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domingo, 14 de agosto de 2011

TRABALHO SUPLEMENTAR, ÓNUS DA PROVA - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - 04/07/2011

Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
621/09.6TTMAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: EDUARDO PETERSEN SILVA
Descritores: TRABALHO SUPLEMENTAR
ÓNUS DA PROVA

Nº do Documento: RP20110704621/09.6TTMAI.P1
Data do Acordão: 04-07-2011
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .

Sumário: Ao trabalhador que peticiona a remuneração de trabalho suplementar compete alegar e provar pelo menos o horário de trabalho ou o período de trabalho diário, a prestação de trabalho para além deles e que tal prestação foi expressa e previamente determinada pelo empregador, ou que tal prestação foi realizada de modo a não ser previsível a oposição do empregador.
Reclamações:

Decisão Texto Integral: Processo nº 621/09.6TTMAI.P1
Apelação – 2ª

Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 71)
Adjunto: Desembargador Machado da Silva (reg. nº 1.570)
Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório
B… intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra a Ré C…, Lda., pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização pela resolução com justa causa do contrato de trabalho, no valor de 4 660,22 euros, no pagamento do salário de Setembro de 2008 no montante de 641 euros, de 1.114 euros pelas férias vencidas em 1/01/08, 6.940 euros por trabalho suplementar, 1.253,25 euros de proporcionais de férias, subsidio de ferias e de Natal, e juros de mora desde a cessação do contrato em 4/10/2008.
Alegou em síntese que foi contratado no início de Maio de 2003 para motorista de ligeiros, tendo a partir de Março de 2004 desempenhado as funções de motorista de pesados; desde a mesma data efectuava 3 horas de trabalho extraordinário por dia; a R. não lhe pagou a retribuição e o subsidio das férias vencidas em 1/01/08; que a Ré lhe disse que o terminal de … iria fechar, pelo que deveria ir para …; que porém se recusou a custear-lhe as despesas de deslocação, pelo que continuou a apresentar-se ao trabalho no terminal de … até ao final de Setembro de 2008, mês que não lhe foi pago; que por isso resolveu o contrato de trabalho por carta de 3/10/2008, alegando justa causa.

Contestou a R. alegando, em síntese, que não se dedica ao transporte de passageiros, não lhe sendo assim aplicável a C.C.T. entre a Antrop e a Festru; que o A. foi admitido por contrato de 1/06/2007; que em Maio de 2003 já tinha trabalhado para a R., mas por contrato que cessou por caducidade em 31/05/2006, tendo então recebido a correspondente compensação e já estando prescrito qualquer crédito derivado desse anterior contrato; que o A. não realizou trabalho extraordinário, até porque não indica qual era o horário de trabalho, nem a R. lhe solicitou tal realização; que como motorista de pesados o local de trabalho do A. era todo o território nacional onde tivesse que recolher e distribuir as mercadorias; que a R. lhe deu uma ordem de serviço para se apresentar no terminal de … em 8/09/08, não tendo o A. comparecido nem justificado a ausência; que a R. não lhe tinha que pagar despesas de deslocação, pois ia utilizar a viatura da R., com combustível pago por esta e bem poderia regressar ao Porto dentro do período de 8 horas de trabalho; que o A. também não exerceu o direito à resolução dentro do prazo legal de 30 dias, pelo que caducou tal direito; que não existia prejuízo sério nem danos que justificassem a resolução; que a R. lhe pagou os subsídios de férias e natal que reclama; que o vencimento de Setembro de 2008 também foi pago, mas descontando as faltas injustificadas; que existe litigância de má fé, devendo o A. ser condenado a indemnizar a R. em 1500 euros.

Foi dispensada a audiência preliminar e o saneamento e condensação do processo.

Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida decisão sobre a matéria de facto, sem reclamações.

Foi seguidamente proferida sentença que a final decidiu: “julgar a presente acção apenas parcialmente por provada, condenando-se a Ré C…, Lda., a pagar ao Autor B…:
- 2 923,20 euros por trabalho suplementar;
- 557 euros das férias vencidas em 1/01/2008;
- 1 227,90 euros de proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal;
- e juros, sobre as quantias anteriores, pela mora no respectivo pagamento desde o dia seguinte à cessação do contrato (4/10/2008) até integral pagamento e à taxa legal (arts. 804º a 806º do Cód. Civil).
No mais, vai a Ré absolvida do que vinha peticionado pelo Autor”.

