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segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - GREVE SERVIÇOS MÍNIMOS FALTAS INJUSTIFICADAS JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO - 14/09/2011


Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
22/10.3TTPDL.L1-4
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: GREVE
SERVIÇOS MÍNIMOS
FALTAS INJUSTIFICADAS
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO

Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 14-09-2011
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Parcial: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: MANTIDA A DECISÃO


Sumário: I -O Secretário Regional da Economia do Governo Regional do Açores dispunha de competência para intervir no despacho conjunto de definição dos serviços mínimos da greve convocado pelo sindicato dos Autores- o STAD;
II – Sendo a entidade empregadora uma pessoa colectiva de natureza exclusivamente privada, não fazendo parte da administração directa ou indirecta do Estado, os serviços mínimos a prestar durante a greve não têm que ser declarados pelo tribunal arbitral;
III- Constitui justa causa de despedimento o comportamento do trabalhador, que, exercendo as funções de vigilante num aeroporto, cabendo-lhe, entre outras tarefas, a vigilância em postos de rastreio de passageiros e no “check point” do controlo de bagagem, e estando escalado para o cumprimento dos serviços mínimos durante a greve decretada pelo seu sindicato, decide, de forma consciente, permanecer no aeroporto em situação de não actividade, obrigando o seu empregador a reformular a escala para cumprimento de serviços impreteríveis.


(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

A, B e C, nesta acção 22/10, D, E e F, na acção 23/10, apensa, vieram demandar, no Tribunal do Trabalho de Ponta Delgada, a G - Consultadoria de Aviação Comercial S.A., pedindo que fosse declarada a nulidade da cessação dos seus contratos de trabalho, com a condenação da Ré a reintegrar os Autores nos seus postos de trabalho, sem prejuízo da opção pela indemnização pela cessação do contrato de trabalho, a exercerem no momento processual próprio, e ainda a pagar-lhes as quantias já vencidas de €1.259,20 a cada um deles, acrescida das retribuições que se vencerem até decisão final e de juros à taxa legal.
Alegaram, em síntese:
Eram trabalhadores da Ré e foram por esta despedidos com invocação de justa causa (não realização de serviços mínimos) quando estavam de greve.
Todavia, este despedimento é ilícito, dado que:
- o Secretário Regional da Economia do Governo Regional do Açores não tinha competência para intervir no despacho conjunto de definição dos serviços mínimos da greve convocado pelo sindicato dos Autores- o STAD;
- os serviços mínimos a prestar durante a greve tinham que ser declarados pelo tribunal arbitral;
- o despacho conjunto em causa é nulo também por não ter definido os meios necessários para assegurar os serviços mínimos, não se encontrando devidamente fundamentado;
- os Autores não tiveram conhecimento de que estavam escalados para o cumprimento dos serviços mínimos, nem a consciência da ilicitude do seu comportamento.
A Ré contestou, dizendo que não se verificam os vícios de ordem formal que foram apontados pelos Autores.
O comportamento dos mesmos foi de molde a tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral.
Efectuado o julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção improcedente e absolvendo a Ré do pedido.
x
Inconformados com tal decisão, vieram os Autores interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões:
(…)
A Ré contra-alegou, propugnando pela manutenção da decisão recorrida.
Foram colhidos os vistos legais.
x
Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões, temos, como questões em discussão, as de saber
- se o despacho conjunto que decretou a observância dos serviços mínimos, constante de fls. 221- 224, está ferido de nulidade, por não ter sido proferido pela entidade governamental competente;
-se nessa fixação dos serviços mínimos deveria ter intervindo o tribunal arbitral;
- se o referido despacho também é nulo por omissão de fundamentação;
- se se verificou justa causa para o despedimento dos Autores.
x
Na 1.ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade, não impugnada, e que este Tribunal de recurso aceita:
1- A A. A celebrou um contrato de trabalho a termo incerto em 6 de Julho de 2009, e veio as ingressar para os quadros da R. e exerceu funções até ao dia 23 de Outubro de 2009, auferindo um salário de 629,60.
2- A A. C celebrou um contrato de trabalho a termo incerto em 1 de Junho de 2005, e veio a ingressar para os quadros da R. e exerceu funções até ao dia 23 de Outubro de 2009, auferindo um salário de 629,60.
3- A A. C celebrou um contrato de trabalho a termo incerto em 10 de Junho de 2005, e veio a ingressar para os quadros da R. e exerceu funções até ao dia 23 de Outubro de 2009, auferindo um salário de 629,60.
4- O A. D celebrou um contrato de trabalho a termo incerto em 12 de Março de 2007, e veio a ingressar para os quadros da R. e exerceu funções até ao dia 22 de Outubro de 2009, auferindo um salário de 629,60.
5- A A. E celebrou um contrato de trabalho a termo incerto em 1 de Junho de 2005, e veio a ingressar para os quadros da R. e exerceu funções até ao dia 23 de Outubro de 2009, auferindo um salário de 760,99.
