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quarta-feira, 2 de maio de 2012

TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO TRANSMISSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO DIREITO COMUNITÁRIO - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - 16/04/2012


Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
434/08.2TTSTS.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERREIRA DA COSTA
Descritores: TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
TRANSMISSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
DIREITO COMUNITÁRIO

Nº do Documento: RP20120416434/08.2TTSTS.P2
Data do Acordão: 16-04-2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .

Sumário: I – Transmitida a titularidade ou a exploração de um estabelecimento, ou efetuada a sua reversão, a posição de empregador passa a ser ocupada pelo transmissário, cessionário ou reversário, pois o legislador pretende que se mantenha a posição de mercado que o estabelecimento representa, tanto ao nível dos negócios, como ao nível do emprego – cfr. Art.º 318.º do CT2003 e Art.ºs 1.º e 3.º da Diretiva 2001/23/CE, do Conselho.
II – Dados os escopos assinalados, tais normas – de interesse e ordem pública e de natureza imperativa – não podem ser afastadas por acordo entre particulares, em sentido desfavorável aos trabalhadores, pois elas visam a manutenção dos postos de trabalho existentes na data da transmissão, atento o princípio da segurança no emprego, ínsito no Art.º 53.º da Constituição da República.
III – Dos n.ºs 2 e 3 do Art.º 5.º da Diretiva resulta que, visando o processo de insolvência o desmantelamento da unidade económica, não se aplica a disciplina da transferência, cessão ou reversão da unidade económica; porém, se as medidas adotadas no processo de insolvência visarem a manutenção da unidade económica, embora com alteração subjetiva do titular do estabelecimento ou da sua exploração, nada impede que se mantenha a proteção dos trabalhadores, como sucede in casu.
IV – Tendo cedente e cessionário acordado, ao celebrar o contrato de cessão de exploração, que os contratos de trabalho dos trabalhadores do primeiro não acompanhavam a referida cessão de exploração, pretendendo que o segundo não ingressasse no estatuto jurídico-laboral do primeiro, agiram contra legem, em fraude à lei.
V – Se o cedente instaurado procedimento disciplinar, que desaguou em despedimento, contra um dos trabalhadores do estabelecimento, tal procedimento é ineficaz, por se tratar do exercício do poder disciplinar a non domino.
Reclamações:

Decisão Texto Integral: Reg. N.º 846
Proc. N.º 434/08.2TTSTS.P2

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B… deduziu em 2008-12-02 contra:
a) C…, Ld.ª e
b) D…, S.A.,
a presente ação declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, pedindo que se:
I – Declare a ilicitude do despedimento;
II – Condene as RR. a:
A) – Reintegrar a A. no seu posto de trabalho;
B) – Pagar à A.:
1 - Todas as quantias (salários, férias e subsídios) desde a data do despedimento até à reintegração;
2 - Uma indemnização por danos não patrimoniais sofridos no valor de 50.000,00 euros;
3 - Juros que se vençam desde a citação até integral pagamento.
Alegou a A. que foi admitida ao serviço da 1.ª R., C…, em 1972-09-25 para, sob as suas ordens e direção e mediante retribuição mensal, que se veio a fixar em € 711,00, exercer as funções de controladora de produção, o que aconteceu até 2008-10-21, data em que foi despedida, no culminar de procedimento disciplinar, adrede instaurado, sendo certo que este está ferido de nulidade e de caducidade, atentos os factos que descreve.
Alegou também que entre as RR. foi celebrado um contrato de cessão de exploração em 2007-08-01, passando a 2.ª R., D…, a explorar o aludido estabelecimento, razão pela qual a esta entidade competia o poder disciplinar, pelo que, tendo sido despedida pela 1.ª R., o procedimento disciplinar é nulo e ineficaz.
Igualmente, alegou a A. que sofreu danos não patrimoniais, que descreve, em consequência do referido despedimento.
Alegou a A., por último, que o despedimento é ilícito, devendo as RR. ser condenadas nos pedidos acima descritos.
Contestaram as RR., por exceção, invocando a ineptidão da petição inicial, com fundamento na contradição entre o pedido e a causa de pedir, nos termos do Art.º 193.º, n.º 2, alínea b) do Cód. Proc. Civil e alegaram que a A. foi despedida com justa causa, apurada em procedimento disciplinar válido e eficaz, pedindo a final a sua absolvição da instância.
A A. respondeu à contestação.
Foi proferido despacho saneador no qual se julgou improcedente a exceção dilatória da ineptidão da petição inicial, não verificada a exceção de caducidade do procedimento disciplinar e improcedente a nulidade da nota de culpa, tendo-se elaborado a MA e a BI, sem reclamações.
Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal e respondeu-se à BI pela forma constante do despacho de fls. 195 a 198, sem reclamações, embora a A. tenha vindo reclamar mais tarde, mas sem sucesso.
Proferida sentença, o Tribunal a quo decidiu:
A – Declarar a nulidade e ineficácia do processo disciplinar movido contra a A. e consequente ilicitude do despedimento de que foi alvo;
B – Condenar a R. D… a pagar à A:
1) - A quantia de € 27.136,50, acrescida de juros de mora legais até efetivo e integral pagamento;
2) - As retribuições que esta deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença – descontando das mesmas as retribuições por esta auferidas, a título de subsídio de desemprego, que a R. deverá entregar à Segurança Social – e que nesta data se fixam em €22.041,00;
C – Absolver:
3) - A R. D… do demais peticionado;
4) - A R. C… do pedido contra si formulado.
Inconformada com o assim decidido, veio a 2.ª R., D…, interpôr recurso de apelação, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

