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terça-feira, 29 de outubro de 2013

INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA RESIDÊNCIA - Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra - 16.10.2013


Acórdãos TRC
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
181/09.8PAVNO-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ORLANDO GONÇALVES
Descritores: INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA
RESIDÊNCIA
ESTRANGEIRO

Data do Acordão: 16-10-2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 1.º JUÍZO DO TRIBUNAL JUDICIAL DE TOMAR
Texto Integral: S

Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 318º CPP, 145º E 152.º, N.º 7 DA LEI Nº 144/99 DE 31 DE AGOSTO DE 1999

Sumário: 1.- Aceitando o Tribunal a quo, que se verificam os requisitos normativos que excecionalmente permitem a inquirição de testemunha fora do local onde territorialmente vai decorrer o julgamento, impunha-se afastar a regra geral e determinar a inquirição da testemunha nesse local;
2.- Existe violação das regras da interpretação da lei quando, verificando-se a situação excecional prevista na norma para a tomada de declarações fora do Tribunal da Comarca do julgamento, se indefere o requerimento invocando-se para o efeito a existência de uma norma que, como regra geral, impõe que as declarações sejam prestadas presencialmente na audiência de julgamento a realizar no Tribunal da Comarca onde este vai decorrer.


Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

Relatório

Por despacho de 20 de Dezembro de 2012, proferido pela Ex.ma Juíza do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Tomar, foi indeferido o requerimento da demandante A..., em que solicitava a inquirição, na Suíça, da testemunha B... , com recurso a meios de telecomunicação em tempo real ou, na indisponibilidade destes, mediante carta rogatória a expedir para as autoridades judiciárias helvéticas.

Inconformado com o douto despacho dele interpôs recurso a demandante A..., concluindo a sua motivação do modo seguinte:
1.º Ao indeferir o requerimento da demandante, ora recorrente, apresentado, via fax, em 03-12-2012 (carimbo de entrada de 05-12-2012), na parte relativa ao pedido de inquirição da testemunha B..., na Suíça, o Tribunal a quo violou os artigos 318.º, n.º1 e n.ºs 5 a 7.º, 124.º, n.º2 125.º, 340.º, n.º1 e 323.º-a) e b), todos do C.P.P.
2.º Violou, igualmente, por omissão de aplicação, o regime instituído pela Lei n.º 144/99, de 31-08, bem como os princípios da Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo e Protocolos Adicionais.
3.º Essa violação decorreu da circunstância de ter interpretado tais normativos, em conjugação com o artigo 317.º, n.º1 do C.P.P., no sentido estrito de que – apesar de a recorrente ter fundamentado o aludido requerimento em realidade perfeitamente enquadrável no regime do citado artigo 318.º, n.ºs 1 e 3 do C.P.P. e suficientemente justificadora dos mecanismos processuais excecionais consagrados nos n.ºs 5 a 7 e nos diplomas referenciados na anterior conclusão 2.º - não seria possível inquirir a testemunha na Suíça, impondo a sua presença no Tribunal Judicial de Tomar.
4.º Deveria tê-los interpretado em sentido contrário. Precisamente no sentido de que, ante a verificação de todos os requisitos necessários à aplicação do regime consagrado no artigo 318.º, a regra da presencialidade poderá/deverá ser excecionada.
5.º Nesta conformidade, deverá o presente recurso obter provimento, determinando-se a revogação do despacho recorrido e a sua substituição por um outro que defira o requerimento da recorrente e ordene a inquirição da testemunha B... na Suíça, nos termos do artigo 318.º, n.ºs 5 a 7 do C.P.P. em conjugação com o regime instituído pela Lei n.º 144/99, de 31-08, e com os princípios orientadores da Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo e Protocolos Adicionais.

O Ministério Público na Comarca de Tomar respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção integral da sentença recorrida.

A Ex.ma Procuradora-geral adjunta neste Tribunal da Relação apôs o seu visto.

