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quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora - REAPRECIAÇÃO DA PROVA POSSE USUCAPIÃO ESPAÇO AÉREO AQUISIÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE SOBRE O SOLO PRESUNÇÃO REGISTRAL - 08/09/2011


Acórdãos TRE
Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
149/07.9TBSTC
Relator: JOÃO GONÇALVES MARQUES
Descritores: REAPRECIAÇÃO DA PROVA
POSSE
USUCAPIÃO
ESPAÇO AÉREO
AQUISIÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE SOBRE O SOLO
PRESUNÇÃO REGISTRAL

Data do Acordão: 08-09-2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: ALENTEJO LITORAL - SANTIAGO DO CACÉM
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO

Sumário:
1 - Face ao princípio da liberdade julgamento a que alude o artº 655º do mesmo diploma e no contexto do qual o juiz aprecia livremente as provas, analisa-as criticamente e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, especificando os fundamentos que foram decisivos para formar tal convicção, excepto quando a lei exija formalidades especiais para a prova dos factos controvertidos, caso em que tal prova não pode ser dispensada, não pode pretender-se a alteração da decisão da matéria de facto com base em que os meios de prova invocados permitiam decisão diversa. Com efeito, o que o recorrente tem de demonstrar é que os meios de prova de que se socorre, impunham decisão diversa da proferida.
2 - A presunção a que alude o artº 7º do C.R. Predial, abrange apenas o facto inscrito, o seu objecto e os sujeitos da relação jurídica subjacente ao registo e já não os elementos da descrição do prédio, como a sua composição, as áreas e as confrontações.
3 - A publicidade é um elemento integrante do facto possessório, porque é por ela que ele adquire um valor social. Ou seja, exige-se que os actos materiais, quando observados pelos interessados de que fala o artº 1262º, criem nestes a convicção inequívoca de que correspondem ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real de gozo por parte de quem os pratica.
4 - Não se afigura concebível que, qualquer interessado que observe alguém que se limita a estender roupa, e a deter um fogareiro e vasos de flores no espaço aéreo de uma determinada faixa de terreno, entenda tais actos como exercício do direito de propriedade sobre o solo desta, sendo certo que é precisamente a aquisição do solo que pretendem os AA. ver reconhecida por usucapião.



Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Évora:
J… e mulher C… propuseram acção declarativa de condenação com processo ordinário contra R…, todos melhor identificados nos autos, pedindo que este seja condenado a reconhecê-los como legítimos possuidores e proprietários plenos de uma faixa de terreno com 70 cm de largura e 8,5 m de comprimento situada entre o muro e a extrema poente do seu prédio urbano sito no R…, Santiago do Cacém inscrito na matriz sob o artº… com o prédio do Réu inscrito sob o artº… com a área de 5,44 m2 e a abrir mão da mesma entregando-a livre e devoluta aos AA., e a demolir e remover todas as construções nela edificadas, no prazo máximo de 15 dias e ainda na sanção pecuniária compulsória de 125 €/dia após a data da citação e até à data da cessação da lesão do direito dos AA., tudo com base nos factos descritos na p.i. que se dá por reproduzida.
O R. contestou alegando que os AA. não são possuidores e proprietários de qualquer faixa de terreno para além daquele em que se encontra edificada a sua moradia e deduziu reconvenção pedindo a condenação dos AA. a reconhecerem o seu direito de propriedade sobre prédio sito na Rua…, da freguesia de Santiago do Cacém, descrito sob o nº…, da anexação de um pedaço de terreno descrito sob o nº…, deu origem ao prédio descrito sob o nº…, da freguesia de Santiago do Cacém, com a área total de 284,2 m2, sendo a coberta de 117,6 e a descoberta de 166,6 m2, bem como serem condenados a retirar o estendal que invade a propriedade do Réu, a rectificar a área constante do registo por eles apresentado em 27/07/2006 e, ainda, como litigantes de má fé, em multa e em indemnização a favor da Casa do Farol, em Vila Nova de Santo André, em quantum não inferior a € 5.000,00, tudo com base no seu articulado de contestação-reconvenção que igualmente se dá por reproduzido.
Os A. responderam pugnando pela improcedência do que o R. apresentou como excepções bem como da reconvenção.
Admitido o pedido reconvencional, foi oportunamente exarado o despacho saneador, seguido da selecção da matéria de facto assente e controvertida com a organização, quanto a esta, da base instrutória.
Após demorada instrução do processo, teve lugar a audiência de julgamento, seguida da decisão de fls. 275-289 sobre a matéria de facto, a qual foi objecto de reclamação por parte do Réu, parcialmente atendida.
Por fim, foi proferida a sentença julgando a acção e a reconvenção parcialmente procedentes e em consequência:
- Declarou que os autores J… e mulher C… adquiriram a propriedade por usucapião de uma faixa de terreno existente a poente do seu edifício com uma largura de quarenta e cinco centímetros correspondente à área do estendal que mantém encastrado no muro da varanda do rés-do-chão do seu edifício;
- Condenou o Réu R…:
- a remover as construções, designadamente o muro que efectuou na parte em que estas estejam construídas na área de terreno referido no prazo de quinze dias a contar do trânsito em julgado da decisão;
- no pagamento da sanção pecuniária compulsória de vinte euros diários por cada dia que decorrer após a decurso do prazo de quinze dias referido sem remover as referidas construções;
- Declarou o Réu proprietário do prédio sito na Rua…, da freguesia de Santiago do Cacém, descrito sob o nº… e da anexação de um pedaço de terreno descrito sob o nº… que deu origem ao prédio descrito sob o nº…, da freguesia de Santiago do Cacém, com área coberta de 117,6 metros quadrados e uma área não determinada com as restrições resultantes da aquisição do terreno pelos autores atrás referida.
Os AA, pediram a rectificação da sentença na parte em que consigna não ser possível determinar exactamente o cumprimento da varanda, por entenderem ser o mesmo determinável, no que foram desatendidos.
Entretanto, interpôs o Réu o recurso de apelação a que se seguiu a interposição por parte dos AA. de recurso subordinado, formulando nas respectivas alegações as seguintes conclusões:
Apelação do Réu:
1. A desmaterialização dos processos não implica a ausência de assinatura - por uma questão de segurança todas as decisões judiciais têm de ser assinadas, digital ou manualmente.
2. A sentença é nula, nos termos do disposto no artº 668º, 1, a) CPC, por não conter a assinatura do Mmo. Juiz recorrido.
3. O Apelante impugna ao abrigo do disposto no artº 690º-A CPC a decisão do tribunal recorrido sobre os factos constantes dos quesitos 7º a 10º da base instrutória, que deveriam ter sido considerados não provados.
4. Isso mesmo resulta dos depoimentos das testemunhas N…, C…, T…, C… e, embora não directamente indicada, do depoimento da testemunha J… e resulta ainda da inspecção judicial de fls. 273 e do documento nº 3 junto à contestação.