1. São cinco as questões objeto desta Apelação: Nulidade da Sentença: por omissão de pronúncia e por oposição entre os fundamentos e a decisão proferida; saber se houve de facto transmissão do estabelecimento, nos termos e para os efeitos do disposto pelo art. 318º do C .T., por força da qual se transmitiu para a Recorrente a posição jurídica de empregadora; saber se, tendo o Tribunal considerado ter havido essa transmissão, o que determinou a nulidade e ineficácia do processo disciplinar por ter sido instaurado, tramitado e decidido por quem não tinha poderes para o efeito; as consequências desse despedimento ilícito podem ser imputadas à Recorrente; saber se houve justa causa de despedimento; saber se é devido o montante das indemnizações que a Recorrente foi condenada a pagar.
2. Na reposta dada à matéria de facto o Tribunal a quo não deu resposta ao quesitado no art. 26° da Base Instrutória, que não integrou nos factos provados nem nos não provados; pelo que ocorre omissão de pronúncia que acarreta a nulidade da Sentença nos termos do preceituado pela al. d) do n.º 1 do art. 668º do CPC; 3. Nos factos dados como assentes no Despacho Saneador, o Tribunal a quo considerou assente, nas alíneas C) e O) que a A. era paga pela C… e que sempre prestou o seu trabalho na sede e edifício da Ré C…, sob ordens e direção desta. Contudo na Sentença conclui-se que desde 1/08/2007 por força do contrato de cessão de exploração outorgado entre as RR., a Ré C… deixou de deter o exercício do poder disciplinar, como tal o processo disciplinar não pode ter-se como válido.
4. No entanto, pronunciou-se após pela inexistência de justa causa de despedimento, e condenou a D… - que nenhuma influência teve no processo disciplinar - no pagamento das consequentes indemnizações;
5. Embora considere que por força daquela cessão, deixou a ré C… de deter o exercício do poder disciplinar, que assim é nulo e ineficaz, ao tecer considerações quanto ao ónus de prova, do empregador, dos factos constitutivos do despedimento, continua a referir-se à C… - que antes considerou já não ser detentora do poder disciplinar - declarando depois que, por força do contrato de cessão de exploração, a D… ingressou obrigatoriamente no estatuto jurídico-laboral da ré C…, pelo que é ela que responde pelo pagamento reclamado.
6. Na resposta dada à matéria de facto o Tribunal deu como não provado o art. 1º da Base Instrutória. Fundamentou tal resposta dizendo que: "não sabemos quando, e de que forma, a autora tomou conhecimento do contrato que unia ambas as empresas".
7. Já na Sentença, pode ler-se que: "(...) só após a decisão daquele processo disciplinar é que a aqui trabalhadora tomou conhecimento desta cessão e dos seus exatos termos (...) ".
8. Trata-se de conclusão a que o Tribunal, em face dos factos apurados, nunca poderia chegar. Com efeito, ao dar como não provado que a A. apenas soube do descrito em N) aquando da oposição à providência cautelar por si instaurado (quesito 1º), jamais poderia concluir que "(...) só após a decisão daquele processo disciplinar é que a aqui trabalhadora tomou conhecimento desta cessão e dos seus exatos termos (...)".
9. Verifica-se assim, nas situações acima descritas (pontos 3 a 8 das conclusões), uma oposição entre os fundamentos e a decisão proferida o que configura igualmente nulidade da Sentença, art. 668° n.º 1 aI. c) do CPC.
10. Nos autos que correm termos com o n.º 1727/07.1 TBSTS pelo 2° Juízo Cível de Santo Tirso foi em 12/04/2007 decretada a insolvência da Ré C….
11. Em 01/08/07 foi outorgado Contrato de Cessão de Exploração entre a Massa Insolvente e a D…, em resultado de prévio e expresso acordo da maioria dos membros da Comissão de Credores.
12. Na Assembleia de Credores de 23/08/07 foi deliberado por unanimidade (com votos, designadamente, do M. Público, E… e Instituto de Solidariedade e Segurança Social) manter o contrato de cessão de exploração do estabelecimento industrial; decisão essa que por não impugnada transitou em julgado.
13. Em 18/01/2008 foi criada a Comissão de Trabalhadores, para efeitos de representação dos trabalhadores na insolvência.
14. Por Douto Despacho de 18/01/08 foi a insolvência declarada fortuita.
15. A Assembleia de Credores deliberou revogar o Plano de Insolvência, determinando-se em consequência o prosseguimento dos autos para liquidação do ativo da insolvente.
16. Foi publicado anúncio para venda mediante propostas em carta fechada, do estabelecimento industrial da C… e de dois imóveis, e aceite a proposta para adjudicação de tais bens à D… (o que lhe foi comunicado em 15/12/09).
17. Todavia até esta data, não foi ainda possível a outorga da escritura pública de venda dos bens, mantendo-se em vigor o contrato de "cessão da exploração", com as obrigações dele decorrentes.
18. O contrato junto aos autos é na verdade, um contrato atípico. Foi outorgado dentro do âmbito muito específico deste processo de insolvência, de acordo com o deliberado na reunião de 1/08/07 da Comissão de Credores nomeada, com um propósito claramente enunciado e limites precisamente definidos.
19. Pretendeu-se garantir a manutenção em funcionamento da insolvente, pois o seu encerramento contribuiria irremediavelmente para a desvalorização do património da Massa Insolvente.
20. E a outorga do contrato com a D… era a única alternativa de que então dispunham para garantir no imediato a prossecução da atividade.
21. Tal contrato foi feito tendo em conta a complementaridade das atividades industriais das outorgantes, e com o único objetivo de assim permitir a manutenção em funcionamento do estabelecimento industrial da Insolvente, evitando o despedimento coletivo de todos os trabalhadores, no decurso do processo de insolvência - note-se que então se lutava pela manutenção em funcionamento da C… (foram inclusive apresentados vários Planos de Insolvência).
22. Por isso se previu no contrato que as partes o poderiam denunciar a todo o tempo, sem direito a indemnização à contraparte, apenas bastando o cumprimento de aviso prévio; e que o mesmo sempre caducaria com a alienação do estabelecimento no âmbito da liquidação da massa insolvente ou com a aprovação de plano de insolvência.
23. O único propósito de tal contrato foi o de manter a C… em atividade.
24. A D… (que até aí já usava parte do imóvel ocupado pelo estabelecimento industrial da C…, em virtude de contrato de arrendamento), passaria a utilizar também móveis, máquinas, utensílios e veículos que fazem parte desse estabelecimento industrial mediante o pagamento de uma renda mensal. Sendo certo que a D… suportaria os encargos, da responsabilidade da Massa Insolvente da C…, relativos ao estabelecimento (como água, energia elétrica, telefone e gás); as despesas de manutenção dos equipamentos, e o custo inerente aos trabalhadores da C… (salários, contribuições e quotizações para a Segurança Social) que lhe seria debitado por aquela por força da disponibilização desses trabalhadores pela C… para execução das encomendas da D….
25. Em momento algum se pretendeu a transmissão da titularidade do estabelecimento para a D…, o que de resto não teria qualquer sentido nessa fase do processo de insolvência em que se perspetivava a viabilização da C…, nem então seria admitido nesses autos de insolvência.
26. A D… prosseguiu a sua atividade industrial; trabalhando para a sua clientela, com a sua maquinaria e funcionários, mas usando as instalações, máquinas e funcionários da C…, cujo custo de utilização lhe era mensalmente debitado;
27. Nestes termos, não se registou qualquer transferência da propriedade do estabelecimento industrial da C… para a Recorrente.
28. Porque nunca esteve em causa a transmissão de uma unidade económica nos termos do art. 318º do CT, ficaram expressamente excluídos do contrato os trabalhadores da C…, que continuaram para todos os efeitos vinculados em exclusivo à C… - sendo que como refere o contrato no seu ponto 7: "Ficam excluídos do âmbito deste contrato de cessão de exploração todos os trabalhadores da 1ª outorgante, permanecendo esta a única e exclusiva responsável pelos trabalhadores (…) quer no que respeita às obrigações decorrentes da execução e cessação dos respetivos contratos de trabalho (…)".
29. De resto todos os critérios de aferição de subordinação jurídica e económica dos trabalhadores apontam, até hoje, para a C….
30. Em nenhum momento foram postos em causa os direitos adquiridos dos trabalhadores da C… nem posta em causa a sua garantia de estabilidade no emprego; foi isso que o contrato quis acautelar, pois a não ser outorgado a alternativa era o despedimento coletivo dos trabalhadores.
31. Não pode o Tribunal deixar de interpretar o contrato à luz da declaração negocial das partes, do texto do contrato, da vontade efetiva das partes e do seu escopo.
32. Não obstante alguma confusão dos trabalhadores que prestaram depoimento em julgamento, ficou clara a identificação pelos mesmos da coexistência nas mesmas instalações de trabalhadores C… e trabalhadores D…, sendo que praticamente todas as testemunhas responderam que alguns trabalhadores recebiam salário da C… e outros da D….
33. A testemunha F… referiu que as ordens eram dadas tanto pelo Administrador da D…, Sr. G…, como pelo, em tempos, gerente da C…, Eng. H…; que os trabalhadores da C… eram sub-contratados pela D… para quem prestavam trabalho, sendo que a produção era feita tanto com máquinas da C… como da D….
34. E a testemunha I… referiu receber instruções precisas do Administrador de Insolvência da C…, Dr. J… quer relativamente ao comportamento exigido aos trabalhadores quer quanto a outros assuntos de gestão da C…; declarou que os salários sempre continuaram a ser processados pela C…; emanando as instruções disciplinares para os trabalhadores C… do respetivo Administrador de Insolvência; esclareceu que os trabalhadores C… prestam serviços para a D…, executando as encomendas daquela pelo que as ordens diretas de produção - e só essas - emanam da Administração da D…, serviço esse cujo custo é debitado mensalmente à D… (como prestação de serviços, sub-contratação de trabalhadores).
35. A confirmar isto mesmo, veja-se o raciocínio do Tribunal a quo de que “(…) a própria trabalhadora não conseguiu vislumbrar qualquer alteração no funcionamento da empresa, pois que, ali sempre trabalhou, nas mesmas funções e posto de trabalho, com os mesmos colegas de trabalho e auferindo o mesmo vencimento", acrescentando nós - que auferia da mesma C…, continuando a trabalhar sob ordens e direção desta.
36. Com base naquele, o Tribunal poderia, e deveria, ter concluído pela inexistência da transmissão e manutenção inalterável do vínculo contratual (e naturalmente da posição de empregador).
37. Sem prescindir, ainda que o Tribunal considerasse existir uma situação de cedência dos trabalhadores sempre seria uma espécie de cedência ocasional de trabalhadores: em que o trabalhador passa a desenvolver atividade noutra empresa sob direção desta mas mantém o vínculo com a cedente que detém o poder disciplinar e a obrigação de pagar a retribuição, transferindo apenas para a cessionária, de modo temporário, o poder de direção; existindo uma colaboração entre cedente/cessionária. Esta cessão tem caráter limitado, sendo que finda a cedência os trabalhadores regressam à sua empresa.
38. Inexistindo Transmissão do Estabelecimento, não tem aplicação ao caso concreto o disposto no art. 318º do CT.
39. Não tendo ocorrido a transmissão da posição jurídica de empregadora para a Recorrente D…, sempre teria esta de ser absolvida do pedido.
40. Na oposição apresentada em 13/11/08 nos autos de procedimento cautelar de suspensão de despedimento instaurado pela A. e que correu termos com o n.º 379/08.6 TTSTS pelo Tribunal de Trabalho de Santo Tirso a Ré C… veio invocar a existência do contrato de cessão de exploração.
41. Em resposta apresentada em 17/11/08 a A., aí requerente, veio alegar que de acordo com o n.º 3 do art. 318° do CT por força desse contrato se havia transmitido para o cessionário – D… - a posição contratual de entidade patronal pelo que o despedimento da trabalhadora pela C… era absolutamente ineficaz, porquanto nessa altura 21/10/08 a entidade patronal da requerente seria a D…, única entidade com legitimidade para proceder disciplinarmente contra a requerente e eventualmente despedi-la.
42. No entanto, posteriormente veio requerer a emissão de Declaração de Situação de Desemprego, sendo-lhe entregue o respetivo Modelo RP5044, emitido pela C… em 26/11/2008 e assinado pelo seu Administrador de Insolvência - declaração que a A. não contestou e que apresentou nos Serviços da Segurança Social vindo a auferir o subsídio de desemprego.
43. Mais, veio intentar Ação emergente de contrato de trabalho contra a C… e a Recorrente D…, pedindo que fossem as RR. condenadas a reintegrar a A. no seu posto de trabalho e condenadas a pagar-lhe todas as quantias devidas desde o despedimento até à reintegração e no pagamento de indemnização por danos não patrimoniais,
44. na qual refere que a A. foi admitida ao serviço da R. C…, contra o pagamento pela C… do salário, que sempre prestou o seu trabalho na sede e nos edifícios da R. C…, sempre sob as ordens e direção da R. C… - art. 1°, 4°, 5° e 6° da p.i., correspondentes às alíneas A) a D) dos factos assentes no Despacho Saneador.
45. Se nos causa estranheza os termos em que a A. redigiu a p.i. (dizendo que sempre trabalhou sob ordens e direção da C… - que sempre lhe pagou o salário - para depois dizer que afinal, dado o contrato de cessão de exploração, desde 2007 que a sua entidade empregadora passou a ser a D…, pelo que o despedimento é nulo e ineficaz; concluindo com o pedido de condenação de ambas (?!) na sua reintegração e no pagamento das indemnizações que reclamou;
46. mais estranhamos, com o devido respeito, a Sentença proferida: O Tribunal ou não considerava a existência de cessão da posição jurídica de empregador para a D… e aí, decidindo pela inexistência de justa causa do despedimento, condenaria a C… na reintegração/indemnização da A. e pagamento das quantias devidas, ou decidindo pela transmissão para a D… dos contratos de trabalho, teria de julgar nulo e ineficaz o processo disciplinar, absolvendo a D…, dado que nenhuma decisão disciplinar foi por esta tomada.
47. Estando assente que o processo disciplinar foi instaurado, tramitado e decidido pela C… - que o Tribunal entendeu não ter legitimidade para o efeito - teriam que ter sido extraídas todas as consequências dessa ilegitimidade: se o processo é nulo e ineficaz, é como se não tivesse existido despedimento; pelo que não pode a D… responder pela aplicação da sanção disciplinar que nele foi feita pela C…, quando de nenhum modo participou desse processo de decisão.
48. Nestes termos, como acima aflorado, o raciocínio desenvolvido pela Mma. Juíza na Fundamentação da Sentença em crise, mostra-se inconciliável com a decisão proferida, configurando a Nulidade da Sentença, já arguida.
49. Sem prescindir, de tudo quanto vai supra alegado, e não obstante entendamos que a sua aferição só faria sentido no caso de o Tribunal ter decidido pela inexistência de transmissão da empresa, considerando válido o procedimento disciplinar movido pela C… à A.:
50. O Tribunal considerou que dos factos provados nenhum fundamento resulta que pudesse sustentar o despedimento de que a A. foi alvo.
51. De qualquer modo, dá como provada a existência de conflito entre a A. e a testemunha K…; a ameaça dirigida à colega/testemunha L… - que considera como ato isolado - e o erro e inerente prejuízo causado pela A. na encomenda do cliente M….
52. Da prova testemunhal produzida (salientando que alguns dos depoimentos não são, pelo menos na gravação facultada pelo Tribunal, audíveis na íntegra, prejudicando nessa parte a sua apreciação pela Recorrente), tinha o Tribunal elementos para considerar provado: que a colega K… ficou ofendida com a arguida, face à discussão ocorrida no gabinete, no episódio do telefone; que na sequência do incidente o ambiente ficou tenso; que a colega K… andava assustada com o comportamento da A.; que a A. cometeu outros lapsos, mas que por filtragem de colegas não implicaram prejuízo económico para a empresa - cfr. depoimento da testemunha F…; que se verificou um incidente na cantina com o colega N….
53. Também entendemos que pouca credibilidade deveria ter merecido o depoimento da testemunha H…, infirmado que foi em parte pela testemunha F… (ao afirmar que não terá questionado o primeiro sobre o incidente das escadas e depois que os últimos degraus das escadas são pouco visíveis para quem se encontra em baixo).
54. Nessa medida, dados como provados esses factos, resultaria demonstrada a inadequação do comportamento da trabalhadora: a falta de urbanidade para com os companheiros de trabalho, perturbadora dos serviços da empresa e causadora de mau ambiente de trabalho; a provocação repetida de conflitos com colegas - o tal "feitio especial" que reconhece a Mma. Juíza na resposta à matéria de facto (e que foi referenciado pelas testemunhas em jeito de eufemismo, para definir o caráter que reconhecem à A.) - e a omissão do devido zelo e diligência no exercício das funções; o que ditou a quebra de confiança da entidade empregadora - fundamento para o despedimento da A. com justa causa.
55. A sanção disciplinar aplicada à A. assentou em diversos comportamentos que a entidade patronal considerou revelarem uma atuação reiterada, inaceitável da trabalhadora - que se agravou nos últimos meses, mais precisamente, desde o início dos conflitos com a colega K….
56. Deste modo, sempre deveria ter sido considerado existir justa causa para o despedimento da A.
A assim não se entender, sem conceder que, pelo que vai exposto, entendemos nada ser devido.
57. A Decisão Final proferida em sede de processo disciplinar pela C…, resultou da conjugação da vasta prova, documental e testemunhal, produzida no decurso do processo disciplinar, com especial enfoque para os depoimentos colhidos junto de outros colegas. O mesmo se diga em relação à Nota de Culpa.
58. E note-se bem que em alguns casos os depoimentos da mesma testemunha, colhidos em fase de inquérito preliminar, depois na instrução do processo disciplinar e após em julgamento, não são inteiramente coincidentes (sendo os últimos claramente mais vagos...).
59. Vejam-se a esse propósito os depoimentos prestados em sede de inquérito pelas testemunhas L…, P..., Q…, F…, S… e T….
60. Também a própria A. apresentou significativas e reveladoras incoerências no processo disciplinar: primeiramente negou todos os factos imputados que depois pareceu confessar.
61. Assim, no cálculo da indemnização a que o Tribunal entendeu ter a A. direito, e para aferir do grau de violação ocorrida haverá necessariamente que se atender à prova produzida nos autos de procedimento disciplinar pois foi nesse contexto que foi apreciada a conduta da A. e tomada uma decisão quanto à sanção disciplinar a adotar, e não apenas atender à prova produzida em julgamento, cerca de 2 anos mais tarde,
62. O que, a nosso modesto ver, dentro de todo esse circunstancialismo, deveria levar à fixação da indemnização a que alude o art. 439º n.º 1 do CT, no mínimo legal de 15 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade.
63. Por outro lado, tendo o Tribunal considerado que existiu uma Transmissão do Estabelecimento - o que não se aceita - pela qual desde a data de outorga do contrato de cessão de exploração em 1/08/2007, se transferiu para a D… a posição de empregadora da A. e demais trabalhadores da C…, sempre a A., assim que soube de tal transmissão (pelo menos desde 17/11/08), deveria ter-se apresentado ao trabalho, ao serviço da entidade empregadora, que alega ser a D…, o que em momento algum fez,
64. pelo que nunca poderia a Autora, ainda que, o que por mera hipótese de raciocínio se equaciona, fosse a Recorrente a sua empregadora, vir a exigir-lhe todas as retribuições vencidas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da Sentença, e muito menos, ser a Recorrente condenada a pagar-lhas.
No final das conclusões, apresentou a apelante o seguinte:
“PROVA:
DOCUMENTAL: Requer a junção aos autos de 10 documentos, ao abrigo da faculdade concedida pelo art. 706° n.º 1, 2ª parte do CPC, na redação aplicável, documentos cuja junção se manifestou necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.
De facto, face à inesperada Decisão do Tribunal a quo quer quanto à interpretação do contrato de "cessão de exploração", quer na surpreendente condenação da D… após se declarar o procedimento disciplinar nulo e ineficaz; revela-se importante para o esclarecimento da verdade e a boa decisão da causa, a junção dos documentos agora apresentados.”
A A. apresentou a sua contra-alegação e deduziu recurso subordinado, tendo a final formulado as seguintes conclusões:
A) Na hipótese de proceder o recurso principal, então não se verifica a existência dos requisitos que podem gerar o despedimento com justa causa.
B) Da matéria de facto dada como provada nem sequer existe um comportamento culposo da recorrente.
C) Muito menos a impossibilidade de subsistência da relação laboral.
D) Sendo certo que a recorrente prestou o seu trabalho durante quase quarenta anos, sem qualquer sanção disciplinar.
E) São assim as recorridas e nos termos do n.º 3 do artº 318º do C.T. solidariamente responsáveis pelo pagamento da indemnização e créditos laborais.
F) Sempre o será a recorrida C… (Massa Insolvente).
As RR. apresentaram a sua contra-alegação, relativamente ao recurso subordinado interposto pela A.
O Tribunal a quo, relativamente às nulidades da sentença invocadas apenas na alegação do recurso, decidiu suprir a omissão de pronúncia que consistiu na falta de resposta ao quesito 26º da BI, dando como “não provada a matéria constante do artigo 26º da base instrutória” e indeferiu a nulidade invocada que consistiria na oposição entre os fundamentos e a decisão.
O Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que a apelação não merece provimento, ficando prejudicado o conhecimento do recurso subordinado.
Apenas a apelante, a 2.ª R., Felpinter, tomou posição quanto ao teor de tal parecer.
Recebido o recurso, elaborado o projeto de acórdão e entregues as respetivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos[1], foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:

A-) A autora foi admitida ao serviço da ré C… em 25/09/1972.
B-) A autora sempre exerceu as funções de controladora de produção, verificando as produções, as encomendas e a execução das mesmas.
C-) Contra o pagamento, pela ré C..., do salário mensal de 711,00 €.
D-) Sempre prestou o seu trabalho na sede e edifício da ré C…, sob as ordens e direção desta.
E-) Em 16 de julho de 2008, a autora recebeu uma carta em que lhe foi comunicada a abertura de processo disciplinar, nos termos do documento de fls. 1 do processo disciplinar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
F-) Na mesma data, foi notificada pessoalmente da sua suspensão preventiva até ao termo do processo disciplinar, sem que lhe fosse comunicada qualquer intenção de despedimento.
G-) Foi ouvida pelo instrutor nomeado, U…, tendo negado os factos sobre a eventual agressão de uma outra trabalhadora de nome K….
H-) Por carta registada, com aviso de receção, em 12/08/2008, foi a autora notificada da nota de culpa, na qual se concluía que o comportamento da trabalhadora arguida assume uma gravidade que torna imediata e praticamente impossível a subsistência da relação da trabalho, consubstanciando a sua atuação justa causa de despedimento, nos termos dos documentos de fls. 24 a 30 do processo disciplinar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
I-) Por carta registada de 22/08/2008, a autora respondeu à nota de culpa, nos termos dos documentos de fls. 40 a 44 do processo disciplinar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
J-) Por fax de 05/09/2008, a instrutora do processo disciplinar notificou o patrono da autora que o processo disciplinar ficava disponível para consulta no seu escritório, pelo prazo de 10 dias úteis, com a possibilidade de apresentar nova defesa ou corrigir a já antes deduzida, conforme fls. 46 do processo disciplinar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
K-) Em 15/09/2008, a autora juntou um aditamento à defesa anterior, conforme documento de fls. 62 a 64 do processo disciplinar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
L-) As diligências instrutórias foram dadas por concluídas em 26/09/2008.
M-) Na sequência do referido processo disciplinar, foi a autora notificada, por carta registada com aviso de receção datada de 16/10/2008, mas registada a 17/10/2008, do relatório final e da decisão da Ré (ambos datados de 16/10/2008) que lhe aplicou a sanção disciplinar de despedimento com justa causa, nos termos dos documentos de fls. 87 a 101 do processo disciplinar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
N-) Entre a ré C… e a ré D… foi outorgado, em 1 de agosto de 2007, um contrato por via do qual a D… passou a utilizar todos os móveis, máquinas, utensílios e veículos que se encontrem no estabelecimento industrial da C….
O-) Convencionando expressamente as partes que “Ficam excluídos do âmbito de aplicação deste contrato de cessão de exploração todos os trabalhadores da 1ª outorgante, permanecendo esta a única e exclusiva responsável pelos trabalhadores, quer no que respeita a acidentes de trabalho e doenças profissionais, quer no que respeita às obrigações decorrentes da execução e cessação dos respetivos contratos de trabalho, juntando-se uma lista com a identificação de todos os trabalhadores, como Anexo II, o qual fica a fazer parte integrante deste contrato e que por ambos os contraentes vai rubricado” – cf. cláusula 7ª do contrato junto aos autos.
P-) Obrigando-se a C… a disponibilizar à D… a mão de obra constituída pelos seus trabalhadores, para que aquela pudesse executar as suas encomendas.
Mais se provou que:

1º No mês de junho de 2008, a autora foi chamada atenção pela sua colega K… pelo facto de não ter recebido um telefonema de um cliente.
2º Que pedia contacto urgente com a autora.
3º K… tentou encontrar a autora, que encontrou à conversa com uma colega, transmitindo-lhe o recado.
4º Por erro da autora, na encomenda nº ………, da cliente M…, foram produzidas mais de cerca de 150 kg de fio, o que originou a devolução da cliente e consequente nota de culpa no valor de 234,54 euros, (valor sem IVA).
5º Sendo que o fio a mais foi devolvido para ser tingido noutra cor, o que originou para a ré D… um custo acrescido de 200,00 (valor sem IVA).
6º Embora a encomenda mencionasse o peso e o nº de bobines, a autora deveria ter calculado a encomenda somente pelo nº de kg, pois essa é a quantidade pretendida pelo cliente, tendo a autora feito o cálculo em bobines.
7º Bem sabendo que não era esse o procedimento normal das encomendas daquela cliente, como de resto havia já sido chamada a atenção pelo seu superior hierárquico, Sr. F….
8º Apesar disso, quando confrontada com a reclamação da cliente, apresentou um documento escrito afirmando que todas as encomendas eram calculadas em bobine, nada tendo sido informada que deveria ter sido calculado em kg.
9º E, questionada pela gerência, acabou por admitir essas declarações não correspondiam a verdade.
10º Em determinado dia, vendo a colega L… a conversar com o gerente G…, afirmou que quem a denunciasse já não subiria a rampa de acesso à empresa.
11º A gerência da C… só tomou conhecimento dos factos referidos em 15º e 16º, em 09/07/08, pois, internamente, a reclamação do cliente e posterior nota de devolução permaneceram na Secção da Tinturaria para análise.
12º Só quando em julho, interpelada sobre o motivo da não libertação da letra, a cliente revelou que apenas o faria após resolução da reclamação apresentada, é que a situação foi reportada à gerência da C…, que de imediato ordenou ao responsável da tinturaria que elaborasse relatório da ocorrência e identificasse os culpados.
Estão também provados os seguintes factos:
13º É do seguinte teor a nota de culpa referida em H-), supra:
“NOTA DE CULPA
É intenção desta Empresa proceder ao despedimento com invocação de justa causa da trabalhadora B…, filha de V… e de W…, nascida em 31/03/1958, portadora do Bilhete de Identidade n.º ……., emitido em 19/03/2001 pelo Arquivo de Identificação de Lisboa, contribuinte fiscal n.º ………, beneficiária n.º ……….., residente na Rua … n.º …, …, Santo Tirso, admitida como trabalhadora desta Empresa em 25/09/1972, desempenhando as funções de Controladora de Produção, porquanto:
1.º
No passado mês de junho, em dia que não foi possível apurar, quando regressava ao seu gabinete, a arguida foi chamada à atenção pela Colega K… (Escriturária Geral, que exerce funções juntamente com a arguida, na Secção da tinturaria) pelo facto de a arguida não responder ao telefonema recebido de um cliente (X…).
2.º
Sucedeu que tocando incessantemente o telefone da arguida, ausente do gabinete, a referida colega atendeu a chamada do cliente, que pedia contacto urgente com a arguida.
3.º
A D. K… tentou localizar a arguida, que encontrou à conversa com uma colega, transmitindo-lhe o recado. No entanto, apesar do passar das horas a arguida não respondeu à chamada, tendo o telefone começado novamente a tocar (tratando-se do mesmo cliente).
4.º
A arguida mostrou-se totalmente transtornada com o reparo da colega, batendo violentamente com o telefone na secretária, enquanto berrava com a colega dizendo: "Filha da puta, você não tem que atender o meu telefone".
5.º
A D. K… ficou chocada com o modo como foi tratada pela arguida, sentindo-se profundamente ofendida com a conduta daquela.
6.º
Dias mais tarde, já no corrente mês de julho, a arguida, tendo sabido que o gerente Sr. G… estivera a conversar com a colega K…, abordou-a no sentido de saber se a havia acusado perante aquele, dizendo-lhe após em tom ameaçador: "Desgraçada de você se me acusa ao Sr. G…. Eu ponho-a no hospital".
7.º
A colega ficou bastante assustada com as ameaças da arguida, passando a temer os momentos em que estavam a sós no gabinete.
8.º
Este episódio foi relatado pela trabalhadora ofendida à colega L…, que exerce funções no laboratório da tinturaria, à Dr.ª I…, Diretora Financeira, e após ao gerente Sr. G….
9.º
No dia 10 de julho quando a D. K… estava de saída da empresa ao final da tarde, e ao descer as escadas da Tinturaria, foi surpreendida pela arguida que descia atrás dela. Ao chegarem ao fundo das escadas, a arguida deu-lhe com os joelhos nas costas, ao mesmo tempo que dizia: "Ande lá, rápido, rápido, …”, com o que quase provocou a queda da colega, causando-lhe fortes dores na coluna nos dias seguintes (com necessidade de medicação).
10.º
A trabalhadora visada entendeu esta agressão, como gesto intimidatório da arguida, manifestando ao superior hierárquico a impossibilidade de permanecerem no mesmo gabinete.
11.º
Por erro da arguida, na encomenda n.º ……… da cliente "M…, S.A.", foram produzidos a mais cerca de 150 kg de fio, o que originou a devolução da cliente e consequente nota de débito no valor de 234,54 € (valor sem IVA).
12.º
O fio produzido a mais foi devolvido para ser tingido numa outra cor, o que implicou para a entidade patronal um custo acrescido de 200,00 € (valor sem IVA).
13.º
Segundo foi apurado pelo Sr. S… (Encarregado de Tinturaria) e Sr. F… (Técnico de Tinturaria), tal erro foi direta e exclusivamente imputável a negligência (falta de atenção ou descuido) da arguida.
14.º
Na verdade embora a encomenda mencionasse expressamente quer o peso quer o número de bobines, a arguida deveria ter calculado a encomenda somente pelo número de Kg, pois essa é a quantidade pretendida pelo cliente, sendo que no caso concreto a arguida fez o cálculo em bobines.
15.º
A arguida bem sabia que não era esse o procedimento normal nas encomendas daquela cliente; de resto havia sido previamente chamada à atenção para tal facto pelo seu superior hierárquico, Sr. F….
16.º
No entanto, quando confrontada com a reclamação da cliente, a arguida apresentou um documento escrito, elaborado e assinado por si, no qual dizia que todas as encomendas que passam por si eram calculadas em bobines, pelo que terá feito, como habitualmente, não tendo sido informada de que a encomenda devia ter sido calculada em kg.
17.º
Deste facto a gerência tomou conhecimento no dia 9 de julho com a elaboração da respetiva Nota de ocorrência.
18.º
Questionada pela gerência, a arguida admitiu que as declarações constantes do documento que redigiu não correspondiam à verdade, isto é, que sabia que a encomenda devia ter sido calculada em Kg.
19.º
São recorrentes os lapsos cometidos pela arguida no exercício das suas funções (como códigos errados ou máquinas trocadas quanto ao peso da partida), cometidos por desleixo e falta de atenção, sendo que graças à intervenção atenta de outros trabalhadores, os mesmos têm sido detetados a tempo de garantir a sua correção, evitando prejuízo patrimonial para a empresa.
20.º
Para além da negligência e desleixo no exercício das suas funções, e da gravidade e reiteração do seu comportamento para com a colega K…, o que criou um ambiente de tensão no setor e a degradação das condições de trabalho,
21.º
a arguida é conflituosa no relacionamento com os demais colegas (exceto os superiores hierárquicos), denotando arrogância e falta de respeito no trato.
22.º
Em dia que não se pode precisar, a arguida após ter visto a colega L… conversar com o gerente Sr. G…, dirigiu-se a ela e a um grupo de outras colegas, dizendo-lhes que quem a denunciasse ao Sr. G… "já não subiria a rampa" de acesso à empresa.
23.º
Estas declarações foram entendidas por esta trabalhadora como uma ameaça dirigida a si (por a arguida a ter visto a conversar com o gerente).
24.º
São também frequentes as discussões e desentendimentos com colegas, o que causa mau ambiente de trabalho.
25.º
Noutra ocasião, durante o almoço na cantina, dirigiu-se ao colega Q… dizendo "Tu comes como um burro!"; esta situação foi muito comentada, já que presenciada por alguns trabalhadores.
26.º
A arguida tem mantido este comportamento há vários anos, mas só agora, com as participações da D. K…, e as averiguações feitas junto dos trabalhadores, a gerência se apercebeu do mesmo, dado que os colegas apesar de ofendidos se sentiam melindrados pelo que não reportaram as situações, limitando-se a afastar-se do convívio da arguida.
Neste contexto, a arguida B… criou um ambiente de mau estar e de perturbação do normal funcionamento do serviço, pela atitude arrogante, a falta de respeito para com os seus colegas e pelos erros cometidos.
Com a sua atuação a arguida violou o disposto nas alíneas c), d). e) e i) do n.º 3 art. 396° do C.T.:
- demonstrando falta de urbanidade para com os seus companheiros de trabalho, dirigindo-se-lhes de modo impróprio, o que criou perturbação nos serviços da Empresa e mau ambiente de trabalho;
- desrespeitando os colegas de trabalho ao provocar repetidamente conflitos com outros trabalhadores da empresa;
- omitindo de forma reiterada o zelo e diligência no exercício das funções que lhe estão confiadas, com o que causou prejuízo económico à empresa;
- praticando, no âmbito da empresa, violência física e injúrias sobre colegas.
O comportamento da trabalhadora arguida assume uma gravidade que torna imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, até porque apesar de várias vezes chamada à atenção, a arguida persistiu na sua conduta, repetindo os conflitos com os colegas, com o que criou um ambiente de forte tensão no local de trabalho.
A atuação da arguida consubstancia justa causa de despedimento por iniciativa da entidade patronal e por facto imputável à trabalhadora, nos termos do n.º 1, 2 e 3 al. c), d), e) e i) do art. 396º do Código de Trabalho.”.
14º - A R. C… foi declarada em situação de insolvência por sentença de 2007-04-12, que transitou em julgado – cfr. certidão de fls. 60 a 65 do I volume do processo principal.
15º - São do seguinte teor as cláusulas 1) a 5) do contrato de cessão de exploração, referido em N-):
1) A 1ª outorgante [C…] é dona e legítima possuidora de um estabelecimento industrial constituído por uma fábrica de produtos de algodão e outras fibras têxteis…
2) O aludido estabelecimento industrial encontra-se instalado nos prédios, descritos na Conservatória do Registo Predial sob os n.os 550; 648; 651; 652; 641; 649; 240; 367 c 782, composto por Edifício Industrial com 17.764,00 m2 de área coberta e o restante de logradouro, propriedade da 1ª outorgante. _
3) Pelo presente contrato a 1ª outorgante cede a exploração do dito estabelecimento industrial à 2ª outorgante, que aceita, nos termos a seguir
exarados.
4) O presente contrato de cessão da exploração manter-se-á em vigor até que o estabelecimento industrial em causa seja alienado no âmbito da liquidação da massa insolvente ou seja objeto de um qualquer plano de insolvência que, no âmbito do processo supra identificado, venha a ser aprovado, altura em que caducará, sem prejuízo do que se dispõe na cláusula seguinte.
5) Os outorgantes poderão denunciar o presente contrato de cessão de exploração a todo o tempo desde que procedam à notificação do outro outorgante mediante carta registada com aviso de receção, remetida com uma antecedência mínima de 15 dias e sempre para o final do mês, não tendo qualquer dos outorgantes direito a indemnização por força dessa denúncia, seja a que título for.
- cfr. doc. de fls. 76 a 78 do procedimento cautelar de suspensão do despedimento individual, apenso.

Fundamentação.
Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respetivo objeto[2], como decorre do disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, na redação que lhe foi dada pelo diploma referido na nota(1), ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho[3], salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, são sete as questões a decidir nestes autos, a saber:
A – No recurso principal:
I – Junção de documentos
II – Nulidade da sentença
III – Transmissão do estabelecimento
IV – Nulidade e ineficácia do procedimento disciplinar
V – Justa causa
VI – Montante da indemnização e retribuições vencidas e vincendas
B – No recurso subordinado:
VII – Responsabilidade solidária das RR.

