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quinta-feira, 9 de agosto de 2012

EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO COMPENSAÇÃO ACEITAÇÃO TÁCITA- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - 27/06/2012


Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
54/10.1TTALM.L1-4
Relator: MARIA JOÃO ROMBA
Descritores: EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
COMPENSAÇÃO
ACEITAÇÃO TÁCITA
RETRIBUIÇÃO
RETRIBUIÇÃO-BASE

Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 27-06-2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO

Sumário: I -A aceitação pela A. do despedimento por extinção do posto de trabalho (uma vez que não elidiu a presunção resultante de ter recebido a compensação posta à sua disposição) não faz precludir o direito da mesma a ver reapreciada a questão do cálculo da compensação e consequentemente, obter a condenação da R. na respectiva diferença, se esse pedido foi deduzido subsidiariamente para o caso de improcedência da ilicitude e não apenas no âmbito da impugnação do despedimento.
II - A retribuição base, parcela principal da retribuição definida no art. 249º do CT de 2003, é um conceito mais restrito do que o conceito geral de retribuição resultante deste preceito não beneficiando da presunção estabelecida no respectivo nº 3.
(Elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

AA intentou acção declarativa sob a forma comum contra “BB, Lda.”, “CC” e “DD”, peticionando que fosse declarada a ilicitude do seu despedimento, que os Réus fossem condenados no pagamento de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados em valor não liquidado mas provisoriamente fixado em € 15.000,00, na sua reintegração no seu posto de trabalho, no pagamento das retribuições devidas desde a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão com as legais deduções, no pagamento das retribuições em dívida no valor de € 14.407,59 e no reembolso de deduções indevidamente efectuadas na sua retribuição no valor de € 591,65, a que acrescem os juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento.
Para a hipótese de não ser acolhido o pedido de reintegração por ilicitude do despedimento, peticionou que os Réus fossem condenados a pagarem-lhe a quantia de € 16.850,33, correspondente ao remanescente da compensação devida pela extinção do seu posto de trabalho, acrescida de juros de mora à taxa legal computados desde a data do despedimento.
Para tanto alegou, em síntese, que desempenhou funções de directora do externato “O B...”, o qual pertencia ao segundo Réu, sendo que a sua exploração fora, até 1 de Setembro de 2007, assegurada pela terceira Ré e, desde então, pela primeira Ré. Por carta datada de 11 de Novembro de 2008, a primeira Ré comunicou à Autora o início do processo de extinção do seu posto de trabalho, sem lhe fornecer os documentos a que aludia nessa comunicação, o que invocou na sua oposição ao despedimento. Ainda assim, veio a ser proferida decisão de despedimento, a qual considera ter sido assente em motivos falsos. Alega existência de erro no cálculo da compensação que lhe foi paga, na medida em que não foi contabilizada uma remuneração que lhe era paga semestralmente e que foi judicialmente reconhecida como fazendo parte do seu vencimento, sendo que a falta de disponibilização desse montante também conduz à ilicitude do despedimento.
Alega também que o despedimento lhe causou danos de índole patrimonial e não patrimonial e que não foram pagas as retribuições semestrais vencidas em Junho de 2006, Dezembro de 2006, Junho de 2007, Dezembro de 2007, Junho de 2008 e Dezembro de 2008 e os proporcionais da mesma referente ao ano de 2009, tendo ainda a primeira Ré deduzido indevidamente a quantia de € 591,65 relativamente a faltas injustificadas.
Os Réus apresentaram contestação invocando a ilegitimidade substantiva do segundo Réu e da terceira Ré, alegando, em resumo, que as Rés celebraram um acordo de transmissão definitiva do estabelecimento de ensino. Defenderam a licitude do procedimento conducente ao despedimento da Autora e a licitude do despedimento, por ser verdadeiro o motivo invocado. Sustentam que a compensação disponibilizada à A. era a devida e fora aceite por esta pelo seu valor. Sustentaram ainda que as retribuições semestrais vencidas nos meses de Junho de 2006, Dezembro de 2006 e Junho de 2007 são reclamadas pela Autora numa acção executiva que corre termos no mesmo tribunal, sendo que a primeira Ré desconhecia que a Autora era credora dessa retribuição e que a mesma não a interpelou para o seu pagamento. Foi o facto de a A. ter dado faltas injustificadas que motivou as deduções que a mesma Ré efectuou na sua retribuição. Opuseram-se à reintegração na medida em que colocaria em causa a viabilidade da primeira Ré e porque os demais demandados já transmitiram aquele estabelecimento, não se dedicam ao ensino e não têm qualquer lugar compatível.
Concluíram pela absolvição do pedido.
A Autora respondeu à matéria de excepção expressamente invocada na contestação.
No despacho saneador concluiu-se pela ilegitimidade adjectiva do segundo Réu e da terceira Ré quanto aos pedidos atinentes à ilicitude do despedimento e quanto ao pedido de pagamento das retribuições semestrais vencidas em Dezembro de 2007, Junho de 2008 e Dezembro de 2008 e respectivo valor proporcional, juros de mora e ainda da quantia deduzida por falta injustificadas e, consequentemente, decidiu-se a sua absolvição da instância.
Procedeu-se a julgamento, seguido da prolação da sentença que decidiu:
- julgar procedente a excepção peremptória invocada pela Ré “BB, Lda.” e, em consequência, absolvê-la do pedido de declaração da ilicitude do despedimento, do pedido de condenação na reintegração, do pedido de condenação no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais e do pedido de pagamento das retribuições devidas entre a data do despedimento e a data do trânsito em julgado da presente decisão com as legais deduções que foram formulados nestes autos pela Autora AA;
- julgar a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência:
- condenar a Ré “BB, Lda.”, o Réu “CC” e a Ré “DD” a pagarem à Autora AA a quantia de € 6.808,23 (seis mil oitocentos e oito e vinte três cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos até 15 de Janeiro de 2010 no valor de € 829,78 (oitocentos e vinte e nove euros e setenta e oito cêntimos) e de juros de mora vencidos e vincendos a partir dessa data e até integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ao ano;
- condenar a Ré “BB, Lda.” a pagar à Autora AA a quantia de € 6.972,96 (seis mil novecentos e setenta e dois euros e noventa e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos desde o momento em que deveriam ter sido pagas à Autora as importâncias que integram aquela quantia e de juros de mora vincendos até integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ao ano;
- condenar a Ré “BB, Lda.” a pagar à Autora AA a quantia de € 591,65 (quinhentos e noventa e um euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos até 15 de Janeiro de 2010 no valor de € 21,66 (vinte e um euros e sessenta e seis cêntimos) e de juros de mora vencidos e vincendos a partir dessa data e até integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ao ano;