Inconformada, interpôs a Ré o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões:
1º A aqui Ré foi condenada em sede de decisão ora recorrida a pagar ao Autor a quantia de € 2923, 20 a título de trabalho suplementar, €557,00 a título de férias vencidas em 1/01/2008, € 1227, 90 a título de proporcionais de Férias, subsídios de Férias e de Natal.
2º Porquanto ficou demonstrado, para o que interessa:
«1-A Ré é uma sociedade que se dedica e se dedicava pelo menos nos anos de 2004 a 2009, de forma habitual e com fins lucrativos à actividade de transportes públicos de mercadorias,
2. Possuindo para o efeito várias viaturas, e o respectivo alvará que lhe permite desenvolver a respectiva actividade
6. O Autor foi admitido ao serviço da aqui Ré em 1 de Junho de 2007.
7. Para sob as suas ordens, direcção e fiscalização desempenhar as funções de motorista de pesados.
8. Pelo prazo de doze meses.
9. Renováveis por iguais períodos, caso o contrato de trabalho não fosse denunciado ela Ré com a antecedência de 15 dias sob a data da renovação.
10. Auferia no desempenho da sua actividade a retribuição mensal de Eur: 557, 00, acrescido de Eur: 7,00 a título de subsidio de alimentação por cada dia completo e efectivo de trabalho.
11. Ficou ainda acordado, a realização de oito horas de trabalho diário, com um intervalo para almoço.
12. No exercício das suas funções de motorista de pesados, competia-lhe distribuir mercadorias, e recolhê-las em todo o território nacional.
19. O Autor nos anos de 2007 e 2008 efectuava duas horas de trabalho, no final do dia, para além das oito horas diárias, as quais não foram pagas pela Ré.
20. Por força das funções a desenvolver pelo trabalhador, o local de trabalho fixado pelo Autor e pela Ré abrangia todo o território nacional.
21. Desde a data da sua admissão ao serviço da Ré, em 1 de Junho de 2007, e já na vigência do seu anterior contrato, o Autor, procedia a ligações entre os Terminais da Ré sediados na …, em … e em ….
22. Distribuía a mercadoria na zona Norte e Sul, a qual incluía o território Nacional entre Viana de Castelo e Lisboa, abrangendo à área de Coimbra, Abrantes, Leiria, Sintra.
23. Por carta registada com aviso de recepção datada de 29 de gosto de 2008, a Ré enviou ao Autor uma correspondência em que lhe transmitia uma ordem de serviço, consubstanciada na obrigação de se apresentar no dia 8 de Setembro de 2008, no Terminal de …, a qual recebeu em 2 de Setembro de 2008.
27. O Autor não compareceu no dia 8 de Setembro de 2008 em …, nem justificou a sua ausência.
28. O Autor remeteu por registo a Ré uma correspondência através da qual informava que nos termos do artº 315 nº 1 do Código de Trabalho não lhe era possível proceder à transferência de Terminal, invocando prejuízo sério.
29. Por carta registada com Aviso de Recepção datada de 10 de Setembro de 2008 a Ré voltou a insistir junto do Autor, para se apresentar no seu Terminal …, alertando-o para a inexistência de alteração de local de trabalho, e para a pratica de faltas injustificadas caso não cumprisse com a ordem de serviço.
30. O Autor rescindiu o seu contrato de trabalho fundamentando-se na falta de pagamento pontual do seu vencimento por carta datada de 3 de Outubro de 2008.
31. Por carta registada com aviso de recepção datada de 20 de Outubro de 2008 a Ré veio esclarecer o Autor que a rescisão por si operada era ilícita, e que sempre ofereceu as condições necessárias para manter o seu posto de Trabalho.
32. Não era necessário pagar ao Autor qualquer quantia para o mesmo se poder deslocar para Sintra, uma vez que iria utilizar uma viatura da Ré para o efeito, como sempre fez.
33. Podendo abastecer a mesma em qualquer posto de combustível da D…, S.A. por possuir um cartão que lhe dava acesso ao mesmo, sem nada pagar.
34. Qualquer outra despesa a realizar pelo motorista, a mesma seria liquidada contra apresentação da respectiva factura, como sempre tinha acontecido até àquele momento.
35. O que se pretendia era a prossecução da ligação entre as duas cidades, indo o autor levantar/buscar a mercadoria em … para a entregar em … a outra empresa de transportes, que por sua vez, passaria a distribuí-la.
36. O Autor gozou férias em Agosto de 2008, e foi-lhe liquidado o respectivo subsídio no final de Julho de 2008.
37. Em Outubro de 2008 foi-lhe pago os proporcionais de férias referente ao ano de 008, no valor de Eur: 25,35.
38. Foi-lhe pago em Outubro de 2008, o respectivo subsídio de Natal no montante de Eur: 417, 75.
39. O vencimento de Setembro de 2008 foi processado e pago, descontando o valor correspondente a 17 dias – 136 horas - em que o Autor faltou no seu posto de trabalho. 40. O Autor não se apresentou no Terminal de …. da Ré, não iniciou qualquer viagem ao volante de qualquer viatura da Ré, nem efectuou qualquer serviço no período de 17 dias do mês de Setembro de 2008, não justificando essas suas faltas.
3º Não tendo sido alegado, nem demonstrado, o inicio e termo da jornada de trabalho, nem tão pouco o inicio e termo do trabalho efectuado para além daquele inicio e termo da jornada de trabalho, nem os dias concretos em que o autor prestou serviço fora da hora do inicio e termo da jornada de trabalho,
