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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DO PEDIDO PERÍODO INTERMÉDIO - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto-16-01-2012


Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
293/11.8TBPFR-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA PAULA CARVALHO
Descritores: EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE
PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DO PEDIDO
PERÍODO INTERMÉDIO

Nº do Documento: RP20120116293/11.8TBPFR-A.P1
Data do Acordão: 16-01-2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: ANULADO O JULGAMENTO.
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Legislação Nacional: ARTº 236º, Nº 1 DO CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS

Sumário: I - O juiz deve rejeitar sempre o pedido de exoneração do passivo restante se for apresentado após a assembleia, enquanto decide livremente sobre a sua admissão ou rejeição se for apresentado no período intermédio”.
II - O período intermédio, quando o insolvente não é o requerente, constitui o tempo que decorre entre a citação e o encerramento da assembleia, pelo que o decurso do prazo de 10 dias não faz precludir o direito que o insolvente se arroga.
III - O juiz não pode indeferir o pedido de exoneração do passivo apresentado no denominado período intermédio sem ouvir os credores, o administrador e sem justificar.
IV - A premissa fundamental do artº 236, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas é que o pedido de exoneração possa ser apreciado na assembleia.
Reclamações:

Decisão Texto Integral: Processo nº 293/11.8tbpfr-Ap1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

Relatório
B…, Lda. requereu a insolvência de C….
Em 28 de Março de 2011 C… informou o processo que havia requerido apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de custas e nomeação de patrono, solicitando a suspensão da instância até essa nomeação.
Em 2 de Junho de 2011 o Instituto da Segurança Social comunicou que esse pedido foi indeferido.
Em 7 de Junho de 2011 foi proferida decisão a declarar a insolvência de C… e designou-se o dia 23 de Agosto de 1011 para a realização da assembleia de credores.
Em 17 de Agosto de 2011 o insolvente C… veio requerer que lhe fosse concedida a exoneração do passivo restante.
Em 23 de Agosto de 20011 foi realizada a assembleia de credores.
Nessa assembleia a Senhora Administradora da Insolvência declarou não se opor ao requerimento apresentado pelo insolvente quanto à exoneração do passivo restante.
O credor presente declarou abster-se.
De seguida, foi proferido o despacho a considerar que o requerimento do insolvente foi apresentado mais de 10 dias após a citação, pelo que, atento o disposto no art. 236 nº 1 e nº 2 e 238 do CIRE, foi indeferido.
Inconformado, o requerente interpõe o presente recurso, alegando, em síntese, que o decurso do prazo de 10 dias após a citação não preclude a possibilidade de o insolvente requerer a exoneração até ao termo da assembleia de credores

