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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

ACÓRDÃO EUROMILHÕES - CONFISSÃO, DEPOIMENTO DE PARTE, CONTRATO ATÍPICO, SOCIEDADE - Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães - 19-05-2011

Acórdãos TRG
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1498/08.4TVLSB.G1
Relator: RAQUEL REGO
Descritores: CONFISSÃO
DEPOIMENTO DE PARTE
CONTRATO ATÍPICO
SOCIEDADE

Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 19-05-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE

Sumário: I - Não pode ser equiparável à confissão a condescendência quanto a determinado facto, dada a exigência contida no artº 357º, nº1, do Código Civil.
II - o Tribunal, em qualquer altura do processo, pode determinar a comparência pessoal das partes para a prestação de depoimento sobre factos que interessem à decisão da causa.
III - Quando a parte presta o seu depoimento não se visa exclusivamente a confissão.
IV - Nada obsta a que o tribunal na sequência dos poderes que tem de ouvir qualquer pessoa, incluindo as partes, por sua iniciativa, na busca da verdade material, tome em consideração, para fins probatórios, as declarações não confessórias da parte, as quais serão livremente apreciadas, nos termos do artº 655º, nº1, do Código de Processo Civil.
V – A actividade de um par de namorados que, semana após semana, faz um exercício comum de escolha das chaves e de preenchimento e registo das apostas, visando a obtenção de lucro patrimonial que está exclusivamente dependente do factor “sorte”, configura-se como uma sociedade de fito não económico.
VI – Tal acordo qualifica-se como um contrato atípico, a que deve aplicar-se as disposições relativas à sociedade.


Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:



I – RELATÓRIO.



1. Luís…, solteiro, residente em Courel, Barcelos, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário contra Augusto… e mulher Maria…, bem como contra Cristina…, todos residentes em Remelhe, Barcelos, pedindo sejam os RR. condenados:
- A entregar ao A. todo o valor correspondente ao prémio obtido no jogo do “euromilhões”, do concurso 07/2007, no valor de €15.000.000,00, acrescido de juros e demais frutos recebidos pela aplicação do mesmo, juros esses contados desde a data de recebimento do prémio e até integral e efectivo pagamento;
- Quando assim se não entenda, mormente caso se conclua que o pagamento de €2,00, efectuado posteriormente à obtenção do prémio, corresponde a um terço do mesmo, sempre o A. terá direito a dois terços do prémio obtido no sorteio;
- Finalmente, sempre e em última instância, o A. terá direito a metade do prémio obtido;
- Sempre, e em todas as circunstâncias e situações supra descritas, ao valor a entregar ao A. pelos RR deverá acrescer juros e frutos, contados desde a data do recebimento do prémio até integral e efectivo pagamento.

Para tanto e em suma, alegou que há cerca de três anos encetou uma relação de namoro com a ré Cristina Simões e, desde então, começaram a jogar no “euromilhões”, em conjunto.
Nessa sequência, no dia 9 de Janeiro de 2007, como era habitual, de acordo com a dita ré, efectuou o registo de três apostas pelo que pagou um total de €6,00.
Efectuado o sorteio, no dia 19/01/07, veio a constatar-se que uma das apostas tinha sido premiada com um prêmio de €15.000.000,00.
Por solicitação e insistência da ré Cristina, foi assinada um declaração na qual constava que o titular do prémio seria o réu Augusto, com a justificação de o seu pai ser mais sabedor.
Não obstante ulteriores insistências e interpelações que efectuou, os RR nunca entregaram ao A. qualquer parte do montante global do prémio, que, por direito próprio lhe pertence.

2. Regularmente citados, contestaram os RR aceitando a invocada relação amorosa e a regularidade do jogo durante o namoro, mas dizendo que jogavam individualmente, ficando sempre claro entre eles quais eram as apostas de cada um, suportando também cada um, exclusivamente do seu bolso, o custo das apostas que faziam, sendo, por isso, absolutamente falso que jogassem em conjunto.
Concluem pela total improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido.

3. O autor apresentou réplica na qual, após impugnar a versão dos factos alegada pelos RR, concluíu como na petição inicial.

4. Procedeu-se à elaboração da matéria de facto assente e da base instrutária e realizou-se a audiência de julgamento com observância do formalismo legal, tendo-se respondido à matéria constante da base instrutória por despacho proferido a fls. 1048 e segs., sem reclamação.

5. De seguida, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou todos os RR a pagar ao Autor:
- O montante correspondente a metade do valor do prémio do euromilhões - €7.500.000,00 —, acrescido de metade do valor resultante dos frutos civis ou rentabilização desse capital, obtidos através do investimento efectuado em produtos bancários;
- O montante correspondente a metade do valor global recebido ou levantado por A. e R. que inclui o valor dos juros levantado pela R. -, acrescido de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data em que a A. procedeu à transferência do valor dos supra aludidos €100.000,00 - 17/05/07 -, até efectiva entrega, e incidentes sobre o valor da diferença existente entre o valor que o A. já recebeu — valores que lhe foram entregues pela R. -, e o correspondente àquele a que tem direito — correspondente ao valor da referida metade -, e que esteve na posse da R., Cristina.

6. Inconformados, apelaram os RR para este Tribunal, concluindo as suas alegações nos seguintes termos:
(…)


Terminam pedindo o integral provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida que deverá ser substituída por acórdão que absolva totalmente os RR do pedido.
7. Foram apresentadas contra-alegações pugnando pela manutenção do decidido.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A. Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:

1 - O A. é estudante da Universidade Lusíada, pólo de Vila Nova de Famalicão.
2 - Vive rio lugar de Boavista, Courel, em Barcelos.
3 - O A. e a R. Cristina namoravam há cerca de 3 anos.
4 - Os 1º e 2º RR são pais da 3ª R.
5 - De Agosto de 2005 até Setembro de 2007, o A. trabalhou na empresa “P… & T… , Lda.”.
6 - Empresa esta com escritório na Rua Fernão de Magalhães, nº2, 54/76, Barcelos.
7 - O horário de trabalho era das 9h às 12h30 e das 14h30 às 19h.
8 - Durante este período e no período de almoço, o A. deslocava-se do trabalho para casa para aí fazer a sua refeição de almoço.
9 - Fazendo o caminho inverso, de casa para o trabalho, a seguir ao almoço, sempre entre as 14,00 h e as 14,25h.
10 - Jogavam, com regularidade, no jogo da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) designado “euromilhões”.
11 - Praticamente todas as sextas-feiras, o A. dirigia-se ao Balcão da “Casa Brandão”, na freguesia de Alvelos, Concelho de Barcelos, para aí fazer a aposta e respectivo registo do “Euromilhôes”.
12 - A “Casa Brandão” situa-se a caminho do domicílio do A. para o trabalho.
13 - A caminho da casa Brandão, no dia 19-01-2007, o Autor recebeu uma mensagem da sua namorada, aqui 3ª Ré, a lembrá-lo de jogar no dito euromilhões”
14 - Em regra, a aposta era de cerca de €2,00 (dois euros) a €6,00 (seis euros) por semana.
15 - Sendo uma aposta sugerida pela 3 Ré.
16 - Habitualmente o A. jogava duas apostas e a R. Cristina apenas uma, embora nem sempre assim sucedesse (dado que muitas vezes jogavam ambos o mesmo número de apostas).
17 - E também habitualmente as apostas eram feitas num único boletim e realizadas num só momento pelo A.
18 — Desde que iniciaram o namoro o A. e a R. Cristina jogavam no euromilhões, pelo menos, uma aposta sugerida pela R., Cristina, e outra sugerida pelo A., sendo que, por vezes, este último, por sua iniciativa, fazia mais apostas, suportando os respectivos custos, sem que disso desse prévio conhecimento à R., Cristina, mas fazendo-o com a convicção de que se saísse o prémio em qualquer delas estava obrigado a proceder à divisão pela metade, com a R., Cristina.
19 - Um dos boletins do euromilhões que o A. e a R., Cristina, jogaram foi premiado com um prémio de valor não concretamente determinado.
20 - O valor do custo das apostas semanalmente efectuadas era suportado pelo A. e pela R. Cristina.
21 - Na presente situação, referente ao sorteio nº3, de 2007, do “euromilhões”, o A. efectuou o pagamento de €4,00, e a R., Cristina, de €2,00, referentes a duas e a uma das três apostas efectuadas, respectivamente.
22 - O registo de aposta foi efectuado às 14.15 h. do dia 19 de Janeiro de 2007.
23 - Registo esse que o A. fez, pagando um total de €6,00 (seis euros), equivalente a três apostas.
24 - O A. guardou o talão comprovativo de pagamento e aposta consigo.
25 - Após a realização do sorteio do euromilhões, no mesmo dia 19/01, o A. e a R., Cristina, constataram que o talão que aquele detinha tinha sido o premiado, com o 1º prémio no valor total de €15.000.000,00 (quinze milhões de euros).
26 - A chave sorteada com o primeiro prémio deste jogo, corresponde aos números 5-13-27-33—42, e as estrelas 2 e 4, indicados pela R. Cristina, que os comunicou ao A., por forma não concretamente apurada.
27 - Depois de ter verificado que no sorteio do “euromilhões” tinha saído a chave que tinha indicado ao A., a R. Cristina telefonou-lhe a confirmar se ele tinha registado a aposta por si sugerida.
28 - Perante a resposta afirmativa do A., comunicou-lhe que o “euromilhões” tinha saído na chave que ela indicou no boletim que tinha registado.
29 - E pediu-lhe para guardar o talão e para lho entregar no dia seguinte.
30 - Ao que o A. anuiu.
31 - Após essa constatação — de que o talão que o A. detinha havia sido premiado -, a R. Cristina deu conhecimento desse facto aos RR. Augusto… e Maria…., seus pais, e o Autor deu também desse facto conhecimento ao Joaquim…, seu pai.
32 - O A., no dia seguinte - 20 de Janeiro de 2007, sábado - apareceu em casa da Ré Cristina, por volta das 20 horas e 30 minutos.
33 - O A. entregou voluntariamente à R. Cristina e à mãe desta o talão do registo da aposta efectuada, cujo original foi entregue à SCML.
34 - Nessa ocasião a R. Cristina entregou ao A. o valor de €2,00, referente à aposta correspondente aos números por ela indicados.
35 - E o A. não reclamou qualquer parcela do prémio.
36 - Durante a semana seguinte, o Autor, todos os RR. e o pai do Autor combinaram deslocar-se à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), para se proceder à confirmação do prémio e ao seu eventual levantamento.
37 - A R. Cristina já tinha em sua posse os títulos relativos à aposta premiada.
38 - O A. era, nessa ocasião, o seu namorado e tinha sido ele quem procedeu ao registo da aposta que levou à obtenção do prémio.
39 - E, no dia combinado o A. apareceu na estação de serviço de Viatodos, acompanhado pelo seu pai, local onde ficaram de se encontrar para depois seguirem para a estação de caminho de ferro de Vila Nova de Famalicão, dado pretenderem fazer a viagem de ida e volta de comboio.
40 - Na SCML de Lisboa — no departamento de jogos — foram recebidos por uma responsável que se identificou como sendo a Drª Ana Marta Costa.
41 - Intitulando-se como uma das responsáveis pelo atendimento e pagamento deste tipo de prémios.
42 - Esta perguntou aos presentes quem tinha sido o premiado.
43 - Nessa reunião tendo sido colocada por um dos presentes a questão de saber se era possível passar mais do que um cheque para pagamento da totalidade do valor do prémio, a Drª Ana Marta logo esclareceu que a SCML só iria proceder à emissão de um cheque. 44 - A Drª Marta aguardou que lhe fosse comunicado por algum dos presentes, qual o processo que pretendiam que fosse adoptado para proceder ao pagamento do prémio.
45 - A R. Cristina, por razões de segurança e por entender que o seu pai era uma pessoa com maior experiência de vida do que ela, solicitou à Drª Ana Marta que o pagamento do prémio fosse efectuado ao seu pai e que em nome dele fosse emitido o correspondente cheque.
46 - Após a R. Cristina ter informado a Drª Marta de que pretendia que o pagamento do prémio do euromilhôes fosse emitido em nome do Augusto… , seu pai, este último encetou contacto directo com ela.
47 - Na reunião que se seguiu na SCM a conversa decorreu, essencialmente, entre os RR. Augusto… e Cristina e a referida Drª Ana Marta.
48 - Nessa mesma altura foi assinada uma declaração, intitulada “termo de identidade”, na qual constava que o titular do prémio seria o Sr. Augusto…, aqui 1.2 R,.
49 - A declaração donde constava que o titular do prémio era o 1º Réu foi feita por virtude de isso assim ter sido solicitado pela R. Cristina.
50 - Isso foi sugerido pela R. Cristina, alegando, designadamente, “questões de segurança”.
51 - A R. Cristina justificou tal acto com o facto do pai, enquanto pessoa mais velha e experiente do que ela, reunir melhores condições para tratar de assuntos relacionados com o dinheiro do prémio, nomeadamente, a nível bancário.
52 - Nesse mesmo dia receberam desta — Drª Marta — a informação de que o valor do prémio só poderia ser levantado após dez dias úteis, aproximadamente, depois daquela data.
53 - O A. e o seu pai, presentes na reunião, permaneceram em silêncio e não deduziram qualquer objecção nem reclamaram o pagamento de qualquer parcela do prémio.
54 - Ficou então acordado nessa reunião que a SCML iria passar, no prazo aproximado de dez dias úteis, um cheque a favor do 1º Réu.
55 - Que seria entregue — por razões de segurança - na instituição bancária escolhida pela Cristina.
56 - A 7/02/07, os 4 intervenientes deslocaram-se à Caixa Central e Crédito Agrícola Mútuo de Lísboa — A., os 3 RR. e o pai do A. — e a dita Drª Ana Marta Costa.
57 - Tendo ainda estado presentes, os gerentes do Balcão e de conta, Paulo Correia e Manuel Ferreira.
58 - Na deslocação à CCAML, no dia 07/02/2007, onde os esperava a Drª Ana Marta foram entregues à Cristina e ao seu pai os documentos relativos ao pagamento do prémio.
59 - Nessa ocasião foram abertas duas contas bancárias, na C.C.C.A.M., de Lisboa, sendo uma delas aberta em nome do A. e de todos os RR. e outra em nome do A. e da R. Cristina.
60 - “FF” Na conta aberta em nome dos quatro — A. e 3 RR. — ficaram como 1ºs titulares os pais da R., Cristina, a R. Cristina e do A.
61 - “GG” O cheque relativo ao prémio de €15.000.000,00 foi emitido em nome do lº R. e depositado nessa conta.
62 - Nem o Autor, nem o seu pai levantaram, na ocasião, qualquer objecção à solução vertida nas alíneas “FF” e “GG”, da matéria assente.
63 - Qualquer movimento da conta aberta em nome dos 4 intervenientes só poderia ser efectuado pelos pais da R., Cristina, ou por qualquer um dos outros titulares com o consentimento daqueles.
64 - Para essa conta aberta em nome do A. e da 3ª R. nunca foi transferido qualquer dinheiro.
65- Embora a conta estivesse em nome dos pais da Cristina, que eram os seus primeiros titulares e os que a podiam movimentar, a R. Cristina pediu informações e deu ordens de movimentação da mesma.
66 - A R. Cristina, com autorização dos primeiros titulares da conta, dava ordens e efectuava pedidos que os referidos colaboradores da instituição bancária respeitavam e cumpriam.
67 - Era com a R. Cristina e com os pais desta que os gerentes bancários sempre trataram das questões relacionadas com as contas bancárias onde foi depositado o dinheiro do prémio.
68 - Do montante relativo ao prémio foram feitas cinco transferências e todas, no seu conjunto, de valor não superior a €100.000,00 (cem mil euros).
69 - E desse valor, o A., na sua conta pessoal — nº 104040192560554 —, recebeu aproximadamente cerca de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros).
70 - Foram transferidos para a conta comum do A. e da 3. R. — 104040209671107—, na Caixa Agrícola de Barcelos, cerca de €22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros).
71 - Foram transferidos valores monetários para a conta dos pais da 3ª Ré.
72 - Em 17/05/07 foi feita uma transferência do montante de €100.000,00 da conta nº 40210043452, para a conta nº 40079274329.
*

