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quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

RESPONSABILIDADES PARENTAIS ALIMENTOS - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - 15/11/2012


Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
7737/10.4TBVNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ FERRAZ
Descritores: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
ALIMENTOS

Nº do Documento: RP201211157737/10.4TBVNG.P1
Data do Acordão: 15-11-2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .

Sumário: Deve ser sempre fixada prestação alimentar a favor do menor, mesmo quando sejam desconhecidas as condições socioeconómicas do progenitor que não tem a sua guarda e ainda que não se saiba do seu paradeiro.
Reclamações:

Decisão Texto Integral: Proc. 7737/10.4TBVNG.P1 – apelação
José Ferraz (666)
Exmos Adjuntos
Des. Amaral Ferreira
Des. Ana Paula Lobo

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1) – B…, residente na Rua …, …, …, Vila Nova de Gaia, requereu que fossem judicialmente reguladas as responsabilidades parentais quanto à menor C…, nascida em 28 de Junho de 2006, filha da requerente e de D…, este com última morada, conhecida em Portugal, na Rua …, …, casa . …, Vila Nova de Gaia.

Pede que a menor fique à guarda e cuidados da mãe, com um regime de visitas livre e a contribuição do requerido com 175,00€ para alimentos à menor.

Tendo o requerido sido citado editalmente, e não comparecendo para a realização da conferência no dia designado, passou-se à realização do inquérito sobre a situação económica, moral e social da requerente.

Junto o relatório, e não requerida e realizadas outras diligências de prova, teve vista no processo o Digno Curador de Menores que promoveu que a menor permanecesse aos cuidados da progenitora, que deverá exercer sozinha as responsabilidades parentais e que se fixe um regime livre de visitas, nada promovendo quanto à fixação de uma pensão de alimentos porquanto nada se sabe quanto à situação económica do progenitor.

Foi proferida sentença que decretou
a) A menor fica entregue aos cuidados da mãe e a residir com esta e a quem competirá a decisão relativa aos actos da vida corrente da filha e as responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância para a vida da menor;
b) O pai poderá visitar a sua filha livremente, sem prejuízo dos horários de repouso e das actividades escolares da menor, conquanto avise a progenitora da sua intenção de concretizar as visitas com, pelo menos, 48 horas de antecedência.

Não foi fixada prestação alimentar a pagar pelo requerido por se desconhecer se exerce qualquer actividade e se tem rendimentos, nem sendo possível apurar tais elementos devido ao desconhecimento do seu paradeiro.
Implicitamente improcedeu, nessa parte, a pretensão da requerente.