4º Não poderia ter sido considerado demonstrado como veio a ser acolhido no ponto 19 da fundamentação fáctica do douto aresto que o Autor prestou no decurso dos anos de 2007 e 2008 no final do dia duas horas de trabalho suplementares.
5º O teor do ponto 19 da fundamentação fáctica da sentença é meramente conclusiva, e destituída de qualquer sustentáculo factual.
6º Face ao exposto, porque o autor não cumpriu com ónus que lhe cabia de alegar e demonstrar os dias e horas concretos em que prestou trabalho suplementar, nem alegou e demonstrou que o fora por conveniência e interesse da entidade patronal aqui Ré, não poderia ter sido considerado demonstrado o vertido no ponto 19 da fundamentação fáctica da sentença.
7º Pelo que violou ou mal interpretou o tribunal “a quo” o disposto no artº 342º do C`d. Civil.
8º O teor do ponto de 19 da fundamentação factica encera conceitos de direito uma vez que apela a sensibilidade e conhecimento técnico- jurídico do julgador, designadamente quanto a definição de trabalho suplementar previsto no artº 197º do Cód. De Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003, a horário de trabalho previsto no artº 159º desse mesmo diploma legal….
9º Consequentemente, nos termos do artº 511º e 646º nº 4 do CPC, aplicável ex vi artº 1º nº 2 al. a ) do CPT deverá tal ponto ser considerado não escrito.
10º Acresce que não podia o Tribunal “a quo” socorrendo-se de presunções, para que assente na falta de prova carreada para os autos pela Ré, no sentido de demonstrar que o autor faltou ao serviço enquanto a laborar sobre as suas ordens direcção e fiscalização, considerar provado que o trabalho suplementar alegadamente prestado por este aquela o foi em todos os dias úteis do período compreendido entre 1 de Junho de 2007 e Setembro de 2008, descontando 25 dias de férias.
11º Na verdade e como já vimos, está vedado ao julgador socorrer-se de presunções, que não as legais, para subsumir determinada factualidade a uma norma jurídica, em desrespeito da repartição do ónus da prova, legalmente imposta, até porque em lado algum ficou demonstrado ou sequer alegado, que as duas horas de trabalho suplementares supostamente realizadas ao fim do dia o foram todos os dias úteis da semana
12º Pelo que mal andou ou interpretou o tribunal “a quo” o disposto no artº 342º e 349ºa 351 d Código Civil.
13º Por tudo quanto se vem a referir não podia o Tribunal a quo condenar a Ré a pagar ao autor a quantia de € 2923, 20 a título de trabalho suplementar, pelo que deverá ser nesta parte revogado o aresto ora recorrido.
SEM CONCEDER
14º A ré foi ainda condenada a pagar ao Autor proporcional de subsidio de Natal referente ao ano de 2008, no valor de € 417, 75.
15º Porém ficou a constar do ponto 38 da fundamentação fáctica da douta sentença «Foi-lhe pago em Outubro de 2008, o respectivo subsídio de Natal no montante de Eur: 417, 75.»
16º O teor deste ponto veio a acolher a afirmação da Ré inserta no artº 119º da sua contestação em resposta ao alegado nos artºs 24 ºe 25º da PI que impugna especificamente nesse outro articulado, segundo a qual terá liquidado em Outubro de 2008 o respectivo subsidio de Natal no montante de 417, 75.
17º Pese embora, não ter sido claramente individualizado o ano a que se reportava o Subsidio de Natal pago naquela data, sempre se dirá que socorrendo –nos das regras da interpretação dos negócios jurídicos previsto no artº 236º do Cód. Civil, ex vi artº 295º desse mesmo diploma legal ,
18º E uma vez que o autor não peticionou, o valor de subsidio de Natal referente a qualquer outro ano,
19º Uma vez que a Ré se refere especificamente aos artº 24º e 25º da PI, onde aí se alega a falta de pagamento do subsidio de Natal referente ao ano de 2008, que impugna especificamente no artº 120º da sua contestação, após ter afirmado ter afirmado o seu pagamento
20º Uma vez que a Ré na sua impugnação referindo-se a Outubro de 2008, utilizou o adjectivo “ respectivo” para se referir ao Subsidio de Natal desse ano,
21º Outra não poderia ser a interpretação senão que o subsidio de Natal pago em Outubro de 2008 pela Ré ao Autor se reportava ao ano de 2008.
22º Consequentemente deverá ser a sentença ora posta em crise revogada na parte em que condena a Ré no pagamento ao Autor do subsidio de Natal do ano de 2008
23º Assim, caso o Tribunal “a quo” , tivesse considerado que a prova do pagamento do subsidio de Natal em Outubro de 2008, não se reportaria ao ano de 2008, violou ou mal interpretou o disposto nos artº 236º e 295º do Cód. Civil, bem como o alegado nos artºs 24º da PI e 119 e 120 da Contestação.
24º Caso a materialidade acolhida no ponto 38º da fundamentação fáctica da decisão se reporta a prova do pagamento do subsidio de Natal do ano de 2008, a sentença padece de nulidade nos termos do 668º nº 1 al. c) do CPC aplicável ex vi artº 1º nº2 al. a) do CPT, por se verificar contradição entre a fundamentação fáctica e a decisão.
SEM CONCEDER
25º Foi ainda a ré condenada ao Autor as férias vencidas em 1/01/2008 no valor de € 557, 00,
26º Sem prejuízo do que adiante se irá expor sempre se dirá que as férias vencidas a 1 de Janeiro de 2008, e reportadas ao ano de 2007, tendo presente que o autor foi admitido ao serviço da Ré em 1 de Junho de 2007 (ponto 21 da fundamentação fáctica), computam-se em 14 dias úteis, e não em 25 dias úteis como vem referido na sentença.