5. Os depoimentos das testemunhas em causa foram prestados na sessão de julgamento que decorreu no dia 28/09/2009 (localiza os depoimentos na gravação)
6. Ainda que não seja alterada a resposta aos quesitos 7º e 8º, entende-se que nunca deveria ter ficado provado que a actuação descrita dos AA. sobre o espaço aéreo de parte da faixa de terreno reivindicada decorreu desde 1989, sem qualquer interrupção e “… na convicção e convencimento de que a mesma era parte integrante do prédio que tinham adquirido em 4 de Setembro de 1987”.
7. Tal entendimento resulta do depoimento das testemunhas J… e N…, prestados no dia e hora indicados em 5 e de onde resulta claro que a testemunha N… nem sabe que faixa de terreno está em causa e refere uma outra, com a largura de 2/3 metros, onde viu um estendal e por onde passou com andaimes.
8. Resulta também do depoimento de M…, testemunha que refere que o fogareiro apenas foi construído há quatro anos (localiza o depoimento na gravação).
9. Quanto à convicção e convencimento de que a mesma área cujo espaço aéreo ocupam era parte integrante do prédio que tinham adquirido em 4 de Setembro de 1987, impugna-se que tivessem ou tenham os AA. tal convicção e a mesma não podia ter sido provada por prova testemunhal, quando ninguém pode ser testemunha em causa própria e é certo que as percepções das testemunhas J…, N…, C…, T…, C…, a propósito do convencimento ou convicção dos AA. têm uma só fonte, que é o A. marido, conforme resulta dos depoimentos prestados no dia e hora já indicados.
10. É como se a parte fosse testemunha, o que é inadmissível.
11. Acresce que estão provados factos que militam contra a alegada convicção, a saber, está provado (quesitos 3 e 16º) que a casa tem uma área coberta de 132 m2, precisamente a mesma área que tinha o projecto apresentado pelos AA (facto assente E) e bem assim está provado que nos limites do seu prédio confinantes com a via pública os AA usaram a solução de beirado, ao passo que a cobertura de tal prédio a sul e poente tem platibandas, com águas pluviais e outras drenadas por caleira no interior do prédio /respostas aos quesitos 24º e 25º) sendo que o custo de uma platibanda e de uma caleira impermeabilizada com tubos e queda de águas pluviais interiores é superior ao custo de um beirado (resposta ao quesito 26º).
12. Pelo exposto deveria a resposta aos quesitos 7º a 10º ser diversa da que foi dada, devendo tais quesitos ser considerados não provados.
13. Os quesitos 18º e 20º foram considerados não provados, quando deveriam ter sido considerados provados, face ao depoimento da testemunha M… prestada na sessão de julgamento que decorreu em 28/09 e que se encontra gravado entre as 16:17:55 e as 16: 42: 55 horas, e também ao depoimento da testemunha filha do dono do prédio que agora pertence ao R., R…, depoimento prestado na sessão de 28/09/2009 e gravado entre as 15:51:20 e as 16:17:21 horas.
14. Uma vez que sejam considerados provados os quesitos 18º e 20º, deverá proceder-se a alterações nas respostas dadas aos quesitos 21º, 22º, 23º, 24º, 27º e 30º pois que referidas às extremas, a limites confinantes, estilício e “invadir” deixam de estar prejudicadas.
15. Em relação à resposta ao quesito 33º julga o apelante que ela deveria ser alterada, qualquer que seja a decisão relativamente aos quesitos 18º e 20º, pois enquanto na contestação se alegou tendo em atenção a altura do muro da varanda – e foi essa a expressão levada à base instrutória, a resposta respectiva optou por considerar apenas a altura do pavimento da cave até ao terreno a poente, sendo certo que a essa altura de 1,23 m, há que adicionar 0,80 m relativa à altura do muro da varanda (ver resposta ao quesito 4º)..
16. A resposta ao quesito 33º deveria pois ser que a aluíra do muro da varanda é pelo menos de 2, 03 até ao terreno a poente (ou como consta da BI até ao nível do quintal do ora R.).
17. O quesito 34º deveria ter sido considerado provado, pelo menos a sua segunda parte, face ao entendimento que se tem acerca dos quesitos 18º e 20º.
18. Ainda que não se perfilhe esse entendimento, deveria a resposta ao quesito 34º, à semelhança do que foi feito em relação aos quesitos 1º e 2º e 7º e 8º. E até 33º ser adequada à solução jurídica possível – deveria então ter-se respondido que os AA. não dispõem de qualquer acesso ao terreno a poente da varanda da cave do edifício, com base nos depoimentos das testemunhas C…, T…, C… e M….
19. A resposta ao quesito 41º deve ser alterada pelos mesmo motivos que devem levar à alteração das respostas aos quesitos 18º e 20º.
20. A acção e a reconvenção propostas são acções declarativas de condenação, pois que visam exigir a prestação de uma coisa ou de um facto, pressupondo a violação de um direito (artº 4º,2,b) CPC), razão pela qual, para que qualquer dos pedidos possa proceder, tem de ser provado o já existente direito de propriedade de cada parte reivindicante sobre a coisa reivindicada.
21. A causa de pedir, quer no caso da acção quer da reconvenção, é o facto de a faixa de terreno reivindicada pertencer, respectivamente, aos AA. ou ao R. por integrar o prédio de uns e de outro, razão que leva a que o primeiro pedido dos AA é que seja o R. condenado a “reconhecer os AA como legítimos possuidores e proprietários plenos da faixa de terreno (…) com a área de 5,44 m2 e a abrir mão da mesma faixa de terreno, entregando-a livre e devoluta aos AA.”.
22. A prova da integração da faixa reivindicada num ou noutro prédio não foi feita através da presunção registral porque as certidões de registo têm força probatória plena quanto às presunções registrais júris tantum estabelecidas no artº 7º do C. R. Predial (a de que o direito existe tal como o registo o revela; e a de que o direito pertende a quem está inscrito como seu titular) mas essa prova legal plena – ilidível mediante prova do contrário (artº 350º, nº 2 do C.Civil) – não abrange os elementos circunstanciais descritivos como as áreas, limites e confrontações.
23. Fora do âmbito da força probatória material legal plena dos documentos referidos, vigora o princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal (artº 655º, 1 CPC), que não pode nunca justificar que os factos sejam julgados sem prova ou contra as provas e para assegurar que assim é, a lei comete ao tribunal de recurso de 1º grau poderes em matéria fáctica.
24. O tribunal recorrido entendeu (mal em nossa opinião, como acima se defendeu) que não foi feita a prova em causa, nem por uma das partes nem pela outra, de integração daquela parcela de terreno num ou noutro prédio, e concluiu pela improcedência da primeira causa de pedir invocada pelos autores (integração da parcela de terreno no seu prédio, e por isso passou à análise da questão que considerou ser a segunda causa de pedir invocada pelos AA., a usucapião.
