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terça-feira, 31 de julho de 2012

PROCESSO DISCIPLINAR - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça - 05/07/2012


Acórdãos STJ
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
126/11.5YFLSB
Nº Convencional: CONTENCIOSO
Relator: MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Descritores: PROCESSO DISCIPLINAR
PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
DECISÃO FINAL
PRESCRIÇÃO
PROCEDIMENTO CRIMINAL
PATROCÍNIO JUDICIÁRIO

Data do Acordão: 05-07-2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: RECURSO DE CONTENCIOSO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Legislação Nacional:
CONSTITUIÇÃO, ARTIGO 32º
CÓDIGO PENAL, ARTIGO 121º
ESTATUTO DISCIPLINAR DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, APROVADO PELA LEI Nº 58/2008, DE 9 DE SETEMBRO
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE 7 DE ABRIL DE 2011, PROC. Nº 152/10.1 YFLSB

Sumário :

1. O Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública, aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro, é aplicável aos factos praticados antes da sua entrada em vigor (nº 1 do artigo 4º da Lei nº 58/2008).
2. Os prazos de prescrição previstos no novo Estatuto aplicam-se aos factos anteriores, mas só se contam a partir da entrada em vigor do Estatuto, salvo se for mais favorável a aplicação da lei antiga.
3. O Supremo Tribunal de Justiça tem entendido que a decisão final do procedimento disciplinar, para efeitos de prescrição, tendo havido reclamação do Conselho Permanente para o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, é o acórdão do Plenário.
4. O procedimento disciplinar prescreve se o arguido não foi notificado da deliberação final do Conselho Superior da Magistratura no prazo de dezoito meses, contado da data em que o procedimento foi instaurado (artigo 6º, nº 6).
5. Em caso de impugnação judicial dessa deliberação, não é aplicável o nº 3 do artigo 121º do Código Penal.
6. O procedimento disciplinar tem natureza administrativa e termina com uma decisão administrativa – no caso, do Conselho Permanente ou do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, conforme não tenha ou tenha havido reclamação; não tem duas fases, uma administrativa e outra judicial, formando um suposto conjunto.
7. A aplicação do nº 3 do artigo 121º do Código Penal traduzir-se-ia, aliás, num regime mais gravoso para o arguido do que aquele que resulta do nº 6 do artigo 7º do Estatuto Disciplinar.
8. Da exigência constitucional de que sejam assegurados ao arguido “os direitos de audiência e defesa”, não resulta a obrigatoriedade de que o procedimento disciplinar e o julgamento da impugnação judicial da decisão nele proferida tenham de estar concluídos em vinte e sete meses, contados desde o início do procedimento disciplinar.
9. Aliás, se assim fosse, o legislador teria aprovado um regime que manifestamente conduziria à impossibilidade de punir as sanções disciplinares.

Decisão Texto Integral:

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça:


1. Em 10 de Novembro de 2010, AA, Juiz de direito, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 20 de Setembro de 2011, que indeferiu o requerimento de que fosse declarada a prescrição do procedimento disciplinar contra ele instaurado em 27 de Janeiro de 2009, requerimento esse datado de 2 de Maio de 2011.
Neste procedimento, tinha-lhe sido aplicada a pena disciplinar de advertência registada, por deliberação do mesmo Plenário de 20 de Abril de 2010. Também esta deliberação havia sido impugnada mediante recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, que, por acórdão de 7 de Abril de 2011, indeferiu a anulação pretendida.

O recorrente sustenta, em síntese, que a decisão final do procedimento disciplinar foi o acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, para o qual reclamou da deliberação do respectivo Conselho Permanente; que desse acórdão interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça; que se deve aplicar o disposto no nº 3 do artigo 121º do Código Penal – “só este entendimento é conforme às garantias de defesa constitucionalmente previstas do Arguido em processo penal, aplicáveis a todos os procedimentos sancionatórios, nos termos do art. 32º, nº 10, da Constituição da República Portuguesa"; e que, portanto, “o procedimento disciplinar instaurado ao arguido prescreveu no (…) dia 26 de Março de 2011”.

Alega que “deve a presente acção ser julgada procedente e, assim, o (…) acórdão anulado, concluindo-se pela prescrição das infracções disciplinares imputadas ao A. E, em consequência, pelo arquivamento dos autos (…)”.

Após o visto do Ministério Público, foi apensado o processo nº 123/10.8YFLSB, no qual foi proferido o acórdão do Supremo Tribunal da Justiça de 7 de Abril de 2011.

O Conselho Superior da Magistratura respondeu, sustentando a improcedência do recurso.