B) O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3, 685º-A e 685º-B, nº2, b), do C. P. Civil).
Tenha-se, ainda, presente que nos recursos se apreciam questões e não razões.

*
Por razões de ordem prática, a abordagem do presente recurso não obedecerá à sistematização dada às mui doutas alegações, à qual, de resto, o Tribunal não está vinculado.
*
Comecemos, por isso, por conhecer de um invocado erro material de que fala aquela peça processual.
Alega-se não constar da sentença a alínea “FF” da matéria assente.
Tal alínea (fls. 190) é do seguinte teor:
«Nessa reunião procedeu-se à abertura de uma conta em nome dos quatro – A e 3 RR – da qual constavam como 1ºs titulares os pais da R. Cristina (também aqui RR) a Ré Cristina e do Autor».
Salvo melhor entendimento, não se descortina o invocado erro. Na verdade, a factualidade contida na citada alínea encontra-se reproduzido sob os nºs 59 e 60 dos factos consignados na sentença recorrida, sendo que o primeiro contém, ainda, parte da alínea II).
Improcede, pois.
*
Entre-se, agora, na reapreciação da matéria de facto.
Todos sabemos o regime jurídico atinente à apreciação da prova pelo Tribunal da Relação que, de todo o modo, aqui se impõe reproduzir.
Nos termos do disposto no artº 712º, nº1, do Código de Processo Civil, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 685º-B, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
Por seu turno, dispõe o nº2 do artº 685°-B, do Código de Processo Civil que, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente, sob pena de rejeição, em que se funda para arguir o erro na apreciação da prova.

Os apelantes insurgem-se quanto às respostas dadas aos quesitos 5º, 24º e 50º da Base Instrutória.

Relativamente ao quesito 5º, cujo teor era se «Depois da euforia e choque iniciais, normais neste tipo de situações, contactaram os aqui 1º e 2º réus e o autor contactou igualmente o seu pai?», respondeu o Tribunal a quo que «Após essa constatação – de que o talão que o autor detinha havia sido premiado – a ré Cristina deu conhecimento desse facto aos RR Augusto… e Maria…, seus pais, e o autor deu também desse facto conhecimento ao Joaquim… , seu pai».
Segundo a apelação, é falsa a parte respeitante ao autor e ao seu pai, porquanto, sendo o prémio de 19.01.2007, só no domingo, dia 21 é que aquele o deu a conhecer a este.
Sustenta-se nos depoimentos que reproduz a fls. 1193 e 1194, dos quais resulta que que só no dia 21 o autor deu a conhecer que lhe tinha saído o euromilhões.
Dando por adquirido que as afirmações reproduzidas vão, realmente, no sentido de que assim foi, ou seja, de que a comunicação foi efectuada no domingo, isso em nada contraria a resposta dada ao quesito. Nela não é dito que o conhecimento ao pai do autor foi dado de imediato ou no mesmo dia, mas tão só que lhe foi dado conhecimento.
Por outro lado, da mera comunicação no domingo não resulta a relevância que se lhe pretende atribuir. É que essa circunstância, em termos abstractos, poderá resultar de um carácter mais reservado ou cauteloso ou de relacionamento mais distante e menos eufórico entre pai e filho.
Acresce que o teor do artº 26º da petição inicial não permite as ilações que os apelantes, numa leitura de parte muito pessoal e em favor da sua tese, dele querem retirar.
Portanto, com certeza se pode dizer que as afirmações invocadas no recurso não são incompatíveis com a resposta dada, pelo que é de manter.