27º Não foi especificado no ponto 36º da fundamentação fáctica da decisão, mas deveria sê-lo porque relevante para a boa decisão da causa, que a importância paga a título de subsidio de Natal, ascendia a € 557,00,
28º Materialidade alegada no artº 117º da contestação por remissão para o documento XIII que a Ré deu por reproduzido e nesta medida integrou na sua defesa.
29º Consequentemente devera ser acrescentado ao ponto 36º da fundamentação fáctica da decisão, a seguir a “Julho de 2008” «(…) no valor de € 557,00
30º Assim pese embora o Tribunal “a quo” ter-se socorrido desta materialidade - o valor do subsidio de férias ascender a €557,00- uma vez que descontou tal montante no valor a liquidar ao Autor a título de ferias vencidas em 1 de Janeiro de 2008, por não ter levantado tal materialidade a facto assente violou o mesmo o disposto no artº 511º , 653º, e 659º nº 2 do CPC aplicável ex vi artº 1º nº 2 al.a ) do CPT
31º Tendo presente o que se acaba apenas seria devido a título de férias e subsidio de ferias (€ 557,00 de salário : 25 dias legais de férias)x 14 dias de férias devidas = € 311, 92 respeitante a cada uma das remunerações num total de € 623,84
32º Pelo que admitindo para efeitos de raciocínio académico que seria devido alguma quantia a título de ferias, e/ ou subsidio de férias vencidas em 1/01/2008, tendo presente a prova de pagamento em Julho de 2008 de €557,00 referente ao subsidio de férias gozadas pelo Autor (ponto 36 da fundamentação fáctica), apenas seria devido a titulo de ferias vencidas em 1 de Janeiro de 2008 a quantia de € 66,84
33º Consequentemente, mal andou ou interpretou o Tribunal “ a quo”, o disposto no artº 212 nº 2 do Cód. de Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003.
PORÉM ENTENDE-SE QUE NADA É DEVIDO A ESTE TÍTULO AO AUTOR
34º O autor limitou-se a alegar, que eram devidas ao autor por parte da Ré as ferias vencidas em 1/01/08 e respectivo subsidio de férias referente ao trabalho prestado em 2007 (artº 12º da PI.
35º Em lado algum o mesmo veio alegar ou sequer ficou demonstrado que a Ré não lhe tivesse liquidado a retribuição referente ao mês em que gozou férias, retribuição esta que se distingue do direito a férias e subsidio.
36º Tendo ficado demonstrado no ponto 36º da fundamentação fáctica da sentença que o Autor gozou férias e foi –lhe pago o respectivo subsidio no final de Julho de 2008, nada é devido a este título, nomeadamente o valor de 557, 00 relativas a férias vencidas em 01/01/2007.
37º Consequentemente, mal andou ou interpretou o tribunal a quo o disposto no artº 212 nº 1 e 255 nº 2 e nº 1 “a contrario sensu” do Código de Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003, verificando-se ainda nulidade de sentença nos termos do artº 668 nº 1 al. e) do CPC aplicável ex vi artº 1º, nº 2 al. a) do CPT por o tribunal ter condenado em objecto diverso do pedido.
36º Em todo o caso sempre o douto aresto padece de nulidade nos termos do artº 668 nº 1 al. c) do CPC por a decisão se encontrar em oposição com a fundamentação fáctica na qual se considerou demonstrado quer o gozo de ferias, quer o pagamento do respectivo subsidio
Sem Conceder
38º Da conjugação dos nº 2 e 4 do artº 212º do Código de Trabalho aprovado pela Lei nº 99/ 2003, decorre que não pode resultar para o trabalhador um período de ferias superior a 30 dias no mesmo ano civil, quando contratado no ano anterior as suas férias se vençam, ou são gozadas no ano seguinte juntamente com as que tiver adquirido nesse ano em que são gozadas.
39º Tendo o trabalhador sido contratado em 1 de Julho de 2007 e posto termo ao seu contrato de trabalho em 3 de Outubro de 2008, resulta que o Autor apenas poderia gozar 30 dias de ferias, com direito ao respectivo subsidio, proporcional a este tempo, em todo o período que esteve a laborar sob as ordens, direcção e fiscalização da Ré.
40º Pese embora, a sentença não especificar no ponto 36º da sua fundamentação fáctica, o período de tempo de férias gozadas em Agosto de 2008 pelo Autor, certo é que, a condenação da Ré ao pagamento de € 557,00 em 1/ 01/2008, correspondente ao vencimento base, a que teria direito aquele caso tivesse gozado a integralidade das ferias a que se reporta o artº 213 do CPT,
41º E uma vez que a sentença não limita os dias de ferias gozados em Agosto de 2008 pelo trabalhador, conclui-se que aí se entendeu que o Autor gozou a título de ferias todo o mês de Agosto, isto é pelo menos vinte e dois dias 42º Por outro lado ficou demonstrado o pagamento do respectivo subsidio no valor de € 557, 00
43º Assim apenas são devidos a final
a)- 8 dias de férias
b)- 8 dias de subsidio de férias, aos quais se deverão descontar o valor de 25, 32 pagos em Outubro de 2008 a título de proporcionais de férias
44º Tudo num total de (€ 557,00: 25 dias de férias legais)X (8 dias de férias + 8 dias de subsidio)- € 25, 32= € 356,48- €25, 32 =€ 331,16
45º Assim mal andou ou interpretou o Tribunal a quo o disposto nos artºs 212º nº 2 e 4, 255º, 221º do Cód. de Trabalho aprovado pela Lei nº 99/ 2003