6- A A. F celebrou um contrato de trabalho a termo incerto em 3 de Junho de 2005, e veio a ingressar para os quadros da R. e exerceu funções até ao dia 23 de Outubro de 2009, auferindo um salário de 629,60.
7- No desempenho das suas funções as AA., por ordem sob a direcção e fiscalização da R., desempenhavam as tarefas correspondentes à categoria profissional de vigilante, com funções de vigilância no Aeroporto João Paulo II, na Ilha de S. Miguel, na Região Autónoma dos Açores.
8- Tarefas que se consubstanciavam na actividade profissional de vigilância, prevenção e segurança no âmbito da operação de verificação que um determinado voo pode realizar-se com segurança exigível pelas autoridades aeroportuárias.
9- As AA. estão filiada no STAD, Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria Vigilância, Limpeza, Domésticas, e Actividades Diversas, com sede na Rua de São Paulo, no12, 1200 – 428 Lisboa, com delegação local, sito na Rua do Peru, nº 101, 9500 – 340 Ponta Delgada.
10- A R. tem a sua sede no continente português.
11- Nos dias 25 e 24 de Agosto as AA. receberam as Notas de Culpa, com intenção de despedimento com justa causa.
12- Na Nota de Culpa a R. alega que as AA. nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009, não compareceram ao serviço, invocando que faltaram injustificadamente, alegando que as AA. não cumpriram os serviços mínimos definidos na sequência de uma greve decretada pelo Sindicato para aqueles dias.
13- Os AA. nos dias 4 e 7 de Setembro de 2009, contestaram a nota de culpa nos termos do documento que se junta alegando em suma a falta de fundamento da acusação.
14- Em 23 e 22 de Outubro de 2009 e na sequência do processo disciplinar, a Ré despediu com alegação de justa causa as AA., com efeitos imediatos à recepção da carta, da decisão final.
15- Na acusação que constava da nota de culpa e que foi mantida no Relatório Final do processo disciplinar, que serviu de base à decisão punitiva, a R. despediu as AA. com fundamento no facto de estas, tendo aderido à greve declarada pelo STAD nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009, para os vigilantes ao serviço da R. nos Aeroportos do Açores, não ter cumprido os serviços mínimos para os quais estavam escaladas naqueles dias de greve.
16- No dia 29 de Julho de 2009, o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas (adiante STAD), comunicou, por meio de fax, a convocação de uma greve de 48 horas para todos os locais de trabalho da Região Autónoma dos Açores.
17- Na sequência da recepção do pré-aviso de greve, e face à posição assumida pelo STAD quanto aos serviços mínimos no que concerne aos Aeroportos dos Açores, a Ré enviou para o referido sindicato a comunicação de fls. 113 e seguintes.
18- Face à convocação de greve e tendo em vista a negociação de um acordo quanto aos serviços mínimos e quanto aos meios necessários para os assegurar, a Direcção Regional do Trabalho, Qualificação Profissional e Defesa do Consumidor (Secretaria Regional do Trabalho e Solidariedade Social) convocou, por fax enviado no dia 31 de Julho de 2009, uma reunião.
19- Reunião essa que, após adiamento, teve lugar no dia 6 de Agosto de 2009.
20- Na referida reunião, não foi alcançado acordo quanto aos serviços mínimos e aos meios necessários para os assegurar durante o período de greve.
21- Em conformidade, a Secretaria Regional do Trabalho e Solidariedade Social, nomeadamente, a Direcção Regional do Trabalho, Qualificação Profissional e Defesa do Consumidor, notificou, no dia 7 de Agosto de 2009, a ANA –
Aeroportos de Portugal, S.A. do documento de fls. 219.
22- E, por sua vez, a ANA – Aeroportos de Portugal, S.A., no mesmo dia, deu conhecimento à Ré do teor do mesmo.
23- Nesse documento, a Secretaria Regional solicita a colaboração da ANA para a “(...) Disponibilização do número de trabalhadores que, por seu turno, se encontram afectos à prestação do serviço contratado à G, S.A., designadamente, no que concerne ao rastreio de passageiros, da bagagem de cabine, e da bagagem de porão, no período e nos estabelecimentos que podem ser afectados pela greve; (...)”.
23- E para a “(...) Informação sobre as condições técnicas e operacionais, consideradas como indispensáveis à execução daquelas tarefas em situação de greve, nomeadamente, no que concerne ao número de elementos por turno, e horário a assegurar nos postos de controlo dos aeroportos.(...)”.
25- No dia 11 de Agosto de 2009, a Secretaria Regional do Trabalho e Solidariedade Social e a Secretaria Regional da Economia proferiram o despacho conjunto referente aos serviços mínimos a prestar nos Aeroportos da Região Autónoma dos Açores.
26- Nesse despacho, é referido que “(...) Nos termos do n.º 7 do artigo 538º do Código do Trabalho, os trabalhadores que ficam adstritos à prestação de serviços mínimos são designados pelo Sindicato que declarou a greve até 24 horas antes do início do período de greve ou, se este o não fizer, deve a ICTS Portugal – Consultadoria de aviação Comercial, S.A. proceder a essa designação (...)”.
