia sentido, parece-nos, que a lei repetisse na alínea c) as mesmas exigências que faz na alínea b) do mesmo preceito.


Mas a recorrente vinca que a invalidez relativa (que, contrariamente ao que parece resultar da sentença, se afere por uma capacidade ou incapacidade remuneratória e não por uma incapacidade ou capacidade médica) lhe permite continuar a trabalhar.


Assim é, mas a questão, salvo o devido respeito, é apenas uma questão de prestação social e não de contrato de trabalho; na pensão por invalidez absoluta o pensionista não pode cumular rendimentos de trabalho nem pensões do seguro social voluntário, subsídio de doença ou subsídio de desemprego; na pensão por invalidez relativa já pode acumular, diferentemente, rendimentos do trabalho, seja eles provenientes da profissão que vinha exercendo até então, seja de profissão ou de actividades diferentes daquela.


Já se disse que a questão é de acumulação de rendimentos, não é de manutenção do contrato de trabalho: em lado algum o diploma que atribui as pensões (e que fomos citando) o refere ou consente, salvo o devido respeito, a interpretação defendida. Diploma esse que, acrescente-se é anterior ao Código do Trabalho de 2009 e neste não se reflectiu qualquer modificação no regime da caducidade do contrato de trabalho.


Por isso, o artigo 343.º, alínea c) refere-se a qualquer reforma, por velhice ou (qualquer reforma) por invalidez e, invocada esta, conduz à caducidade do contrato.



A finalizar, acrescentamos que a jurisprudência em que a recorrente se funda não infirma o que aqui se conclui, porquanto respeita a caso diferente, ou seja, a um caso de incapacidade e não de reforma, e a interpretação por nós feita (distinguindo prestação social e cumulação de rendimentos da manutenção daquele contrato de trabalho) não enferma de qualquer inconstitucionalidade.


Acresce que do montante da prestação social, mesmo que inferior ao salário mínimo nacional, não resulta igualmente qualquer violação à Constituição.


Assim, resolvida a única questão que era objecto do presente recurso, concluímos pela improcedência deste.


3. Sumário

1 – Para efeitos de reforma, a invalidez, tout court, sempre foi o que hoje é a invalidez relativa, ou seja, o que o Decreto-Lei n.º 187/2007 acrescentou não foi a invalidez relativa, mas a invalidez absoluta.

2 – Efectivamente, o que mudou foi a consagração de um regime mais favorável para o que hoje, e como novidade, se chama invalidez absoluta (fixação de um prazo de garantia mais baixo, não aplicação do factor de sustentabilidade, no momento da conversão da pensão por invalidez em velhice e a fixação de uma regra mais favorável nos, assim chamados, mínimos sociais).

3 – O artigo 343.º, alínea c) do CT/2009 refere-se a qualquer reforma, por velhice ou (a qualquer reforma) por invalidez e, invocada a reforma, determina a caducidade do contrato.




4. Decisão

Pelas razões ditas, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar improcedente a presente apelação, interposta por A... contra B..., SA, assim confirmando o decidido em 1.ª instância.


Custas pela recorrente


José Eusébio Almeida (Relator)
Manuela Fialho
Azevedo Mendes


[1] E que a distinção é apenas para o regime da protecção prevista no diploma resulta claro do seu artigo 13.º.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/5a726b00ae3925e9802578b5004f65ff?OpenDocument

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