25. A sentença entende que pelo facto de os apelados alegarem a usucapião estão desde logo a invocar a aquisição do direito de propriedade, quando é certo que esta não depende apenas da alegação do facto, tem de ser pedida, tem de haver uma manifestação de vontade.
26. A usucapião representa uma mudança na ordem jurídica existente e o exercício de um direito potestativo, pelo que a acção correspondente é uma acção constitutiva (artº 4º, nº 2, CPC) que tem de ter o correspondente pedido.
27. Os AA. não pediram ao tribunal que os declarasse proprietários de faixa de terreno em causa em virtude da usucapião (e poderiam tê-lo feito subsidiariamente a para o caso de falecer a prova da integração daquela faixa de terreno no prédio de que são proprietários inscritos no registo) apenas pediram que os reconhecesse como titulares de um pré-existente direito de propriedade.
28. Os AA. não só não efectuaram tal pedido como defendem, em requerimento entrado em juízo em 13/09/2007, que a acção não está sujeita a registo porque “Já constam no Conservatória do Registo Predial como exclusivos titulares da referida área de 5,44 m2.
29. Ou seja, são os próprios AA. que esclarecem e reiteram que a acção por eles proposta assenta exclusivamente num direito de propriedade já existente em que foram investidos por título translativo datado de 4 de Setembro de 1987 (aquisição derivada).
30- A usucapião não é automática, não basta alguém exercer a posse sobre um a coisa determinada; é ainda necessária uma manifestação de vontade do possuidor em benefício de quem estão reunidos os requisitos legais, o que resulta claramente dos arts. 1257º, 1288º e 303º, aplicável ex vi do artº 1292, do CC.
31. Os apelantes limitaram - se a dizer que neles se reuniam os requisitos da usucapião (arts. 14º e 16º da p.i.) mas, como não pediram ao tribunal a declaração da mesma, omitiram aquela manifestação de vontade.
32. Quando na sua parte decisória a sentença declara que os autores adquiriram a propriedade por usucapião de uma faixa de terreno existente a poente do seu edifício com uma largura de quarenta e cinco centímetros correspondente à área do estendal que mantêm encastrado no muro da varanda do rés - do – chão do seu edifício, está a conhecer de questão que não lhe foi colocada e portanto não podia apreciar (artº 668, 1,d) e condenou em objecto diverso do pedido pelo que é nula (artº 661, 1 e 668, 1,e) CPC)
33. Nos termos do artº 1287º CC, a posse, mantida durante um certo lapso de tempo, do direito de propriedade ou de outro direito real de gozo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação.
34. Face aos factos dados como provados, os apelados não tiverem qualquer actuação nem praticaram actos materiais correspondentes ao exercício do direito de propriedade sobra a referida faixa de terreno.
35. Perante a resposta dada aos quesitos 7º a 10º vê-se que a actuação dos AA. não foi sobre a faixa de terreno e sim sobre parte do seu espaço aéreo.
36. O direito de propriedade que tem como objecto coisas imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo, com tudo o que se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei ou negócio jurídico (artº 1344º) mas já não se vê como uma ocupação parcial do espaço aéreo pode levar à aquisição do imóvel.
37. Não houve nem há actos materiais de posse sobre o terreno em si.
38. A posição seguida na sentença levaria, por exemplo, e com maior razão de ser, a que actos de passagem sobre um determinado terreno (que como se sabe podem redundar na constituição de uma servidão de passagem) levassem à aquisição do imóvel ou da parte dele que dava essa serventia.
39. Ao decidir como decidiu, a sentença interpretou erradamente e violou os arts. 1252º, 1287º, 1305º do CC e incorreu numa nulidade pois que a fundamentação de facto é contraditória com a decisão (artº 668º, 1, c), CPC.
40º. Acresce que a sentença enferma de uma outra contradição entre a fundamentação e a decisão (artº 668º, 1, c) CPC), pois que se considerar que a faixa de terreno em causa pode ser objecto de usucapião, está com isso a dizer, e sendo certo que ela não é res nullius, que a mesma pertence ao prédio do R., pois que se fosse dos AA. a usucapião não faria sentido nem seria possível – e isto quando entendeu não ter sido feita prova da integração da faixa num prédio ou noutro.
41. Não tendo os AA feito prova da integração no terreno por eles adquirido da faixa de terreno reivindicada, nem adquirido o direito de propriedade sobre a referida faixa por usucapião, não podem exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da mesma o reconhecimento do seu direito de propriedade nem a consequente restituição do bem possuído, pois que tais direitos estão reservados ao proprietário – artº 1311º CC.
42. A improcedência dos dois primeiros pedidos dos AA. faz cair pela base a condenação no pagamento de uma quantia a título de sanção pecuniária compulsória, visto que não se verificam os respectivos requisitos legais.
43. No tocante ao pedido reconvencional, errou a sentença, pois que o apelante não solicitou ao tribunal nenhuma alteração na ordem jurídica existente, fundando a qualidade de proprietário sobre o prédio em causa no facto de o ter comprado (em parte) e de ter adquirido o respectivo direito de propriedade por usucapião conforme escritura de justificação que serviu de base ao registo (noutra parte).
44. E o que o apelante pediu ao tribunal foi que condenasse os AA. reconvindos a reconhecerem esse pré-existente direito do apelante.
45. Se a sentença entendeu – mal, como vimos – que os AA. tinham adquirido uma parte do prédio do R., apenas tem de indeferir o pedido por este formulado, por considerar procedente uma excepção.
46. Consequentemente, a sentença condenou em objecto diverso do pedido, o que a torna nula (artº 667º, 1, e) CPC.
47. Os AA. vieram a juízo deduzir pretensão cuja falta de fundamento não podem ignorar, alteraram a verdade dos factos quando alegaram, no artº 14º da p. i. que era na faixa de terreno que reivindicaram que tinham o estendal, os vasos de flores e a estrutura em alvenaria do fogareiro, quando se apurou que o estendal estava na varanda do edifício que construíram, os vasos de flores eram apoiados no parapeito da mesma varanda e o fogareiro também pendia parcialmente sobre a área reivindicada mas não estava nela instalado, está instalado na varanda da cave.
48. Além do mais, os AA. fazem do processo um uso manifestamente reprovável, com o fim de obterem um objecto ilegal, pois os AA. bem sabem que não se podem apropriar licitamente de terreno que apenas ao Apelante pertence.
49. Por tudo deveria ter sido considerado procedente o pedido de condenação por litigância de má fé.
Termina no sentido de ser dado provimento ao recurso com as legais consequências.