Em seu entender, “a decisão final, para efeitos do artigo 6º, nº 6, do Estatuto Disciplinar (ED), será”, no caso de ter havido reclamação para o Plenário de deliberação do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura, “a decisão do Permanente”; de qualquer modo, as normas do Estatuto relativas à prescrição só valem para a “fase administrativa do procedimento disciplinar”, e a prescrição só ocorreria em 27 de Julho de 2010 (portanto, depois da notificação das deliberações do Conselho Permanente e do Plenário).


2. Em alegações, o recorrente veio suscitar a questão prévia da “falta de constituição de advogado ou de jurista designado”, por vir a contestação do Conselho Superior da Magistratura subscrita pelo seu Vice-Presidente: “(…) o recurso previsto nos arts. 168º e ss. do Estatuto dos Magistrados Judiciais na sequência da entrada em vigor do CPTA é hoje, em rigor, uma acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo, aplicando-se a esta os preceitos deste Código e do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei nº 13/2001, de 19 de Fevereiro”. Relevaria agora o artigo 11º do CPTA.

Requereu, consequentemente, que o Conselho Superior da Magistratura fosse notificado para constituir advogado ou nomear jurista para o representar (art. 33º do Código de Processo Civil).

Quanto à prescrição, o recorrente reiterou o entendimento de que “caso o arguido impugne judicialmente a decisão, o EDTFP não contém norma que fixe prazo de prescrição para tal situação, pois que os prazos de prescrição estabelecidos no seu art. 6º (e 26º) só se reportam à fase administrativa, nada nele se estabelecendo quanto à fase judicial. (…) Tem, necessariamente, que concluir-se haver um vazio no Estatuto Disciplinar que deverá ser preenchido através da remissão feita para as garantias do processo penal. E, nessa medida, deve ser aplicado o art. 121º, nº 3 do Código Penal, que determina que “(…) a prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver ocorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade”.

E repetiu que “só este entendimento” respeita o nº 10 do artigo 32º da Constituição.

Também alegaram o Conselho Superior da Magistratura e o Ministério Público.

O Conselho Superior da Magistratura, citando os acórdãos deste Supremo Tribunal de 16 de Dezembro de 2010 (proc. 34/2010.7YFLSB) e de 4 de Julho de 2002 (proc. 4336/01), começou por afirmar estar devidamente representado. Quanto ao mais, remeteu para a resposta e para a fundamentação da deliberação impugnada.

O Ministério Público veio sustentar a aplicabilidade do disposto no artigo 11º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, quanto à representação do Conselho Superior da Magistratura. Suscitou nova questão prévia: “o acto externo e lesivo, que a final decidiu do procedimento em causa, ao aplicar ao requerente a pena disciplinar, é a anterior deliberação de 20 de Abril de 2010”, e não a deliberação de 20 de Setembro de 2011. Quando muito, a figurar-se alguma potencialidade externa na deliberação de 20 de Setembro de 2011, então ela assumir-se-ia com carácter meramente confirmativo da anterior, como tal, nos termos previstos na alínea a) do art. 53º do CPTA, igualmente inimpugnável”; e, de qualquer modo, sempre seria “legalmente inadmissível” a pretensão de revogação da deliberação de 20 de Abril de 2010, “à luz do disposto no nº 1 do art. 141º do art. 147º do CPA".

No que toca à prescrição, o Ministério Público entende: que “a decisão final” a encerrar o procedimento disciplinar “é a do Plenário” e não do Conselho Permanente; que a reclamação para o Plenário é “necessária, com efeito suspensivo, para a abertura da via contenciosa (arts. 165º, 167º-A e 168º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais; art. 163º, nº 1 do CPA)”; e que nem se coloca a hipótese de aplicação do nº 3 do artigo 121º do Código Penal, nos termos pretendidos pelo recorrente, uma vez que não se pode “falar da prescrição de procedimento disciplinar, quando esse procedimento se encontra encerrado, com a decisão final administrativa”. “A eventual submissão ao controlo judicial da decisão em causa (…) não reabre, prolonga, ou vem coroar o procedimento disciplinar, que findo se mantém”.


3. Notificado para o efeito (fls. 63), o recorrente veio pronunciar-se sobre a nova questão prévia suscitada pelo Ministério Público a fls. 66, sustentando a sua improcedência.

E, a fls. 75, na sequência da notificação de fls. 71, veio reafirmar a ocorrência de prescrição.