2) - Discordando da decisão enquanto não fixa prestação alimentar a cargo do requerido, apela a requerente, mãe da menor.
Apresenta alegações, com as quais igualmente conclui (sem atenção ao que devem ser as conclusões, parecendo a recorrente entender que alegações e conclusões são a mesma coisa):
“A - A Apelante e o Requerido nos presentes autos são os pais da menor C….
B - Impende sobre ambos a obrigação de sustento para com a menor, sendo que esta, tal como explanado na sentença de que se recorre, “é mais vasta do que a existente nos restantes casos de direito de alimentos definidos na lei”, cfr. Art.º 2009.º, C.C.
C- Não se afere, pois, que a obrigação de sustento dos pais se afira de maneira indiscriminada e sem que obedeça a um critério de proporcionalidade, legalidade e igualdade, designadamente, no que concerne aos “meios daquele que houver de prestá-los e às necessidades daquele que houver de recebê-los (Cfr. também art.ºs 1874.º, n.º 2, 1885.º CC e art.º 27.º, n.º 3 da Convenção dos Direitos da Criança).
D- Foi dado por assente na sentença de que se recorre que não existem condições para a fixação de alimentos, cfr. alíneas a), b) e c) do ponto 4.
E- Sucede, porém, que designadamente, quanto ao apoio do tio materno, constante do facto dado por vertido na alínea a), tal apoio apenas se mantém enquanto estiver este de baixa por doença, o que terminará em Maio de 2011, facto esse que desde já, se Requer a V. Exa. se digne instar junto da Segurança Social sua confirmação, uma vez que aquando da solicitação da aqui apelante para que fosse tal declaração emitida foi a mesma recusada, nos termos e para os efeitos do Art.º 712.º, n.º 1 alínea b) e c) do CPC;
F- Tal facto obrigará o mesmo a voltar ao seu local de trabalho, na Alemanha, pelo que, foi tal facto erroneamente considerado como provado, bem como, se Impugna o Relatório Social no qual foi dado por provado o rendimento constante dos € 1.000,00 respeitantes à baixa médica do tio, apenas e só nessa parte.
G- A sentença em crise ao não fixar os alimentos, padece essencialmente de omissão de pronúncia devida, porquanto, ao invocar o constante nas alíneas b) e c), denega-se de se pronunciar quanto à fixação de alimentos à menor cuja regulação de responsabilidades parentais aqui se encontra em apreço, numa situação que viola clamorosamente o princípio da equidade e proporcionalidade, que norteiam o processo aqui em apreço, designadamente, os art.ºs 150.º da OTM e art.º 1878.º e 2004.º do CC, bem como, viola o princípio da igualdade e Não Discriminação, constitucionalmente consagrados, art.º 13, 26.º, e 36.º, n.ºs 4 e 5.º da CRP,
e princípio da proibição de “non liquet”, nos termos e para os efeitos do art.ºs 668.º, n.º 1 alíneas b) e d) e 712.º, n.º 1 alínea b) e c) do CPC, nulidade essa que expressamente se invoca .
H- Senão veja-se, que, no âmbito dos processos de jurisdição voluntária (art.º 150.º OTM), domina o princípio da equidade sobre o da legalidade estrita, devendo encontrar-se soluções de conveniência e oportunidade que salvaguardem o superior interesse da criança.
I- Consequentemente, Salvo devido respeito por melhor opinião, deveria a Meritíssima Juiz a Quo, ter fixado a pensão de alimentos à filha menor C… na sentença em crise e condenando-se o progenitor ao pagamento da mesma.
J- Tal condenação judicial impõe-se e mostra-se indispensável para que o Fundo de garantia de alimentos devidos a menores possa intervir em substituição do progenitor faltoso.
K- Assegurando, assim, o cumprimento do previsto na Constituição da
República Portuguesa em matéria de direitos individuais, dignidade, desenvolvimento integral, protecção, direito de alimentos, como pressupostos do direito `a vida, e acautelando os superiores interesses da menor C…, em obediência ao estipulado na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das criança – Art.º 3.º.
L- A Sentença em crise, ao apenas se basear nas alíneas b) e c), denega-se de julgar a fixação de alimentos, violando-se assim o art.º 668.º, n.º 1, alíneas b) e d) e 712.º, N.º 1, alíneas b) e c) do CPC, em contradição com a jurisprudência recente e dominante, cfr. Ac. da Relação de Lisboa de 19/02/2009, Proc. n.º 11244/08 8.ª Secção, in www.dgsi.pt., na qual se estipulou que:
M- “I – Independentemente da situação económica do progenitor a quem o menor não fique confiado, deverá sempre ser fixada uma determinada quantia a título de pensão de alimentos a que aquele esteja obrigado.
N- II – A questão da possibilidade de o progenitor poder cumprir com tal obrigação apenas se coloca, logicamente, após definição daquela.
O- III- Só deste modo, será tal prestação exigível, logo que o progenitor alcance uma situação financeira que o torne apto a assegurar a mesma.
P- IV- Tal fixação de alimentos é igualmente fundamental para que, em caso de incumprimento do progenitor, possa ser desencadeada a intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores”.
Q- Violando assim, os art.ºs melhor identificados em 7 e que aqui se transcrevem - designadamente, os art.ºs 150.º da OTM e art.º 1878.º e 2004.º do CC, bem como, viola o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado, art.º 13.º, 26.º, e 36.º, n.ºs 4 e 5.º da CRP, bem como, o art.º 668.º n.º 1 alínea b) e d) e 712.º , n.º 1 alineas b) e c) do CPC, nulidade essa que expressamente se invoca.
R- Pois a ser assim, qualquer pessoa teria filhos irresponsavelmente, e jamais seria chamado a provir ao seu sustento, com base na sua ausência em parte incerta, irresponsabilidade ou na impossibilidade de serem aferidas as suas condições económicas.
S- Ao não decidir da fixação de uma quantia concreta a título de pensão alimentícia da menor, viola, desde já, o princípio de proibição de “non liquet”, pois, efectivamente, ao não decidir ignora tal necessidade de fixação.
T- Assim sendo, é entender da Apelante, que a presente sentença é nula na parte que não fixa alimentos à menor C…, nos termos do art.º 668.º, n.º 1 alíneas b) e d) e 712.º, n.º 1 alíneas b) e c), bem como, são violados, os art.ºs 150.º da OTM e art.º 1878.º e 2004.º do CC, e se viola o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado, art.º 13.º, 26.º, e 36.º, n.ºs 4 e 5.º da CRP, bem como, o art.º 668.º n.º 1 alínea b) e d) do CPC, nulidade essa que expressamente se invoca, devendo a mesma ser revogada nessa parte, porque omissa, revogada e ser substituída por outra que fixe uma prestação alimentar a favor da Menor, em termos que o Tribunal a quo considere equitativos sobre as necessidades da menor, condenando-se o Requerido Progenitor a pagá-la à menor.