Contra-alegou o MPº pugnando pela manutenção parcial da sentença, que apenas deve ser revogada no que toca à condenação no pagamento do proporcional de subsídio de Natal.

O Exmº Senhor Procurador Geral Adjunto nesta Relação não emitiu parecer.

Corridos os vistos legais cumpre decidir.

II. Matéria de facto
A matéria de facto dada como provada na 1ª instância é a seguinte:
1. A Ré é uma sociedade que se dedica e se dedicava pelo menos nos anos de 2004 a 2009, de forma habitual e com fins lucrativos à actividade de transportes públicos de mercadorias,
2. Possuindo para o efeito várias viaturas, e o respectivo alvará que lhe permite desenvolver a respectiva actividade
3. Não possui qualquer viatura para transporte público de passageiros, seja em pesados, seja em ligeiros.
4. Não possui alvará que a autorize a desenvolver a actividade de serviço de transportes de passageiros.
5. A – Associação Nacional de Transportadores Rodoviários de Pesados de Passageiros é constituída por sócios cuja actividade económica se relaciona com a indústria de transportes rodoviários em automóveis, pesados de passageiros, próprios ou fretados, em território nacional ou linhas internacionais.
6. O Autor foi admitido ao serviço da aqui Ré em 1 de Junho de 2007.
7. Para sob as suas ordens, direcção e fiscalização desempenhar as funções de motorista de pesados.
8. Pelo prazo de doze meses.
9. Renováveis por iguais períodos, caso o contrato de trabalho não fosse denunciado pela Ré com a antecedência de 15 dias sob a data da renovação.
10. Auferia no desempenho da sua actividade a retribuição mensal de Eur: 557,00, acrescido de Eur: 7,00 a título de subsidio de alimentação por cada dia completo e efectivo de trabalho.
11. Ficou ainda acordado, a realização de oito horas de trabalho diário, com um intervalo para almoço.
12. No exercício das suas funções de motorista de pesados, competia-lhe distribuir mercadorias, e recolhê-las em todo o território nacional.
13. O Autor já em Maio de 2003 tinha sido admitido ao serviço da Ré para sob as suas ordens, direcção e fiscalização desempenhar as funções de motorista de ligeiros, e posteriormente de pesados.
14. Pelo prazo de um ano renovável por igual período caso o contrato não fosse denunciado.
15. Por carta registada com aviso de recepção datada de 3 de Maio de 2006, recebida em 9 do mesmo mês ano a Ré pôs termo ao aludido contrato com efeitos a partir do dia 31 de Maio de 2006, alegando a sua caducidade.
16. Por força dessa caducidade foi acordado entre as partes, e nesta medida aceite pelo Autor o pagamento de uma compensação global no valor de Eur. 1.252,04 (mil duzentos e cinquenta e dois euros e quatro cêntimos) advindo da caducidade desse contrato de trabalho.
17. Este valor foi efectivamente recebido pelo Autor, o qual, emitiu em 31 de Maio de 2006 uma declaração, no âmbito da qual afirmava que nessa data a aqui Ré mais nada lhe devia.
18. No período que mediou entre 1 de Junho de 2006 e 31 de Maio de 2007, o Autor esteve a prestar trabalho sob as ordens, direcção e fiscalização da E…, Lda., NIPC ……….
19. O Autor nos anos de 2007 e 2008 efectuava duas horas de trabalho, no final do dia, para além das oito horas diárias, as quais não foram pagas pela Ré.
20. Por força das funções a desenvolver pelo trabalhador, o local de trabalho fixado pelo Autor e pela Ré abrangia todo o território nacional.
21. Desde a data da sua admissão ao serviço da Ré, em 1 de Junho de 2007, e já na vigência do seu anterior contrato, o Autor, procedia a ligações entre os Terminais da Ré sediados na …, em … e em ….
22. Distribuía a mercadoria na zona Norte e Sul, a qual incluía o território Nacional entre Viana de Castelo e Lisboa, abrangendo à área de Coimbra, Abrantes, Leiria, Sintra.
23. Por carta registada com aviso de recepção datada de 29 de Agosto de 2008, a Ré enviou ao Autor uma correspondência em que lhe transmitia uma ordem de serviço, consubstanciada na obrigação de se apresentar no dia 8 de Setembro de 2008, no Terminal de …, a qual recebeu em 2 de Setembro de 2008.
24. A afectação de um motorista a um terminal resumia-se à circunstância do trabalhador passar a estar disponível para a execução do serviço desse Terminal.
25. Passando esse mesmo terminal, a que estaria afecto o trabalhador, a poder contar com a sua disponibilidade na organização das rotas de distribuição das suas encomendas.
26. A gerência da Ré deslocou-se às instalações de …, e o Autor nada perguntou quanto a uma presumível mudança de local de trabalho.
27. O Autor não compareceu no dia 8 de Setembro de 2008 em …, nem justificou a sua ausência.
28. O Autor remeteu por registo a Ré uma correspondência através da qual informava que nos termos do artº 315 nº 1 do Código de Trabalho não lhe era possível proceder à transferência de Terminal, invocando prejuízo sério.
29. Por carta registada com Aviso de Recepção datada de 10 de Setembro de 2008 a Ré voltou a insistir junto do Autor, para se apresentar no seu Terminal de …, alertando-o para a inexistência de alteração de local de trabalho, e para a pratica de faltas injustificadas caso não cumprisse com a ordem de serviço.
30. O Autor rescindiu o seu contrato de trabalho fundamentando-se na falta de pagamento pontual do seu vencimento por carta datada de 3 de Outubro de 2008.
31. Por carta registada com aviso de recepção datada de 20 de Outubro de 2008 a Ré veio esclarecer o Autor que a rescisão por si operada era ilícita, e que sempre ofereceu as condições necessárias para manter o seu posto de Trabalho.
32. Não era necessário pagar ao Autor qualquer quantia para o mesmo se poder deslocar para …, uma vez que iria utilizar uma viatura da Ré para o efeito, como sempre fez.
33. Podendo abastecer a mesma em qualquer posto de combustível da D…, S.A. por possuir um cartão que lhe dava acesso ao mesmo, sem nada pagar.
34. Qualquer outra despesa a realizar pelo motorista, a mesma seria liquidada contra a apresentação da respectiva factura, como sempre tinha acontecido até àquele momento.
35. O que se pretendia era a prossecução da ligação entre as duas cidades, indo o Autor levantar/buscar a mercadoria em … para a entregar em … a outra empresa de transportes, que por sua vez, passaria a distribuí-la.
36. O Autor gozou férias em Agosto de 2008, e foi-lhe liquidado o respectivo subsídio no final de Julho de 2008.
37. Em Outubro de 2008 foi-lhe pago os proporcionais de férias referente ao ano de 2008, no valor de Eur: 25,35.
38. Foi-lhe pago em Outubro de 2008, o respectivo subsídio de Natal no montante de Eur: 417, 75.
39. O vencimento de Setembro de 2008 foi processado e pago, descontando o valor correspondente a 17 dias – 136 horas - em que o Autor faltou no seu posto de trabalho.
40. O Autor não se apresentou no Terminal de … da Ré, não iniciou qualquer viagem ao volante de qualquer viatura da Ré, nem efectuou qualquer serviço no período de 17 dias do mês de Setembro de 2008, não justificando essas suas faltas.

III. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do disposto nos artigos 1º, nº 2, al. a), e 87º do Código de Processo do Trabalho, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, as questões a decidir são as seguintes:
a) nulidade da sentença nos termos do artº 668º nº 1 al. c) do CPC caso a materialidade acolhida no ponto 38º da fundamentação fáctica da decisão se reporte a prova do pagamento do subsídio de Natal do ano de 2008, por contradição entre a fundamentação fáctica e a decisão.
b) nulidade da sentença nos termos do artº 668º nº 1 al. d) e também c), do CPC, por nada ser devido a título de férias vencidas em 1.1.2007, tendo o tribunal condenado em objecto diverso do pedido e encontrando-se a decisão em oposição com a matéria de facto na qual se considerou demonstrado quer o gozo de férias quer o pagamento do respectivo subsídio.
c) alteração da matéria de facto relativamente:
- ao ponto 36º da fundamentação, ao qual se deve acrescentar que o valor do subsídio pago foi de €557,00;
- ao ponto 19º da fundamentação de facto, que encerra conceitos de direito, pelo que deve ser dado por não escrito.
d) saber se o A. não tem direito ao pagamento do trabalho suplementar, porque não alegou nem provou os respectivos factos constitutivos.
e) saber se o A. não tem direito ao proporcional de subsídio de Natal referente ao ano de 2008, porque já lhe foi pago.
f) saber se, relativamente às férias vencidas a 1.1.2008, o A. não tem direito a 25 dias úteis mas apenas a 14 dias úteis.
g) saber se nada é devido ao A. a título de férias e subsídio de férias vencidos em 1.1.2008 uma vez que o A. não alegou nem demonstrou que a Ré não lhe tivesse liquidado a retribuição referente ao mês em que gozou férias.
h) saber se, tendo o A. sido contratado em 1.7.2007 e posto termo ao seu contrato em 3.10.2008, apenas poderia gozar 30 dias de férias, por força da conjugação do disposto nos nºs 2 e 4 do artº 212 do Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003.
i) saber se, por já ter sido pago €557,00 de férias, apenas são devidos 8 dias de férias e 8 dias de subsídio, a que se deverá descontar o valor de €25,32 pagos em Outubro de 2008 a título de proporcionais de férias.