- condenar a Ré “BB, Lda.” a pagar à Autora AA a quantia de € 12.396,48 (doze mil trezentos e noventa e seis euros e quarenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos desde 9 de Fevereiro de 2009 e de juros de mora vincendos até integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ao ano;
- absolver a Ré “BB, Lda.” do demais peticionado;
A 1ª R., inconformada, veio apelar apenas da parte da sentença que condenou a pagar diferenças relativamente ao valor da compensação.
Deduziu nas respectivas alegações as seguintes conclusões:
(…)
A A. contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença.
Subidos os autos a este tribunal, também o M.P. no seu parecer se pronunciou pela improcedência do recurso.

O objecto do recurso, como mostram as conclusões que antecedem, consiste apenas na questão de saber se a sentença recorrida incorreu em erro ao ter condenado a 1ª R. a pagar diferenças pelo valor da compensação devida pelo despedimento, por ter considerado para o respectivo cálculo a retribuição semestral, suscitando-se ainda, previamente, a questão de saber se, pelo facto de ter recebido a compensação, a A. fica impedida de vir discutir o respectivo valor e modo de cálculo.

Com interesse para a apreciação do recurso é a seguinte a factualidade dada como provada:
1. A Autora, até ao seu despedimento por extinção do posto de trabalho prestou funções no Externato “EE”, sito (…) em Almada, desde Novembro de 1976, muito embora pertencesse aos quadros do “Grupo FF” desde 1 de Abril de 1974;
2. A Autora exerceu, desde Setembro de 1987 até Fevereiro de 2004, as funções de directora do Externato “EE”, data em que, por decisão da Administração da 3ª Ré e a pretexto de uma alegada reestruturação, passou a ser designada por directora administrativa;
(…)
7. O Externato “EE” é propriedade do segundo Réu, “CC”, o qual é representado pela respectiva entidade gestora, “CC” (…);
8. Por Contrato de Cessão da Posição Contratual de 20 de Agosto de 2002, “GG, SA,” cedeu à “DD” a posição contratual detida pela primeira no contrato referido em 3. dos factos provados, tudo conforme documento de fls. 43 a 46 dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
(…)
11. A ré “BB, Ldª.”, (…), é uma sociedade comercial por quotas, que tem por objecto a exploração de todos os graus e formas de ensino e da actividade editorial, sendo os seus gerentes HH e II, tudo conforme documento de fls. 413 e 414;
12. Com data de 31 de Julho de 2007, entre “CC”, representado pela respectiva entidade gestora (…), “DD”, “JJ, S.A. (em liquidação)” (…)e “BB, Lda.”, celebraram um contrato inominado pelo qual os três primeiros declararam, na cláusula 1ª: “Com efeitos referidos ao dia 01 de Agosto de 2007, a JJ, a DD e o CC transmitem para a BB todos os seus direitos e obrigações relativos ao estabelecimento (apenas com as excepções do nº2 da cláusula 2ª), tornando-se, pois, a BB titular plena do estabelecimento”, tudo conforme documento de fls. 294 a 314.
13. O Estabelecimento objecto do referido contrato é o Externato “EE”;
(…)
21. No comunicado intitulado, “Comunicação aos Trabalhadores de «EE»”, de 13 de Agosto de 2007, subscrito em conjunto pela primeira e pela terceira Rés, escreveu-se que “(…) que com efeitos a partir de 1 de Setembro de 2007, BB, Ldª passará a ser a proprietária do estabelecimento “O B...”, por aquisição por esta sociedade dos direitos e obrigações relativos a este estabelecimento, mantendo-se a mesma Direcção Executiva, Conselho Pedagógico e estrutura docente.
Mais se informa que os trabalhadores manterão, ao serviço da nova titular, todos os direitos e regalias anteriores à data da transmissão do estabelecimento, designadamente quanto a antiguidade e remuneração, não havendo, actualmente, quaisquer medidas projectadas que os afectem.”, tudo conforme documento de fls. 55 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