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P..

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação

O despacho recorrido tem o seguinte teor:
« (…)
Quanto à testemunha B..., não obstante as razões aí aduzidas pelo Distinto Advogado da demandante, a verdade é que a regra é serem ouvidas presencialmente as testemunhas conforme o dispõe 317º/1 do CPP, no decurso da audiência de julgamento.
Pelo que o requerido vai indeferido, devendo a testemunha encontrar-se presente a fim de ser ouvida.
Notifique.».
*
O requerimento sobre o qual recaiu o despacho tem, por sua vez, na parte com interesse para a decisão da causa, o seguinte teor:
« A..., demandante nos autos de processo comum singular supra referenciados, tendo sido notificada da devolução das convocatórias dirigidas ás testemunhas que subsequentemente se identificam, vem expor e requerer o seguinte:
A) – Quanto à testemunha B...:
1 – Encontra-se a residir, a título permanente na Suíça, para onde se viu obrigada a emigrar, tendo fixado nesse país a sua vida familiar e profissional, não sendo previsível o seu regresso a Portugal nos tempos mais próximos.
2 – Embora a sua presença na audiência não seja essencial à descoberta da verdade, o seu depoimento já o é, em virtude de ter conhecimento directo e pessoal dos factos alegados nos arts. 8.º a 87.º e 95.º a 99.º do PIC.
3 – Como é óbvio, a sua eventual deslocação a Portugal exclusivamente com o propósito de ser inquirida, causar-lhe-ia graves prejuízos económicos, dificuldades e inconvenientes, quer sob o ponto de vista pessoal, profissional, decorrentes, fundamentalmente, não apenas das despesas implicadas na viagem, mas, igualmente, da ausência ao trabalho e inerente risco de despedimento, face à precariedade da sua condição de emigrante.
4 - Com fundamento no exposto, requer-se:
4.1 - Que, ao abrigo dos acordos de cooperação internacional e europeia em matéria penal, em conjugação com o disposto no artigo 318.º, n.ºs l e 5, com as necessárias adaptações, seja a mencionada testemunha inquirida, à matéria indicada no ponto 2, com recurso a meios de telecomunicação em tempo real, ou, na indisponibilidade destes, mediante carta rogatória a expedir para as autoridades judiciárias helvéticas.
4.2 – Que, para efeitos de concretização do requerido no ponto anterior, seja atendida a morada da testemunha na Suíça que ora se indica: Av. De la Granada n.º10, CH-1207 Geneve Suíça.».