a) e b)
O artigo 77º do actual CPT (na senda da anterior versão) dispõe:
“1 - A arguição da nulidade da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
2 - Quando da sentença não caiba recurso ou não se pretenda recorrer, a arguição das nulidades da sentença é feita em requerimento dirigido ao juiz que a proferiu.
3 - A competência para decidir sobre a arguição pertence ao tribunal superior ao ou juiz, conforme o caso, mas o juiz pode sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso”.
O processo laboral contempla portanto um regime especial de arguição de nulidades da sentença, sendo certo que a mesma deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso.
Trata-se de regra ditada por razões de economia e celeridade processuais e prende-se com a faculdade que o juiz tem de poder sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso.
“Para que tal faculdade possa ser exercida, importa que a nulidade seja arguida no requerimento de interposição do recurso que é dirigido ao juiz e não nas alegações de recurso que são dirigidas ao tribunal superior, o que, implica, naturalmente, que a motivação da arguição também conste daquele requerimento”- vide ac. da Relação de Lisboa de 25.1.2006, proferido no processo nº 8769/2005-4 in www.dgsi.pt.
Assim, é entendimento dominante a nível jurisprudencial que o tribunal superior não deve conhecer da nulidade ou nulidades da sentença que não tenham sido arguidas, expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso, mas apenas nas respectivas alegações – vide neste sentido vg: ac. do STJ de 25-10-1995,CJ,T III, pág 281, supra citado aresto da Relação de Lisboa de 25-1-2006, acórdão da Relação de Lisboa, de 15-12-2005, proferido no processo 8765/2005-4 in www.dgsi.pt.
A arguição que não seja levada a cabo nesses moldes é intempestiva e obsta a que dela se conheça.
No caso concreto, a arguição das nulidades foi apenas feita nas alegações, humildemente no meio delas, e não expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso, pelo que delas não se poderá conhecer.

c) No ponto 36º da fundamentação de facto consta: “O Autor gozou férias em Agosto de 2008, e foi-lhe liquidado o respectivo subsídio no final de Julho de 2008” e a recorrente pretende que se acrescente “no valor de €557,00.”
Trata-se duma mera precisão, porque não resultando dos articulados o acordo quanto ao pagamento, não deixa de resultar provado o valor da retribuição e do subsídio de férias (artº 13º da petição inicial, artº 117º da contestação e respectivo documento nº XIII, fotocópia do recibo de remunerações).
Deste modo, altera-se a redacção do ponto 36º da fundamentação de facto para “O Autor gozou férias em Agosto de 2008, e foi-lhe liquidado o respectivo subsídio no final de Julho de 2008, no valor de €557,00”.

O ponto 19º da fundamentação de facto, com o seguinte teor: “O Autor nos anos de 2007 e 2008 efectuava duas horas de trabalho, no final do dia, para além das oito horas diárias, as quais não foram pagas pela Ré”, encerra conceitos de direito ou é conclusivo, de modo que deva ser dado por não escrito?
Dispõe o artº 646 nº 4 do CPC: “Têm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”.
Com o ponto 19º ficamos a saber que o A., nos anos de 2007 e 2008, trabalhava oito horas diárias, e no final do dia, ainda trabalhava mais duas. É certo que a expressão “das oito horas diárias” faz lembrar, se não o horário (porque não há qualquer indicação de horas de início e fim) pelo menos o período de trabalho diário. Mas a expressão “além das oito horas diárias” reporta-se ao ponto 11º da mesma matéria de facto, que consagra que ficou acordado entre as partes que o A. trabalharia 8 horas por dia. É além dessas que a Mmª Juiz a quo dá como provado que o A. trabalhava ainda mais duas.
Não há, no ponto em questão, verdadeiramente nem expressamente nenhuma referência a nenhum conceito de direito, nem nenhuma conclusão. Conclusão haveria – e seria uma conclusão de facto – se o A. tivesse alegado que começava às “x” horas e terminava às “y” horas, todos os dias, e a Mmª Juiz a quo tivesse consagrado apenas a soma das horas, concluindo assim pelo número de horas.
Repare-se que em lado algum do ponto 19º se diz que o A. prestou duas horas diárias de trabalho suplementar – isso sim seria um conceito de direito.
A redacção do ponto 19º é substancialmente igual a dizer que nos anos de 2007 e 2008 o A. trabalhou dez horas por dia. A conclusão jurídica poderá não ser a que a sentença consagrou, mas dizer isso não encerra nem pressupõe – ainda que vá indiciando o sentido em que a solução de direito se encaminhará – qualquer conceito ou noção de direito.
Termos em que, nesta parte, improcedem as conclusões do recurso, não se eliminando nem alterando o ponto 19º da fundamentação de facto.