27- O STAD acusou a recepção do fax com o despacho conjunto da Secretaria Regional do Trabalho e da Solidariedade Social e da Secretaria Regional da Economia (onde é invocada a afixação dos serviços mínimos a prestar durante a mencionada greve), tendo dado conhecimento do teor da resposta à Ré.
28- Nesse documento, o STAD não reconhece competência à Secretaria Regional da Economia para intervir validamente na fixação dos serviços mínimos.
29- A Ré designou os trabalhadores adstritos à prestação dos serviços mínimos e elaborou as respectivas escalas de serviços, de tudo isto dando conhecimento à Secretaria Regional e ao STAD.
30- A Autora A estava escalada para prestar serviços mínimos nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009.
31- À data da prática dos factos e conforme previamente definido, a Autora A iria prestar serviço no turno das 13h30 às 22h00 (dias 13 e 14 de Agosto de 2009), e na operação de segurança às instalações do Aeroporto dos Açores, nomeadamente como vigilante nos dois postos de rastreio de passageiros e no check point de controlo de bagagem.
32- A Autora A faltou nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009.
33- Nos dias 11 e 12 de Agosto de 2009, a Autora A encontrava-se no período de folga.
34- A Autora B estava escalada para prestar serviços mínimos no dia 14 de Agosto de 2009.
35- À data da prática dos factos e conforme previamente definido, a Autora B iria prestar serviço no turno das 13h30 às 22h00 (dia 14 de Agosto de 2009), e na operação de segurança às instalações do Aeroporto dos Açores, nomeadamente como vigilante nos dois postos de rastreio de passageiros.
36- A Autora B faltou no dia 14 de Agosto de 2009.
37- Nos dias 12 e 13 de Agosto de 2009, a Autora A encontrava-se no período de folga.
38- A Autora C estava escalada para prestar serviços mínimos no dia 13 de Agosto de 2009.
39- À data da prática dos factos e conforme previamente definido, a Autora C iria prestar serviço no turno das 5h00 às 13h30 (dia 13 de Agosto de 2009), e na operação de segurança às instalações do Aeroporto dos Açores, nomeadamente como vigilante nos dois postos de rastreio de passageiros.
40- A Autora C faltou no dia 13 de Agosto de 2009.
41- Nos dias 14 e 15 de Agosto de 2009, a Autora A encontrava-se no período de folga.
42- O Autor D estava escalado para prestar serviços mínimos nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009.
43- À data da prática dos factos e conforme previamente definido, o Autor D iria prestar serviço no turno das 13h30 às 22h00 (dias 13 e 14 de Agosto de 2009), e na operação de segurança às instalações do Aeroporto dos Açores, nomeadamente como vigilante nos dois postos de rastreio de passageiros..
44- O Autor D faltou nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009
45- Nos dias 15 e 16 de Agosto de 2009, o Autor D encontrava-se no período de folga
46- A Autora E estava escalada para prestar serviços mínimos nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009.
47- À data da prática dos factos e conforme previamente definido, a Autora E iria prestar serviço no turno das 13h30 às 22h00 (dias 13 e 14 de Agosto de 2009), e na operação de segurança às instalações do Aeroporto dos Açores, nomeadamente como vigilante nos dois postos de rastreio de passageiros e no check point de controlo de bagagem (HBS).
48- A Autora E faltou nos dias 13 e 14 de Agosto de 2009.
49- Nos dias 11 e 12 de Agosto de 2009, a Autora E encontrava-se no período de folga.
50- A Autora F estava escalada para prestar serviços mínimos no dia 13 de Agosto de 2009.
51- À data da prática dos factos e conforme previamente definido, a Autora F iria prestar serviço no turno das 13h30 às 22h00 (dia 13 de Agosto de 2009), e na operação de segurança às instalações do Aeroporto dos Açores, nomeadamente como vigilante nos dois postos de rastreio de passageiros.
52- A Autora F faltou no dia 13 de Agosto de 2009.
53- Nos dias 14 e 15 de Agosto de 2009, a Autora F encontrava-se no período de folga.
54- Nos dias 13 e 14 de Agosto os Autores estiveram nas instalações do Aeroporto João Paulo II, na companhia de outros colaboradores da Ré e do representante do STAD, Sr. H.
55- Em consequência, a Ré instaurou, a 17 de Agosto de 2009, um processo disciplinar contra os Autoras por existirem indícios suficientes da prática de factos que justificam a aplicação da sanção disciplinar de despedimento.
56- A Ré determinou a prestação dos serviços mínimos, nos seguintes termos:
a) dois postos de rastreio de passageiros e o check point de controlo de bagagem;
b) um voo por destino programado, com excepção dos destinos de Lisboa e Terceira que deveriam ser dois (no caso do aeroporto de Ponta Delgada);
c) um voo por destino (restantes Aeroportos).
57- A Ré viu-se forçada a reformular a escala para cumprimento dos referidos serviços impreteríveis, nomeadamente através da solicitação do trabalho de outros agentes.