22. A partir de 1 de Setembro de 2007 e até ao seu despedimento, os vencimentos da Autora passaram a ser pagos pela primeira Ré, BB, Ldª;
(…)
48. Por carta datada de 11 de Novembro de 2008, recebida pela Autora em 21 desse mesmo mês e ano, a 1ª Ré, “BB Ldª”, comunicou à Autora a sua decisão de dar início ao processo de extinção do seu posto de trabalho;
(…)
51. Por carta datada de 9 de Dezembro de 2008, recebida pela Autora em 18 desse mês, a 1ª Ré comunicou à Autora a decisão final do processo de despedimento, com efeitos a 5 de Fevereiro de 2009, tudo conforme documento de fls. 62 e decisão de fls. 63 e 64 cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos;
52. A Ré BB, Ldª. remeteu à Autora uma carta datada de 11.12.2008 onde se lê entre o mais “(…) indicámos que o contrato de trabalho de V.Exª. cessava no dia 05 de Fevereiro de 2009. Ora tal indicação deve-se a manifesto lapso. (…) Queira, pois, por favor ter em conta que a data de cessação do contrato de trabalho de V.Exª. é 09 de Fevereiro de 2009 (…)”, tudo conforme documento de fls. 250 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
53. A Autora enviou à ré uma carta datada de 11 de Fevereiro de 2009 e por ela recebida em 12 do mesmo mês com o seguinte teor “Exmos Senhores, Venho para os devidos efeitos, comunicar a V.Exas. que reitero a minha total oposição ao meu despedimento, em consonância com a posição que anteriormente manifestei na minha carta resposta de 28 de Novembro de 2008, no respectivo processo de extinção do posto de trabalho, que considero totalmente ilícito e infundamentado, sendo minha intenção impugná-lo judicialmente nos termos legais (…)”, tudo conforme documento de fls. 118 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido
54. A Autora recebeu a compensação que a 1ª Ré lhe disponibilizou;
55. A importância recebida pela Autora, no dia 16 de Fevereiro de 2009, a título de compensação, no montante de € 69.618,43 (sessenta e nove mil seiscentos e dezoito euros e quarenta e três cêntimos) foi suportada pelo 2º Réu, “CC” que a abonou;
(…)
58. Do vencimento da Autora faz parte uma remuneração paga semestralmente, em Junho e Dezembro de cada ano, no valor de 2.324,32 euros cada semestre, entre Dezembro de 2007 e Dezembro de 2008 e de 2.391,73 euros a partir de Janeiro de 2010;
59. Esta remuneração começou a ser mensalmente paga à Autora desde Setembro de 1987, data em que assumiu as funções de directora;
60. Posteriormente, passou a ser paga mensalmente, (12 meses), em dinheiro, incorporada no vencimento;
61. Ultimamente vinha sendo paga duas vezes ao ano, mais concretamente, em Junho e Dezembro de cada ano;
62. Sobre esta remuneração incidiam os descontos legais para a segurança social e retenções para efeitos de IRS;
63. Esta importância era actualizável na mesma percentagem do salário base mensal;
(…)
66. Por sentença de 30 de Agosto de 2006, proferida pelo 2º Juízo do Tribunal de Trabalho de Almada, no processo nº .../05.4TTALM, confirmada pelo Acórdão da Relação de Lisboa, de 13 de Dezembro de 2007, transitada em julgado em Janeiro de 2008, foram os 2º e 3º Réus condenados solidariamente a pagar à Autora “€ 4.339,90 relativa à parte da retribuição devida semestralmente e não liquidada, bem como as importâncias que entretanto se tenham vencido na pendência da suspensão preventiva e não hajam sido pagas (…)”, tudo conforme documentos de fls. 87 a 115 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
(…)
69. 1ª Ré não pagou à Autora as remunerações semestrais vencidas em Dezembro de 2007, Junho de 2008 e Dezembro de 2008, no valor de €:2.324,32 cada e o valor proporcional da prestação semestral com vencimento em Junho de 2009, referente ao mês de Janeiro de 2009, €:398,62 e a 16 dias de Fevereiro de 2009 no valor de €:227,78, no valor total de €7.599,36;
70. A 1ª Ré não teve em conta o valor desta remuneração no cálculo da compensação;
(…)