A 1.ª questão.
Trata-se de saber se deve ser admitida a junção dos documentos apresentados pela 2.ª R., D..., ora apelante, no final da sua alegação.
De facto e como se referiu no relatório supra, no final das conclusões, apresentou a apelante o seguinte:
“PROVA:
DOCUMENTAL: Requer a junção aos autos de 10 documentos, ao abrigo da faculdade concedida pelo art. 706° n.º 1, 2ª parte do CPC, na redação aplicável, documentos cuja junção se manifestou necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.
De facto, face à inesperada Decisão do Tribunal a quo quer quanto à interpretação do contrato de "cessão de exploração", quer na surpreendente condenação da D… após se declarar o procedimento disciplinar nulo e ineficaz; revela-se importante para o esclarecimento da verdade e a boa decisão da causa, a junção dos documentos agora apresentados.”
Dispõe adrede o Cód. Proc. Civil[4]:
Artigo 693.º-B
Junção de documentos
As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 524.º, no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) a n) do n.º 2 do artigo 691.º.
Ora, a ação principal foi precedida por procedimento cautelar de suspensão de despedimento individual, que se encontra apenso, onde foram suscitadas as questões que foram tratadas na sentença ora impugnada e, por outro lado, os documentos juntos são cópia de documentos e requerimentos também juntos no referido procedimento cautelar. Daí que a consideração da cessão do estabelecimento, a condenação da 2.ª R. no pedido e a ineficácia do procedimento disciplinar não sejam questões surpresa, pois aquando do julgamento já haviam sido suscitadas e debatidas.
Assim, a junção de documentos com a alegação de recurso, para além de não ser legalmente admissível, traduziu-se num ato inutíl, que a lei proíbe, atento o disposto no Art.º 137.º do Cód. Proc. Civil, na medida em que são mera repetição de documentos já juntos aos autos da providência apensa, pelo que será ordenado oportunamente o seu desentranhamento e entrega à parte, D..., indo a mesma condenada em multa, que se fixa em 1 UC.

A 2.ª questão.
Trata-se de saber se a sentença é nula.
Na verdade, como a apelante refere nas conclusões 2 a 9 do recurso principal, a sentença é nula por omissão de pronúncia, pois não foi dada resposta ao quesito 26.º da BI, que não integrou nos factos provados nem nos não provados, pelo que ocorre omissão de pronúncia, nos termos do preceituado na alínea d) do n.º 1 do Art.º 668º do CPC; por outro lado, considerando o descrito nas conclusões 3 a 8, verifica-se uma oposição entre os fundamentos e a decisão proferida, o que a seu ver configura igualmente nulidade da sentença, atento o disposto no Art.º 668.º, n.º 1, alínea c) do CPC.
Vejamos.
As nulidades podem ser processuais, se derivam de atos ou omissões que foram praticados antes da prolação da sentença; podem também ser da sentença, se derivam de atos ou omissões praticados pelo Juiz na sentença.
Aquelas, constituindo anomalia do processado, devem ser conhecidas no Tribunal onde ocorreram e, discordando-se do despacho que as conhecer, pode este ser impugnado através de recurso de agravo. Porém, as nulidades da sentença, tendo sido praticadas pelo Juiz, podem ser invocadas no requerimento de interposição do recurso [dirigido ao Juiz do Tribunal a quo, para que este tenha a possibilidade de sobre elas se pronunciar, indeferindo-as ou suprindo-as] e não na alegação [dirigida aos Juízes do Tribunal ad quem], como dispõe o Art.º 77.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho, sob pena de delas não se poder conhecer, por extemporaneidade[5].
No entanto, recentemente, o Tribunal Constitucional, pelo seu Acórdão n.º 304/2005, de 2005-06-08, proferido no Proc. n.º 413/04 decidiu, nomeadamente, o seguinte:
Julgar inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.ºs. 2 e 3), com referência aos n.ºs. 1 e 4 do artigo 20.º da Constituição, a norma do n.º 1 do artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro [que corresponde, com alterações, ao Art.º 72.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 1981], na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição do recurso com referência a que se apresenta arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço ao tribunal superior[6].
In casu, a 2.ª R., ora apelante, não invocou as nulidades da sentença no requerimento de interposição do recurso, mas apenas na alegação e nas conclusões do recurso, como se vê de fls. 226 ss., pelo que delas não devemos, em princípio, tomar conhecimento.
Acontece, porém, que o Tribunal a quo, apesar de assim também entender, acabou por conhecer das invocadas nulidades da sentença, despacho que não foi impugnado.
Dele consta nomeadamente:
“(i) Quanto à omissão de pronúncia:
Alega a R. que o tribunal não deu resposta à matéria quesitada no art. 26º da base instrutória.
Tem de facto razão.
Mas, da própria leitura da motivação da matéria de facto, se retira que de mero lapso se tratou, pois que, em bom rigor, o tribunal motivou a sua decisão de julgar não provada tal matéria. Veja-se que ali se diz que "No que se prende com a relação entre C… e D…, não sabemos quando, e de que forma, a autora tomou conhecimento do contrato que unia ambas as empresas (as próprias testemunhas ouvidas em julgamento não souberam explicar muito bem os termos do contrato, cujo clausulado não sabiam com exatidão – veja-se, por exemplo, T…, que disse ser funcionário da D…, mas que quem sempre lhe pagou foi a C…, e que terminou o seu depoimento dizendo “as relações entre C… e D… não sei”, também F…, que afirmou ser hoje funcionário da D… – embora já o tenha sido da C… -, mas que diz, e todos assim o reconheciam, ao que parece, ser superior hierárquico da autora, já que era quem lhe dava ordens e instruções na execução do seu trabalho, sendo que esta seria funcionária da C…, não sabendo também ele explicar muito bem a relação entre as duas empresas).
Tal entendimento esteve depois subjacente à sentença proferida, pelo que, suprindo tal nulidade, julgamos agora como "Não provada a matéria constante do artigo 26º da base instrutória".
Notifique e anote no despacho de fls. 195.
Dn.
(ii) Quanto à oposição entre os fundamentos e a decisão proferida.
Invoca a R. que foram dados como assentes no despacho saneador, nas alíneas C) e D), que a A. era paga pela C… e que sempre prestou o seu trabalho na sede e edifício da Ré C…, sob ordens e direção desta. Contudo, alega, na sentença conclui-se que existiu em 01/08/2007 uma cessão de exploração para a D… por força da qual a Ré C… deixou de deter o exercício do poder disciplinar, que como tal não pode ter-se como válido.
No entanto, decidindo pela inexistência de justa causa de despedimento, condenou a D… – que nenhuma influência teve no processo disciplinar – no pagamento das consequentes indemnizações.
Invoca também a R. que, na resposta dada à matéria de facto, o Tribunal deu como não provado o art. 1º da Base Instrutória, fundamentando tal resposta no facto de: “não sabemos quando, e de que forma, a autora tomou conhecimento do contrato que unia ambas as empresas”. Já na sentença, afirma, pode ler-se que: “(…) só após a decisão daquele processo disciplinar é que a aqui trabalhadora tomou conhecimento desta cessão e dos seus exatos termos (…)”.
Trata-se de conclusão a que o Tribunal, em face dos factos apurados, nunca poderia chegar.
Com efeito, afirma, ao dar como não provado que a A. apenas soube do descrito em N) aquando da oposição à providência cautelar por si instaurada (quesito 1º), jamais poderia concluir que “(…) só após a decisão daquele processo disciplinar é que a aqui trabalhadora tomou conhecimento desta cessão e dos seus exatos termos (…)”.
Verifica-se assim, em ambos os casos, uma oposição entre os fundamentos e a decisão proferida, o que configura igualmente nulidade da sentença proferida.
Vejamos então.
No primeiro caso, veja-se, ao ter sido dado como assente que a A. foi admitida e era paga pela C… e que sempre prestou o seu trabalho na sede e edifício daquela, sob ordens e direção desta – por força da não impugnação de tal matéria – não impede que na Sentença se conclua que existiu em 01/08/2007 uma cessão de exploração para a D… (cujos termos, aliás, estavam já descrito nas alíneas N-) a P-) da matéria assente) limitando-se o tribunal a apreciar juridicamente aquela factualidade assente.
No caso aqui em apreço, e quanto a nós, por força do acordo celebrado entre ambas as empresas, e atento o disposto no artigo 318.º do Código do Trabalho, conforme à jurisprudência comunitária, parece claro que a própria organização pessoal da empresa foi inequivocamente transmitida de uma sociedade (C…) para outra (D…). E esta cedência arrastou necessariamente consigo os contratos de trabalho, a categoria profissional e a antiguidade dos trabalhadores. Nem outra solução seria, aliás, viável. A própria trabalhadora não conseguiu vislumbrar qualquer alteração no funcionamento da empresa, pois que, ali sempre trabalhou, nas mesmas funções e posto de trabalho, com os mesmos colegas de trabalho e auferindo o mesmo vencimento, resultando evidente do julgamento realizado a “confusão” instalada entre os trabalhadores daquelas empresas que, em bom rigor, não sabiam quem era a sua entidade empregadora.
O regime legal desta cessão envolveu, assim, automaticamente para o cessionário a posição jurídica de empregador relativamente aos contratos de trabalho que à data da cessão nele exerciam a sua atividade, visando proteger os trabalhadores.
Tratando-se, quanto a nós de norma imperativa, como já o dissemos, que visa acautelar os interesse e direitos dos trabalhadores, não podem as partes, em comunhão de esforços, e fugindo claramente ao objetivo legal, afastar aquele normativo com base num simples contrato, ainda que celebrado de acordo com o princípio da liberdade contratual que impera entre nós. A ser assim, concluímos, por força daquela cessão, deixou a ré C… de deter o exercício do poder disciplinar que lhe permitia instaurar e conduzir o processo instaurado que culminou no despedimento da autora, sendo, também quanto a nós, por força do contrato de que aqui cuidamos, a ré Felpinter é a única responsável pelo pagamento da indemnização fixada nos autos.
E tal não nos parece que esteja ferido de qualquer contradição, competindo às rés resolverem entre si os problemas que possam surgir por força do contrato que celebraram, em outra sede, que não esta, mas que não pode, nunca, interferir com os direitos da aqui autora.
Já no segundo caso, não vemos de que forma possa apontar-se qualquer contradição ou oposição na sentença. Invocar-se na resposta dada à matéria de facto que “não sabemos quando, e de que forma, a autora tomou conhecimento do contrato que unia ambas as empresas”, e concluir-se na sentença, que: “(…) só após a decisão daquele processo disciplinar é que a aqui trabalhadora tomou conhecimento desta cessão e dos seus exatos termos (…)”, não configura, quanto a nós, qualquer contradição, ainda que possamos admitir que uma leitura atenta da factualidade provada não permitisse levar a essa “conclusão”.
No entanto, inexiste qualquer contradição entre uma e outra afirmação – com efeito, não ficando provado que a A. apenas soube do descrito em N) aquando da oposição à providência cautelar por si instaurada (quesito 1º), não contraria o facto da autora “(…) só após a decisão daquele processo disciplinar tivesse tomado conhecimento da cessão e dos seus exatos termos (…)”.
Verifica-se assim, em ambos os casos, que não existe, contrariamente ao pretendido pela R. D… qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão proferida, inexistindo assim, quanto a nós, qualquer nulidade na sentença proferida que aqui possamos suprir.
Notifique.”.
Ora, suprida a nulidade no primeiro caso, deixou ela de existir, pelo que nada temos a decidir, tanto mais que concordamos integralmente com tal decisão.
Quanto à segunda nulidade, devemos referir em primeiro lugar que o despacho transcrito explicita devidamente o seu raciocínio, explicando as alterações decorrentes da celebração do contrato de cessão de exploração, entre as RR., pelo que as contradições invocadas, a existirem, seriam meramente aparentes. Por outro lado, a contradição referida na alínea c) do n.º 1 do Art.º 668.º do Cód. Proc. Civil, é entre os fundamentos e a decisão, constantes da sentença, quando a apelante está a invocar a fundamentação do despacho em que se respondeu à BI, sendo certo que, aparte isso, o despacho bem explica a razão pela qual não ocorre a invocada contradição entre os fundamentos e a decisão, pois a circunstância de se conhecer um determinado facto depois do processo disciplinar, não significa que se se saiba quando e onde a A. tomou esse mesmo conhecimento, para além de que não pode haver contradição entre um facto não provado e um facto provado.
Assim, concordando inteiramente com o decidido no transcrito despacho, consideramos suprida a primeira nulidade e indefere-se a segunda, assim procedendo a 3.ª conclusão do recurso principal e improcedendo as conclusões 4.ª a 9.ª.