58- Foi a Ré quem escalou as AA. para a prestação dos serviços mínimos, nos dias em que decorria a greve, tendo estas decidido, de forma consciente, permanecer no aeroporto em situação de não actividade.
59- A representante de SATA veio a arguir a nulidade do pré- aviso de greve por preterição da forma legal prevista, nomeadamente por dele não constarem as assinaturas necessárias à vinculação do STAD.
60- Mais foi referido que a realizar-se greve, a mesma deveria ser tida como ilícita.
61- A Administração Regional acompanhou a posição da SATA quanto à ilicitude da greve.
62- O representante do STAD nessa reunião, Senhor H (coordenador regional do STAD) nada disse a respeito da referida preterição da formalidade, nomeadamente não referiu que o Senhor I tinha poderes para vincular o STAD para efeitos de pré-aviso de greve.
63- No dia 7 de Agosto, o STAD enviou, para a Ré, um fax contendo cópia de um escrito denominado procuração em que são atribuídos poderes ao Senhor I para formalizar o pré-aviso de greve.
64- Em tal aviso de greve, não é feita referência à existência dos poderes de representação a favor do Senhor I.
65- A Ré requereu junto dos serviços do Ministério Público que se procedesse a averiguações quanto à preparação da referida procuração.
x
-o direito:
- a primeira questão:
Trata-se de saber se o despacho governamental que estabeleceu os serviços mínimos a prestar pelos Autores durante a greve está ferido de ilegalidade, por ausência de competência do Secretario Regional da Economia.
Antes de mais importa dizer o seguinte:
Dispõe o nº 1 do artº 57º da Constituição (CRP) que “É garantido o direito à greve”.
E o nº 3 estabelece: “A lei define as condições de prestação, durante a greve, de serviços mínimos necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis”.
Mas se o direito à greve é um direito constitucional, não é um direito absoluto, podendo sofrer determinados restrições, que, contudo, só podem verificar-se em contextos legalmente estabelecidos e têm de conter-se dentro de limites bem definidos.
É o que resulta do disposto no artº 18º, nº 2, da CRP: “A lei só pode restringir os direitos, (…) nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direito ou interesses constitucionalmente protegidos”.
E o nº 3 do mesmo artigo rege, na parte que agora nos interessa, que: “As leis restritivas de direitos, (…) não podem (…) diminuir a extensão e o alcance da conteúdo essencial dos preceitos constitucionais”.
E um dos direitos tutelados constitucionalmente é o direito de deslocação – artº 44º da CRP.
No que se refere à fixação dos serviços mínimos durante a greve, entendeu-se no Ac. do STA de 26/06/2008 (in www.dgsi.pt):
“…o direito à greve não é absoluto visto o seu nº 3 introduzido no texto constitucional pela Revisão de 1997, autorizar que a lei ordinária defina "as condições de prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis", o que constitui uma limitação ao seu exercício irrestrito, como também o nº 2 do seu artº 18º consente que esse exercício possa ser constrangido quando seja "necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos". O que quer dizer que, apesar fundamental, o direito à greve pode ser regulamentado e esta regulamentação pode constituir, objectivamente, numa restrição ao seu exercício sem que tal possa ser considerado como uma violação inconstitucional do direito à greve. Ponto é que ela se destine a ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, a promover a segurança e manutenção de equipamentos e instalações e se limite ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.”
O direito à greve encontra-se regulado nos art.ºs 530º e ss do Código do Trabalho de 2009 (CT).
A lei confere aos trabalhadores aderentes à greve determinados deveres, que podem implicar a necessidade de prestação de serviços durante a mesma. É o que decorre do nºs 1, 2 e 3 do artº 537 do CT, e que se verificam em duas situações:
- Os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações (nº 3);
- Quando estão em causa empresas ou estabelecimentos que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis (nºs 1 e 2).
Escreveu-se, a este propósito, no recente acórdão desta Relação de Lisboa de 7/12/2010 (Relatora Desembargadora Paula Sá Fernandes), disponível em www.dgsi.pt:
”Nesta última situação – satisfação de necessidades sociais impreteríveis – os seus limites revestem-se de alguma complexidade pois pressupõem a articulação de dois conceitos relativamente indetermináveis: - a satisfação de necessidades socialmente impreteríveis e os serviços mínimos que devem ser prestados para assegurar a referidas necessidades, pelo que os seus limites hão-de ser integrados em função e à luz de cada situação.
A doutrina tem entendido a possibilidade e a necessidade de desenvolver um critério qualificador das necessidades sociais impreteríveis, de entre o conjunto das necessidades inerentes aos bens e interesses constitucionalmente protegidos em sede de direitos fundamentais, designadamente, Monteiro Fernandes, em “Manual do Direito do Trabalho”, 13ª edição, pág. 926. Também no mesmo sentido, Liberal Fernandes, em obra recente, “A obrigação de serviços mínimos como técnica de regulação da Greve nos serviços essenciais”, a pág.457, refere que: “Em sentido laboral, os serviços mínimos compreendem a actividade que os trabalhadores em greve ficam obrigados a prestar (ou a continuar a prestar, uma vez que, por definição, a satisfação das necessidades sociais impreteríveis não admite interrupções) durante a paralisação colectiva; esta dimensão está directamente relacionada com os limites que a ordem jurídica impõe ao exercício do direito à greve e traduz a quota de prestação laboral que não pode ser interrompida ou suspensa, sob pena de lesão dos direitos fundamentais dos cidadãos.