Conclui as alegações:
a) - A apresentação fora de prazo, causa de indeferimento liminar, do pedido de exoneração do passivo restante a que alude a alínea a) do n.º 1 do art.s 238.º do CIRE reporta-se à apresentação após a realização da assembleia de apreciação do relatório do administrador da insolvência;
b) - O decurso do prazo de 10 dias a contar da citação a que se reporta a 1.ª parte do n.º 1 do art.s 236.º do CIRE não preclude a possibilidade de o devedor apresentar o requerimento de exoneração até ao termo daquela assembleia;
c) - Nessa circunstância, o juiz decide por sua livre decisão e mais amplamente do destino desse pedido, em função dos dados substanciais constantes do processo sobre o mérito do comportamento dos devedores, v. g., os que se reportam às diversas alíneas b) a g) do n.º 1 daquele art.s 238.º e da posição assumida pelos credores e pelo administrador da insolvência na assembleia de apreciação do relatório.
d) - Tendo a iniciativa do processo de insolvência pertencido à sociedade "B…, Lda", e não ao recorrente, de harmonia com o art.º 236.º do CIRE, o requerimento de exoneração do passivo restante deveria ter sido apresentado nos 10 dias posteriores à sua citação para o processo (e que dadas as circunstâncias do pedido formulado à Segurança Social vieram a confundir o recorrente com os prazos em curso, não lhe tendo sido nomeado patrono para o representar condignamente), contudo, nunca depois da realização da assembleia de apreciação do relatório do administrador de insolvência, o que veio a acontecer;
e) - De acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 236.º do CIRE, o juiz deve rejeitar sempre o pedido se for apresentado após a assembleia de apreciação do relatório, enquanto decide livremente sobre a admissão ou rejeição se for apresentado no período intermédio;
f) - Período intermédio significa o que decorre entre a citação e a realização da assembleia;
g) - O pedido de exoneração do passivo restante pressupõe a insolvência, sendo uma confissão ficta de tal situação;
h) O requerimento contendo o pedido de exoneração do passivo restante foi apresentado em 17 de Agosto de 2011, i.e, antes da realização da assembleia de apreciação do relatório do administrador de insolvência, a qual teve lugar no dia 23 de Agosto último;
i) - Tal como é defendido por Carvalho Fernandes não é verdade que a apresentação do pedido fora de prazo determine, sem mais, o seu indeferimento liminar, tal só acontecendo se, cabendo a iniciativa do processo da insolvência a terceiro, o pedido de exoneração for apresentado após a realização da assembleia de apreciação do relatório do administrador da insolvência, sendo que, nos demais casos, a extemporaneidade do pedido só por si não releva para efeito de indeferimento liminar, cabendo ao juiz apreciar livremente se deve ser admitido ou rejeitado o pedido, em função de outros dados (substanciais) que o processo releve e da posição assumida pelos credores e pelo administrador da insolvência na assembleia de apreciação do relatório;
j) _ O tribunal a quo não podia indeferir liminarmente o pedido somente com fundamento no n.º 1 e 2 do art.º 236.º do CIRE uma vez que este fundamento necessitava de, a jusante, ser coadjuvado com os demais requisitos substanciais exigidos do n.º 1 do art.º 238.º do CIRE;
I) - Existe contradição com o regime legal preconizado com o n.º 2 do artº 238.º, pois, caso o tribunal a quo julgasse que o pedido era extemporâneo, deveria ter proferido despacho dentro do prazo anterior à assembleia de apreciação do relatório do administrador da insolvência;
m) - O Exmo. Juiz do Tribunal a quo solicitou somente os credores presentes na
Assembleia de Credores se pronunciassem quanto ao pedido de exoneração do passivo restante, esquecendo e não inquirindo os restantes credores, o que constitui uma violação do princípio da igualdade, quando estes se deverão pronunciar sobre os requisitos materiais/substanciais;
*
Fundamentação
Os Factos a considerar são os constantes do relatório.
*
O Direito
Para fundamentar a decisão de indeferimento da exoneração do passivo restante, o tribunal considerou que o insolvente não apresentou tempestivamente o pedido de exoneração do passivo restante, pois apenas foi deduzido depois dos 10 dias subsequentes à citação, ultrapassando o prazo previsto no art. 236 nº 1 do CIRE.
Dispõe este preceito que “O pedido de exoneração do passivo restante é feito pelo devedor no requerimento de apresentação à insolvência ou no prazo de 10 dias posteriores à citação e será sempre rejeitado se for deduzido após a assembleia de apreciação do relatório; o juiz decidirá livremente sobre a admissão ou rejeição do pedido apresentado no período intermédio”.
A interpretação desta norma não pode ser efectuada de forma isolada e estanque, antes se impõe a sua articulação com as restantes normas que regulam e enformam a razão de ser deste instituto, conexa com os valores que se impõe tutelar.
