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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL COMPETÊNCIA INTERNACIONAL REGULAMENTO CE MENOR RESIDÊNCIA HABITUAL - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - 22/09/2011


Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1729/10.0TMLSB-B.L1-8
Relator: ILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Descritores: REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL
COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
REGULAMENTO CE
MENOR
RESIDÊNCIA HABITUAL

Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 22-09-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE

Sumário: I - Em matéria da competência para a regulação do poder paternal de menores filhos de cidadãos portugueses residentes em diferentes Estados membros da Comunidade Europeia rege o Regulamento (CE) nº 2201/2003, de 27de Novembro.
II - No que respeita à responsabilidade parental e em matéria de competência geral, preceitua o artº 8 do Regulamento que o foro apropriado é o do tribunal competente do Estado-Membro da residência habitual da criança, com referência à data da instauração do processo.
III - A determinante fundamental a ter em conta é o da efectiva ligação do menor e dos seus progenitores a Portugal, país da nacionalidade de todos, dado que ela perdura por cerca de 6 anos em relação ao menor, pois a apelante foi residir para Inglaterra e com ela o menor, em meados de Setembro de 2010, o que induz uma clara desvinculação, por ora, a Inglaterra.
IV - A acção de alteração da regulação das responsabilidades parentais, a tramitar-se num tribunal inglês corre sérios riscos de não poder acautelar da mesma forma o supremo interesse do menor.
V - Residindo o pai do menor em Portugal, aqui tendo sempre vivido o pai, a mãe e o menor, que se apenas se encontrar em Inglaterra há muito pouco tempo, o critério da proximidade, interpretado segundo o antes afirmado e previsto no referido nº (12) do Regulamento, aponta a competência para os tribunais portugueses.
(ISM)
Decisão Texto Parcial:

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO

A… veio requerer alteração à regulação do exercício do poder paternal relativamente ao seu filho, B…, contra a mãe do menor, C….

Citada para alegar nos termos do art° 182° n° 3 da OTM a requerida invocou a excepção da incompetência internacional do Tribunal de Família e Menores de Lisboa.
O MP e o requerente pugnaram pela competência do tribunal.

Foi proferida decisão que julgou improcedente a excepção da incompetência internacional do tribunal.

Não se conformando com a decisão, dela recorreu a requerida, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:
1ª- O tribunal recorrido decidiu pela improcedência da excepção da incompetência internacional invocada pela ora recorrente.
2ª- Para tal, fundamentou a sua decisão pela aplicação do artº155° n° 5 da OTM.
3ª – Tal decisão viola o artº 8° da Constituição da Republica Portuguesa e o artº 65° n° 1 do Código de Processo Civil, ao não ter feito aplicação da legislação internacional constante quer da Convenção de Haia de 5.10.1961 relativa à Competência das Autoridades e à Lei Aplicável em Matéria de Protecção de Menores e o Regulamento (CE) n° 2201/2003 do Conselho, de 27.11.2003, relativo à Competência, Reconhecimento e à Execução de Decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental.
4ª – Para se aferir do tribunal internacionalmente competente para decidir o mérito desta questão não é o artº 155° n° 5 da OTM que se deve aplicar, mas de acordo com o artº65° do CPC, tem de ser atendido o direito supranacional aplicável.
5ª – Quer a Convenção de Haia referida, quer o Regulamento (CE) n° 2201/2003 de 27.11.2003, preceituam que o tribunal competente para a alteração das responsabilidades parentais é o tribunal da residência habitual do menor. E,
6ª – O domicílio do menor passou a ser, desde 10 de Setembro de 2010, em Inglaterra.
7ª – Isto porque é em Inglaterra que o menor passou a ter residência permanente, onde está matriculado numa escola e onde a progenitora, pessoa com quem vive e sempre viveu desde que nasceu, tem um emprego estável.
8ª – Aliás, as normas internacionalmente aplicáveis, e mesmo as normas internas, apontam como factor de atribuição de competência do tribunal a residência do menor por um critério de proximidade e por isso ser mais apto para avaliar e tutelar mais eficazmente os seus interesses.
Por fim,
9ª – A ida da mãe do menor para Inglaterra teve como finalidade proporcionar ao menor urna melhor qualidade de vida para o mesmo, dada a maior facilidade que aí encontrou trabalho e com melhor remuneração.
10ª – Assim, a deslocação do menor para Inglaterra foi perfeitamente lícita, na medida em que, foi sempre a mãe quem teve a guarda do menor desde a data do seu nascimento.
11ª - Da mesma opinião perfilhou o Tribunal de Família e de Menores de Matosinhos que, em 2006 homologou o acordo de Regulação do Exercício do Poder Paternal, quando indeferiu o incidente de incumprimento de visitas por parte mãe do menor, por ter considerado a sua deslocação para Inglaterra perfeitamente lícita e remeter, agora, para o tribunal do domicílio onde o menor reside actualmente, para a regulação dos futuros convívios do menor com o pai.
Termina pedindo que seja julgada procedente a excepção da incompetência internacional dos tribunais portugueses.