Termos em que deve conceder-se integral provimento ao presente recurso interposto pela recorrente, revogando-se a sentença na parte de ausência de fixação de alimentos, modificando-se a decisão da Primeira Instância e, em consequência, passar da mesma a constar a fixação de uma pensão alimentícia a favor da Menor C…, por ser de inteira e Sã JUSTIÇA.”

O Exmo Magistrado do Ministério Público respondeu pela improcedência da apelação.

Corridos os vistos cumpre decidir.

3) – Na sentença recorrida vem julgada provada a seguinte factualidade:
a) A menor C… é filha de D… e de B….
b) Nasceu em 28 de Junho de 2006 e é natural da freguesia ….
c) Os progenitores não são casados entre si, tendo mantido uma relação de namoro, rompendo a relação de forma definitiva quando a menor tinha cerca de um ano e seis meses.
d) Após a separação do casal, a menor ficou a residir com a progenitora que tem assegurado a prestação de cuidados, a satisfação das necessidades básicas de alimentação, saúde e conforto.
e) O requerido/progenitor foi residir para Espanha, fazendo dois contactos por ano com a menor, coincidentes com as alturas em que se desloca a Portugal.
f) A menor mantém convívio com os avós e tios paternos.
g) Após a separação, o requerido/progenitor nunca contribui a qualquer título para o sustento da menor.
j) A progenitora integra, juntamente, com a filha o agregado da avó materna, do qual ainda faz parte um tio materno da menor, ocupando um imóvel de construção muito antiga, com graves deficiências de conservação.
l) A progenitora não exerce actividade remunerada, recebendo RSI, no valor mensal de € 284.29, a que acresce a pensão de reforma da avó materna de € 416.84, o subsídio por doença do tio materno, de € 1.001.00 e o rendimento proveniente da prestação familiar da menor, no montante de € 42.23.
m) Como despesas fixas mensais o agregado familiar apresenta 20,00 Euros de renda de casa, € 28.00 relativos a consumos de electricidade e água, € 40.00 de TVcabo e Internet, € 25.00 de fraldas e as respeitantes à alimentação, vestuário e calçado.
n) A progenitora mantém há cerca de um ano e quatro meses uma relação de namoro, perspectivando constituir família com o namorado.
o) A menor sofre de anemia, sendo acompanhada na consulta de hematologia no Centro Hospitalar ….
p) A menor é também acompanhada na consulta de Desenvolvimento e aguarda o início das sessões de terapia da fala.
r) A menor e a progenitora interagem de forma adequada e demonstram sentimentos de afectividade recíprocos.
s) É desconhecido o actual paradeiro do requerido/progenitor.

4) Perante o teor das conclusões cumpre apreciar se
a) deve ser modificada a decisão de da matéria de facto,
b) se a sentença é nula e
c) se deve ser fixada prestação alimentar a cargo do requerido.

5) – Quer a recorrente o afastamento da matéria de facto da referência ao apoio (material) do tio materno que integra/integrava o agregado familiar da avó materna da menor e que o mesmo encontrava de “baixa” percebendo o subsídio de € 1001,00.

E quer que este tribunal indague junto da segurança social da data em que termina a “baixa” e o subsídio.
O que a apelante nesse sentido requer (conclusão E) revela alguma confusão quanto à normal tramitação do processo. Não é nesta fase de recurso que o tribunal vai indagar do que quer que seja da situação patrimonial do agregado familiar em que se integra a menor, nomeadamente do tempo de recebimento do subsídio de doença do seu tio materno (e mesmo sem que se veja nessa pretensão efeito útil). Se a apelante entendia relevante a informação da Segurança Social, não se vê dificuldade, com a intervenção do tal tio da menor, na obtenção da informação e, se não prestada, devia ser junto do tribunal recorrido, na fase da instrução ou antes, que a (ora) apelante devia tê-lo requerido. O processo tem regras que devem ser observadas (mesmo estando no âmbito da jurisdição voluntária) e, também por isso, é que as partes são assistidas por advogados, para mais eficazmente possam fazer valer os seus direitos.
O certo é que tio materno da menor fazia parte do agregado familiar e recebia subsídio de baixa por doença e, como a apelante reconhece (conclusão E) tinha apoio do mesmo (o que é normal acontecer em contributo para custeio das despesas do agregado familiar da avó materna da menor em que o mesmo se integrava).
Acresce que na sentença, em matéria de facto, também se não afirma esse apoio (o que, desde logo, implicaria nada haver a modificar), mas apenas “a progenitora não exerce actividade remunerada, recebendo RSI, no valor mensal de € 284.29, a que acresce a pensão de reforma da avó materna de € 416.84, o subsídio por doença do tio materno, de € 1.001.00 e o rendimento proveniente da prestação familiar da menor, no montante de € 42.23” – al. l) da matéria de facto. A referência ao apoio do tio materno é feita na discussão quando se afirma “a requerida progenitora encontra-se desempregada, recebe rendimento social de inserção e conta com o apoio económico da avó e do tio maternos”, o que, como se disse, é normal, na medida em vivem na mesma casa (da avó) com natural partilha das despesas.