Recurso subordinado dos Autores:
1. Foi considerado assente e provado, além do mais:
a) Que o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha nº… – do qual os AA. são proprietários plenos – tem uma área coberta de cerca de 133 m2 (132,80 m2) e pelo menos uma área descoberta que se traduz numa floreira na varanda da cave com a área de 1,83 metros quadrados;
a) Que existe uma área global de 5,44 m2, sobre a qual, desde 1989 e até, pelo menos, 26/06/2006, os autores exerceram a posse contínua, pacificamente e de boa fé, sem oposição, na convicção e convencimento de que a mesma era partes integrante do prédio que tinham adquirido em 4 de Setembro de 1987, na qual mantêm um estendal que implantaram na varanda do rés do chão do seu prédio, colocam vasos de flores sobre o muro da varanda e têm um fogareiro que parcialmente ocupa aquela área, pendendo sobre a mesma, pelo que os AA. adquiriram aquela área de 5,44 m2 por usucapião em 1994.
c) Como, dessa área descoberta de 5,44 m, a área de 1,83 m2 tem sido utilizada como floreira, restam: 5,44 m2-1,83 m2 = 3,61 m2.
d) sendo a área resultante da multiplicação do comprimento pela largura e sendo a lrfura de 0,45 m, temos que o comprimento em causa é de 3,61 m2/0,45 m = 8,02m.
e) Logo, a área reivindicada pelos AA. – 5,44 m2 – foi efectivamente adquirida por estes, por usucapião, em 1994. E como, dessa área, 1, 83 m2 correspondem à floreira dos AA., a restante área tem de ser de 3,61 m2 (5,44 m2- 1,83 m2) e, conhecendo-se que a largura é de 0, 45 m, o respectivo comprimento é de 3, 61 m2/0, 45m = 8,02.
f) Aquela área foi objecto de invasão e ocupação abusivas por obras efectuadas pelo R. que construiu um muro encostado a parte do muro construído pelos autores com uma altura variável entre 1 e 2,54m acima do muro da varanda da cave do prédio dos autores e ainda umas escadas, obras que foram efectuadas pelo réu na faixa de terreno referida com 5, 44 m2.
2. Resulta do supra exposto que a aliás douta sentença recorrida deveria ter quantificado quer a área adquirida por usucapião pelos AA. – 5,44 m2 – quer a área invadida e ocupada abusivamente pelo R. – 3, 61 m2 – correspondente a uma largura de 0,45m e a um comprimento de 8,02m.
3. Quanto à área usucapida de 5,44m2, a mesma resulta dos factos provados e assentes, pelo que a respectiva omissão no segmento condenatório do R. traduz, salvo o devido respeito, violação do disposto no artº 659, 3, CPC.
4. Quanto à área invadida e ocupada abusivamente pelo R. – 3, 61 m2 – uma vez que a sua quantificação depende de simples cálculos aritméticos, poderia e deveria a douta sentença ter sido rectificada nos termos do artº 667º, CPC. Não o tendo sido, a douta sentença, nesse ponto, violou o disposto no artº 659º, 3, cPC.
Terminam pedindo a revogação da sentença no segmento em que a mesma omite a quantificação das áreas usucapida (5,44 m2) e ocupada abusivamente pelo R (3,61 m2), com as demais legais consequências, designadamente a condenação do R. a reconhecer a aquisição pelos AA., por usucapião, da área de 5,44 m2 e a remover as construções, designadamente o muro, que efectuou na área de 3, 61 m2 (8,02 x 0,45m) do terreno dos AA.
AA. e R. contra-alegaram relativamente aos recursos da parte contraria no sentido da respectiva improcedência.
Remetidos os autos a esta Relação, ordenou o Ex.mo primitivo Relator a sua devolução à 1º instância para ali se conhecer da nulidade da sentença consistente na falta de assinatura do juiz, na sequência do que foi proferido o despacho de fls. 459, julgando improcedente a arguição.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
Na sentença considerou-se provada a seguinte factualidade:
A. Está inscrita a favor dos autores a aquisição do direito de propriedade sobre o prédio urbano sito no R…, com o número de polícia…, na cidade de Santiago do Cacém, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo… [anteriormente inscrito sob o artigo…] e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha nº….
B. O prédio urbano supra identificado foi adquirido pelos autores por compra em 4 de Setembro de 1987, encontrando-se registado a seu favor desde 23 de Setembro de 1987.
C. Em 1987, após a compra supra referida, os autores requereram à Câmara Municipal de Santiago do Cacém a demolição do prédio acabado de adquirir e o licenciamento da sua reconstrução, dando origem ao processo de obra nº ….
D. Da certidão emitida pela Câmara Municipal de Santiago do Cacém em 12 de Julho de 2006 consta o seguinte:
“Segundo – Do mesmo processo consta informação dos Serviços técnicos a saber:
1 - Trata-se de processo de pedido de certidão comprovativa da cedência ao domínio público de determinada área do prédio original do requerente.
2 - O prédio situa-se no Centro Histórico de Santiago do Cacém e foi intervencionado com a actual construção em 1987, a qual deu origem à demolição integral das ruínas então existentes.
3 – O prédio original, à data da aquisição pelo actual requerente, tinha a área coberta de 72,80 m2 e a área descoberta de 76,44 m2 totalizando a área de 149,24 m2.
4 – Por proposta do então requerente e concordância por parte da Câmara, este cedeu parte do seu terreno ao domínio público, para garantir um mais correcto alinhamento da construção na zona do gaveto.
5 – Dos elementos constantes do processo de licenciamento da obra (processo…) nomeadamente a peça desenhada correspondente à implantação pode constatar-se (em conjunto com o mapa de áreas) que a construção é de 133,00 m2, e ainda a área de cedência em frente ao prédio é de 10,80 m2.
6 – Face ao exposto, considera-se não ser possível certificar de acordo com o requerido, embora se confirme ter havido cedência de 10,80 m2. O prédio antigo, construído por superfície coberta e superfície descoberta totaliza 149,24 m2 e não 142,24 m2, conforme consta do requerimento. Da medição em desenho e do mapa de áreas que consta do processo de licenciamento de obra obtemos 133,00 m2 de área de construção /implantação, e não 110, m2 conforme consta no requerimento. O Arqutecto. (r) J….
Terceiro – Consta do processo parecer do do Chefe de Divisão, a saber: “Proponho que se certifique conforme parecer Técnico “. A Chefe de Divisão de Gestão Urbanística. (r) M…Drª”.
E. Tal certidão foi emitida em conformidade com o projecto apresentado pelos autores, nomeadamente a memória descritiva e justificativa e mapa de áreas onde consta o seguinte:
Descrição da fracção:
Cave com área bruta de 133, a área habitável de 45,94, a área útil de 62,6, a área de varandas e sacadas de 23,2 e a área de garagem privativa de 25,81; e
Rés-do-chão com a tipologia T3, com área bruta de 133, a área habitável de 93,36 e a área de varandas e sacadas de 16,80.