*
*

O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação. ( Cfr. entre outros , os acórdãos do STJ de 19-6-96 [1] e de 24-3-1999 [2] e Conselheiros Simas Santos e Leal Henriques , in Recursos em Processo Penal , 6.ª edição, 2007, pág. 103).
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar [3], sem prejuízo das de conhecimento oficioso .
No caso dos autos, face às conclusões da motivação da recorrente A... a questão a decidir é a seguinte:
- se o despacho recorrido, ao indeferir o requerimento para inquirição da testemunha na Suíça, com recurso a meios de telecomunicação em tempo real, ou, na indisponibilidade destes, mediante carta rogatória, violou os artigos 318.º, n.º1 e 5 a 7, 124.º, n.º2 , 125.º, 340.º, n.º1 e 323.º- a) e b), todos do C.P.P. e, por omissão de aplicação, o regime instituído pela Lei n.º 144/99, de 31-08, bem como os princípios da Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo e Protocolos Adicionais, pelo que deve ser revogado e substituído por outro despacho que defira o requerimento da recorrente.
-
Passemos ao conhecimento da questão.
Resulta do art.317.º, n.º1, do Código de Processo Penal, que designado dia para audiência de julgamento, as testemunhas, os peritos e os consultores técnicos indicados por quem se não tiver comprometido a apresentá-los na audiência, são notificados para comparência.
O art.318.º do Código de Processo Penal, estabelece, por sua vez, o seguinte:
« 1 - Excepcionalmente, a tomada de declarações ao assistente, às partes civis, às testemunhas, a peritos ou a consultores técnicos pode, oficiosamente ou a requerimento, não ser prestada presencialmente, podendo ser solicitada pelo presidente ao juiz de outra comarca, por meio adequado de comunicação nos termos do artigo 111.º; se:
a) Aquelas pessoas residirem fora da comarca;
b) Não houver razões para crer que a sua presença na audiência é essencial à descoberta da verdade; e
c) Forem previsíveis graves dificuldades ou inconvenientes, funcionais ou pessoais, na sua deslocação.
2 - A solicitação é de imediato comunicada ao Ministério Público, bem como aos representantes do arguido, do assistente e das partes civis.
3 - Quem tiver requerido a tomada de declarações informa, no mesmo acto, quais os factos ou as circunstâncias sobre que aquelas devem versar.
4 - A tomada de declarações processa-se com observância das formalidades estabelecidas para a audiência.
5 - A tomada de declarações realiza-se em simultâneo com a audiência de julgamento, com recurso a meios de telecomunicação em tempo real.
6 - No caso previsto no número anterior, observam-se as disposições aplicáveis à tomada de declarações em audiência de julgamento. Compete, porém, ao juiz da comarca a quem a diligência foi solicitada praticar os actos referidos nos artigos 323.º, alíneas b, primeira parte,) d) e e), e 348.º, n.º3.
7 - Fora dos casos previstos no n.º 5, o conteúdo das declarações é reduzido a auto, sendo aquelas reproduzidas integralmente ou por súmula, conforme o juiz determinar, tendo em atenção os meios disponíveis de registo e transcrição, nos termos do artigo 101.º.».
Da conjugação destas disposições legais resulta que, como regra, designado dia para a audiência de julgamento, as testemunhas devem comparecer na audiência de julgamento, para aí ser inquiridas.
È na audiência de julgamento que existe a desejável oralidade e imediação na produção de prova, na recepção directa de prova e se assegura o princípio do contraditório, garantido constitucionalmente no art.32.º, n.º5.
Só os princípios da oralidade e imediação «… permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível a credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais.».[4]
Sendo esta a regra, o art.318.º do Código de Processo Penal, admite excepções à mesma.
Assim, o Tribunal pode prescindir da presença do assistente, das partes civis, das testemunhas, dos peritos e dos consultores técnicos, na audiência onde decorre o julgamento, se se verificarem três requisitos, cumulativos:
- Aquelas pessoas residirem fora da comarca;
- Não houver razões para crer que a sua presença na audiência é essencial à descoberta da verdade; e
- Forem previsíveis graves dificuldades ou inconvenientes, funcionais ou pessoais, na sua deslocação.