Por outro lado, quer do Relatório da Segurança Social quer da sentença não resulta que o apoio do tio materno seja para sempre. Ocorre enquanto dura e (como reconhecido pela apelante), na data do relatório, da sentença, e mesmo na data das doutas alegações, esse apoio verificava-se, como a apelante acaba por reconhecer (conclusão E).
Vir, na fase de recurso, impugnar o Relatório Social, e quando se reconhece a referida realidade, na data em que foi elaborado e junto, é extemporâneo e inconsequente.
Nenhuma razão se aduz para censurar a decisão de facto, enquanto espelha a situação à data em que foi proferida.
O que implica manter-se a decisão, nesse aspecto.

6) – Quanto à alegada nulidade por omissão de pronúncia na não fixação de uma prestação alimentar.
Analisando o teor da sentença, não vemos como é possível suscitar-se tal nulidade, quando nela expressamente se diz (conhecendo da questão) que não se fixa uma prestação alimentar e se apontam as razões para assim decidir.
A nulidade prevista no artigo 668º/1, d), do CPC (omissão de pronúncia), é a sanção para a violação do disposto no artigo 660º/2, quando impõe que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras).
São questões completamente diferentes a omissão de pronúncia (nulidade – vício da sentença), que acontece quando, de todo, o tribunal não aprecia ou conhece de questão colocada pelas partes (já que a causa deve ser decidida nos limites por elas fixado), e outra, bem diversa, é o erro de julgamento, quando na decisão ocorre deficiente aplicação da lei, por errada indagação e interpretação, ou incorrecta subsunção dos factos à lei.
Uma coisa é a discordância da decisão porque se entende que, na situação, outro deveria ser o sentido da mesma, em conformidade com os comandos legais. O tribunal decidiu; só que decidiu mal. Outra, bem diferente, é a censura que se faz á sentença por ela omitir decisão quanto a uma questão colocada ao tribunal para apreciação. Nesse caso, na correcção da imputação do vício, o juiz simplesmente não apreciou a questão.

Ora, na sentença impugnada pondera-se “atendendo aos gastos normais com o sustento, habitação e educação de uma criança de quatro anos, tendo ainda em conta o nível socio-económico que a envolve, temos por adequado ao seu desenvolvimento a quantia de pelo menos 150,00 Euros (€ 75.00).
A requerida progenitora encontra-se desempregada, recebe rendimento social de inserção e conta com o apoio económico da avó e do tio maternos.
Não obstante, revela-se inexequível a estipulação de uma pensão de alimentos a cargo do progenitor, pois que se desconhece o seu actual paradeiro.
Na verdade, no caso, desconhecemos se o requerido exerce qualquer actividade e se tem rendimentos, ou seja, não foi possível apurar tais elementos devido ao desconhecimento do seu paradeiro, pelo que, a fim de obstar a violação do citado art. 2004º do C.C., não se fixa a prestação de alimentos, sem prejuízo de ulterior fixação”

A sentença é clara. Sem permitir dúvida, pronuncia-se quanto à obrigação de alimentos do progenitor à menor, mas não fixa prestação alimentar concreta a pagar pelo requerido por se desconhecer a sua situação económica, nomeadamente se aufere qualquer rendimento, desconhecendo-se mesmo o seu paradeiro.
O tribunal conhece da questão do alimentos, só que não a resolve a contento da apelante, porque não sabe se o requerido tem rendimentos e assim possibilidade de pagar qualquer prestação (por desconhecer as possibilidades do mesmo) e, na eventualidade de se fixar uma prestação, poder violar-se o disposto no artigo 2004º/1 do CC (quando estabelece que os alimentos devem ser fixados de acordo com as possibilidade de quem deva prestá-los).
O tribunal decidiu de determinado modo e diz porque assim decide, não só conhecendo da questão como fundamentando a decisão adoptada.