d) Relativamente ao trabalho suplementar, considerou-se na sentença: “Passando agora à questão do trabalho suplementar, o que o A. logrou provar foi que o período de trabalho diário acordado era de 8 horas, tendo no entanto o A. trabalhado mais 2 horas por dia, nos anos de 2007 e 2008, ou seja, desde a admissão (em 1/06/07) até ao último mês de trabalho (Setembro de 2008).
Tal circunstancialismo configura a prestação de trabalho suplementar, na acepção do art. 197º do C.T.. E dado que foi em beneficio da R., sem que esta nunca tenha manifestado qualquer oposição à sua realização, é de dar por exigível o respectivo pagamento, nos termos do art. 258º do C.T..
(…)
Quanto aos dias em que o A. terá efectivamente trabalhado – e prestado o trabalho suplementar – nada ficou concretamente apurado, mas não tendo a R. alegado faltas ao serviço antes de Setembro de 2008 – como seria seu ónus, segundo o art. 342º, nº 2, do Cód. Civil – é de concluir que o A. tem a haver 10,44 euros por cada dia útil compreendido no aludido período/tempo da relação laboral, descontando os dias legais de férias (25 em cada um dos anos, segundo o art. 213 do C.T.), o que lhe permite reclamar o montante global de 10,44 euros x 280 dias = 2 923,20 euros”.

Na petição inicial o A. alegou apenas que “a partir de Março de 2004, começou a efectuar 3 horas de trabalho extraordinário, que era sempre efectuado no final do dia” e no artigo 26º contabilizou ano a ano, mês a mês, o nº de horas extraordinárias prestadas.
Não alegou a hora de início e de termo do seu horário de trabalho, nem alegou os dias concretos em que tais horas foram prestadas, nem alegou que o trabalho suplementar lhe foi prévia e expressamente exigido pela Ré, ou realizado de modo a não ser previsível a oposição desta.
Nos termos do artº 197º do Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003, aplicável ao caso dos autos, dado o período em que o trabalho suplementar foi alegadamente prestado, “Considera-se trabalho suplementar todo aquele que é prestado fora do horário de trabalho” constituindo assim elemento de facto necessário à alegação de quem peticiona o pagamento, a prestação do trabalho e o horário de trabalho além do qual tal prestação teve lugar. Mas é também facto necessário – ou seja, facto constitutivo do direito ao pagamento do trabalho suplementar, nos termos do artº 342º nº 1 do Código Civil, a alegação de que o trabalho foi prestado após prévia e expressa determinação da entidade patronal, ou de modo a não ser previsível a sua oposição.
Veja-se a este propósito em www.dgsi.pt o Ac. do STJ de 7.10.2010 proferido no processo 459/05.0TTFAR.S1, do qual transcrevemos, tendo interesse até a evolução histórica: “Na primitiva versão do Decreto-Lei n.º 421/83, dispunha o artigo 6.º, n.º 1, que «[a] prestação de trabalho suplementar tem de ser prévia e expressamente determinada pela entidade empregadora, sob pena de não ser exigível o respectivo pagamento».
Tendo o acórdão do Tribunal Constitucional de 23 de Novembro de 1999 (publicado Diário da República, II Série, n.º 68, de 21 de Março de 2000, pág. 5349), declarado inconstitucional essa norma, quando interpretada no sentido de considerar não exigível o pagamento de trabalho suplementar prestado com conhecimento do empregador (implícito ou tácito) e sem a sua oposição, por violação dos artigos 59.º, n.º 1, alínea a) e d), 2.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, a jurisprudência deste Supremo Tribunal orientou-se, pacificamente, no sentido de considerar que, para que o trabalhador tenha direito à retribuição por trabalho suplementar, é necessário que demonstre que prestou trabalho fora do horário normal e que esse trabalho foi efectuado com o conhecimento e sem oposição da entidade patronal (cfr., por todos, o Acórdão de 18 de Janeiro de 2005, Documento n.º SJ200501180009234, em www.dgsi.pt).
O Código do Trabalho de 2003 inovou, nesta matéria, ao estabelecer no artigo 258.º, n.º 5, que «[é] exigível o pagamento de trabalho suplementar cuja prestação tenha sido prévia e expressamente determinada, ou realizada de modo a não ser previsível a oposição do empregador».
Atento o disposto no artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, ao trabalhador que invoca o direito à remuneração por trabalho suplementar compete alegar e provar os factos constitutivos desse direito, ou seja, que prestou trabalho fora do horário de trabalho e que tal sucedeu por determinação prévia expressa do empregador, ou com conhecimento e sem oposição deste, ou, no regime do Código de 2003, que a prestação desse trabalho foi realizada em circunstâncias de não ser previsível a oposição do empregador”.
A matéria de facto provada permite a conclusão que se retirou na sentença de que o trabalho suplementar “foi em beneficio da R., sem que esta nunca tenha manifestado qualquer oposição à sua realização”? Os factos provados são a este respeito ou que se podem convocar são os que constam dos nºs 11, 12, 19, 20, 21 e 22, mas, com o devido respeito, não só o facto não foi alegado, como cremos que não se deduz dos factos provados. O trabalho terá sido em benefício da Ré, se foi, mas donde retirar que a Ré nunca manifestou oposição? Porventura do facto de se ter dado a alegação da Ré, a este propósito, como não provada: - artigos 43 a 45 da contestação, respondidos como não provados. De novo com o devido respeito, a não prova da alegação da Ré não faz provar nem presumir o seu contrário, nem provar aquilo que o A. não alegou. Não vemos que dos factos provados – que são apenas o nº de horas de trabalho diário e as funções do A. enquanto motorista de pesados no território nacional – resulte que a prestação de trabalho suplementar tenha sido realizada em condições de não ser previsível a oposição da Ré.
Deste modo, improcede a condenação da recorrente no pagamento de trabalho suplementar.
Sempre se dirá, contudo e ainda, que se tal facto constitutivo tivesse sido alegado e provado, a condenação no pagamento do trabalho suplementar era devida, mesmo sem a alegação concreta dos dias e horas trabalhados e das horas de início e termo do horário, mas que a condenação não poderia ser liquidada nesta sede, porque não se presume que não haja faltas a partir da sua não invocação pela empregadora, devendo o apuramento ser feito em liquidação de sentença.
Veja-se a mais recente jurisprudência sobre o assunto, apesar da corrente inversa ter sido constante no passado, no Ac. do STJ de 18.2.2011, em cujo sumário se lê: “I - O trabalho suplementar corresponde ao trabalho prestado fora do horário de trabalho: cabem aqui todas as situações de desvio ao programa normal de actividade do trabalhador, como seja o trabalho fora do horário em dia útil e o trabalho em dias de descanso semanal e feriados.
II - Resultando provado que a trabalhadora prestou trabalho suplementar, mas fracassando a prova dos dias e do número exacto de horas em que trabalhou, para além do período normal de trabalho, deve o respectivo apuramento – e, consequentemente, o apuramento dos valores a esse título devidos – ser relegado para posterior liquidação, ao abrigo do disposto no art. 661.º, n.º 2, do Código de Processo Civil”.