F. Do projecto apresentado pelos autores consta ainda que a cava é constituída por uma sala, uma wc, uma despensa, um escritório, uma varanda e uma garagem, com área bruta de 133 metros quadrados e o R/C é constituído por uma sala, 3 quartos, 1 wc, 1 cozinha, 1 sala de refeições e uma varanda, com área bruta de 133 metros quadrados, não constando qualquer logradouro.
G. Da caderneta de fiscalização da obra dos autores, referente ao acompanhamento da obra, consta que no dia 28 de Abril de 1988, “A obra encontra-se em fase de preparação da cobertura. Esta não apresenta alterações ao projecto aprovado. Verificou-se apenas uma alteração na localização das instalações sanitárias da cave”.
H. Das peças escritas e desenhadas do projecto, incluindo mapa de áreas entregue pelos autores na Câmara Municipal, não consta qualquer área além das indicadas no projecto, nem consta qualquer logradouro ou quintal nem consta qualquer faixa de terreno localizada entre a extrema do prédio dos autores e a extrema do prédio do Réu.
I. Segundo o teor da certidão de registo predial referente ao prédio…, sito na Rua…, freguesia de Santiago do Cacém, cuja propriedade se mostra registada a favor dos autores pela apresentação 03/190386, foi efectuado o averbamento nº 1, onde consta que o prédio é constituído por cave e r/c, tendo na cave um compartimento e no r/c 4 compartimentos e cozinha, S.C. 72,80 m2 – Quintal: 76,44 m2 e pela apresentação 10/20060727, foi efectuado o averbamento 02, constando que o referido prédio é composto de um edifício de cave, r/c, garagem e quintal – S. C. 132 m2 – S.D.5,44 m2.V.P. 21.o47,97 €. Artigo 3506: tendo a área de 10,80 m2 ocupada pela via pública.
J. O prédio urbano supra identificado confronta a Poente com o prédio urbano sito na cidade de Santiago do Cacém, na Rua…, com os números de polícia…, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Santiago do Cacém sob o artigo…, e actualmente descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha nº…, cuja propriedade se mostra registada a favor do Réu desde 17 de Maio de 2005.
K. O réu adquiriu o prédio em causa em 16 de Maio de 2005, por nesta data o ter comprado aos anteriores proprietários R… e marido R….
L. Por carta registada datada de 26 de Junho de 2006, enviada ao autor, J…, o réu, fez constar: “Na qualidade de proprietário do prédio sito na Rua…, nºs… em Santiago do Cacém, que confina com o local onde reside, venho por este meio solicitar e V. Exa. retire de imediato o fogareiro de alvenaria e os casos que pendem sobre o meu logradouro, bem como o estendal, objectos que ultrapassam o plano vertical da divisão que delimita as nossas propriedades e ainda que tape as goteiras da varanda.
Como é do V/ inteiro conhecimento procedi às obras necessárias com vista à construção de uma garagem ao nível da Rua, com um alpendre a tardoz e cave, conforme projecto aprovado na Câmara, licença….
Acontece que os referidos objectos impedem o normal andamento das obras, com incómodos e prejuízos dai resultantes.
Como apesar da minha insistência, V. Exa não retirou os objectos referidos ou tapou as goteiras vejo-me na necessidade de formalizar, por esta via, o pedido de remoção e tapagem que deverão ser postos em prática dentro de um prazo máximo de oito dias, a contar do registo da presente. Findo Tal prazo, informo V. Exa que actuarei de acordo com os direitos que me assistem, estando inclusivamente disposto a socorrer-me da via judicial para a resolução do problema”.
M. Do registo predial consta que, à data da aquisição pelos autores, o prédio escrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha nº… tinha uma área global de 149,24 metros quadrados, sendo 72,80 metros quadrados de superfície coberta e 76,44 metros quadrados de superfície descoberta [quintal].
N. No âmbito do processo de reconstrução do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha…, os autores cederam ao Município de Santiago do Cacém uma área que ficou a constar do registo predial como tendo 10,80 metros quadrados que passou a integrar a via pública.
O. O prédio descrito na conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha nº…, após a sua reconstrução, ficou com a área bruta construída de cerca de 133 metros quadrados [133,80 metros quadrados].
P. Ao edificarem o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha… os autores construíram um muro, com 80 centímetros de altura e 7,83 metros de comprimento [muro de varanda].
Q. Desde a data da conclusão do seu prédio em 1989, os autores utilizam o espaço aéreo da referida faixa de terreno com 5,44 metros quadrados na área onde mantêm um estendal que implantaram na varanda do rés-do-chão do seu prédio, colocam vasos de flores sobre o muro da varanda e têm um fogareiro que parcialmente ocupa aquela área, pendendo sobre a mesma, sem qualquer interrupção, à vista de toda a gente, incluindo os vizinhos, sem usarem violência e, pelo menos até 26 de Junho de 2006, sem oposição, na convicção e convencimento e que a mesma era parte integrante do prédio que tinham adquirido em 4 de Setembro de 1987.
R. Em Agosto de 2006 quando regressaram de férias, os autores depararam-se com obras levadas a cabo pelo réu na sua ausência.
S. O Réu construiu um muro encostado a parte do muro construído pelos autores com uma altura variável entre 1 e 2,54 metros acima do muro da varanda da cave do prédio dos autores e ainda umas escadas.
T. As referidas obras foram efectuadas pelo réu na faixa de terreno referida com 5,44 metros quadrados e que os autores reivindicam.
U. O prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob a ficha nº… tem uma área coberta de cerca de 133 metros quadrados (133,80 metros quadrados) e pelo menos uma ara descoberta que se traduz numa floreira na varanda da cave com a área de 1,83 metros quadrados.
V. O prédio nº 7 e 9 pertença do réu tem uma área coberta de 117,60 metros quadrados e um quintal com pelo menos 168,83 metros quadrados [medição efectuada na pressuposição de que os muros são meeiros], num total de 283,43 metros quadrados,
W. O prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacem sob a ficha nº… confronta a norte e a nascente com a via pública e a sul com o prédio sito na Rua… com os números….
X. Os autores construíram uma varanda na cave com a área de 12,40.
Y. Os autores construíram uma varanda no rés-do-chão da sua residência com a área de cerca de 7,50 metros quadrados.
Z. Os autores construíram o seu prédio implantando a cave de nível com a Rua …, por onde se acede à garagem dos autores, nível esse que a tardoz tem um desnível entre o pavimento da cave e o terreno a poente de cerca de 1,23 metros.
AA. A cobertura do prédio dos autores tema sul e poente platibandas com as águas pluviais e outras drenadas por caldeira no interior do prédio dos autores.
BB. Nos limites confinantes com a via pública os autores usaram a solução do beirado que goteja directamente sobre a via pública.
CC. O Custo de uma platibanda e de uma caleira impermeabilizada com tubos de queda de águas pluviais interiores é superior a um beirado.