A apelante pode discordar da decisão se, no seu entender e perante a lei aplicável, outra deveria ser a solução, nomeadamente que acolhesse a sua pretensão.
Mas de modo nenhum tem fundamento para qualificar a sentença como nula por omissão de pronúncia.
Improcede a questão.

7) – Da verdadeira questão colocada no recurso – se devem ser fixados alimentos à menor C…, a pagar pelo requerido, em prestação quantificada, não obstante se desconhecer o paradeiro do progenitor e não se apurar qual a sua situação económica.
A questão tem merecido diferentes soluções, havendo, no entanto, uma inclinação jurisprudencial consideravelmente maioritária na 2ª Instância[1] (e com uniformidade na jurisprudência recente no STJ[2]) que entende que deve ser fixada uma prestação alimentar, no que aqui interessa, a cargo do progenitor que não tem a guarda do filho menor, mesmo quando se desconhece quais os seus rendimentos (ou se os tem) ou não lhe são conhecidos rendimentos, e mesmo o seu paradeiro (como sucede no caso destes autos, em atenção ao que do processo consta ..).
Sem que se desconheça a posição e argumentação em sentido diverso[3] e os seus fundamentos, mas que, reconhecendo-se o valor da argumentação, inclinámos pela posição que entende dever fixar-se uma prestação alimentar, quando em causa o filho menor, dada a sua relação, a filiação estabelecida, com o progenitor, a natureza das responsabilidades parentais e os direitos/deveres que aos progenitores cabem. Solução com suporte legal no disposto nos artigos 1877º, 1878º, 1882º e 1917º do CC, 36º/3 e 5, da CRP, e 27º/2 da Convenção Sobre os Direitos da Criança, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República 20/90, de 8 de Junho, publicada no Suplemento do DR, de 12 de Setembro de 1990).
A não ser naquelas situações em que demonstrada esteja a completa impossibilidade do progenitor suportar uma prestação alimentar, sem se desconsiderar que, a não se tratar de situações definitivas e irreversíveis, modificando-se a situação de facto, modificável é a decisão atinente aos alimentos (estando-se no âmbito da jurisdição voluntária e porque os alimentos dependem, em primeira linha, da necessidade do alimentando e, por regra, da possibilidade do devedor dos alimentos, uma e outra não imutáveis). O que não é o caso dos autos. Nada consta quanto à completa impossibilidade do requerido poder suportar uma prestação alimentar à filha.
E não apenas por havendo instituição pública (FGADM), que “acessoriamente” pode ser chamada a suportar o encargo com os alimentos devidos ao menor, não cobrados do progenitor onerado, se tornar necessária a condenação deste nessa prestação, e assim, ao nenhuma ser fixada, por não se conhecerem rendimentos ao progenitor ou mesmo se desconhecer o seu paradeiro, gerarem-se situações de desigualdade, colocando-se os filhos a quem se não fixam alimentos impedidos de recorrer ao FGDAM e, assim, em desvantagem em relação aos que, na mesma situação de carência, vêem fixada tal prestação (mas não paga por não conseguirem obter a sua cobrança e, daí, o recurso ao Fundo de Garantia)).
Pois que, e não obstante o que se estabelece em 1º da Lei 75/98, de 19 de Novembro, não temos por indiscutível que o titular do direito aos alimentos, não possa recorrer directamente ao FGDAM, demonstrando a impossibilidade de obter uma concreta prestação do progenitor (mesmo que tenha de o demandar conjuntamente).
Embora não se deva afastar, mas considerar, as consequências de diverso entendimento (que vem sendo adoptado) e, nesse caso, do obstáculo que seria, para acesso ao FGADM, a abstenção da fixação duma concreta prestação alimentar (agravando a situação de carência de quem, também pelo sua própria condição, de modo nenhum pode prover ao seu sustento, não obstante ter direito aos alimentos, mas que se deixaria sem satisfação).