Importa que o interprete e aplicador da lei atenda ao preceituado no art. 9 do CC, nos termos da qual “A interpretação não deve cingir-se à letra da lei mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”.
Neste exercício hermenêutico o interprete deve partir da premissa de que o legislador tem presente a unidade e a coerência do sistema jurídico, expressando-se de forma sistemática e harmoniosa, pelo que se impõe-se, apelar não só à letra da lei, mas, simultaneamente, atender à sua ratio, fixando o seu sentido, no pressuposto que, conforme preceitua o nº 3 do art. 9 do CC, “Na fixação do sentido e alcance da lei o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.
No caso em apreço, ainda que se atendesse apenas à letra da norma do art. 236 nº 1 do CIRE, constatamos que o legislador, embora fixando o prazo de 10 dias subsequentes à citação, também refere expressamente o “período intermédio”, pelo que se impõe determinar este conceito e as suas consequências na especificidade da legislação em mérito e do concreto incidente deduzido.
Referem Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código de Insolvência e Da Recuperação De Empresas Anotado, 779, em consonância, aliás, com as regras de interpretação acima enunciadas, que “A integral compreensão do regime estatuído impõe, porém, a conjugação do nº 1 do art. 236 com o nº2 do art. 18 e a al. d) do art. 238 (..) Estatui o preceito em anotação que o juiz deve rejeitar sempre o pedido se for apresentado após aquela assembleia, enquanto decide livremente sobre a sua admissão ou rejeição se for apresentado no período intermédio”.
Como explicam os mesmos autores, determinante é que esse pedido de exoneração possa ser apreciado na assembleia. Esta constitui a premissa fundamental da norma, única forma de a pretensão ser definitivamente apreciada.
De outro modo, não se compreenderia a referência ao período intermédio, esvaziando-se o seu conteúdo e o seu alcance.
O período intermédio, quando o insolvente não é o requerente, constitui o tempo que decorre entre a citação e o encerramento da assembleia, pelo que o decurso do prazo de 10 dias não faz precludir o direito que o insolvente se arroga.
Só com este alcance assume sentido a expressão contida na norma e o poder aí conferido ao julgador de, nestas condições, decidir livremente sobre a sua admissibilidade.
Como se refere no douto acórdão deste Tribunal da Relação de 8.7.2010, in www.dgsi.pt “O juiz não pode indeferir o pedido de exoneração do passivo apresentado no denominado período intermédio sem ouvir os credores, o administrador e sem justificar o indeferimento em alguma das situações previstas nas als. b) a g) do nº 1 do art. 238, em função dos elementos que o processo revela e da posição assumida por credores e administrador, com produção de prova, se necessário”.
Ora, no caso concreto, o despacho recorrido limita-se, lapidar e perfunctóriamente, a justificar o indeferimento com o excesso do prazo de 10 dias, omitindo quaisquer outras razões, nomeadamente, a verificação, ou não, de algum dos pressupostos elencados no nº 1 do art. 238 do CIRE, quando é seguro que se impõe, pelos motivos já enunciados, a conjugação e articulação destes preceitos, sendo certo que a razão de ser da faculdade concedida no período intermédio apenas tem o sentido de na assembleia ser facultado aos credores e ao administrador pronunciarem-se sobre esse pedido.
A decisão recorrida, salvo o devido respeito, por omissão, desvirtua esta possibilidade, apresentando absoluta carência de fundamentação, ao arrepio do imperativo que impõe o dever de fundamentação, constitucionalmente consagrado no art. 205 da CRP, (em situação semelhante à que se decidiu no douto acórdão citado, cuja fundamentação se sufraga).
Acresce que a faculdade de o juiz decidir livremente não significa um afastamento dos imperativos legais que devem orientar a actividade jurisdicional, antes onera ainda mais o julgador com esse dever de fundamentar de forma explícita, abrangente e, pelo menos, suficiente a solução adoptada em face do ordenamento jurídico que também o vincula.
Assim, impõe-se que o tribunal, para além de auscultar o administrador e todos os credores, fundamente a decisão, articulando a apreciação do pedido em função do parecer de todos os intervenientes e com referencia às premissas enunciadas no art. 238 nº 1 b) a g) do CIRE.
***
Decisão
Em face do exposto, acorda-se em julgar o recurso procedente, devendo a decisão recorrida ser substituída por outra que, de forma fundamentada, com prévio contraditório em relação a todos os sujeitos processuais, e ponderando as vicissitudes concretas emergentes do processo, admita ou rejeite o pedido de exoneração do passivo restante.
Custas pela massa insolvente.
*
Porto, 16 de Janeiro de 2012
Ana Paula Vasques de Carvalho
Manuel José Caimoto Jácome
Carlos Alberto Macedo Domingues

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/4e5f6f266b1e471b80257997003b998a?OpenDocument

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