As 3.ª e 4.ª questões.
Trata-se de saber se não ocorreu a transmissão do estabelecimento da 1.ª R. para a 2.ª R. e se o procedimento disciplinar, instaurado e decidido pela 1.ª, não é nulo, nem ineficaz, como pretende a apelante.
No seguimento da tese da A., de que tendo ocorrido a cessão de exploração do estabelecimento da 1.ª R. para a 2.ª R., o poder disciplinar passou a ter como titular a 2.ª demandada, pelo que o procedimento disciplinar, instaurado e decidido pela 1.ª, é nulo e ineficaz e tendo o Tribunal a quo decidido em conformidade, assim condenando a 2.ª R. nas consequências do despedimento ilícito, veio esta, ora apelante, defender que não ocorreu a transmissão do estabelecimento, sendo o procedimento disciplinar válido e eficaz, pelo que deverá ser absolvida do pedido.
Vejamos.
Estabelece a Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 2001-03-12[7], o seguinte:
Artigo 1.º
b) … é considerada transferência, na aceção da presente diretiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendendo-se como um conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória.
Artigo 3.º
1. Os direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes à data da transferência são, por esse facto, transferidos para o cessionário.
Tais disposições legais foram transpostas, para o direito interno, pelo Cód. do Trabalho de 2003, nos seguintes termos:
Artigo 318º
Transmissão da empresa ou estabelecimento
1 — Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmite-se para o adquirente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores [...].
3 — O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração da empresa, do estabelecimento ou da unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes exerceu a exploração da empresa, estabelecimento ou unidade económica.
4 — Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
Ora, como se vê das disposições legais transcritas, tanto nacionais como europeias, o legislador pretendeu atualizar o regime jurídico da transmissão da empresa ou estabelecimento, assim unificando debaixo do mesmo conceito as hipóteses de transferência de uma empresa, de um estabelecimento ou de parte de uma empresa ou de parte de um estabelecimento. Por outro lado, a mesma disciplina da transmissão da titularidade é aplicada à transmissão, cessão ou reversão da exploração, como é a nossão hipótese: cessão da exploração do estabelecimento industrial.
Acresce que, atento aquele conceito amplo de unidade ou entidade económica, desde que se mantenha a respetiva identidade, é indiferente que não tenha existido qualquer negócio translativo da propriedade do estabelecimento ou dos seus elementos, nomeadamente, corpóreos, entre transmitente e transmissário, pela interposição de um terceiro, ou de vários terceiros, pois o escopo do legislador consiste, por um lado, em permitir a continuação da exploração da posição de mercado que a unidade económica representa e, por outro lado, permitir a manutenção do nível do emprego que existia na entidade transmitente. E isto é assim mesmo quando haja um hiato no funcionamento da unidade económica, pois o que importa é que se mantenha aquela posição de mercado, tanto ao nível dos negócios, como dos contratos de trabalho [segurança no emprego][8].
Este conceito briga com a conceção que a doutrina e a jurisprudência nacionais desenvolveram ao longo de anos, frente ao disposto no Art.º 37.º da LCT[9], em que se exigia, para a verificação da transmissão, que tivesse sido celebrado um contrato translativo do estabelecimento entre transmitente e transmissário e que não ocorresse qualquer hiato na atividade do mesmo estabelecimento.
No entanto, desde a Diretiva n.º 77/187/CEE, do Conselho, de 1977-02-14, alterada pela Diretiva n.º 98/50/CE, do Conselho, de 1998-06-29, que precederam a vigente Diretiva 2001/23/CE, do Conselho, de 2001-03-12, tal exigência não se coloca, ou é secundarizada, porque o relevante é a manutenção da posição de mercado que a unidade económica representa, naquela dupla vertente da continuação da atividade económica e da manutenção do emprego, o que veio a ficar completamente clarificado para todos, entre nós, com a aprovação do Cód. do Trabalho de 2003[10].
Dado os escopos assinalados, tais normas – de interesse e ordem pública e de natureza imperativa – não podem ser afastadas por acordo entre particulares, nomeadamente, transmitente e transmissário, cedente e cessionário, ou reversante e reversário, em sentido desfavorável aos trabalhadores, pois elas visam exatamente a manutenção dos postos de trabalho existentes na data da transmissão, atento o princípio da segurança no emprego, ínsito no Art.º 53.º da Constituição da República.[11]
No entanto, tendo a 1.ª R. sido declarada em situação de insolvência, como vem provado, põe-se a questão de saber se esta disciplina lhe é aplicável, atento o disposto no Art.º 5.º da referida Diretiva, que dispõe:
1. Salvo determinação em contrário dos Estados-Membros, os artigos 3.º e 4.º não se aplicam a uma transferência de empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento quando o cedente for objeto de um processo de falência ou de um processo análogo por insolvência promovido com vista à liquidação do seu património e que esteja sob o controlo de uma entidade oficial competente (que pode ser um administrador de falências, autorizado por uma entidade competente).
2. Quando os artigos 3.º e 4.º se aplicarem a uma transferência no decurso de um processo de insolvência que tenha sido instaurado em relação a um cedente (independentemente do facto de tal processo ter ou não sido instaurado com o objetivo de proceder à liquidação do seu património), e desde que esse processo esteja sob o controlo de uma entidade oficial competente (que pode ser um administrador de falências, se determinado pela legislação nacional), o Estado-Membro pode determinar que:
a) Sem prejuízo do n.º 1 do artigo 3.º, as dívidas do cedente decorrentes de contratos de trabalho ou de relações de trabalho pagáveis antes da data da transferência ou antes da abertura do processo de falência não sejam transferidas para o cessionário, desde que esse processo dê lugar, por força da legislação em vigor nesse Estados-Membro, a uma proteção pelo menos equivalente à prevista para situações abrangidas pela Diretiva 80/987/CEE do Conselho, de 20 de outubro de 1980, relativa à aproximação das legislações dos Estados--Membros respeitantes à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador e/ou, alternativamente, que:
b) O cessionário, o cedente, ou a pessoa ou pessoas que exercem as funções do cedente, por um lado, e os representantes dos trabalhadores, por outro lado, possam acordar em certas alterações das condições de trabalho, na medida em que a legislação ou a prática em vigor o permitam, com o objetivo de salvaguardar as oportunidades de emprego através da garantia de sobrevivência da empresa, do estabelecimento ou da parte de empresa ou estabelecimento em questão.
Destas disposições do Art.º 5.º da Diretiva resulta que, visando o processo de insolvência o desmantelamento da unidade económica porque, por exemplo, cada elemento do seu ativo vai ser objeto de venda judicial, em separado, nesse caso não se aplica a disciplina da transferência, cessão ou reversão da unidade económica, porque esta vai desaparecer, enquanto tal. Porém, se as medidas adotadas no processo de insolvência visarem a manutenção da unidade económica, embora com alteração subjetiva do titular do estabelecimento ou da sua exploração [isto é, do empregador], nada impede que se mantenha a proteção dos trabalhadores, sendo anódino o fenómeno da insolvência.[12]
In casu, dados os factos provados, concluímos que a cessão da exploração do estabelecimento industrial da 1.ª R. para a 2.ª R., depois de declarada aquela em situação de insolvência, visou a conservação da unidade económica, afirmando-se que com ela se pretendia evitar o despedimento coletivo dos trabalhadores da 1.ª R., sendo certo que, naturalmente, tal negócio respeitou os interesses do desenvolvimento económico da unidade industrial em causa.
Assim, é a disciplina das disposições legais acima transcritas aplicável ao caso, tanto mais que o CT2003 nada dispõe em sentido contrário – cfr. a primeira parte do n.º 1 do Art.º 5.º da Diretiva referida: “Salvo disposição em contrário dos Estados-Membros…”.
No entanto, tendo as RR. acordado, ao celebrar o contrato de cessão de exploração, que os contratos de trabalho dos trabalhadores da 1.ª R. não acompanhavam a referida cessão de exploração, pretendendo que a R. D… não ingressasse no estatuto jurídico-laboral da 1.ª R., C…, agiram contra legem, em fraude à lei. Na verdade, clausularam em sentido diametralmente oposto ao direito nacional e comunitário, tendo agido ao longo do tempo em consonância com tal propósito, como se vê da atitude tomada com o procedimento disciplinar instaurado. Por exemplo, a 2.ª R. sofre os alegados prejuízos causados pelo imputado comportamento da A., no que respeita à produção, em excesso, de fio encomendado pela M…, mas é a 1.ª R. quem age disciplinarmente, sendo certo que o seu património corre o risco de desaparecer no culminar do processo de insolvência, assim se esfumando a garantia patrimonial dos credores, nomeadamente dos trabalhadores, enquanto a 2.ª R., continuando com o seu giro comercial e industrial, não tem de agir disciplinarmente, isto é de despedir e de correr o risco de vir a ser condenada pelas consequências do despedimento ilícito.[13]
É manifesto que o contrato foi celebrado contra lei imperativa, pelo que temos de entender que ocorreu a transmissão da unidade económica, nos termos previstos no CT2003 e na Diretiva 2001/23/CE, e com ela foram transferidos para a 2.ª R. os contratos de trabalhado dos trabalhadores da 1.ª R., existentes na data da transferência, pelo que passou aquela, desde então, a ser a respetiva empregadora.
Daí que se tenha de entender que foi a 2.ª R., D…, quem procedeu ao despedimento da A., pois ambas as RR. agiram de comum acordo com o fim de afastar da 2.ª as eventuais responsabilidades sociais do negócio, tendo a 1.ª assumido formalmente efetuar o despedimento que a 2.ª R. fez sem processo disciplinar; tanto assim é que apenas a 2.ª R. exerce poderes sobre o estabelecimento, que ela tomou de exploração.
Por isso, não ocorreu qualquer nulidade da sentença, por contradição entre os fundamentos e a decisão, pois a dificuldade dos termos da causa não facilitou certamente um discurso mais claro; na verdade, agindo em fraude à lei, a 2.ª R. pretendeu obter um benefício para si, com o sacrifício eventual de interesses dos trabalhadores, usando a 1.ª R., como empregadora.
De qualquer modo, mesmo que assim não se entendesse, sempre se poderia afirmar que o procedimento disciplinar foi instaurado e decidido a non domino.
Na verdade, a partir da data da celebração do contrato de cessão da exploração, tendo os contratos de trabalho acompanhado o estabelecimento, cuja exploração passou para a 2.ª R., a 1.ª R. deixou de ser a empregadora da A.[14], perdendo esta o poder disciplinar, atento o disposto, a contrario sensu, nos Art.ºs 365.º e ss. do CT2003, pelo que o procedimento disciplinar instaurado à A. é ineficaz. Tal significa, por isso, que a A. foi despedida sem precedência de procedimento disciplinar. E foi-o pela 2.ª R. por ser ela quem efetivamente permite ou impede os trabalhadores de exercer atividade no estabelecimento fabril que explora, pelo que a não ser assim, há muito teria a 2.ª R. convocado a A. para desfazer o “equívoco do despedimento” e para a convidar a retomar o trabalho. Tal não aconteceu porque ambas as RR. agiram em fraude à lei, como já se explicitou anteriormente, na tentativa de iludir as disposições legais, comunitárias e nacionais, acerca da transmissão do estabelecimento.
Em síntese, concluímos que ocorreu transmissão do estabelecimento e a A. foi ilicitamente despedida, pela 2.ª R.
Improcedem, destarte, as conclusões 10 a 49 do recurso principal.