Quer também atacar-se a resposta dada ao quesito 24º, cujo teor era o seguinte: «No dia 19 de Janeiro de 2007, a ré Cristina enviou do seu telemóvel (do operador TMN, com o nº963302912) para o telemóvel do autor (do operador TMN com o nº967142409) uma mensagem em que lhe pedia para registar a sua aposta e lhe indicava a chave que pretendia que fosse registada?»
Obteve como resposta que estava «Provado apenas que a caminho da casa Brandão, no dia 19-01-2007, o autor recebeu uma mensagem da sua namorada, aqui 3ª ré, a lembrá-lo de jogar no dito “euromilhões”.
Em defesa da tese do recurso, diz-se que o Tribunal não valorou devidamente o depoimento do autor produzido na providência cautelar de arrolamento (apensos A e B).
Dispõe o artº 355º, nº3, do Código Civil que a confissão feita em qualquer procedimento preliminar ou incidental vale como confissão judicial na acção correspondente.
Sabemos todos que o depoimento de parte é um meio processual destinado a provocar a confissão judicial, ou seja, o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária (artº 352º do Código Civil).
E esta declaração de vontade tem como destinatário a parte contrária e não o juiz, ainda que, como meio de prova que é, sempre possa ajudar a suportar a formação do convencimento do julgador na conjugação com outros elementos de prova (STJ, 25.11.2010, itij).
Ora, quando do depoimento derive uma declaração com eficácia de confissão judicial, determina o artº 563º, nº1, do Código de Processo Civil que deve ser reduzido a escrito nessa parte ou naquela em que sejam narrados factos ou circunstãncias que impliquem a indivisibilidade da declaração confessória.
“A redacção incumbe ao juiz, podendo as partes ou seus advogados fazer as reclamações que entendam” - nº2. “Concluída a assentada, é lida ao depoente, que a confirmará ou fará as rectificações necessárias” - nº3.
Resulta, então, da lei que a confissão judicial obtida em depoimento de parte deve ser reduzida a escrito, sob pena de não ter força probatória plena contra o confitente (artº 358º nº1 do Código Civil), sendo então livremente apreciada, nos termos dos artigos 655º nº 1 do Código de Processo Civil e 358º nº4 do Código Civil.
Além disso, a declaração confessória deve ser inequívoca, salvo se a lei o dispensar – artº 357º, nº1, do mesmo diploma.
Significa isto que determinante para a lei é que o comportamento voluntário da parte (activo ou omissivo), seja concludente, sem acenos infirmativos ou titubeantes (Rui Rangel, O Ónus da Prova no Processo Civil, Almedina, 2ª edição, 273).
Também Hélder Martins Leitão – Da Instrução em Processo Civil, Das Provas, pag.70, defende não ser equiparável à confissão a condescendência quanto a determinado facto, pois que aquela traduz uma declação de ciência que marca uma afirmação incontrariável.
No caso em apreço, como da própria reprodução feita pelos RR decorre, o autor começa por afirmar que não se recorda do exacto teor da mensagem aqui em apreciação – supostamente, a da chave sorteada – mas que andaria à volta do euromilhões; refere que seria “joga no euromilhões por mim, ou uma coisa assim”, reafirmando que não sabia propriamente o que ela dizia.
Desse depoimento não resulta de modo algum a confissão de que ela, naquela mensagem, lhe tenha indicado a chave.
Muito menos se pode concluir que a aposta era só dela, que disso ele tinha consciência e que apenas estava a fazer o favor de a registar!
Para um casal de namorados que, semana após semana, preenchem um só boletim de jogo, com números fornecidos pelos dois, não se vislumbra como a mensagem teria, necessariamente, de ser interpretada no sentido defendido.
De todo o modo, realça-se que, nesta rubrica, os recorrentes até advogam a livre valoração do depoimento de parte, contra a qual, noutros pontos, tanto se insurgem (cf. fls.1219 verso – fls.102 das alegações)
Ora, relativamente a uma hipotética confissão do autor efectuada em sede de providência cautelar, compulsados os respectivos autos, do depoimento do autor apenas foi feita uma assentada do seguinte teor (acta de fls.472):
«Relativamente ao artº 23º da oposição, respondeu ser verdade ter guardado o talão comprovativo da aposta.
Relativamente ao artº 29º da oposição, respondeu que no dia seguinte, sábado doa 21 de Janeiro de 2007, entregou à requerida Maria…, voluntariamente, o talão de registo da aposta.
Relativamente ao artº 30º da oposição, respondeu afirmativamente».
Recorde-se que o artº 30 da oposição tinha o seguinte teor: «E tendo então recebido da Cristina o valor da aposta por ela efectuado?».
Aqui chegados e presentes os fundamentos exarados, temos por adequada a resposta dada pela 1ª instância, que se mantém.
Tudo, sem prejuízo de aquele Tribunal ter dado como provado, no quesito 25º, que os números e as estrelas da chave sorteada foram comunicados ao autor pela ré Cristina, embora por forma não concretamente apurada.

Quanto ao artº 50º da Base Instrutória, cujo teor era se «Nem o autor, nem o seu pai levantaram qualquer objecção à solução vertida nas alíneas “FF” , “GG” e “HH” da matéria assente?» respondeu do seguinte modo a Tribunal recorrido:
«Provado apenas que nem o autor, nem o seu pai levantaram, na ocasião, qualquer objecção à solução vertida nas alíneas “FF” e “GG” da matéria assente».
Em abono da sua tese de que deveria incluir o factualismo atinente à alínea ‘HH’, os recorrentes invocam o teor dos depoimentos das testemunhas que assistiram ao acto (Joaquim, Paulo… e Manuel…), além do depoimento de parte do recorrido.
Quanto ao depoimento de parte, remete-se para tudo quanto acima se disse em sede de assentada, pelo que, não havendo confissão, não existe prova tarifada.
Por outro lado, o apelo ao teor dos depoimentos testemunhais é feita sem enunciação expressa das concretas afirmações que justificam a almejada resposta.
Anteriormente ao DL 303/2007, preceituava o artº 690°-A, nº2, no que agora releva, que quando os meios probatórios invocados como fundamento de erro na apreciação das provas tivessem sido gravados, devia o recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda.
De acordo com o novo regime estatuído no artº 685º-B do Código de Processo Civil, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto e quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro, tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda.
É manifesta a maior exigência hoje feita neste domínio, impondo às partes grande rigor e precisão, enunciando que afirmação ou afirmações concretas foram feitas e por quem, que justificam a ocorrência do alegado erro de decisão.
«Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação inconsequente de inconformismo» - Abrantes Geraldes, “Recursos em Processo Civil, Novo regime”, pag.142, Almedina.
Pretendeu-se, «na medida do possível, levar a que se possam aproveitar as vantagens decorrentes da oralidade, ainda que mitigada, considerando mais adequada a audição dos depoimentos pela Relação (ainda que sem os presenciar e sem apreender os efeitos de expressões não verbalizadas) do que a leitura de fastidiosas laudas de depoimentos transcritos» - idem, pag.144.
No caso em apreço, julgamos impor-se a conclusão de que, na verdade, os apelantes não observaram os requisitos legais supra enunciados. Ao invés de indicarem as concretas passagens dos depoimentos que impunham a decisão almejada, limitaram-se a juntar aos autos a respectiva transcrição.
Consequentemente, por inobservância da forma legalmente estatuída, vai indeferida a impugnação da matéria de facto no que a este quesito concerne.