DD. Ao edificarem o prédio os autores deixaram as janelas ao nível da cave recuadas entre 0,85 e 2,00 metros e a nível do rés-do-chão e recuo varia entre 1,15 e 1,58 metros.
EE. Ao autores, ao edificarem o seu edifício, no lado poente mais a norte [extrema com o ora réu], para endireitarem a construção, de modo a alinharem a estrutura [pilares e vigas], dentro da sua propriedade, deixaram um espaço livre na cave intramuros, onde construíram uma floreira, sendo esta, unicamente, a área descoberta de 1,83 metros quadrados.
FF. Posteriormente, os autores construíram uma janela de correr e uma porta, ambas em alumínio, na varanda do r/c, bem como instalaram um estendal, uma parabólica, um fogareiro e vasos de flores na cave.
GG. Os autores construíram uma escada metálica sem qualquer licença camarária.
HH. A tardoz a altura entre o pavimento da varanda da cave do edifício dos autores e o solo a poente é de 1,23 metros de altura.
II. O réu, na altura da aquisição do seu prédio, confrontou os anteriores proprietários com as obras efectuadas pelos autores, designadamente a abertura de frestas ao nível do r/c e da cave; a abertura de uma janela de correr de alumínio ao nível do r/c; a instalação de uma parabólica no cunhal do prédio a noroeste, alimentada por um cabo exterior na empena norte; a instalação de um fogareiro e de um estendal ocupando parte do logradouro; a colocação de uma escada na varanda do r/c, tapando parcialmente uma janela existente na empena do prédio do Réu, voltada para a varanda do prédio dos autores.
JJ. A antiga proprietária referiu que achava que estavam sobre o seu terreno.
KK. Pelo menos uma vez, o autor tentou adquirir à anterior proprietária do prédio do Réu parte do terreno ou o prédio todo.
LL. O réu requereu e obteve o alvará de licenciamento de construção nº… de 19 de Junho de 2006 referente a construção de uma garagem no nível da rua [piso 0], com um alpendre a tardoz e cave para arrumos, aproveitando-se o nível do terreno, sendo: Área de implantação de 39 m2; úmero de pisos acima da cota de soleira: 1; números de pisos abaixo da cota de soleira: 0; cércea: 4,50 m2; Área bruta da garagem : 25 m2; Área bruta do Alpendre da Garagem: 14 m2; Área bruta do Alpendre do Quintal: 39 m2; Área útil da Garagem: 18,30 m2; Área útil do Alpendre da Garagem: 10,90 m2; Área útil do Alpendre do Quintal: 29.20 m2.
MM. No âmbito do licenciamento nº…, o réu construiu um muro e uma escadaria vencendo o desnível existente entre a garagem e o solo que é de 3,13 metros.
NN. O prédio do réu é composto por um edifício de r/c, 1º andar e quintal.
OO. O prédio dos autores não foi construído em harmonia com a planta e projecto de construção entregues na Câmara Municipal.
PP. A parede sul do prédio dos autores mede 10,31 metros quando no projecto estava prevista uma parede com 11 metros.
Vejamos então, começando, obviamente, pelo recurso principal, ou seja o interposto pelos RR.
Perante a arguição da nulidade da sentença e o fundamento invocado, ou seja a falta de assinatura do juiz, ordenou o Ex.mo primitivo Relator a baixa dos autos à 1ª instância onde foi proferido o despacho de fls. 459 pronunciando-se no sentido de a mesma não ocorrer, face ao que o R. veio a fls. 469 alegar que a arguição foi feita de boa fé.
Tendo a questão ficado assim sanada, prejudicadas se mostram as conclusões 1ª e 2ª da alegação.
Como se vê das demais conclusões, o apelante impugna, em primeiro lugar, a decisão sobre a matéria de facto, quanto às respostas aos quesitos 7º a 10º, 18º, 20º, (e em consequência destes dois últimos, das respostas aos quesitos 21º, 22º, 23º, 27º, 30º e 41º), 33, 34º com base no depoimento das testemunhas que identifica.
Sendo de frisar que são, no caso, aplicáveis as normas atinentes aos recursos anteriores à reforma operada pelo Dec. Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, é sabido que a modificabilidade pela Relação da decisão da matéria de facto pressupõe, para além do cumprimento dos ónus impostos pelo artº 690º-A, nº 1, ou seja, a indicação dos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, que sejam indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (Cfr. artº 712º, nº 1, als. a) e b).
Na verdade atento o princípio da liberdade julgamento a que alude o artº 655º do mesmo diploma e no contexto do qual o juiz aprecia livremente as provas, analisa-as criticamente e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, especificando os fundamentos que foram decisivos para formar tal convicção, excepto quando a lei exija formalidades especiais para a prova dos factos controvertidos, caso em que tal prova não pode ser dispensada, não pode pretender-se a alteração da decisão da matéria de facto com base em que os meios de prova invocados permitiam decisão diversa. Com efeito, o que o recorrente tem de demonstrar é que os meios de prova de que se socorre, impunham decisão diversa da proferida.
Como se escreveu no acórdão do Supremo tribunal de Justiça de 21/05/2008, “o que é proposto ao tribunal de segunda instância não é que proceda a um novo julgamento – desprezando o juízo formulado na 1ª instância sobre as provas produzidas e a expressão do processo lógico que conduziu à pronúncia sobre a demonstração (ou não ) dos factos ajuizados – mas tão só que no uso dos poderes próprios de tribunal de recurso, averigúe – examinando a decisão de 1ª instância e respectivos fundamentos, analisando as provas gravadas e procedendo ao confronto do resultado desta análise com aquela decisão e fundamentos, sem deixar d éter presentes as limitações inerentes à ausência de mediação e da oralidade no tribunal de recurso – se o veredicto alcançado pelo tribunal recorrido se apresenta com o mínimo de razoabilidade face às provas produzidas”.
É, assim, pela fundamentação invocada para a decisão que normalmente se afere a correcção do juízo crítico sobre as provas produzidas.
Descendo ao caso em apreço, e estando em causa uma faixa de terreno a poente do prédio dos AA., vejamos o teor da matéria neles perguntada as respostas que lhes foram dadas e se as mesmas devem ser alteradas.
Quesito 7º:
Os AA., desde a conclusão do seu prédio, em 1989, sempre utilizaram a supra referida faixa de terreno como logradouro do seu prédio?
Quesito 8º:
…nela implantaram um estendal, colocaram vasos de flores e fogareiros?
Quesito 9º:
…sem qualquer interrupção, à vista de toda a gente, incluindo os vizinhos, de modo pacífico e sem oposição de ninguém?
Quesito 10º:
…na convicção o convencimento de que a mesma era parte integrante do prédio que tinham adquirido, por compra, em 4/09/1987 e referido em A) da matéria assente?