e) Relativamente ao proporcional do subsídio de Natal, a recorrente tem razão e o recorrido também lha concede. Este tinha pedido inicialmente €1.253,25, a título de proporcionais de férias, de subsídio de férias e de Natal respeitantes ao ano da cessação do contrato, foi dado como provado no facto nº 37 que foram pagos €25,35 a título de proporcionais de férias, e no facto nº 38º que foram pagos €417,75 a título de subsídio de Natal. Deste modo, só por mero lapso consta da sentença que no que concerne a proporcionais, “A ré apenas logrou provar o pagamento de 22,35 euros (…) pelo que está em dívida a diferença de 1.227,90 euros”.

f) Nos termos dos artº 211º, 212 nº 1 e 2, 213 nº 1 e 221 nº 2 e 3, todos do Código do Trabalho, posto que o contrato durou mais de um ano, o recorrido tinha dois dias úteis por cada mês trabalhado desde Junho a Dezembro de 2007 e venceu, em 1.1.2008, o direito a vinte e dois dias úteis de férias. Na verdade, em 1.1.2008 o contrato entra no ano posterior ao da admissão, e assim cai sob a regra geral do artº 212 nº 1, não excepcionado pelos nº 2 e 3 do mesmo preceito. O reporte das férias ao trabalho prestado no ano anterior não coincide necessariamente com um ano de trabalho anterior, no caso das férias que se vencem no ano seguinte ao da admissão. A ficção de recompensa funciona do mesmo modo.
Mas note-se agora que o recorrido, na petição inicial, não reclamou o pagamento da retribuição nem do subsídio relativo a qualquer dia de férias relativo a 2007, isto é, qualquer dos dias de férias que se lhe foram vencendo ao longo dos seis meses que trabalhou em 2007.

g) O recorrido, tendo gozado as férias em Agosto, não alegou que não recebeu a respectiva retribuição e consequentemente a recorrente não deve ser condenada a pagá-la? – Alegou sim, nos artigos 11, 12 e 13 da petição inicial (e por isso não tinha a recorrente razão, se pudesse ter sido conhecida a nulidade arguida, quando referiu que o tribunal conheceu de questão de que não podia conhecer). E a prova do pagamento competia à recorrente, nos termos do artº 342º nº 2 do Código Civil, que a não fez. Aliás, nos autos não se encontra o recibo de Agosto de 2008.

h) e i) Nada ficou apurado nos autos relativamente aos dias de férias vencidos ao longo de 2007, se foram ou não gozados e quando, e nem tinha de ficar, precisamente porque como já notámos, o recorrido nada reclamou a esse título. Não faz pois sentido, isto é, não é necessário saber se em Agosto de 2008 o recorrido gozou 22 dias úteis e se por isso a recorrente apenas lhe deverá 8 dias de férias e 8 dias de subsídio.

Ora, em conclusão, temos provado que o recorrido gozou férias em Agosto de 2008 – o que se tem de ler, como resulta da alegação dos artigos 11 e 12 da petição inicial – como gozou férias durante todo o mês de Agosto, que o recorrido tinha direito a 22 dias úteis de férias e que e a recorrente não provou, e incumbia-lhe tal prova, que lhe pagou a correspondente retribuição, isto é, a retribuição do mês de Agosto de 2008. Nada há portanto a alterar à sentença, improcedendo as conclusões do recurso nesta parte.

Nestes termos, alterar-se-á a sentença recorrida, eliminando a condenação no pagamento da retribuição por trabalho suplementar, descontar-se-á à quantia arbitrada relativa a proporcionais de férias, de subsídio de férias e de Natal, o proporcional de Natal e manter-se-á no mais a sentença.

IV. Decisão
Nos termos supra expostos acordam conceder provimento parcial ao recurso, alterando a sentença recorrida e condenando assim a recorrente a pagar ao recorrido a quantia de €557,00 (quinhentos e cinquenta e sete euros) relativa às férias vencidas em 1/01/2008, acrescida da quantia de €710,15 (setecentos e dez euros e quinze cêntimos) relativa a proporcionais de férias e de subsídio de férias, no montante global de €1.267,15 (mil duzentos e sessenta e sete euros e quinze cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal desde, como peticionado, o dia seguinte à cessação do contrato (4/10/2008) e até integral pagamento, absolvendo a recorrente de todo o demais peticionado pelo recorrido.
Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento.

Porto, 4.7.2011
Eduardo Petersen Silva
José Carlos Dinis Machado da Silva
Maria Fernanda Pereira Soares (votei a decisão relativamente ao trabalho suplementar)
_________________
Sumário:
Ao trabalhador que peticiona a remuneração de trabalho suplementar compete alegar e provar pelo menos o horário de trabalho ou o período de trabalho diário, a prestação de trabalho para além deles e que tal prestação foi expressa e previamente determinada pelo empregador, ou que tal prestação foi realizada de modo a não ser previsível a oposição do empregador.

(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artigo 138º nº 5 do Código de Processo Civil).
Eduardo Petersen Silva

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/925e0f8f75d6bf05802578ca004f3575?OpenDocument

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