Vejamos, agora, a questão relativa aos factos instrumentais, de cuja decorrência está também invocada a nulidade consignada no artº 668º, nº1, d), do Código de Processo Civil.
Quanto à nulidade, respeita a dita alínea, no que aqui interessa, à omissão de pronúncia sobre questões que devesse apreciar.
Desta feita, como se colhe da acta de fls. 493, os apelantes requereram um aditamento à base instrutória, para que dela passasse a constar factos instrumentais atinentes ao ramo de actividade comercial da empresa onde antes trabalhava o autor, desde quando até quando o fez, que salário auferia.
Por despacho inserto a fls. 552 e seguintes, o Sr. Juiz a quo, depois de dissertar largamente sobre o respectivo aspecto jurídico, inferiu tal pretensão nomeadamente por entender que as extrapolações a fazer da circunstância de ter continuado a trabalhar e com um salário baixo, respeitam à valoração dos meios probatórios, a considerar na motivação dos factos essenciais.
Daqui resulta que, atempadamente, aquele Magistrado pronunciou-se sobre a questão suscitada, emitindo a decisão respectiva, indeferindo-a em concreto. Não se vislumbra de que modo possa ter ocorrido nulidade.
Esquecem, agora, os recorrentes que, na sequência desse indeferimento, essa factualidade não se fez constar da sentença, sendo, todavia, idónea na formação da convicção do julgador.
Considerando que já por demais se escreveu nestes autos sobre a matéria, recorde-se tão só o seguinte: Nos termos do artº 511º do Código de Processo Civil, o juiz, ao fixar a base instrutória, selecciona a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que deva considerar-se controvertida.
E a questão da relevância reconduz-nos ao problema de saber se determinado facto é essencial para a decisão do pleito ou se, pelo contrário, se trata apenas de um facto instrumental.
Na noção dada por CASTRO MENDES (Direito Processual Civil, II, p. 208), factos instrumentais são os que interessam indirectamente à solução do pleito por servirem para demonstrar a verdade ou falsidade dos actos pertinentes.
Nas palavras de LOPES DO REGO (Comentário ao CPC, p. 201), "factos instrumentais definem-se, por contraposição aos factos essenciais, como sendo aqueles que nada têm a ver com substanciação da acção e da defesa e, por isso mesmo, não carecem de ser incluídos na base instrutória, podendo ser livremente investigados pelo juiz no âmbito dos seus poderes inquisitórios de descoberta da verdade material", enquanto que "factos essenciais, por sua vez, são aqueles de que depende a procedência da pretensão formulada pelo autor e da excepção ou da reconvenção deduzidas pelo réu".
Em Ac. de 27.04.2004 (proc. 204/04, Des. Rui Barreiros, dgsi.pt), a Relação de Coimbra decidiu que "para que os factos sejam instrumentais é necessário que tenham uma relação com os factos principais, de tal maneira que, a partir daqueles, se possa chegar a estes. Assim, determinados factos podem ser instrumentais numa acção e não o serem numa outra - serem até os factos principais ou serem factos irrelevantes".
Ora, no questionário deverão inserir-se tão só os factos sobre os quais pode e deve desenvolver-se utilmente a instrução.
Portanto, não deverão ser quesitados os factos instrumentais que embora possam facilitar a fundamentação das respostas do Tribunal ao questionário, tornam este demasiado extenso e dificultam a produção de prova, sem vantagens reais para a decisão da causa (cf. Ac. RP de 17.02.94, itij).
Volvendo ao concreto, tendo em conta o objecto da lide, saber em que ramo de actividade trabalhava o autor, quanto ganhava e por quanto tempo mais o fez após o sorteio, consubstancia-se, inquestionavelmente, em matéria de natureza instrumental, pelo que bem andou o Sr. Juiz a quo no sentido decidido, que se mantém.
Tais considerações aplicam-se mutatis mutandis quanto ao que fez a ré Cristina antes e depois do sorteio e à existência de estabelecimentos para registar boletins.

Factos Supervenientes: Os apelantes dizem ter sido desconsiderados na sentença factos dessa natureza, assim se violando o disposto nos artº264º, nº2 e 663º do Código de Processo Civil.
Pretendem que seja valorada a seguinte factualidade:
A Ré Cristina subscreveu em Maio de 2007 um seguro de capitalização no montante de €100.000,00 e um depósito a prazo de igual montante, com dinheiro da conta onde foi depositado o Euromilhões, e que o A. subscreveu na mesma altura um seguro de capitalização no montante de €5.000,00 e um depósito a prazo de igual montante, com dinheiro proveniente da conta comum com a R. Cristina.
Reza o primeiro dos preceitos que «o juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artºs 514º e 665º e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e da discussão da causa».
Diz o segundo, no que agora releva, que «…a sentença deve tomar em consideração os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam postriormente à proposição da acção, de modo que a decisão corresponda à situação existente no momento do encerramento da discussão».
Finalmente, de acordo com o artº 506º, nº2, dizem-se supervenientes tantos os factos ocorridos posteriormente ao termo dos articulados , como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos.
O primeiro dos preceitos impõe um limite de cognição ao juiz da causa, impedindo-o de usar factos que não foram alegados, nem resultaram da instrução; é um afloramento do princípio do dispositivo, ainda que mitigado, que não se mostra violado no caso concreto.
Quanto ao segundo, acontece que os factos que se pretendem, agora, como supervenientes reportam-se a Maio de 2007, ocorridos, por isso, muito antes da propositura da acção e, sendo pessoais, logo deles os apelantes tiveram conhecimento, pelo que nada têm de supervenientes; de resto, também não foi feita prova dessa superveniência.
De todo o modo, sempre se dirá, na senda dos ensinamentos de Rui Rangel, que para que tais factos fossem tomados em consideração na decisão, a parte teria que manifestar essa vontade e a parte contrária teria de ter tido a faculdade de exercer o contraditório (cf. “O Ónus da Prova no Processo Civil, pag.43).
Em consequência, é de indeferir o requerido.

Invocam os recorrentes que são falsos os factos dos itens 68 e 69 da sentença (correspondentes às alíneas ‘LL’ e ‘MM’ da matéria assente).
São do seguinte teor:
Do montante relativo ao prémio foram feitas cinco transferências e todas, no seu conjunto, de valor não superior a €100.000,00 (iten 68).
E desse valor, o A., na sua conta pessoal — nº 104040192560554 —, recebeu aproximadamente cerca de €75.000,00 (iten 69).
Estes dois itens correspondem ao teor dos artºs 60º e 61º da petição inicial que, no artº 4º da contestação os recorrentes especificadamente aceitaram.
Portanto, para além de estarem provados por acordo das partes, vir, em sede de recurso, pretender que se considere falsa matéria que aceitou, corresponde, no mínimo, a abuso de direito, na modalidade de venire contra factum próprium.