A 5.ª questão.
Trata-se de saber se existiu justa causa de despedimento.
O despedimento ocorreu sem precedência de procedimento disciplinar, válido e eficaz, como se referiu nas questões anteriores, o que o tornou, sem mais, ilícito.
No entanto, admitindo a regularidade de tal procedimento, o que se dá de barato face ao modo como a apelante recorre, passaremos a analisar a questão agora posta, de saber se existiu justa causa para o despedimento.
Tendo os factos imputados à A., a título de justa causa de despedimento, ocorrido no ano de 2008, portanto, depois de 2003-12-01, ao caso aplica-se o CT2003, atento o disposto no Art.º 3.º, n.º 1 da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto.
Ora, estabelece o Art.º 396.º, n.º 1 do CT[15] que O comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, constitui justa causa de despedimento.
Decompondo o conceito de justa causa, constante da norma, logo se vê que ele se analisa em três elementos, a saber:
a) - Comportamento do trabalhador, culposo – elemento subjetivo;
b) - Uma situação de impossibilidade prática de a relação de trabalho subsistir – elemento objetivo e
c) - Uma relação causal – nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade.
Tal significa que o comportamento do trabalhador tem de lhe poder ser imputado – atribuída a sua autoria[16] – a título de culpa.
Por outro lado, a justa causa tem de ser apreciada em concreto, isto é, o comportamento do trabalhador tem de ser analisado integrado dentro da organização produtiva que é a empresa da entidade empregadora e face aos interesses desta; isto é, como o trabalhador é um elemento da empresa, integrado na respetiva organização dinâmica, o seu comportamento também tem de ser visto em ação, para se poder aferir da sua gravidade e consequências dentro e para a empresa. Para isso, interessa, nomeadamente, averiguar das relações entre o trabalhador e os seus colegas de trabalho, da relação entre o trabalhador e a empresa, saber da prática disciplinar em geral e em relação ao trabalhador em causa e todas as outras circunstâncias concretas do caso.
É fazendo o caldeamento crítico de todos estes elementos e circunstâncias que, caso a caso, se há de concluir pela existência ou não de justa causa, face ao grau de gravidade da conduta, em si mesma e nas suas consequências, que determine a impossibilidade da manutenção do vínculo laboral. Pois, se atendendo ao princípio da proporcionalidade e fazendo apelo a juízos de equidade, for possível a conservação do contrato pela aplicação de sanção mais leve, é isso o que deve ser feito: o despedimento é a sanção mais grave a que se deverá recorrer apenas quando outra sanção não possa eficazmente ser aplicada.
Como se vê, são os mesmos os pressupostos da justa de despedimento, antes e depois da entrada em vigor do CT2003[17].
Por outro lado, dispõe o mesmo Art.º 396.º do CT2003:
‘3 — Constituem, nomeadamente, justa causa de despedimento os seguintes comportamentos do trabalhador:
c) Provocação repetida de conflitos com outros trabalhadores da empresa;
d) Desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, das obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho que lhe esteja confiado;
e) Lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa;
i) Prática, no âmbito da empresa, de violências físicas, de injúrias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhadores da empresa, elementos dos corpos sociais ou sobre o empregador individual não pertencente aos mesmos órgãos, seus delegados ou representantes;’.
Analisando criticamente os factos, parece poder afirmar-se que a A. deu lugar à produção, em excesso, de cerca de 150 kg de fio, o que originou a devolução da cliente M…, sendo que o fio a mais foi devolvido para ser tingido noutra cor, o que originou para a 2.ª R., D…r, um custo acrescido de € 200,00, que a trabalhadora tentou justificar por meios não corretos. Por outro lado, provou-se também que a A., vendo a colega L… a conversar com o gerente G…, afirmou que quem a denunciasse já não subiria a rampa de acesso à empresa. Tal matéria corresponde aos factos assentes, supra, sob os n.ºs 4 a 10, os quais, por sua vez, têm a sua fonte nos pontos 11 a 18 e 22 da nota de culpa.
A apelante entende que se deveria ter dado como provados os restantes factos enunciados na nota de culpa e elenca os depoimentos das testemunhas com base nos quais tal devia ter acontecido, pretendendo que a Relação o faça. Porém, a recorrente não impugnou a decisão da matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, pretendendo apenas que se considere que in casu se encontra preenchido o conceito de justa causa. No entanto, não tendo impugnado tal decisão de facto, apesar de os depoimentos das testemunhas terem sido gravados, a Relação apenas poderá ter em consideração, no juízo a efetuar acerca da justa causa, os factos dados como provados, sendo eles os constantes dos pontos referidos: 4 a 10.
Só que, por aqui, deveria a questão improceder, pois a apelante recorre, nesta parte, fundando-se em todos os factos alegados na nota de culpa, sendo certo que a prova produzida no procedimento disciplinar já foi tomada em conta pelo Tribunal a quo na sua decisão de facto e produziu o resultado referido.
Comparando os factos provados e os alegados na nota de culpa, parece claro que não ocorreu justa causa para o despedimento. Na verdade, não se provou nenhum dos factos alegados nos pontos, nomeadamente, 4, 6, 9 e 25 da nota de culpa.
Quanto aos factos provados, no essencial, a A. deu lugar à produção, em excesso de cerca de 150 Kg de fio, o que ocasionou um prejuízo de cerca de € 200,00 e ameaçou a colega L…, conforme consta no ponto 10 dos factos provados.
Ora, sem mais, temos de convir que tais factos não apresentam um grau de gravidade que impossibilitem a manutenção do contrato de trabalho, surgindo o despedimento como uma sanção exagerada para uma trabalhadora que há mais de três décadas prestava a sua atividade para as RR., desconhecendo-se qualquer passado disciplinar.
Por isso, mesmo que o procedimento disciplinar tivesse sido regularmente instaurado e decidido pela 2.ª R., ora apelante, certo é que o despedimento sempre teria de ser considerado ilícito, dada a ausência de justa causa.
Do exposto resulta que a conduta da A. não tornou imediata e praticamente impossível a manutenção do contrato de trabalho, mantendo-se o suporte psicológico da relação, nada fazendo prever que se a A. tivesse sido punida com uma sanção conservadora do vínculo viesse mais tarde a repetir a infração, pois ela nunca antes o houvera feito e aquilo que agora realizou não apresenta um grau de gravidade, em si e nas suas consequências, que pudesse conduzir a extrair contrária conclusão, pois o despedimento tem de ser entendido, dentro do leque das sanções disciplinares aplicáveis, como a ultima ratio.
Cremos, deste modo, que não ocorreu justa causa de despedimento.
Improcedem, assim, as conclusões 50 a 60 do recurso principal.

A 6.ª questão.
Trata-se de saber se a indemnização de antiguidade, fixada pelo Tribunal a quo em 30 dias de retribuição base e diuturnidades, deverá ser reduzida para 15 dias e se não são devidas as retribuições vencidas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença.
Vejamos.
A apelante entende que a indemnização deve ser fixada em 15 dias - e não 30, como o fez o Tribunal a quo - de retribuição base e diuturnidades, por cada ano de antiguidade ou fração, sendo de atender, para o efeito, à prova produzida nos autos de procedimento disciplinar, pois foi nesse contexto que foi apreciada a conduta da A. e tomada uma decisão quanto à sanção disciplinar a adotar e não apenas à prova produzida em julgamento, cerca de 2 anos mais tarde. Por outro lado, entende que, mesmo que a apelante fosse a sua empregadora, não tem a A. direito a exigir-lhe todas as retribuições vencidas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, e muito menos, ser ela a condenada a pagar-lhas.
Como já se referiu anteriormente, neste recurso apenas se pode atender aos factos dados como provados supra, uma vez que a apelante não impugnou a decisão proferida sobre a matéria de facto, apesar de se ter procedido à gravação dos depoimentos das testemunhas produzidos em audiência. Assim, é irrelevante invocar a prova produzida no procedimento disciplinar, pois ela já terá sido considerada na decisão de facto do Tribunal a quo, se tiver sido caso disso, como anteriormente se referiu. Por isso, pretendendo a apelante a alteração da indemnização, atendendo a 15 dias de retribuição, em vez dos 30 tidos em conta pelo Tribunal a quo, com fundamento na prova produzida no procedimento disciplinar, é manifesto que tal desiderato não pode ser atendido, por falta de legal fundamento.
Por outro lado, entendendo a apelante que não deverá ser condenada a pagar à A. as retribuições vencidas e vincendas desde o despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença porque ela, apelante, é mera cessionária da exploração do estabelecimento industrial da 1.ª R., tal desiderato também não poderá ser atendido porquanto, como acima se concluiu, a apelante despediu a A., ilicitamente, porque sem justa causa, apurada em prévio procedimento disciplinar, não eficaz.
Tal significa que a decisão do Tribunal a quo acerca da condenação da 2.ª R., D..., na indemnização de antiguidade e das retribuições vencidas e vincendas, no modo e nos montantes em que o fez, está correta, considerando, nomeadamente, que as RR. agiram conjuntamente, em fraude à lei, desde a data em que celebraram o contrato de cessão da exploração do estabelecimento industrial da 1.ª R.
Improcedem, assim, as restantes conclusões - 61 a 64 - do recurso principal.
A 7.ª questão.
Trata-se de saber, no recurso subordinado interposto pela A., se, na hipótese de proceder o recurso principal, devem as RR. ser condenadas solidariamente no pagamento à A. da indemnização de antiguidade e restantes créditos laborais.
Ora, não tendo o recurso principal obtido provimento, fica prejudicado o conhecimento do recurso subordinado.
Daí que não se tome conhecimento do seu objeto.