Posto isto temos que, no dia 29 de Julho de 2009, o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas (STAD), comunicou, por meio de fax, a convocação de uma greve de 48 horas para todos os locais de trabalho da Região Autónoma dos Açores.
Face à convocação de greve e tendo em vista a negociação de um acordo quanto aos serviços mínimos e quanto aos meios necessários para os assegurar, a Direcção Regional do Trabalho, Qualificação Profissional e Defesa do Consumidor (Secretaria Regional do Trabalho e Solidariedade Social) convocou, por fax enviado no dia 31 de Julho de 2009, uma reunião.
Nessa reunião não foi alcançado acordo quanto aos serviços mínimos e aos meios necessários para os assegurar durante o período de greve.
Face a tal ausência de acordo, no dia 11 de Agosto de 2009, a Secretaria Regional do Trabalho e Solidariedade Social e a Secretaria Regional da Economia proferiram o despacho conjunto referente aos serviços mínimos a prestar nos Aeroportos da Região Autónoma dos Açores.
Entendem os recorrentes que se quanto ao primeiro não se suscitam dúvidas quanto à sua competência, já quanto ao Secretário Regional da Economia salta à evidência que o mesmo não tem qualquer tutela sobre a actividade de Segurança Privada.
Mas não têm razão.
Dispõe o artº 538º, nos seus nºs 1, 2 e 4, do CT de 2009 (que é o aqui aplicável):
1 – Os serviços previstos nos n.ºs 1 e 3 do artigo anterior e os meios necessários para os assegurar devem ser definidos por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou por acordo entre os representantes dos trabalhadores e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou a respectiva associação de empregadores.
2 – Na ausência de previsão em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou de acordo sobre a definição dos serviços mínimos previstos no n.º 1 do artigo anterior, o serviço competente do ministério responsável pela área laboral, assessorado sempre que necessário pelo serviço competente do ministério responsável pelo sector de actividade, convoca as entidades referidas no número anterior para a negociação de um acordo sobre os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar.
3- (...)
4 – No caso referido nos números anteriores, na falta de acordo nos três dias posteriores ao aviso prévio de greve, os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar são definidos:
a) Por despacho conjunto, devidamente fundamentado, do ministro responsável pela área laboral e do ministro responsável pelo sector de actividade;
b) Tratando-se de serviço da administração directa ou indirecta do Estado, de serviços das autarquias locais ou empresa do sector empresarial do Estado, por tribunal arbitral, constituído nos termos de lei específica sobre arbitragem obrigatória.
Embora a Ré exerça a actividade de segurança privada, pode, como no caso que nos ocupa, fazê-lo em locais de acesso condicionado ao público, nomeadamente em aeroportos, cabendo-lhe, entre outras tarefas, a vigilância em postos de rastreio de passageiros e no “check point” do controlo de bagagem, actividades, como é bom de ver, intrínsecas e indispensáveis à segurança do aeroporto.
Daí que sejam irrepreensíveis as considerações feitas pelo Sr. Juiz de que as “consequências de uma greve dos trabalhadores da R. não põe em causa a segurança privada (abstractamente considerada) mas sim a actividade do aeroporto e respectivo tráfego. A paralisação dos trabalhadores da R. pode implicar, directamente, repito, a paralisação do aeroporto.
São, pois, os transportes que estão aqui em questão, é este o serviço essencial que se pretende assegurar com a definição dos serviços mínimos”.
Ora, e como decorre do artº 12.º, al. d), do Decreto Legislativo Regional nº 25/2008/A, de 31 de Dezembro, é ao Secretário Regional da Economia que cabe exercer competências em matéria de transportes aéreos e marítimos.
Assim, não podem restar dúvidas da competência, para a matéria em questão, designadamente a supervisão do serviço de transportes aéreos e a fixação dos respectivos serviços mínimos em caso de greve, da Secretaria Regional da Economia, não havendo qualquer violação das normas constitucionais invocadas pelos apelantes.
- a segunda questão - a necessidade de intervenção do tribunal arbitral:
Aqui a alegação dos recorrentes não tem, e salvo o devido respeito, qualquer fundamento.
Decorre do transcrita al. b) do nº 4 do artº 538º do CT que a definição dos serviços mínimos e dos meios necessários para os assegurar só competem ao tribunal arbitral se se tratar de “serviço da administração directa ou indirecta do Estado, de serviços das autarquias locais ou empresa do sector empresarial do Estado”
E não resta qualquer dúvida de que a Ré é uma pessoa colectiva de natureza exclusivamente privada, não fazendo parte da administração directa ou indirecta do Estado.