Caso se verifiquem este requisitos, o Tribunal onde se procede ao julgamento e onde não residem aquelas pessoas, solicita ao “juiz de comarca” a tomada de declarações, que se realizará, preferencialmente, em simultâneo com a audiência de julgamento, com recurso a meios de telecomunicação em tempo real, competindo a este praticar os actos referidos nos artigos 323.º, alíneas b, primeira parte, d) e e), e 348.º, n.º3. Só não sendo possível a tomada de declarações nestes termos é que o conteúdo das declarações é reduzido a auto.
Se a pessoa cujas declarações se pretende ouvir reside não só fora da comarca, mas ainda no estrangeiro, cremos que não basta atender apenas ao disposto no art.318.º, n.º1 do Código de Processo Penal, designadamente aos requisitos aí exigidos, para se deferir a tomada de declarações, exigindo-se ainda o respeito das normas vigentes no regime português em matéria de cooperação judiciária em matéria penal.
Decorre do art.8.º da Constituição da República Portuguesa que as normas constantes de convenções internacionais que vinculem o Estado Português, assim como as normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte, têm recepção plena no direito português.
O princípio que enforma o regime da cooperação judiciária internacional no Direito Português é o da primazia das fontes normativas convencionais.
Os pedidos de auxílio judiciário em matéria penal, encontram-se previstos e regulamentados em normas convencionais e, subsidiariamente, na lei interna.
Em primeira linha, como norma de direito internacional que vincula o Estado Português, deve considerar-se a Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo, nomeadamente nos seus arts. 3.º a 6.º e 14.º a 20.º, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República nº 39/94 de 17 de Março de 1994 e ratificada por Decreto do Presidente da República, de 14 de Julho, publicada no Diário da República nº 161, I Série -A de 14 de Julho de 1994 e, ainda, o Protocolo adicional á mesma Convenção, aprovado para ratificação pela Resolução n.º 49/94 de 12.8. e ratificado por Decreto do Presidente da República, e de 12.8.1994, publicado no Diário da República n.º 186, I Série- A, de 12 de Agosto de 1994.
Em segunda linha, deve atender-se ao regime instituído pela Lei n.º 144/99 de 31 de Agosto de 1999, que regulamenta a Cooperação Judiciária Internacional em matéria penal.
Nos termos do seu art.3º, resulta que as formas de cooperação aí previstas regem-se pelas normas dos tratados, convenções e acordos internacionais e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições desse diploma, sendo subsidiariamente aplicáveis as disposições do Código de Processo Penal.
Na Lei n.º 144/99 de 31 de Agosto de 1999, importa aqui realçar a parte que versa sobre as questões do auxílio judiciário mútuo, constantes dos seus artigos 20.º a 30.º e 145.º a 152.º.
E, por fim, em tudo o que não está ali regulado, importa atender ao Livro V, do Código de Processo Penal, artigos 229.º a 240.º, em especial ao aqui estabelecido sobre a prevalência dos acordos e convenções internacionais e lei especial sobre as normas do Código de Processo Penal ( art.229.º) e à emissão de cartas rogatórias ( art.230.º).
Em matéria de auxílio judiciário em matéria penal, importa reter o art.145.º, da Lei n.º 144/99 de 31 de Agosto de 1999, que dispõe, designadamente, o seguinte:
« 1 - O auxílio compreende a comunicação de informações, de actos processuais e de outros actos públicos admitidos pelo direito português, quando se afigurarem necessários à realização das finalidades do processo, bem como os actos necessários à apreensão ou à recuperação de instrumentos, objectos ou produtos da infracção.
2 - O auxílio compreende, nomeadamente:
(…)
d) A notificação e audição de suspeitos, arguidos, testemunhas ou peritos;
(…)
3 - Quando as circunstâncias do caso o aconselharem, mediante acordo entre Portugal e o Estado estrangeiro ou entidade judiciária internacional, a audição prevista na alínea d) do n.º 2 pode efectuar-se com recurso a meios de telecomunicação em tempo real, nos termos da legislação processual penal portuguesa, sem prejuízo do disposto no n.º 10. »
O princípio geral de todas as modalidades de auxílio judiciário é, deste modo, o princípio da necessidade.
Especificamente, para a carta rogatória, o art.152.º, n.º 7 da Lei nº 144/99, estabelece como requisito, para a sua emissão, que ela seja necessária para a prova de algum facto essencial para a acusação e para a defesa.