4. Está assente o seguinte, com interesse para a decisão do recurso:

– Por deliberação do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura de 17 de Novembro de 2009, tomada na sequência de procedimento disciplinar instaurado por deliberação do mesmo Conselho Permanente de 27 de Janeiro de 2009, foi aplicada a AA a pena de advertência registada;

– Essa deliberação foi confirmada pelo Acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 20 de Abril de 2010, proferido na sequência de reclamação;

– Em 11 de Junho de 2010, AA recorreu para o Supremo Tribunal da Justiça do acórdão do Plenário;

– Por acórdão do Supremo Tribunal da Justiça de 7 de Abril de 2011, o recurso foi julgado improcedente (proc. nº 123/10.8YFLSB.S1);

– Em 2 de Maio de 2011, AA requereu ao Conselho Superior da Magistratura que declarasse o procedimento disciplinar extinto por prescrição;

– Por acórdão de 20 de Setembro de 2011 do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, esse requerimento foi indeferido.

– Em 10 de Novembro de 2011 (CONFERIR NO PROCESSO), AA interpôs recurso para o Supremo Tribunal da Justiça do Acórdão de 20 de Setembro de 2011.


5. Questões prévias

– Representação em juízo do Conselho Superior da Magistratura;

– Ilegalidade do recurso.

No que respeita à representação em juízo do Conselho Superior da Magistratura, reitera-se o que este Supremo Tribunal vem decidindo uniformemente, e que se pode ler no recente acórdão de 8 de Maio de 2012, proferido no proc. nº 114/11.1YFLSB. S1 (seguindo o que se decidira, por exemplo, no acórdão de 15-03-2012, aprovado no Proc. n.º 92/11.7YFLSB):

“O recorrido Conselho Superior da Magistratura foi representado no presente processo pelo seu vice-presidente.

(…) Parece não haver dúvidas de que o recurso das deliberações do Conselho Superior da Magistratura para o Supremo Tribunal de Justiça, regulado nos termos dos artigos 168º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais, se configura como uma acção administrativa especial, uma vez que os pedidos que nele podem ser formulados estão intimamente ligados ao estatuto competencial da Administração Pública, não sendo concebível que se pudesse dirigir contra particulares.

Ora sendo assim e para resolução da questão em apreço, há que ter em conta o Código de Processo nos Tribunais Administrativos, nomeadamente o disposto no seu artigo 11º, que dispõe sobre o patrocínio judiciário e representação em juízo.

(…) A exigência de patrocínio judiciário radica, fundamentalmente, na necessidade de as partes serem assistidas por pessoas tecnicamente apetrechadas para uma valoração exacta das razões que lhes assistem em face do direito aplicável.

O vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura é um juiz do Supremo Tribunal de Justiça – cfr. artigo 138º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.

Sendo assim, não se vê que não tenha a competência técnica para representar em juízo o referido Conselho.

E não possa ser abrangido na figura de “licenciado em direito” para exercer essa representação, a que se referem os citados nºs 2 e 4 do artigo 11º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Na verdade, se a um "licenciado em direito com funções de apoio jurídico” pode representar o Conselho Superior da Magistratura em juízo, porque razão um Juiz Conselheiro, vice-presidente desse Conselho, não o poderia fazer?

E quanto à mediação inerente ao patrocínio judiciário, a mesma é um postulado do princípio do direito ao acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, constitucionalmente garantido no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.

E mais uma vez se não vê a razão para distinguir para o efeito “um licenciado em Direito com funções de apoio jurídico” do Conselho Superior da Magistratura de um Juiz Conselheiro vice-presidente desse Conselho.

Ambos são licenciados em Direito, não se vendo em que a intervenção do primeiro seja mais garantística do que a da segundo na defesa do princípio constitucional em causa.

Concluímos, pois, estar o recorrido Conselho Superior da Magistratura devidamente representado em juízo, pelo que nenhuma irregularidade foi cometida a esse respeito”.

Indefere-se, portanto, o requerimento de que o Conselho Superior da Magistratura seja notificado para constituir advogado ou designar jurista que o represente, formulado pelo recorrente.

6. Relativamente à ilegalidade do recurso, suscitada pelo Ministério Público, entende-se que não se verifica, desde logo por se não tratar de acto confirmativo da Deliberação de 20 de Abril de 2010.

7. Cumpre então conhecer da questão da prescrição, que o recorrente funda na aplicação subsidiária do nº 3 do artigo 121º do Código Penal, por haver “um vazio no Estatuto Disciplinar” (art. 21º da petição), “caso o arguido impugne judicialmente a decisão” (art. 16º, também da petição).

É aplicável o novo Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública, aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro, não obstante ter entrado em vigor em 1 de Janeiro de 2009 (artigo 7º da Lei nº 58/2008) e, portanto, em momento posterior ao da prática dos “factos” que vieram a ser considerados infracções disciplinares, e pelas quais o recorrente fui punido com a pena de advertência registada. (nºs 1 e 3 do artigo 4º da Lei nº 58/2008).