Resposta conjunta:
“Provado apenas que desde a data da conclusão do seu prédio em 1989, os autores utilizam o espaço aéreo da referida faixa de terreno de 5,44 metros quadrados na área onde mantêm um estendal que implantaram na varanda e têm um fogareiro que parcialmente ocupa aquela área, pendendo sobre a mesma, sem qualquer interrupção, à vista de toda a gente, incluindo os vizinhos, sem usarem violência e, pelo menos até 26 de Junho de 2006, sem oposição, na convicção e convencimento de que a mesma era parte integrante do prédio que tinham adquirido em 4 de Setembro de 1987”.
Relativamente as estas respostas, depois de se analisarem todos os elementos de prova trazidos aos autos e de se concluir que os mesmos não permitem esclarecer a qual dos prédios pertence a faixa de terreno em disputa, consignou-se na fundamentação da decisão da matéria de facto que “As testemunhas J…, N…, C…, T… e M… foram unânimes na afirmação de que os autores estavam convictos de que aquela área de terreno pertence ao prédio deles e que mantiveram no espaço aéreo daquela terreno um estendal, um fogareiro ou grelhador e vasos de flores pendentes sobre o muro, o que é coerente com a carta que o réu enviou ao autor em 26 de Junho de 2006 onde refere expressamente que estes elementos pendem sobre o terreno que entende ser seu e cós as fotografias que o próprio réu juntou”.
Os R. entende que a resposta deveria ter sido pura e simplesmente negativa, na medida em que “de todos os depoimentos das acima mencionadas testemunhas resultou que aquela faixa de terreno sempre ficou livre. Ou seja, não havia lá qualquer estendal, nem fogareiro, nem vasos de flores.
Salvo o devido respeito, não lhe assiste razão;
Com efeito, do confronto do texto dos quesitos com o teor da resposta conjunta que lhes foi dada, facilmente se constata que o tribunal não acolheu a versão, através deles veiculada, de que o estendal, o fogareiro e os vasos de flores estavam implantados na faixa de terreno, na medida em que a resposta os situa no respectivo espaço aéreo, ou seja, pendendo sobre a mesma. Isso mesmo é depois reafirmado no despacho que decidiu as reclamações às respostas: “O que os Autores de facto ocupam é o espaço correspondente à área ocupada pelo estendal” de acordo, aliás, com o que o próprio apelante fez constar da carta que endereçou ao A. e que constitui o doc. 14 junto com a contestação (fls. 14)
Quesito 18º:
A faixa de terreno referida em 5º faz parte do prédio do R. e do quintal de 166,83 m2?
Resposta:
“Não provado”
Quesito 20º:
Os AA. edificaram o seu prédio à extrema do prédio do Réu?
Resposta.
“Não provado”
Entende o apelante que as respostas deveriam ser de “provado” com base no depoimento de Madalena Vidal, que há 26 anos mora como inquilina no prédio do R e que afirmou que antes de os AA. comprarem o seu prédio este e o prédio dos RR eram divididos por um muro e que os AA. construíram a sua casa ocupando toda a área de terreno delimitada por esse muro. Por outro lado, sempre semeou o quintal e ninguém lhe disse para não semear nenhum bocado, referindo, ainda que o A lhe disse que estava a ver se os donos lhe vendiam um bocado do quintal ao correr com as varandas dele. Por sua vez, a testemunha R…, filha do dono do prédio ora pertencente ao R. Rosa confirmou aquela pretensão de compra.
Ouvida a gravação dos depoimentos destas testemunhas, confirma-se que prestaram efectivamente as declarações do apelante lhes atribui, tendo-se até a primeira perguntado, para reforçar a afirmação de que os AA. ocuparam todo o seu terreno com a construção, para que deixariam os AA. a faixa em disputa se não tinha porta, não tinha nada, sendo que relativamente à segunda, embora filha do anterior proprietário do prédio ora dos RR., expressamente declarou nunca lá ter vivido, já que o pai tinha outra casa e aquele andou sempre de arrendamento.
Na fundamentação da decisão da matéria de facto, o Mmº Juiz, tendo presente o teor dos referidos depoimentos, observou que não eram “por si suficientes para decidir num sentido ou no outro, pois apesar do depoimento de M… ser mais ou menos preciso, a verdade é que estamos a falar de uma pequena área de terreno [70 centímetros de largura] e por isso achamos normal que no momento da construção esta testemunha, não sabendo que esta situação iria ser um foco de problemas, pudesse não se ter apercebido do eventual recuo da construção do autor”.
A isto se acrescentará, a propósito da afirmação da testemunha M… de que nunca lhe disseram para não semear nenhum bocado do quintal e que sempre ocupou tudo, que um arrendatário ocupa o que lhe arrendam, sem que tenha de saber ou deva saber se tudo pertence ao não ao senhorio.
De qualquer forma, e uma vez que é pressuposto da alteração da decisão da matéria de facto que os elementos constantes do processo imponham decisão diversa da recorrida, tal não acontece claramente com os depoimentos em causa, na medida em que como também se salienta e demonstra na fundamentação, “há argumentos e elementos probatórios em ambos os sentidos”.
Portanto, também as respostas a estes quesitos se devem manter.
E posto que assim é, também nenhuma alteração se impõe introduzir às respostas dadas aos quesitos 21º, 22º, 23º, 24º, 27º, 30, 34º e 41º na medida em que tal alteração só era impetrada no pressuposto do atendimento da pretensão do apelante quanto aos quesitos 18 e 20º
Quesito 33º:
A altura do muro da varanda da cave dos AA. é de 2,57 m até ao nível do quintal do ora réu)
Resposta:
“Provado apenas a tardoz de altura entre o pavimento da varanda da cave do edifício dos autores e o solo a poente é de 1,23 metros de altura.
Entende o apelante que a resposta deveria ser alterada no sentido de que a altura do mura da varanda é de pelo menos 2, 03 m até ao terreno a poente ou até ao nível do quintal do ora réu, por isso que àquela altura de 1,23, haveria que adicionar os 0,80m constantes da resposta ao quesito 4º.
Com efeito, na resposta a este último, em consonância, aliás com a resposta dos senhores peritos, deu-se como provado que, ao edificarem o prédio referido em A, os autores construíram um muro, com 80 centímetros de altura e 7,83 metros de comprimento [muro da varanda]. Por isso, dirigindo-se a pergunta constante do quesito à altura do muro da varanda, e não do seu pavimento, e tendo em conta que nos termos da resposta dos Srs. Peritos a esta matéria (v. fls 200) se considerou que a altura de 1,23 se referia à diferença de cotas entre o pavimento da varanda e o solo, a pretensão do apelante é aqui de atender, adicionando lhe os 80 cm da resposta ao quesito 4º, alterando-se consequente mente a resposta para:
“Provado que a altura do muro da varanda é de pelo menos 2,03 m a contar do solo a poente”.