Decisão.
Termos em que se acorda em
I – Quanto ao recurso principal:
a) Ordenar o desentranhamento dos documentos juntos com a alegação e sua entrega à apelante, D..., indo a mesma condenada em multa, que se fixa em 1 UC;
b) Suprir a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia e indeferir a nulidade da mesma, por contradição entre os fundamentos e a decisão;
c) Negar provimento à apelação, assim confirmando a sentença recorrida, ainda que por fundamentação não inteiramente coincidente e
II – Quanto ao recurso subordinado:
d) Não tomar conhecimento do seu objeto.
Custas do recurso principal pela 2.ª R., D... e, quanto ao recurso subordinado, sem custas.

Porto, 2012-04-16
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
António José Fernandes Isidoro
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho
_________________
[1] Atento o disposto no Art.º 707.º, n.º 2 do CPC, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, ex vi do disposto nos Art.ºs 11.º, n.º 1 – a contrario sensu – e 12.º, n.º 1, ambos deste diploma.
[2] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respetivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532.
[3] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro.
[4] Com a reforma dos recursos o Art.º 706.º do Cód. Proc. Civil foi revogado.
[5] Cfr. Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1976, pág. 175 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1990-12-13, 1991-01-31, 1991-04-09, 1994-03-09 e 1995-05-30, in Boletim do Ministério da Justiça, respetivamente, n.º 402, págs. 518-522, n.º 403, págs. 382-392, n.º 416, págs. 558-565, n.º 435, págs. 697-709 e n.º 447, págs. 324-329.
[6] In www.tribunalconstitucional.pt.
[7] In Jornal Oficial das Comunidades Europeias, vulgo JO, n.º L 82, de 2001-03-22, págs. 16 a 20, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos.
[8] Cfr. o Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 2007-09-13 [parte decisória], Processo C-458/05, in Jornal Oficial da União Europeia C 269, de 2007-11-10, págs. 10 e 11.
[9] Abreviatura de Lei do Contrato de Trabalho, vulgo do regime jurídico do contrato individual de trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 1969-11-24.
[10] Cfr. Júlio Gomes, in O conflito entre a jurisprudência nacional e a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias em matéria de transmissão do estabelecimento no Direito do Trabalho: o art. 37º da LCT e a diretiva de 14 de fevereiro de 1977, 77/187/CEE, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Ano XXXVIII (XI da 2.ª série) – N.ºs 1-2-3-4, janeiro – dezembro – 1996, págs. 77 e segs., in Comentário de Urgência ao Acórdão do TJCE, de 20 de novembro de 2003, Processo C-340/01, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Ano XLV (XVIII da 2.ª série) – N.ºs 1-2-3, janeiro – setembro – 2004, págs. 213 e segs., in A Jurisprudência Recente do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias em Matéria de Transmissão de Empresa, Estabelecimento ou Parte de Estabelecimento – Inflexão ou Continuidade?, ESTUDOS DO INSTITUTO DE DIREITO DO TRABALHO, VOLUME I, 2001, págs. 481 e segs. e in DIREITO DO TRABALHO, volume I, Relações Individuais de Trabalho, 2007, págs. 808 e segs., Joana Simão, in A transmissão do estabelecimento na jurisprudência do trabalho comunitária e nacional, Questões Laborais, Ano IX – 2002, n.º 20, págs. 203 e segs., Francisco Liberal Fernandes, in Transmissão do estabelecimento e oposição do trabalhador à transferência do contrato: uma leitura do art. 37.º da LCT conforme o direito comunitário, Questões Laborais, Ano VI – 1999, n.º 14, págs. 213 e segs., Pedro Furtado Martins, in Algumas observações sobre o regime da transmissão do estabelecimento no direito do trabalho português, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Ano XXXVI (IX da 2.ª série) – N.º 4, outubro – dezembro – 1994, págs. 357 e segs., Joana Vasconcelos, in A transmissão da Empresa ou Estabelecimento no Código do Trabalho, Prontuário de Direito do Trabalho, CEJ, n.º 71, maio – agosto de 2005, págs. 73 e segs., Luís Carvalho Fernandes, in Efeitos da Declaração de Insolvência no Contrato de Trabalho segundo o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Ano XLV (XVIII da 2.ª série) – N.ºs 1-2-3, janeiro – setembro – 2004, págs. 5 e segs., Carlos Alberto da Mota Pinto, in Cessão da Posição Contratual, Almedina, 1982, págs. 88 e ss. e João Leal Amado, in Contrato de Trabalho À luz do novo Código do trabalho, Coimbra Editora, 2009, págs. 193 ss..
Cfr. também os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1990-10-17 e de 2004-05-27, in, respetivamente, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 400, págs. 480 a 485 e www.dgsi.pt [Proc. n.º 03S2467], o Acórdão do Tribunal Constitucional de 1991-11-14, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 411, págs. 119 a 125 e o Parecer do Ministério Público de 2000-09-27 , in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 499, págs. 273 a 282.
[11] Francisco Liberal Fernandes, cit., nomeadamente, págs. 216 e 217, Catarina de Oliveira Carvalho, in Admissibilidade de um acordo entre transmitente e transmissário no sentido de excluir a transmissão de contratos de trabalho, Questões Laborais, Ano X – 2003, n.º 21, págs. 99 e segs., Júlio Gomes, in O conflito, cit., págs. 109, nomeadamente e Maria Jorge Morais Ribeiro da Rocha, in Da transmissão da empresa ou estabelecimento no âmbito da relação laboral, Minerva – Revista de Estudos Laborais, Ano III – 2004, N.º 5, Almedina, págs. 129 ss.
[12] Cfr. Júlio Gomes, in A Jurisprudência Recente…, cit., pág. 506, nomeadamente, Catarina de Oliveira Carvalho, in Algumas Questões sobre a Empresa e o Direito do Trabalho no novo Código do Trabalho, A Reforma do Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2004, págs. 437 ss., nomeadamente, a págs. 465 e Joana Vasconcelos, in Insolvência do Empregador, Destino da Empresa e Destino dos Contratos de Trabalho, VIII Congresso Nacional de Direito do Trabalho, Memórias, Coordenação do Prof. Doutor António Moreira, Almedina, 206, págs. 217 e segs., nomeadamente, a págs. 228 a 232.
[13] Cfr. Cláudia Maria Monteiro Gomes de Sousa, in A Fraude à Lei e o Despedimento Coletivo na Transmissão da Unidade Económica, Questões Laborais, Ano XVII – N.ºs 35-36 – janeiro/dezembro 2010, Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer, págs. 159 ss., nomeadamente, págs. 165 ss.
[14] Cfr. Júlio Manuel Vieira Gomes, in Novas, Novíssimas e não tão Novas Questões sobre a Transmissão da Unidade Económica em Direito do Trabalho, Novos Estudos de Direito do Trabalho, Wolters Kluwer Portugal, Coimbra Editora, 2010, págs. 89 e ss., nomeadamente, págs. 115 a 117.,
[15] O que constitui uma reprodução ipsis verbis do Art.º 9.º, n.º 1 do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de fevereiro [de ora em diante designado apenas por LCCT], bem como do Art.º 351.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009, aprovado pelo Art.º 1.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
[16] Imputar... é colocar na conta de alguém uma ação censurável, uma falta, logo, uma ação previamente confrontada com uma obrigação ou com uma interdição que essa ação infringe... ou... Imputar uma ação a alguém é atribuir-lha como sendo o seu verdadeiro autor, colocá-la, por assim dizer, na sua conta, e tornar esse alguém responsável por ela. Cfr. Paul Ricoeur, in O JUSTO OU A ESSÊNCIA DA JUSTIÇA, Instituto Piaget, Lisboa, 1995, pág. 38.
[17] Cfr. António Monteiro Fernandes, in DIREITO DO TRABALHO, 12.ª edição, 2004, págs. 554 ss., Pedro Romano Martinez, in DIREITO DO TRABALHO, 2.ª edição, 2005, págs. 932 ss., Maria do Rosário Palma Ramalho, in DIREITO DO TRABALHO, Parte II – Situações Laborais Individuais, 2006, pág. 835, João Leal Amado, in ALGUMAS NOTAS SOBRE O REGIME DO DESPEDIMENTO CONTRA LEGEM NO CÓDIGO DO TRABALHO, VII CONGRESSO NACIONAL DE DIREITO DO TRABALHO, 2004, págs. 284 e 285, nomeadamente e TEMAS LABORAIS, 2005, págs. 118 e 119, nomeadamente e Júlio Manuel Vieira Gomes, in DIREITO DO TRABALHO, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, 2007, págs. 944 ss.
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S U M Á R I O
I – Transmitida a titularidade ou a exploração de um estabelecimento, ou efetuada a sua reversão, a posição de empregador passa a ser ocupada pelo transmissário, cessionário ou reversário, pois o legislador pretende que se mantenha a posição de mercado que o estabelecimento representa, tanto ao nível dos negócios, como ao nível do emprego – cfr. Art.º 318.º do CT2003 e Art.ºs 1.º e 3.º da Diretiva 2001/23/CE, do Conselho.
II – Dados os escopos assinalados, tais normas – de interesse e ordem pública e de natureza imperativa – não podem ser afastadas por acordo entre particulares, em sentido desfavorável aos trabalhadores, pois elas visam a manutenção dos postos de trabalho existentes na data da transmissão, atento o princípio da segurança no emprego, ínsito no Art.º 53.º da Constituição da República.
III – Dos n.ºs 2 e 3 do Art.º 5.º da Diretiva resulta que, visando o processo de insolvência o desmantelamento da unidade económica, não se aplica a disciplina da transferência, cessão ou reversão da unidade económica; porém, se as medidas adotadas no processo de insolvência visarem a manutenção da unidade económica, embora com alteração subjetiva do titular do estabelecimento ou da sua exploração, nada impede que se mantenha a proteção dos trabalhadores, como sucede in casu.
IV – Tendo cedente e cessionário acordado, ao celebrar o contrato de cessão de exploração, que os contratos de trabalho dos trabalhadores do primeiro não acompanhavam a referida cessão de exploração, pretendendo que o segundo não ingressasse no estatuto jurídico-laboral do primeiro, agiram contra legem, em fraude à lei.
V – Tendo o cedente instaurado procedimento disciplinar, que desaguou em despedimento, contra um dos trabalhadores do estabelecimento, tal procedimento é ineficaz, por se tratar do exercício do poder disciplinar a non domino.
VI – Uma vez que o cedente e o cessionário agiram em fraude à lei, deve entender-se, dentro do circunstancialismo referido, que o trabalhador foi ilicitamente despedido, pelo cessionário.

Manuel Joaquim Ferreira da Costa

Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico.
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