Os pais têm o dever de alimentar os filhos e estes um direito a que aqueles lhe satisfaçam essas necessidades, que não se resumem ao sustento, vestuário e habitação. Não se olvidando que o artigo 2004º do CC apenas prevê as condicionantes da fixação do quantum dos alimentos, nas situações comuns, e não propriamente os pressupostos do direito a alimentos. E, para a medida dessa obrigação (bem mais ampla quando está em causa a obrigação alimentar dos pais aos filhos, como decorre dos artigos 2003º/2, 1878º/1 e 1880º do CC), na determinação das “possibilidades” do obrigado a prestar alimentos, não tem de atender-se apenas às possibilidades efectivas actuais, ou seja, aos rendimentos e bens efectivamente existentes no património do obrigado, no momento da fixação da prestação, mas também à capacidade, disponibilidade e possibilidade do progenitor os obter, dado lhe ser exigível que, não impossibilitado de trabalhar, diligencie por trabalho e obtenção de rendimentos para poder criar os filhos[4]. Quando está em causa a obrigação de alimentos ao filho, há um dever acrescido de prover ao seu sustento e daí também a exigência de maior emprenho na angariação dos meios necessários, de acordo com a sua condição e capacidades. Os direitos e deveres dos progenitores, nessa qualidade, são irrenunciáveis e de cujo exercício não podem ser dispensados (o que, em certa medida, acabaria por acontecer ao não se onerarem com esse encargo efectivo), sabendo-se que o direito a alimentos é irrenunciável e indisponível (artigo 2008/1 do CC), o que decorre do interesse e ordem pública da obrigação de alimentos de tal ordem que afasta a validade da renúncia[5], pois que os alimentos visam a satisfação de necessidades à conservação da vida, que é um direito inalienável[6]. E, como escreve Remédio Marques[7], “os direitos deveres dos progenitores para com os menores são sempre devidos, independentemente dos recursos económicos e do estado de carência económica dos filhos, posto que se trata de direitos cujo exercício é obrigatório e prioritário em atenção à pessoa e interesses do menor” e, continua, “na nossa opinião, não tem aplicação nestas eventualidades, o disposto no art. 2004º/1 do CC, de harmonia com o qual, e ao derredor do princípio da proporcionalidade, se deve atender às possibilidade económicas do devedor, para o efeito de fixar a obrigação de alimentos. Donde, faz-se mister fixar-se sempre uma prestação de alimentos a cargo de um ou de ambos os progenitores, mesmo quando estes estejam desempregados e não tenham meios de subsistência. Não se esqueça que … a capacidade de trabalho é um elemento atendível na fixação da obrigação, mesmo que se esteja temporariamente sem trabalho”.

Neste sentido, e considerando a jurisprudência maioritária, com uniformidade (ao menos da mais recente) jurisprudência do STJ (como já se referiu), na presença do disposto no artigo 8º/3 do CC (uniformidade da interpretação e aplicação da lei, quanto às situações que mereçam tratamento análogo), porque nenhum facto se provou que indiciasse que o progenitor da menor se encontra impossibilitado de trabalhar e obter rendimentos e, indicando-se viver em Espanha, visitando a filha duas vezes por ano quando vem a Portugal (desconhecendo-se se, de propósito, com esse fim), não é excessivo presumir que, para tanto, dispõe de meios económicos para ali viver e fazer essas deslocações, impõe-se determinar o valor da prestação com que deve contribuir para o sustento da filha.

Cabe “primacialmente aos pais e às pessoas que têm a criança a seu cargo a responsabilidade de assegurar, dentro das suas possibilidades e disponibilidades económicas, as condições de vida necessárias ao desenvolvimento da criança” (artigo 27º/2 da Convenção sobre os direito da Criança). E, como decorre do artigo 36º/5 da Constituição, os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos, “dever que surge constitucionalmente autonomizado como dever fundamental e de cujo feixe de relações a prestação de alimentos é o elemento primordial”. Como se afirma no referido Ac. STJ[8], de 12/07/2011, o “fundamento sociológico e jurídico da obrigação de alimentos radica-se na natureza vital e irrenunciável do interesse, juridicamente, tutelado, que tem subjacente a responsabilidade dos pais pela concepção e nascimento dos filhos, independentemente da relação afectiva e do convívio, realmente, existente entre o progenitor não guardião e os filhos, a ponto de permanecer intacta, na hipótese do mais grave corte da relação entre ambos, como acontece com a situação de inibição do exercício do poder paternal, que “em nenhum caso isenta os pais do dever de alimentarem o filho”, como decorre do estipulado pelo artigo 1917º, do Código Civil” e é “esta específica natureza de obrigação fundamental que permite compreender que, na fixação judicial dos alimentos devidos, o tribunal deva ter presente, não apenas, de forma redutora, o estrito montante pecuniário auferido pelo devedor de alimentos, em certo momento temporal, mas, de forma ampla e abrangente, toda a situação patrimonial e padrão de vida deste, incluindo a sua capacidade laboral futura, estando, obviamente, compreendido, no dever de educação e sustento dos filhos, a obrigação do progenitor de, activamente, procurar exercitar uma actividade profissional geradora de rendimentos, que lhe permita o cumprimento mínimo daquele dever fundamental.
Ao fixar a medida dos alimentos devidos a menores, adequando-os aos meios de quem houver de prestá-los, não pode o tribunal limitar-se a atender ao valor actual dos rendimentos, no momento e, conjunturalmente, auferidos pelo obrigado, devendo antes valorar, de forma global e abrangente, a sua condição social, a sua capacidade laboral e todo o acervo de bens patrimoniais de que seja ou possa vir a ser detentor.”