Relativamente à matéria do iten 71, fundamenta-se a almejada alteração (alínea ‘OO’ da matéria assente), no teor dos documentos de fls. 668 a 674 do Apenso A e da declaração da CCAM que foi junta com as alegações.
A última integra-se na decisão de não admissão de documentos constante do despacho supra.
O teor daquele item é o de que «Foram transferidos valores monetários para a conta dos pais da 3ª ré», pretendendo-se que se dê como provado que «Foram feitas 14 transferências para a conta dos pais da 3ª ré, no valor total de €147.000,00».
Os documentos de fls. 668 a 674, não conseguem idoneamente demonstrar o pretendido.
Da factualidade provada (e só nessa deverá atentar o Tribunal) estão apuradas contas com o nºs 104040192560554 (pessoal do autor), e 104040209671107 (do autor e da terceira ré). Das contas referidas nos nºs 71 e 72 da sentença são desconhecidos os respectivos números.
Os documentos – atendíveis - agora chamados à colação (fls.668 a 672 do apenso A) revelam 34 transferências bancárias, mas não permitem concluir a quem se destinavam (com excepção daquelas duas), por se desconhecer os respectivos titulares.
Portanto, não são idóneos a dar como provado o pretendido, pelo que é de manter a factualidade consignada na 1ª instância.

Litigância de má-fé: A decisão do Sr. Juiz a quo abordou proficuamente esta questão, concluindo que não ocorria má-fé do autor.
Para ela se remete, nos termos do artº 713º, nº6, do Código de Processo Civil, assim se mantendo.

Depoimento de parte vs. Testemunho de parte
Basicamente, nesta rubrica, os apelantes insurgem-se contra o que constitui um meio ilegal de prova, usado, nas suas palavras, pelo Sr. Juiz a quo - o testemunho de parte.
Começamos, por isso, por efectuar um breve enquadramento jurídico para, depois, verificarmos o caso em concreto.
A lei processual não fornece um conceito de depoimento de parte, nem estabelece directamente e em concreto o que dele pode ser objecto.
Dispõe sobre quem pode prestá-lo, de quem pode ser exigido e sobre que factos pode recair do ponto de vista da sua relação com a pessoa do depoente.
Não é, porém, questionável que o depoimento de parte, enquanto meio de prova para provocar a confissão, só poderá recair sobre matéria de facto que seja desfavorável ao respectivo depoente – artºs 552º e 563º do Código de Processo Civil e 352º do Código Civil.
A confissão tem forçosamente que incidir sobre factos desfavoráveis ao confitente e favoráveis à parte contrária. Como afirma Alberto dos Reis (Código Processo Civil, Anotado, IV, pág. 70), a confissão constitui prova, não a favor de quem a emite, mas a favor da parte contrária; portanto recai necessariamente sobre factos desfavoráveis ao confitente e favoráveis ao seu adversário.
No despacho datado de 12 de Março de 2010, o Tribunal decide e exara isso mesmo, ou seja, que o depoimento de parte, enquanto meio para obter a confissão, só pode recair sobre factos desfavoráveis ao respectivo depoente.
Porém, na sequência de correspondente opção legislativa, a lei processual civil tem feito florescer cada vez mais os poderes inquisitórios, em detrimento do princípio do dispositivo, com vista à maior aproximação do juiz à verdade material.
Disso são afloramento os artºs 265º nº3, 266º nº2, 552º nº1 e 653º nº1 do Código de Processo Civil).
Por isso, permite-se que o Tribunal, em qualquer altura do processo, possa determinar a comparência pessoal das partes para a prestação de depoimento sobre factos que interessem à decisão da causa.
A que acresce, recorde-se, que do artº 563º, nº1, à contrario, resulta que quando a parte presta o seu depoimento não se visa exclusivamente a confissão.
Nada obsta, portanto, a que o tribunal na sequência dos poderes que tem de ouvir qualquer pessoa, incluindo as partes, por sua iniciativa, na busca da verdade material, tome em consideração, para fins probatórios, as declarações não confessórias da parte, as quais serão livremente apreciadas, nos termos do artº 655º, nº1, do Código de Processo Civil.
Igual entendimento pode ver-se in:
- Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, volume I, 2ª edição, 2004, 2º volume, Almedina, pág. 486;
- Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, 1976, pág. 248,
- Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, II Vol., pag. 211.
- Acórdãos do STJ de 5.11.2008, Procº 1902/2008, de 21.01.2009, Procº 3966/2008, 10.12.2009, de 10.12.91, de 20.01.2004, procº03S3474, 02.11.2004, disponíveis em www.dgsi.pt e 26.10.1999, CJ STJ, ano VII, tomo III, pág. 57 e seguintes;
Neles se adoptou o entendimento de que o depoimento de parte, que não redunde em confissão - por respeitar a factos favoraveis ao depoente -, é de livre apreciação pelo tribunal.
Também no sentido de que os simples esclarecimentos ou afirmações que não possam valer como confissão, podem valer como elementos probatórios sujeitos à livre apreciação do Tribunal, cf. Direito Processual Civil, Pais do Amaral, pag. 325.
Contra tal posição, pode ver-se José Lebre de Freitas, Código de Processo Civil anotado, volume 2º, Coimbra Editora, 2001, páginas 464 a 466.
Conclui-se, pois, que as declarações, prestadas pelas partes, sob juramento (artº 559º), podem ser valoradas pelo tribunal a quo para fundar a sua convicção acerca da veracidade de factos controvertidos favoráveis a qualquer delas.
Ora, no despacho de 16.07.2010, quando o Tribunal a quo vem admitir a valoração dos depoimentos prestados pelo autor e pela ré Cristina a toda a matéria, não contraria qualquer decisão anterior, pois que, agora, se ía para além da obtenção da confissão e se visava fazer uso dos poderes legais mais amplos consignados nos normativos apontados.
De resto, é também de realçar que os depoimentos do autor e da ré Cristina são em grande parte coincidentes, às vezes mesmo em absoluta convergência, como se fez constar do despacho sobre a matéria de facto.
Em consequência, o Tribunal a quo não proferiu qualquer decisão contrária a uma outra anterior, por não incidir sobre o mesmo objecto, nem fez uso de meio ilícito de prova.