O requerente e o Ministério Público contra-alegaram, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

Dispensados os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO.
A) Fundamentação de facto
Com interesse para a decisão da causa, a primeira instância deu como provados os seguintes factos:
1º - B… nasceu ... de ... de 2004 e é filho de A… e de C...
2º - O B… reside com a mãe em Inglaterra desde meados de Setembro de 2010.
3º - O exercício das responsabilidades parentais relativamente ao B… foram reguladas em 28 de Setembro de 2006 por acordo devidamente homologado por sentença transitada em julgado (cfr. fls. 305 dos autos principais).
4º - A criança viajou para Inglaterra com a mãe entre os dias 2 e 19 de Agosto de 2010 (fls. 321 dos autos principais) 10 e 20 de Setembro de 2010 (fls. 325 do mesmo processo)
5º - A mãe não informou os autos que mudara a sua residência para Inglaterra, tendo solicitado sempre certidões com indicação dos dias que iria permanecer em território inglês.
6º - O requerente pai reside na …, n° …, …, em Lisboa.

B) Fundamentação de direito

A questão jurídica que nos compete apreciar, à luz das conclusões da minuta recursória consiste em saber se o Tribunal de Família e Menores de Lisboa é internacionalmente competente para conhecer da alteração à regulação do exercício do poder paternal.

A decisão recorrida entendeu que sim, de acordo com o disposto no artigo 155º nº 5 da OTM, por ser o tribunal da residência do requerente.
É contra este entendimento que se insurge a apelante pelas razões que deixou expostas nas suas alegações.

Cumpre decidir.
O artigo 155º da OTM, na redacção da Lei n.º 133/99, de 28 de Agosto, sob a epígrafe (Competência territorial) preceitua, na parte aplicável, o seguinte:
5 - Se, no momento da instauração do processo, o menor não residir no País, é competente o tribunal da residência do requerente ou do requerido; quando também estes residirem no estrangeiro e o tribunal português for internacionalmente competente, pertence ao tribunal de Lisboa conhecer da causa.
6 - São irrelevantes as modificações de facto que ocorrerem posteriormente ao momento da instauração do processo.
Estamos em sede de competência absoluta, uma vez que está em causa a competência internacional do tribunal recorrido - artº 101º do CPC.
O artº 65º do CPC, ao regular a competência internacional dos tribunais portugueses, salvaguarda o estabelecido em tratados, convenções e regulamentos comunitários.
Na verdade, por força do disposto no artº 8º da CRP, as normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial - nº2 - e as normas dos tratados que regem a União Europeia e as emanadas das suas instituições, são directamente aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito comunitário, ainda que com salvaguarda dos princípios fundamentais do Estado de Direito democrático - nº 4, do mesmo normativo.

Sendo a Inglaterra e Portugal membros da Comunidade Europeia, haverá de atender-se ao disposto no Regulamento (CE) nº 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental, uma vez que o mesmo tem aplicação às matérias respeitantes à atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental - artº 1º nº 1 alª b) - e se assume como instrumento jurídico comunitário vinculativo e directamente aplicável para determinar as regras relativas à competência judiciária, de forma a ultrapassar as disparidades das regras nacionais em matéria de competência judicial - artº 17º.

Este Regulamento começa por consignar, nos seus considerandos (12), que “as regras de competência em matéria de responsabilidade parental do presente regulamento são definidas em função do superior interesse da criança e, em particular, do critério da proximidade… a competência deverá ser, em primeiro lugar, atribuída aos tribunais do Estado-Membro de residência habitual da criança, excepto em determinados casos de mudança da sua residência habitual ou na sequência de um acordo entre os titulares da responsabilidade parental”.

Isso mesmo resulta do estatuído no artigo 8º nº 1 do Regulamento, que dispõe que " Os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal”.

Não define o Regulamento o que deva entender-se por residência habitual. Trata-se, em nosso entender, de um conceito autónomo da legislação comunitária, independente relativamente ao que possa constar das legislações nacionais, devendo ser interpretado em conformidade com os objectivos e as finalidades do Regulamento, e que deve ser procurado caso a caso pelo juiz, mas tendo em conta, desde logo, que o adjectivo “habitual” tende a indicar uma certa duração.