Na decisão a tomar não deve esquecer-se que em causa está o superior interesse da menor (a cuja satisfação devem ser orientadas as decisões relativas a menores), não sendo afastável a comprovada necessidade desta a que lhe sejam prestados alimentos pelo progenitor não guardião (o requerido).
Nem é legítimo supor-se que o pai da C… não saiba das necessidades da filha, para cuja satisfação tem o dever legal e natural de contribuir, e saber da dificuldade/impossibilidade da mãe acorrer, de forma satisfatória, a essas necessidades com os rendimentos de que dispõe. Sabendo dessas necessidades, como não pode deixar de saber, até porque visita a filha duas vezes por ano (al. e) da matéria de facto), remete-se a uma atitude ilegítima de incumprimento do que lhe é devido, já que, como consta da l. g) da matéria de facto, desde a sua separação da mãe da menor, nunca contribuiu a qualquer título para o sustento da filha.

Nem consta que alguma vez tenha demonstrado ou alegado impossibilidade de poder cumprir essa obrigação, como, numa atitude eticamente responsável, lhe competia no caso dela se verificar. “Pelo que a sua completa e censurável desresponsabilização não pode, de modo algum, beneficiá-lo, eximindo-o ao cumprimento de uma obrigação jurídica que decorre automaticamente (…) da sua inalienável qualidade pessoal de progenitor”[9].

Se, por um lado, não decorre da factualidade provada a absoluta impossibilidade do progenitor prestar os alimentos (cumprindo um dever fundamental), por absoluta incapacidade de obter rendimentos, por outro, não vemos motivo para o desonerar de tal encargo, deixando sem protecção a menor. Pedida a prestação alimentar, e afastada a demonstração de uma tal impossibilidade, deve ser fixada uma prestação alimentar “em efectivação e concretização do direito de que goza o respectivo titular”. Acrescendo, como se afirma em Ac. STJ[10], “a ausência do pai que se exime à sua responsabilidade, abandonando e desinteressando-se da sorte do filho, em manifesta violação dos direitos-deveres que sobre si impendem, não poderá aproveitar-lhe para, em sede da concretização da medida dos alimentos, se exonerar da respectiva obrigação.
O abandono, puro e simples, com desprezo pelos direitos e deveres que a condição de progenitor encerra, não pode, sem mais, fazer-se equivaler ou justificar, do ponto de vista da tutela dos interesses em jogo, o reconhecimento da incapacidade de acudir às necessidades alimentares do filho, sob pena de se deixar vazio de conteúdo o aludido direito-dever fundamental de educação e manutenção dos filhos, não separados dos pais”.

Na situação concreta, verifica-se que o progenitor que não tem a guarda da menor, pura e simplesmente, se alheia das necessidades desta, sem que esse alheamento se veja ser resultado de qualquer dificuldade do seu concurso para o sustento daquela, até porque, e já se disse, indicando-se viver em Espanha e visitando, no ano, duas vezes a menor, alguns meios se presume ter para lhe possibilitar essa vida. Se, por um lado, essa conduta configura uma grave violação dos direitos-deveres para com a filha, por outro, seria uma forma fácil de obstar à imposição de uma contribuição para o sustento desta o simples apelo ao desconhecimento das possibilidades económicas do requerido, pelo desconhecimento do seu paradeiro, facilmente podendo o progenitor não guardião contornar a determinação legal, indiferente á sorte da filha, colocando-se em parte incerta.
“O tribunal deve fixar prestação alimentar a favor do menor, a suportar pelo progenitor, mesmo quando o paradeiro e condições sócio-económicas deste se desconheçam”[11].
Impõe-se a concretização da medida alimentar a cargo do requerido.