Não é pelo apelo ao princípio da imparcialidade que se pode, como pretendem os apelantes, tornear o normativo legal citado, estando essa imparcialidade garantida pela intervenção governativa prevista na al. a ) do nº 4, estando nós, como estamos, perante uma empresa de capitais exclusivamente privados.
- a terceira questão:
Aqui entendem os apelantes que o despacho conjunto em causa não se encontra devidamente fundamentado, já que omite completamente a indicação dos meios necessários para assegurar os serviços mínimos, violando o artº 125º do Código de Procedimento Administrativo.
Mais uma vez carecem de razão.
No despacho em questão estabeleceu-se que «o referido Sindicato e os trabalhadores que adiram à greve, devem assegurar a prestação de serviços mínimos indispensáveis ao rastreio de passageiros, da bagagem de cabina, e da bagagem de porão, que permitam a realização:
a) De todos os voos impostos por situações críticas relativas à segurança de pessoas e bens, incluindo os voos-ambulância;
b) De todos os voos de Estado, nacional ou estrangeiro;
c) Nas ligações aéreas com o Continente, de dois voos diários na rota Ponta Delgada/Lisboa, sendo um de manhã e outro à noite:
d) Nas ligações entre as ilhas do arquipélago, de dois voos diários na rota Ponta Delgada/Terceira, e de um voo diário nas restantes rotas programadas».
Para depois se remeter a identificação dos trabalhadores necessários para assegurar os serviços mínimos, e que resulte “da organização técnica do trabalho na empresa”, numa primeira fase para o STAD e, não o fazendo este até 24 horas antes do início da greve, para a entidade empregadora, a Ré, em obediência ao disposto no nº 7 do citado artº 538º do CT.
Salta à vista que esse despacho se encontra devida e exaustivamente fundamentado, com a clara definição do que se entendeu deverem ser os serviços mínimos para a greve em questão, não se exigindo, até porque a lei claramente indica quem deve proceder à designação dos trabalhadores, que fosse esse despacho governamental a efectuar tal designação, o que seria, convenhamos, um pouco caricato.
Segundo Monteiro Fernandes, (Direito do Trabalho, 12.ª ed, Almedina, Coimbra, 2004, pag. 924), parece «claro que ele [o problema da definição] deve ser colocado em três níveis distintos: o da determinação das necessidades a satisfazer e do nível de serviço adequado a essa satisfação; o da definição do esquema organizativo destinado a garantir a realização desse nível de serviço e a correspondente satisfação de necessidades públicas; o da designação das pessoas, concreto, que, apesar de terem aderido à greve, deverão prestar trabalho no quadro desse esquema organizativo
É o primeiro nível, e só esse, que cabe ao Governo ao «identificar necessidades sociais inadiáveis, apontar bens e interesses gerais que são tutelados por direitos constitucionalmente consagrados».
Como se refere, acertada e incisivamente, na sentença, “O que consta do despacho, e é perfeitamente inteligível, são os bens que se pretendem assegurados; aos demais intervenientes cabe implementá-los, realizar as tarefas indispensáveis (e só estas porque estamos perante, precisamente, mínimos de actuação) para conseguir aqueles objectivos”.
Definidos essa necessidade e esse nível de serviço, caberá, nos termos do citado nº 7 do artº 538º do CT, cuja clareza de redacção não permite outra interpretação, aos representantes dos trabalhadores em greve- neste caso o STAD –proceder à designação dos trabalhadores adstritos à realização do serviços mínimos, ou não o fazendo este em tempo oportuno, legalmente fixado, à entidade empregadora.
E o que sucedeu no caso concreto foi que, não o tendo feito o STAD, a Ré designou os trabalhadores adstritos à prestação dos serviços mínimos e elaborou as respectivas escalas de serviços, de tudo isto dando conhecimento à Secretaria Regional e ao STAD.
E tendo, nos termos já expostos, o despacho conjunto de definição dos serviços mínimos sido proferido com a intervenção das entidades competentes do Governo Regional dos Açores, não se verifica a pelos apelantes invocada impossibilidade do STAD de designar os trabalhadores afectos à prestação dos serviços mínimos, pelo que também aqui improcedem as conclusões do recurso.
- a justa causa:
A justa causa de despedimento está definida no artº 351º, nº 1, do CT de 2009 como o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
É necessário que haja um comportamento culposo do trabalhador; a justa causa tem a natureza de uma infracção disciplinar, supondo uma acção ou omissão imputável ao trabalhador a título de culpa, violadora dos deveres a que o trabalhador, como tal, está sujeito, isto é, dos deveres emergentes do vínculo contratual.
Enuncia o legislador, no nº 2 do mesmo preceito e a título meramente exemplificativo (nomeadamente), diversos comportamentos susceptíveis de constituírem justa causa do despedimento de um trabalhador pela sua entidade patronal.