Presunções Judiciais
Entendem os recorrentes que dando-se, apenas, como provado que o autor agia «na convicção de que se saísse o prémio em qualquer delas estava obrigado a proceder à sua divisão por metade com ela», sem se esclarecer se com “animus donandi” ou “animus praestandi” e sem se provar que, na inversa, houvesse anuência ou conhecimento da ré Cristina e inexistindo qualquer elemento que aponte para que a chave fosse conjunta, não pode chegar à “affectio societatis”; fazendo-o, viola a regra dos artºs 341º, 342º, nº1 do Código Civil e 516º do Código de Processo Civil.
Com maior relevância ainda, dizem, se o facto pressuposto decorreu do depoimento de parte.
Vejamos, então.
Relativamente à valoração/admissibilidade dos depoimentos prestados pelas partes, remete-se para o que supra se mencionou e decidiu e que aqui se dá por reproduzido.
Quanto ao demais:
O princípio da verdade veio impor a aceitação das presunções naturais como meios de prova, reconhecendo-se que o julgador devia ser autorizado a descobrir a verdade material sem se encontrar limitado e condicionado ao princípio dispositivo e às regras de repartição do ónus da prova – “O Ónus da Prova no Processo Civil”, Rui Rangel, pag.220.
Sabemos que as presunções são, por definição do artº 349º do Código Civil, ilações que a lei ou o julgador tiram de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.
Nas palavras daquele Ilustre Jurista – pag.222 - «a prova por presunção é de uma importância fundamental, uma vez que existem inúmeros factos com interesse nuclear na procedência de acções que muito poucas vezes podem ser sujeitos a prova directa, obrigando o julgador a ter de contentar-se com meras presunções, sob pena de poderem verificar-se situações de non liquet que constituem verdadeiros actos de negação de justiça».
Não podíamos estar mais de acordo, principalmente quando nos reportamos ao caso em apreciação.
Deparamo-nos com um par de namorados, que o são por período de tempo relevante – três anos – principalmente quando reportado aos dias de hoje; não se trata de relacionamento fugaz.
Deparamo-nos também, como é bom de ver, com situações do quotidiano de um casal que, por isso, ficam quase sempre no resguardo da respectiva intimidade.
E pergunta-se que sentido de razoabilidade se poderá extrair da circunstância de, semana após semana, durante cerca de três anos, o autor inscrever a aposta da ré no seu próprio boletim se, como invoca esta, apenas fazia o favor de proceder ao registo da sua aposta por não haver nas redondezas da recorrente Cristina mediadores da SCML?
Não será da normalidade da vida que se o autor fosse mero mandante – como defende a ré – esta o interpelasse por tal conduta e exigisse que a sua aposta fosse feita em boletim separado, que só a ela pertenceria?
Apesar de o ano ter 52 semanas, de terem jogado durante cerca de três anos e de, segundo a ré, jogar separadamente do autor, sempre anuiu que o boletim fosse comum, com proveito apenas, dir-se-á, para a SCML, dado serem gratuitos para os apostadores.
E nem se diga que o facto de o recorrido fazer, por vezes, mais apostas sem disso dar conhecimento à ré é demonstrativo de que não existia vontade de jogar em comum. É que é preciso ter presente que se tratava de um casal de namorados, não de quaisquer pessoas com ligações mais distantes e formais.
E como explicar que, apesar de o prémio ser exclusivamente da Cristina, os RR tenham efectuado várias transferências de quantias elevadas para a conta pessoal do autor, largos meses decorridos sobre o sorteio com o qual, na versão daqueles, o autor pretende, ilegitimamente, enriquecer-se?
E como valorar o facto – dado como provado – de ter sido colocada à representante da SCML a questão de ser possível passar mais que um cheque para pagamento da totalidade do prémio e ainda o facto de que tal só não ocorreu por recusa da Instituição?
E que razão existiu para, na ocasião do pagamento, terem nascido contas onde o autor também figurava?
São estas e muitas outras, as perguntas que podem colocar-se e que foram formuladas sustentadamente em matéria provada.
Permitem todavia ao juiz, no processo mental de julgamento, chegar à conclusão de que entre o autor e a ré Cristina se estabeleceu, no domínio do jogo em causa, uma relação contratual relevante, que cumpre qualificar e valorar juridicamente, independentemente de a considerarmos sociedade (como a sentença em crise) ou outra figura jurídica. Seguramente, porém, não se configura como mero mandato, como pretendem os RR.
Disso trataremos de seguida.