A mãe da menor, no pedido de regulação do poder parental, requereu uma prestação de € 175.
Na sentença ponderou-se uma despesa da menor de cerca de € 150.
Que, nas alegações se não censura.
Valor que se não vê excessivo mas modesto.
Beneficia a apelante do RSI de 284,29, acrescidos da prestação familiar da menor de € 42,233.
Beneficia a apelante também da ajuda da sua mãe, em cuja casa vive (em economia de escala), embora também bem modesta seja a sua pensão de reforma (€ 416,84) e, transitoriamente, da ajuda de um tio da menor (cfr. al. l) da matéria de facto). Tem-se em atenção que é a mãe (apelante) que dedica tempo, esforço e preocupação com a prestação dos necessários cuidados à filha.
Não só em consideração das que, quantificadas, vêm assentes em m) da matéria de facto, como das despesas com alimentação calçado e vestuário, as necessidades da menor superarão seguramente os referidos € 150,00.
Desconhecem-se os rendimentos do progenitor, havendo que, com cautela e moderação, atender, pelo menos, a um valor correspondente à remuneração mínima garantida que, actualmente, é de €485,00.
Deste modo, mesmo que se atenda apenas àquele valor das despesas da menor, e em atenção aos rendimentos do agregado familiar em que se integra a menor, temos por equitativa e adequada, em consideração da situação de facto conhecida, a prestação € 100,00 desde o pedido, actualizada para € 120,00, a partir da data desta decisão.
Prestação devida desde o pedido (propositura da acção).
Para ser paga até ao dia oito do mês a que respeita.
Sendo as prestações vencidas a pagar, juntamente com as vincendas, em valor de € 40,00 mensais.

Em síntese – mesmo quando se desconhecem as condições sócio-económicas do progenitor que não tem a guarda do filho menor, e mesmo que se não saiba do seu paradeiro, deve ser fixada uma concreta prestação alimentar a favor deste.

8) - Pelo exposto, acorda-se neste tribunal da Relação do Porto em julgar a apelação procedente e, em consequência, fixa-se em € 100,00 mensais, alterada para € 120,00 mensais, a prestação a pagar pelo requerido à menor, sua filha, e a ser paga nos termos atrás definidos.
Custas pelo requerido.

Porto, 15 de Novembro de 2012
José Manuel Carvalho Ferraz
António do Amaral Ferreira
Ana Paula Fonseca Lobo
________________
[1] Entre muitos outros, cfr. da RP, de 27-06-2011, proc. 1574/09.6TMPRT.P1, de 21-06-2011, 1438/08.0TMPRT.P1, de 23-04-2012, proc. 1480/11.4TMPRT.P1; de 12-04-2012, proc.1659/11.9TMPRT.P1 (em que interveio, como adjunto, o ora relator); da RL, de 25-10-2011, proc. 3653/08.8TBAMD.L1-1, de 08-11-2011, proc. 4519/08.7TBAMD.L1-7, de 09-11-2010, proc. 6140/07.8TBAMD.L1-1, de 05-07-2007, proc. 3865/08.4TBAMD.L1-7; da RG, de 08-11-2011, proc. 4396/10.8TBGMR.G1, de10-11-2011, proc. 4483/07.0TBGMR-A.G1, de 20-10-2011, proc. 56/11.0TBGMR.G1.
[2] Cfr. Acs. 27/09/2011, proc. 4393/08.3TBAMD.L1.S1; 29/03/2012, proc. 2213/09.0TMPRT.P1.S; 15/05/2012, proc. 2792/08.0TBAMD.L1.S1; de 22/05/2012, proc. 5168/08.5TBAMD.L1.S1, todos em www.dgsi.pt
[3] Cfr., por exmplo, Acs.RL, de 06-12-2011, 3464/08.0TBAMD.L1-6, de 17-09-2009, 5659/04.7TBSXL.L1-2; de 05-05-2011, 4393/08.3TBAMD.L1-2, e da RP, de 29/11/2011, proc. 2213/09,0TMPRT.P1 (estes últimos vieram a ter decisão diversa em recurso no Supremo Tribunal de Justiça – ver nota anterior). Todos os Acs. referidos em www.dgsi.pt.
[4] Cfr. Acs. do STJ, de 11/12/2009, proc. 110-A/2002.L1.S1, de 12-07-2011, proc. 4231/09.0TBGMR.G1.S1, no mesmo sítio da net.
[5] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, vol. V, p. 589.
[6] Cfr. Eduardo dos Santos, Direito da Família, p. 643.
[7] Em “Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a menores)”, 2ª edição, 72
[8] De 12/07/2011, proc. 4231/09.0TBGMR.G1.S1
[9] Ver Ac. RL, de 10/05/2011, proc. 3823/08.9TBAMD.L1-7.
[10] De 15/05/2012, proc. 2792/08.0TBAMD.L1.S.
[11] Citado Ac. do STJ, de 15/05/2012. Ver, em igual sentido e entre outros, Acs. STJ, 27/11/2011, 4393/08.3TBAMD.L1.S1, e de 22/05/2012, proc. 5168/08.5TBAMD.L1.S1; RP, de 21/06/2011, proc. 1438/08.0TMPRT.P1.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/8f30ab0d5c8d1d3e80257ac3003e6f7a?OpenDocument

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