Passando ao aspecto jurídico da causa, perante o non liquet sobre de qual dos prédios faria parte a faixa em disputa e que, perante o que se acaba de consignar quanto à decisão da matéria de facto, se mantém, em nada relevando para o efeito a alteração da resposta ao quesito 33º, e concluindo-se na sentença que a pretensão dos AA. também não beneficiava da presunção a que alude o artº 7º do C.R. Predial, por isso que “esta abrange apenas o facto inscrito, o seu objecto e os sujeitos da relação jurídica subjacente ao registo e já não os elementos da descrição do prédio, como a sua composição, as áreas e as confrontações, considerou-se, porém, com base nos factos constantes da resposta conjunta aos quesitos 7º a 10º, que aqueles adquiriram por usucapião a área correspondente ao estendal com uma largura de quarenta e cinco centímetros, por entender verificados os respectivos requisitos.
Contra tal se insurge o apelante, quer por razões formais, quer por razões de fundo.
No que respeita à primeiras, a sentença enfermaria das nulidades a que alude o artº 668º, nº 1, al. c) d), e), no primeiro caso por alegada contradição entre os fundamentos e a decisão na medida em que não tendo sido dado como provado que a faixa pertença ao prédio dos AA. ou ao prédio dos RR. (mas, diz o R., “tem de pertencer a um deles, pois não é “rés nullius”), a sentença está a assumir que essa zona integra o prédio dos RR, e, quanto às als. d) e e), porque se pronunciou sobre questão de que não podia tomar conhecimento, posto que não foi efectuado o pedido correspondente condenando assim, em objecto diverso do pedido.
Dir-se-á, relativamente ao primeiro caso, que, concordando-se em que a faixa de terreno em disputa não seja rés nullius, certo é que o tribunal só poderia considerá-la parte integrante de um ou de outro prédio mediante prova credível e concludente, o que não tendo acontecido, torna inultrapassável o falado non liquet.
Só que tal não impede que, demonstrado o exercício, sobre a mesma, por um dos litigantes, de actos de posse pelo tempo e com as características exigidas para a aquisição do direito de propriedade por usucapião, esta não possa ser reconhecida. Se, no caso, a factualidade disponível o permitia ou não, é questão de que mais adiante se tratará.
No que respeita ao invocado excesso de pronúncia, haverá que observar que, centrando-se o litígio dos autos apenas na propriedade da faixa de terreno, e que, para demonstrar pertencer-lhes, os AA. alegaram um modo de aquisição derivada (compra) e um modo de aquisição originária (usucapião-v. artigos 14 a 16º, consignando neste que “Ainda que outro título não houvesse, sempre aos AA. pertenceria em exclusivo o direito de propriedade plena sobre a supra identificada parcela em virtude da sua aquisição por usucapião”), o pedido concreto que depois veio a ser formulado, ou seja o de que “Deve o R. ser condenado a reconhecer os AA. como legítimos possuidores e proprietários plenos da faixa de terreno…” encerra uma pretensão baseada nas duas causas de pedir.
Caberá então indagar se os AA. exerceram sobre a parte da faixa de terreno de cuja aquisiçaõ por usucapião lhes foi reconhecida, posse boa para usucapião.
Nos termos do artº 1287º do C. Civil, a posse mantida durante um certo lapso de tempo do direito de propriedade ou de outro direito real de gozo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação.
Definindo o artº 1251º do C. Civil a posse como o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real, esclarece depois o artº 1263º que uma das formas de sua aquisição consiste, na prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito.
Os elementos da posse são, pois o corpus e o animus, o primeiro, afastada a concepção segundo a qual consistia no contacto corpóreo, no contacto físico com a coisa, concretizado, quer na retenção, quer na fruição, quer na mera possibilidade de fruição dos direitos que recaem sobre as coisas (Cfr. Prof. Manuel Rodrigues, “A Posse”, edição de 1998, pag. 101) e o segundo na intenção de exercer um poder sobre a coisa no próprio interesse, temos que, no presente caso, se considerou que os factos contidos na resposta aos quesitos 7º a 10º revelam a prática a ininterrupta de actos materiais sobre a faixa de terreno numa área que corresponde basicamente à do estendal.
A este entendimento contrapõe o R. que o que das referidas respostas resulta não uma actuação dos AA. sobre a faixa de terreno, mas sim sobre parte do seu espaço aéreo, sendo certo que, dispondo o artº 1344º do mesmo diploma que a propriedade de imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo , com tudo o que nele se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei ou negócio jurídico, não se vê que uma ocupação parcial do espaço aéreo possa levar à aquisição do imóvel.
A questão suscitada mostra-se, quanto a nós, pertinente.
Com efeito, figurando entre os requisitos essenciais da posse boa para usucapião a respectiva publicidade, isto atento o que dispõe o artº 1297º, publicidade essa consistente, nos termos do artº 1262º, em ser exercida de modo a poder ser conhecida pelos interessados, a conclusão pela verificação do elemento corpus há-de resultar, no ensinamento de Durval Ferreira, Posse e Usucapião, 3ª ed. Pag. 153, da prova dos “elementos materiais integrantes quer da coisa quer da relação estancial ou de espaço que à luz do consenso público (ou consciência social) permitam relevantemente a valoração, o entendimento de entre o sujeito e a coisa existir uma relação se senhorio de facto”.
A publicidade é, pois, como por sua vez esclarece Manuel Rodrigues, ob. cit., pag. 187, um elemento integrante do facto possessório, porque é por ela que ele adquire um valor social.
Ou seja, exige-se que os actos materiais, quando observados pelos interessados de que fala o artº 1262º, criem nestes a convicção inequívoca de que correspondem ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real de gozo por parte de quem os pratica.
Ora, não se afigura concebível que qualquer interessado que observe alguém que se limita a estender roupa, e a deter um fogareiro e vasos de flores no espaço aéreo de uma determinada faixa de terreno entenda tais actos como exercício do direito de propriedade sobre o solo desta, sendo certo que é precisamente a aquisição do solo que, por esta acção, pretendem os AA. ver reconhecida por usucapião.
Razão por que não pode ter-se como verificado o corpus da posse quando referido à faixa de terreno, o que conduz à improcedência da acção.
E porque assim é, prejudicado se mostra o conhecimento do recurso subordinado, por isso mesmo que não havendo reconhecimento da aquisição da faixa, não há que curar da respectiva área.
Por todo o exposto e sem necessidade de mais considerandos, na parcial procedência da apelação, revogam a decisão recorrida na parte em que reconheceu terem os AA. adquirido por usucapião a faixa de terreno nela identificada e condenou o réu a remover as construções que nela efectuou bem como no pagamento da sanção pecuniária compulsória ali fixada.
Custas na proporção de vencido.
Évora, 8.09.2011
João Gonçalves Marques
Eduardo Tenazinha
António M. Ribeiro Cardoso

http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/aa867ee3dc7e60438025790c003703fa?OpenDocument

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