Não basta, porém, a demonstração de qualquer dos referidos comportamentos, para que se possa ter por verificada a justa causa para despedimento. Com efeito e conforme decorre daquele conceito, a justa causa de despedimento exige a verificação cumulativa de três requisitos ou pressupostos:
- a existência de um comportamento culposo do trabalhador (requisito subjectivo);
- a verificação da impossibilidade de manutenção da relação laboral entre o trabalhador e o empregador (requisito objectivo);
- a existência de um nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade.
A justa causa de despedimento, pressupõe, portanto, a existência de uma determinada acção ou omissão imputável ao trabalhador a título de culpa, violadora de deveres emergentes do vínculo contratual estabelecido entre si e o empregador e que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a manutenção desse vínculo.
Sendo o despedimento a mais grave das sanções, para que a actuação do trabalhador integre justa causa, é ainda necessário que seja grave em si mesma e nas suas consequências.
O comportamento culposo do trabalhador só integrará justa causa de despedimento quando determine a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho, o que acontecerá sempre que a ruptura seja irremediável, isto é, sempre que nenhuma outra sanção seja susceptível de sanar a crise contratual grave aberta com aquele comportamento.
Daí que não basta que o comportamento se integre numa das hipóteses exemplificativas do nº 2 desse artº 351º, não basta a prova da materialidade dos factos, sendo necessário que os mesmos, pela sua gravidade e consequências, tornem imediata e praticamente impossível a relação de trabalho.
Quanto à impossibilidade prática de subsistência da relação laboral e citando, entre outros, o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 30/04/2003, Proc. n.º 02S568, disponível em www.dgsi.pt, a mesma verifica-se “quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, susceptível de criar no espírito da primeira a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral”.
Ainda de acordo com o mesmo aresto, citando, aliás, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, Almedina, 11ª Edição, pag. 540-541., “Não se trata, evidentemente, de uma impossibilidade material, mas de uma inexigibilidade, determinada mediante um balanço in concreto dos interesses em presença – fundamentalmente o da urgência da desvinculação e o da conservação do vínculo (…). Basicamente preenche-se a justa causa com situações que, em concreto (isto é, perante a realidade das relações de trabalho em que incidam e as circunstâncias específicas que rodeiam tais situações), tornem inexigível ao contraente interessado na desvinculação o respeito pelas garantias de estabilidade do vínculo”.
Acresce ainda que, sendo o despedimento a sanção disciplinar mais grave, a mesma só deve ser aplicada nos casos de real gravidade, isto é, quando o comportamento culposo do trabalhador for de tal forma grave em si e pelas suas consequências que se revele inadequada para o caso a adopção de uma sanção correctiva ou conservatória da relação laboral.
E porque não basta um comportamento culposo, sendo também necessário que ele seja grave em si mesmo e nas suas consequências, gravidade que deverá ser apreciada em termos objectivos e concretos, no âmbito da organização e ambiente da empresa, e não com base naquilo que o empresário subjectivamente considere como tal, é que o nº 3 do artº 351º do CT determina que : “Na apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes”.

Passando ao caso que nos ocupa, começam os Autores /apelantes por pôr em causa a própria existência de uma infracção disciplinar, por, e no seu entender, nenhuma prova ter sido produzida nos autos de que os Autores tiveram conhecimento de que estavam escalados para o cumprimento dos serviços mínimos e o único facto provado sobre essa matéria foi que nos dias de greve não se apresentaram ao serviço e embora tivessem estado no Aeroporto não foram trabalhar, sendo que tal prova cabia à R.
Mais uma vez sem razão.
Com efeito, ficou provado que a Ré designou os trabalhadores adstritos à prestação dos serviços mínimos e elaborou as respectivas escalas de serviços, de tudo isto dando conhecimento à Secretaria Regional e ao STAD (ponto 29 da factualidade provada), que nos dias 13 e 14 de Agosto os Autores estiveram nas instalações do Aeroporto João Paulo II, na companhia de outros colaboradores da Ré e do representante do STAD, Sr. P... M... (ponto 54), e que foi a Ré quem escalou os Autores para a prestação dos serviços mínimos, nos dias em que decorria a greve, tendo estas decidido, de forma consciente, permanecer no aeroporto em situação de não actividade (ponto 58).
Começando pela alegado desconhecimento das escalas de serviço, o ónus da prova do mesmo competia aos Autores, e não à Ré demonstrar o seu conhecimento.
Com efeito, do contrato de trabalho, como contrato sinalagmático, decorre para o trabalhador a obrigação de disponibilizar a sua força de trabalho ao empregador, cabendo-lhe demonstrar e provar a razão da sua ausência ao serviço, sempre e logo que a mesma ocorra. Sempre que o trabalhador falta ao serviço, sobre ele impende o ónus de comunicar à entidade empregadora essa ausência, bem como o motivo justificativo da mesma.
E, no caso em apreço, tendo sido elaboradas as referidas escalas de serviço, competia aos Autores provar que, por qualquer motivo, designadamente por terem estado de folga, não tiveram conhecimento das mesmas.