Neste contexto, resulta provado nos autos que:
- O B... reside com a mãe em Inglaterra desde meados de Setembro de 2010.
- O exercício das responsabilidades parentais relativamente ao B… foram reguladas em 28 de Setembro de 2006 por acordo devidamente homologado por sentença transitada em julgado (cfr. fls. 305 dos autos principais).
- A criança viajou para Inglaterra com a mãe entre os dias 2 e 19 de Agosto de 2010 (fls. 321 dos autos principais) 10 e 20 de Setembro de 2010 (fls. 325 do mesmo processo)
- A mãe não informou os autos que mudara a sua residência para Inglaterra, tendo solicitado sempre certidões com indicação dos dias que iria permanecer em território Inglês.
- O requerente pai reside na …, n° …, em Lisboa.

Não se pode aplicar simplisticamente esta norma, devendo proceder-se a uma interpretação integrada de todo o Regulamento, em que prevê situações de afastamento daquela regra geral.
Trata-se das excepções estabelecidas nos seus artº 9º, 10º, 12º e 13º do Regulamento, todas elas gizadas na prevalência da melhor e mais eficaz protecção do interesse do menor.
O que, no caso em análise, cremos se justificar a sua aplicação.
O menor nasceu em Portugal e é filho de pais portugueses, vive em Inglaterra com a mãe e o pai vive em Lisboa.
A determinação do sentido e alcance da lei não se cinge à sua letra, envolvendo, além do mais, a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada – artº 9 nº 1, do Código Civil.

Ora, no caso dos autos, a determinante fundamental a ter em conta é o da efectiva ligação do menor e dos seus progenitores a Portugal, país da nacionalidade de todos, dado que ela perdura por cerca de 6 anos em relação ao menor, pois a apelante foi residir para Inglaterra e com ela o menor, em meados de Setembro de 2010, o que induz uma clara desvinculação, por ora, a Inglaterra.
Daqui que decorre que a acção de alteração da regulação das responsabilidades parentais, a tramitar-se num tribunal inglês corre sérios riscos de não poder acautelar da mesma forma o supremo interesse do menor.
Por outro lado, apesar da mãe residir temporariamente com o menor em Inglaterra, optou, certamente pela ligação a Portugal pelo facto de a sua vida e condições serem aqui melhor identificáveis, contribuindo para uma decisão consentânea com a realidade familiar e a envolvente social e económica do menor e seus pais.
Em suma, entende-se que sendo o critério vertido no Regulamento o da proximidade da criança e seus pais, então no caso é com Portugal e não com Inglaterra.

Integramos, portanto, a situação na última parte do nº (12) dos Considerandos do Regulamento onde se lê:” (…) a competência deverá em ser, em primeiro lugar, atribuída aos tribunais do Estado – Membro de residência habitual da criança, excepto em determinados casos de mudança da sua residência habitual ou na sequência de um acordo entre os titulares da responsabilidade parental”.

Não existem, pois, dúvidas que residindo o pai do menor em Portugal, aqui tendo sempre vivido o pai, a mãe e o menor, que se apenas se encontrar em Inglaterra há muito pouco tempo, o critério da proximidade, interpretado segundo o antes afirmado e previsto no referido nº (12) do Regulamento, aponta a competência para os tribunais portugueses.

EM CONCLUSÃO:
- Em matéria da competência para a regulação do poder paternal de menores filhos de cidadãos portugueses residentes em diferentes Estados membros da Comunidade Europeia rege o Regulamento (CE) nº 2201/2003, de 27de Novembro.
- No que respeita à responsabilidade parental e em matéria de competência geral, preceitua o artº 8 do Regulamento que o foro apropriado é o do tribunal competente do Estado-Membro da residência habitual da criança, com referência à data da instauração do processo.
- A determinante fundamental a ter em conta é o da efectiva ligação do menor e dos seus progenitores a Portugal, país da nacionalidade de todos, dado que ela perdura por cerca de 6 anos em relação ao menor, pois a apelante foi residir para Inglaterra e com ela o menor, em meados de Setembro de 2010, o que induz uma clara desvinculação, por ora, a Inglaterra.
- A acção de alteração da regulação das responsabilidades parentais, a tramitar-se num tribunal inglês corre sérios riscos de não poder acautelar da mesma forma o supremo interesse do menor.
- Residindo o pai do menor em Portugal, aqui tendo sempre vivido o pai, a mãe e o menor, que se apenas se encontrar em Inglaterra há muito pouco tempo, o critério da proximidade, interpretado segundo o antes afirmado e previsto no referido nº (12) do Regulamento, aponta a competência para os tribunais portugueses.

III - DECISÃO

Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 22 de Setembro de 2011

Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Pais
Carla Mendes

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