Qualificação Jurídica
Dispõe o artº 405º do Código Civil que, dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos naquele código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.
As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei (nº2 do mesmo normativo).
Como pode ler-se in “Contratos Atípicos”, Pedro Pais de Vasconcelos, Almedina, pag.363, “o negócio jurídico e o contrato fundam-se na liberdade insuprimível que os privados efectivamente têm de regular os seus próprios interesses. Mais ou menos limitada pelos ordenamentos estatais, a liberdade contratual existe sempre nalguma medida”.
(…)Costuma dizer-se que a vontade rege no espaço de liberdade que a lei deixa aos privados, espaço que se exprime na autonomia privada – idem, pag.364.
O Sr. Juiz a quo entendeu que o contrato sub júdice deveria ser qualificado como de sociedade civil, qualificação da qual discordam os apelantes.
O artº 980º do Código Civil define-o como aquele pelo qual duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade.
De acordo com tal preceito e seguindo os ensinamentos da doutrina, são três os elementos desta figura jurídica: as contribuições das partes, um exercício comum e o fim da repartição dos lucros.
Nas palavras de Menezes Cordeiro – Manual de Direito das Sociedades, I, Das Sociedades em Geral, pag.269 - «um quarto elemento, de certo modo prévio, seria a intenção de formar a sociedade ou affectio societatis. A sua análise, todavia, reconduz a affectio à própria vontade contratual de formar a sociedade, isto é, à intenção de concluir o contrato aqui em causa. Não teria, assim, um especial relevo como elemento, embora seja um factor importante na distinção entre sociedade e outras figuras semelhantes ou afins».
Prossegue o mesmo autor dando-nos conta do acórdão do STJ de 13.10.77, onde se concluiu que sempre seria indispensável a prova da intenção de formar uma sociedade, ou no sentido jurídico do termo ou como manifestação de mútuo consenso, para que estarmos perante esse contrato.
De outra forma, como atrás se transcreveu, deparar-nos-íamos com figuras semelhantes ou afins.
Também entendemos que urge verificar se estão reunidos os três falados requisitos e se está provada – ainda que por via da presunção judicial – a aludida affectio societatis.
De tudo quanto já se mencionou e que consubstancia a factualidade provada, como sejam as inúmeras apostas de ambos que, semana após semana, durante cerca de três anos, o autor inscreveu num único boletim, com anuência da última, as transferências de quantias elevadas para a conta pessoal do autor, após o sorteio, a pergunta à representante da SCML sobre a possibilidade de ser passado mais que um cheque para pagamento da totalidade do prémio, o que só não ocorreu por recusa da Instituição, a criação de contas onde o autor também figurava, contemporâneas com o prémio e até mesmo a ida a Lisboa, por mais de uma vez, do pai do autor a acompanhar este e os RR, legitimam a presunção de que autor e ré Cristina quiseram e celebraram um contrato – sob a forma consensual - através do qual, mediante as contrapartidas de ambos, visaram repartir os lucros que viessem a obter.
Que ambos contribuíram para o fim pretendido parece não oferecer controvérsia.
Importa, agora, saber se ocorre exercício em comum de certa actividade económica.
«A expressão “exercício em comum” deve ser entendida como exercício por conta de todos. Pode falar-se em “fim comum” desde que a “fim” se dê um alcance particularmente lato. Na verdade, pode o “exercício” não ser levado a cabo por todos os sócios, sem deixar de ser “em comum”.
A natureza “económica” da actividade exigida prende-se com a ideia da repartição de lucros, essencial para distinguir a sociedade da associação» - Menezes Cordeiro, obra citada, pag. 270.
Em anotação ao preceito agora em análise, pode ler-se no Código Civil Anotado, P.Lima e A.Varela, que “actividade económica” significa que dela deve resultar unm lucro patrimonial, embora se não deva confundir actividade económica com simples produção de bens, pois a economia abrange outras actividades além da produção.
Dos trabalhos preparatórios do Código Civil, contidos em “Anotações ao Código Civil, Dos Contratos em Especial”, vol.I, do Cons. Rodrigues Bastos, não se colhe qualquer contributo para a delimitação do conceito de “actividade económica”.
O acórdão da Relação de Lisboa, datado de 18.05.2000, (CJ XXV, T.III, 91) citado nas doutas alegações, fazendo uso dos ensinamentos do Dicionário de Economia de Alain Cotta, acerca do que deve integrar-se naquele, conclui que jogar no totoloto não traduz qualquer actividade económica, porquanto não está interrelacionado com qualquer produção ou transformação de bens, nem ocorre qualquer correspondência entre esses bens e a satisfação das necessidades do homem.
Concorde-se, ou não, com esta definição, também julgamos que a actividade a que se votou o, ao tempo, par de namorados dos autos, não deve ser qualificada como de “actividade económica”, sendo a sua conjugação de esforços neste domínio mais compaginável como uma sociedade de fito não económico, nas palavras de Prof. Menezes Cordeiro (cf. pag.270). Na verdade, o exercício em comum limita-se à escolha da chave e ao preenchimento e registo da aposta e a obtenção de lucro patrimonial está exclusivamente dependente do factor “sorte” .
E, salvo o devido respeito por opinião diversa, também julgamos não estar demonstrada de modo cabal (ainda que com recurso a presunções judiciais) a affectio societatis, quer se configure, quer não, como elemento prévio ao contrato, quando para isso se exige, para além da intenção de se associar, a intenção, ainda, de formar uma pessoa colectiva distinta.
Concluímos, por isso, que o contrato entre o autor e a ré Cristina terá de se qualificar como um contrato atípico.
Como sabemos, os contratos atípicos ou inominados (como no caso de se misturarem no mesmo contrato regras de dois ou mais tipos de contratos) distinguem-se dos contratos mistos (em que há reunião num único contrato das características de dois ou mais contratos, total ou parcialmente regulados na lei) ou da união ou coligação de contratos (em que dois ou mais contratos estão entre si ligados de alguma maneira mas sem prejuízo da sua individualidade própria).
(…)No relacionamento entre o direito autónomo e o heterónomo, entre a lei, a estipulação e os princípios jurídicos e as cláusulas gerais, é muito diferente a posição dos contratos típicos e doa atípicos – Pedro Pais de Vasconcelos, obra citada, pag.365.
Segundo Helena Brito, citada pelo autor que temos vindo a acompanhar (“Concessão Comercial”), no que respeita aos contratos atípicos puros, a “hieraquia das fontes” da relação contratual é a seguinte:
1 – “Deve atender-se, antes de mais, às regras fixadas pelos contraentes, desde que lícitas”;
2 - Em segundo lugar, “às normas e princípios fixados na lei para categorias contratuais, dentro das quais o contrato se inclua”;
3 - “se tal não bastar, deve recorrer-se às normas e princípios estabelecidos na lei para a generalidade dos contratos e, em geral, para os negócios jurídicos e as obrigações”;
4 -“só depois de esgotadas todas estas possibilidades se deve atender às normas reguladoras do ou dos tipos contratuais com que o contrato apresente mais afinidades, aplicando-se por analogia, as disposições não excepcionais desse ou desses tipos contratuais”.
Daí que seja de aplicar ao caso dos autos as disposições relativas à sociedade, dada a ausência de – provado – clausulado fixado pelos contraentes, ausência de categoria legal contratual e inexistência de normas e princípios estabelecidos na lei para a generalidade dos contratos que se mostrem cabais para regular as especificadades presentes no caso que nos detém.
Também Menezes Cordeiro, na obra que temos vindo a citar, é de parecer que, na ausência de fito económico, o contrato se configurará como o produto de contratos atípicos, a que haverá de aplicar o essencial dos artºs 980º e seguintes do Código Civil (pag.270).
Aqui chegados, restaria averiguar da forma de repartição do valor sorteado.
Acontece que as normas jurídicas a aplicar seriam exactamente as mesmas de que o Tribunal a quo fez uso, posto que se concluiu que o regime aplicável por analogia era o do contrato de sociedade previsto e regulado nos artºs 980º e seguintes do Código Civil.
E, como então se escreveu, «sempre que jogou um maior número de chaves do que aquelas que a R. jogou, o A. não deu desse facto prévio conhecimento a esta última (…) nem lhe foi dada a possibilidade de se pronunciar se aceitava que a sociedade tivesse entradas desiguais ou se, pelo contrário, queria manter a afectação de património em plena igualdade entre ambos (…) pelo que, inexistindo qualquer critério de repartição dos lucros fixado contratualmente, ter-se-á de aplicar o regime legal supletivo, em conformidade com o qual, o valor do prémio do “euromilhões” haverá de ser repartido entre o A., Luís Carlos, e a R., Cristina, na proporção de metade, ou seja, de € 7.500.000,00, para cada um deles».
Sufragamos, por inteiro, esta solução.
Além de que o modo concreto de aplicação dos ditos preceitos não foi objecto da presente apelação, não tendo sido formulado pedido expresso de pronúncia pelos recorrentes neste particular domínio, mas cuja necessidade poderia considerar-se decorrer da diferente qualificação jurídica feita por este Tribunal de recurso.

Em conclusão e por tudo, é de manter totalmente o que havia sido decidido em 1ª instância.
***

Dando cumprimento ao determinado no artº 713º, nº7, do Código de Processo Civil, dir-se-á:
I - Não pode ser equiparável à confissão a condescendência quanto a determinado facto, dada a exigência contida no artº 357º, nº1, do Código Civil.
II - o Tribunal, em qualquer altura do processo, pode determinar a comparência pessoal das partes para a prestação de depoimento sobre factos que interessem à decisão da causa.
III - Quando a parte presta o seu depoimento não se visa exclusivamente a confissão.
IV - Nada obsta a que o tribunal na sequência dos poderes que tem de ouvir qualquer pessoa, incluindo as partes, por sua iniciativa, na busca da verdade material, tome em consideração, para fins probatórios, as declarações não confessórias da parte, as quais serão livremente apreciadas, nos termos do artº 655º, nº1, do Código de Processo Civil.
V – A actividade de um par de namorados que, semana após semana, faz um exercício comum de escolha das chaves e de preenchimento e registo das apostas, visando a obtenção de lucro patrimonial que está exclusivamente dependente do factor “sorte”, configura-se como uma sociedade de fito não económico.
VI – Tal acordo qualifica-se como um contrato atípico, a que deve aplicar-se as disposições relativas à sociedade.



III. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação e, embora por fundamento parcialmente diverso, confirmar integralmente a sentença recorrida.

Custas pelos apelantes.
Guimarães, 19 de Maio de 2011
Raquel Rego
Mário Brás
António Sobrinho
Raquel Rego
Canelas Brás
António Sobrinho

http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/91b149fa26cbd1a2802578b0004b773e?OpenDocument

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