O recorrente começa por afirmar que a decisão final do procedimento disciplinar é a deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura (20 de Abril de 2010), e não a do Conselho Permanente (17 de Novembro de 2009); o Conselho Superior da Magistratura discorda, como se viu.

A verdade, todavia, é a de que se trata de uma questão que é indiferente do ponto de vista do presente recurso. Em qualquer caso, sempre teria sido respeitado o prazo de 18 meses, previsto no nº 6 do artigo 6º do EDTAP para a prescrição do procedimento disciplinar (aplicável nos termos do disposto no artigo 131º do Estatuto dos Magistrados Judiciais).

Não é, pois, necessário apreciá-la. Sempre se recorda, no entanto, que o Supremo Tribunal da Justiça tem entendido que a decisão final do procedimento disciplinar, para efeitos de prescrição, tendo havido reclamação do Conselho Permanente para o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, é o acórdão do Plenário (cfr. acórdão de 7 de Abril de 2011, proferido no proc. nº 152/10.1 YFLSB desta Secção de Contencioso).

8. Contrariamente ao que o recorrente sustenta, o procedimento disciplinar não tem duas fases, uma fase administrativa e uma fase judicial, que suportem a construção que elabora, no sentido da aplicação do disposto no nº 3 do artigo 121º do Código Penal a um suposto conjunto formado por essas duas fases.

O procedimento disciplinar tem natureza administrativa e termina com uma decisão administrativa – no caso do procedimento disciplinar instaurado contra magistrados judiciais, com a deliberação do Conselho Superior da Magistratura (seja do Conselho Permanente, seja do Plenário, se houver reclamação).

Essa decisão pode ser judicialmente impugnada; e, se for o caso, inicia-se um processo diferente, de natureza judicial; processo esse que, como o recorrente expressamente afirma nas suas alegações, a fls. 39 – em contradição com a construção que sustenta – “é hoje, em rigor, uma acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo”.

Tanto basta para que se não possa aplicar o nº 3 do artigo 121º do Código Penal, tal como o recorrente pretende, ou seja, considerando que, desde o início do procedimento disciplinar e até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida na impugnação judicial deduzida contra a decisão administrativa final, não podem decorrer mais de vinte e sete meses (os dezoito previstos no artigo 6º, nº 6 do EDTAP acrescidos da metade a que se refere o nº 3 do artigo 121º do Código Penal).

Como expressamente se relata na Exposição de Motivos da Proposta de Lei nº 197/X, que esteve na origem da Lei nº 58/2008 (www.parlamento.pt), entre as alterações que então se pretenderam introduzir figuraram a “redução do prazo de prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar, que passa a ser de 1 ano a contar da data da infracção ou de 30 dias a contar do seu conhecimento pelo superior hierárquico (perto do regime hoje vigente para os trabalhadores em contrato individual de trabalho), sendo que as causas de suspensão de tal prazo passam a encontrar-se condicionadas pela observância estrita de preocupações tendentes a garantir a celeridade na marcha dos processos”, o “Estabelecimento inovador de um prazo máximo de 18 meses para a conclusão do procedimento disciplinar;” e a “redução dos prazos de prescrição das penas disciplinares, a contar da data em que a decisão se tornou inimpugnável: 1 mês para a repreensão escrita, 3 meses para a multa, 6 meses para a suspensão e 1 ano para a demissão, o despedimento por facto imputável ao trabalhador e a cessação da comissão de serviço”. Ou seja: o legislador pretendeu reformular o regime da prescrição, seja “do direito de instaurar procedimento disciplinar”, seja do “procedimento disciplinar”, seja da “prescrição das penas disciplinares”.

As duas primeiras hipóteses figuram no artigo 6º e a terceira no artigo 26º do EDTAP. Releva agora, manifestamente, a segunda (prescrição do procedimento disciplinar), que se traduziu numa inovação, por confronto com o regime constante do artigo 4º do EDFP, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro (os prazos de prescrição das penas figuravam no artigo 34º).

Da conjugação entre os nºs 6 e 7 do artigo 6º do EDTAP resulta:

– que o procedimento disciplinar prescreve, se o arguido não for notificado da decisão final no prazo de dezoito meses, contado desde data em que o procedimento foi instaurado,

– que este prazo apenas se suspende (o artigo 6º não define qualquer causa de interrupção) “durante o tempo em que, por força de decisão jurisdicional ou de apreciação jurisdicional de qualquer questão, a marcha do correspondente processo não possa começar ou continuar a ter lugar”.