Prova essa particularmente difícil, para não dizer impossível, na hipótese concreta, em que os Autores compareceram no aeroporto nos dias da greve, onde certamente lhe foram comunicadas essas escalas (se não foram cabia-lhes o respectivo ónus da prova, pelos motivos expostos), e, sobretudo e decisivamente, face ao que ficou provado no ponto 58: decidiram os mesmos, de forma consciente, permanecer no aeroporto em situação de inactividade.
Não tendo impugnado a matéria de facto, incluindo este ponto 58, não podem os Autores legitimamente escudar-se no alegado desconhecimento, que seguramente não existiu.
E não tendo trabalhado nos dias em questão, estamos na presença de uma situação de faltas injustificadas, nos termos do nº 1 do artº 541º do CT.
Por outro lado, de forma alguma os Autores lograram provar que só não trabalharam por estarem convictos que estavam na presença de uma greve regular e de que não estavam obrigados a cumprir os serviços mínimos, assim incorrendo em erro sobre a ilicitude. Da matéria de facto provada nada resulta que indicie essa falta de consciência da ilicitude. Por outro lado, basta uma leitura atenta do Ac. do STJ citado pelos apelantes para se verificar que situação aí abordada nenhuma similitude tem com a presente.
Posto isto, e tendo em conta que o comportamento do trabalhador tem de ser analisado na perspectiva da sua projecção sobre o vínculo laboral, em atenção às funções que ele exerce e à possibilidade de estas subsistirem sem lesão irremediável dos deveres fundamentais inerentes, não podem restar dúvidas de que a conduta dos Autores inquinou, de forma irremediável, a relação de confiança que deve existir no desenvolvimento de qualquer relação jurídico-laboral.
Exercendo as funções de vigilante, a sua não comparência ao serviço, assegurando os serviços mínimos, implicou que a Ré se visse forçada a reformular a escala para cumprimento dos referidos serviços impreteríveis, nomeadamente através da solicitação do trabalho de outros agentes.
Estando nós perante uma área particularmente sensível da realidade actual, a segurança nos voos, em que os vigilantes assumem um papel assaz fundamental e decisivo.
Não era pois exigível, mesmo na ausência de passado disciplinar, face à gravidade da conduta dos Autores, que a Ré, sob pena de perder a sua autoridade sobre os restantes trabalhadores, tolerasse estes comportamentos da Autores e que adoptasse outra reacção que não a de proceder ao seu despedimento.
Pelo que não merece qualquer censura a decisão sob recurso, improcedendo as conclusões deste.
x

Decisão:
Nesta conformidade, acorda-se em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes.

Lisboa, 14 de Setembro de 2011

Ramalho Pinto
Natalino Bolas
Isabel Tapadinhas (Votei a decisão mas não alguns dos seus fundamentos conforme declaração de voto junta)


Declaração de voto
Apenas votei a decisão não subscrevendo a respectiva fundamentação na parte em que refere que o desconhecimento das escalas de serviço constituía ónus de prova a cargo dos autores não competindo à ré demonstrar o seu conhecimento, que, de resto, aqui foi demonstrado – facto provado 58-.
Efectivamente, ainda que o Cód. Trab. não contenha norma similar à que constava do art. 12.º nº 4 (parte final) da revogada LCCT – segundo a qual cabia ao empregador, na acção de impugnação judicial do despedimento, a prova dos factos constantes da decisão sancionatória – dúvidas não restam de que tal entendimento se mantém actual tendo em conta a estrutura do processo disciplinar e os princípios gerais de repartição do ónus da prova.
Com efeito, se cabe ao empregador a imputação dos factos integradores da justa causa de despedimento, a descrever na nota de culpa e a dar como assentes na decisão final – arts. 353.º nº 1 e 357.º nºs 4 e 5 do Cód. Trab. – e se ele apenas pode invocar, na acção de impugnação do despedimento, os factos e fundamentos da dita decisão – art. 387.º nº 3 do mesmo corpo de leis – logo se percebe que os factos integrantes da justa causa são constitutivos do direito ao despedimento e, consequentemente, impeditivos daqueles que o trabalhador acciona na acção judicial, acobertadas na suposta ilicitude da sanção.
Assim, embora a falta de cumprimento, em sede da responsabilidade contratual, se presuma culposa, por força do disposto no art. 799.º, nº 1, do Cód. Civil, entendo que essa presunção não pode funcionar em sede do direito disciplinar. Em sede do direito sancionatório, tem de ser o empregador a provar a infracção disciplinar e, consequentemente, todos os elementos que a integram, incluindo a culpa do trabalhador, pelas razões que acima referi.
Também não subscrevi a fundamentação no que respeita à afirmação de que (…) não tendo trabalhado nos dias em questão, estamos na presença de uma situação de faltas injustificadas, nos termos do nº 1 do artº 541º do CT, uma vez que, o mencionado preceito, como decorre da sua leitura, apenas se aplica nos casos de ausência do trabalhador por motivo de adesão à greve declarada ou executada por forma contrária à lei e não foi esse o caso.

Isabel Tapadinhas

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/e6e1f17fa82712ff80257583004e3ddc/842ce82f56cf9f9f8025791100529781?OpenDocument

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