Idêntica mesma redacção à deste art.152.º, n.º 7, da Lei nº 144/99, consta do art. 230.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Cremos que não viola o espírito da lei fazer-se uma interpretação extensiva dos artigos 152.º, n.º 7, da Lei nº 144/99, e 230.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, de modo a caber na letra da lei também a emissão de carta rogatória quando necessária para a prova de algum facto essencial para o pedido de indemnização civil.
A letra da lei é mais restrita que o seu espírito: o legislador minus dixit quam voluit.
Retomando o caso concreto, verificamos que a demandante A..., no seu requerimento para inquirição na Suíça da testemunha B..., alegou factos que considerou adequados ao preenchimento dos três requisitos a que alude o art.318.º, n.º1 do Código de Processo Penal, a que acrescentou ainda a essencialidade deste depoimento para a descoberta da verdade, uma vez que a testemunha tem conhecimento directo e pessoal dos factos alegados nos arts. 8.º a 87.º e 95.º a 99.º do Pedido de Indemnização Civil.
O despacho recorrido ao decidir que « Apesar de a recorrente ter fundamentado o aludido requerimento em realidade perfeitamente enquadrável no regime do citado artigo 318.º, n.ºs 1 e 3 do C.P.P. e suficientemente justificadora dos mecanismos processuais excecionais consagrados nos n.ºs 5 a 7 e nos diplomas referenciados na anterior conclusão 2.º », deixou claro, por um lado, que a realidade factual alegada no requerimento pela demandante é perfeitamente enquadrável no regime do citado artigo 318.º, n.ºs 1 e 3 do C.P.P. e, por outro, que essa realidade é suficientemente justificadora dos mecanismos processuais excecionais consagrados nos n.ºs 5 a 7 e nos diplomas referenciados na anterior conclusão 2.º , ou seja, nos acordos de cooperação internacional e europeia em matéria penal, pelo que a solução que se impunha era considerar afastada a regra da presencialidade na audiência de julgamento.
As normas interpretam-se umas pelas outras e é das regras da interpretação da lei, que as normas excepcionais afastam as normas gerais.
Aceitando o Tribunal a quo , mesmo sem exigir a produção de qualquer prova, que se verificam os requisitos normativos que excepcionalmente permitem a inquirição de testemunha fora do local onde territorialmente vai decorrer o julgamento e que até se justificam os mecanismos indicados pela demandante, impunha-se afastar a regra geral e determinar a inquirição da testemunha na Suíça.
Existe violação das regras da interpretação da lei quando, verificando-se a situação excepcional prevista na norma para a tomada de declarações fora do Tribunal da Comarca do julgamento, se indefere o requerimento porque existe uma norma que, como regra geral, impõe que as declarações sejam prestadas presencialmente na audiência de julgamento a realizar no Tribunal da Comarca onde este vai decorrer.
A testemunha B... reside na Suíça; dos elementos juntos aos autos de recurso não se mostra haver razões para crer da essencialidade do seu depoimento ser prestado na audiência de julgamento; residindo a testemunhas a largas centenas de quilómetros de Portugal, onde se encontra a trabalhar, são previsíveis graves dificuldades e inconvenientes para a testemunha vir da Suíça a Portugal, quer a nível laboral, pessoal e mesmo de despesas, ainda que o Tribunal o possa de algum modo o vir compensar. Por outro lado, em face da alegação da requerente, temos como verificada a necessidade e essencialidade deste depoimento para a descoberta da verdade.
Perante o exposto, mais não resta que conceder provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida e ordenar a sua substituição por outra que defira o requerido.

Decisão

Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em conceder provimento ao recurso interposto pela demandante A... e, revogando o despacho recorrido determina-se que seja substituído por outro que ordene a inquirição, na Suíça, da testemunha B..., com recurso a meios de telecomunicação em tempo real ou, na indisponibilidade destes, mediante carta rogatória a expedir para as autoridades judiciárias helvéticas.
Sem custas.

*
Orlando Gonçalves (Relator)
Alice Santos

[1] Cfr. BMJ n.º 458º , pág. 98.
[2] Cfr. CJ, ASTJ, ano VII, tomo I, pág. 247.
[3] Cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, Verbo, 2ª edição, pág. 350.
[4] Obra citada, páginas 233 a 234

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/cb8c372e1192628d80257c08003913f6?OpenDocument

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