Compreende-se que a razão de celeridade que o legislador quis imprimir na actuação disciplinar da Administração não possa aqui determinar solução diferente, uma vez que a mesma está impedida de actuar, por razões que lhe são estranhas e que obviamente escapam ao seu controlo.

A lei não previu, e manifestamente não quis prever, qualquer prazo para a decisão judicial que vier a ser tomada, se a decisão disciplinar administrativa vier a ser judicialmente impugnada – hipótese que se não confunde com aquela de que cura o nº 7 do artigo 6º.

Claro que em caso de impugnação judicial de uma decisão disciplinar final, se a decisão for anulada, a Administração tem de respeitar o prazo de dezoito meses previsto no nº 6, se a anulação for compatível com uma nova decisão condenatória; mas isso não significa que a apreciação judicial esteja sujeita a prazo de prescrição. Significa que, em tal hipótese, o procedimento administrativo “renasce” e, portanto, está sujeito ao mesmo prazo prescricional.

Recorde-se, por fim, que o regime do nº 3 do artigo 121º do Código Penal, preceito cuja epígrafe é “Interrupção da Prescrição”, tem por objectivo limitar (no sentido de proteger o arguido) o efeito das interrupções da prescrição do procedimento criminal (tal como o nº 3 do artigo 28º do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, no âmbito das contra-ordenações); não da suspensão, como facilmente se verifica do respectivo texto, que ressalva “o tempo de suspensão” da contagem do prazo de prescrição.

Esta razão de ser não procederia, pois, para justificar uma hipotética aplicação subsidiária em procedimento disciplinar. Essa aplicação, aliás, traduzir-se-ia num regime mais gravoso do que o que resulta do nº 6, que prevê um prazo único de dezoito meses – diferentemente do que sucede, quer com o procedimento criminal (cfr. artigo 118º do Código Penal), quer com o procedimento contraordenacional (cfr. artigo 27º do Decreto-Lei nº 433/82).

E recorde-se ainda que o mesmo nº 3 não se limita a prever o acréscimo de metade do prazo que ao caso couber. Prevendo a hipótese de, em “disposição especial” se prever um prazo de prescrição do procedimento criminal inferior a dois anos, fixa-se então como “limite máximo da prescrição (…) o dobro desse prazo”. Fosse este preceito aplicável ao caso em apreciação neste recurso, e não seria de nove meses o acréscimo do prazo de dezoito meses.

9. Também não ocorre a inconstitucionalidade apontada pelo recorrente. Segundo sustenta, só a aplicação do regime que descreve, e que retira da aplicação do nº 3 do artigo 121º do Código Penal (dezoito meses + metade), “é conforme às garantias de defesa constitucionalmente previstas do Arguido em processo penal, aplicáveis a todos os procedimentos sancionatórios, nos termos do art. 32º, nº 10, da CRP".

Não se vê como, da exigência constitucional de que sejam assegurados ao arguido “os direitos de audiência e defesa”, resulte a obrigatoriedade de que o procedimento disciplinar e o julgamento da impugnação judicial da decisão nele proferida tenham de estar concluídos em vinte e sete meses, contados desde o início do procedimento disciplinar; nem o recorrente o esclarece, limitando-se a afirmar que uma infracção criminal é mais grave do que uma infracção disciplinar e que, portanto, tem de haver um prazo de prescrição que abranja a apreciação judicial desta última.

Ora, ainda que essa afirmação fosse fundada, a verdade é que há uma enorme diferença entre a imprescritibilidade e a imposição constitucional do prazo de dezoito + nove meses, como o recorrente sustenta; e que, no caso, não é de forma alguma excessivo o tempo em que esses vinte e sete meses foram ultrapassados (o acórdão que indeferiu a arguição de nulidade do acórdão de 7 de Abril de 2011 foi aprovado em 6 de Julho seguinte e logo de seguida notificado ao recorrente).

Diga-se, aliás, que dificilmente se poderia aceitar que o legislador tivesse em mente um tal regime, que manifestamente conduziria à impossibilidade de punir as sanções disciplinares. Com efeito, ao estabelecer o prazo de dezoito meses no nº 6 do artigo 6º do EDTAP, o legislador reconheceu que esse é um prazo razoável de decisão da Administração; seria incompreensível pretender que a sua impugnação judicial tivesse imperativamente de estar decidida com trânsito em julgado no prazo de nove meses.


10. Nestes termos, julga-se improcedente o recurso.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 ucs.

Maria dos Prezeres Pizarro Beleza (Relatora)

Pires da Graça

Isabel Pais Martins

Fernandes da Silva

João Camilo

Paulo Sá


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