Apreciação
A sentença recorrida, embora tendo apreciado a questão da ilicitude do despedimento por extinção do posto de trabalho e concluído que o mesmo era ilícito, nos termos da al. c) do art. 429º do CT de 2003 (por indemonstração dos fundamentos invocados pela 1ª R.), conhecendo da excepção peremptória extintiva invocada pela mesma R., atenta a circunstância de a A. ter recebido a compensação que lhe foi disponibilizada e não ter feito prova do facto contrário ao legalmente presumido nos termos do art. 401º nº 4, aplicável ex-vi do art. 404º do mesmo código, concluiu que a A. aceitou o despedimento protagonizado pela 1ª R., o que implicou que, com a procedência da excepção, considerasse precludidos os direitos emergentes da ajuizada ilicitude do despedimento, absolvendo, consequentemente, a R. dos pedidos nele fundados.
Não obstante, passando a apreciar se eram devidos os créditos reclamados - designadamente uma retribuição de vencimento semestral que fora paga desde 1987 e deixara de o ser a partir de 2006, e a inclusão dessa mesma prestação no cálculo da compensação pelo despedimento (erro de cálculo que, além de invocado pela A. como um dos fundamentos da impugnação do despedimento, também fundamentou o pedido deduzido em termos subsidiários), julgou-os procedentes.
É apenas na parte em que condenou a 1ª R. no pedido subsidiário – pagamento da quantia de € 12.396,48, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do despedimento, relativa à diferença devida a título de compensação pela extinção do posto de trabalho, resultante da inclusão no respectivo cálculo da aludida retribuição semestral, que considerou enquadrar-se na retribuição base – que a 1ª R. pretende impugnar a sentença.
Cabe apreciar. Comecemos pela questão prévia, que consiste em ajuizar se a aceitação do despedimento pela A. (uma vez que não elidiu a presunção resultante de ter recebido a compensação posta à sua disposição) faz precludir o direito da mesma a ver reapreciada a questão do cálculo da compensação e, consequentemente, obter a condenação da R. na respectiva diferença.
Entendemos que não. Esse direito só estaria prejudicado se o pedido se contivesse exclusivamente no âmbito da impugnação do despedimento, como um dos fundamentos da invocada ilicitude do mesmo, uma vez que tal apreciação ficou excluída com a procedência da excepção de aceitação do despedimento (parte da decisão que não foi impugnada, tendo pois transitado em julgado). Mas não é essa a situação no caso em apreço, porquanto o pedido em causa foi formulado em termos subsidiários, para o caso de “não proceder o pedido de reintegração por ilicitude”. Ora, foi precisamente porque, face à procedência da excepção peremptória invocada, a R. foi absolvida do pedido de declaração de ilicitude do despedimento, bem como de condenação na reintegração, no pagamento de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais e das retribuições devidas entre o despedimento e o trânsito em julgado da decisão, que a apreciação do valor da compensação teve lugar, portanto apenas no âmbito do aludido pedido subsidiário.
Como sucede em relação a qualquer outra prestação laboral, designadamente de natureza retributiva, não resulta da lei qualquer óbice a que um trabalhador que tenha recebido uma prestação, se porventura considerar que a mesma não corresponde ao que lhe é legalmente devido, possa vir a tribunal discutir a questão e reclamar direito a diferenças, a menos que, ao recebê-la, tenha declarado nada mais nada mais ter a reclamar a esse título (o que, aceite, ainda que tacitamente, pela outra parte, configura remissão abdicativa, extinguindo o eventual crédito que pudesse existir).
No caso, não consta que tivesse sido feita pela A. uma declaração desse tipo. Se a A. não tivesse impugnado o despedimento (por o ter aceitado, indiscutivelmente, desde o início), mas pretendesse pôr em causa o valor da compensação que lhe foi paga e que recebeu (sem com isso pretender obter a declaração de ilicitude do despedimento), não vislumbramos na lei o que quer que seja que obstasse a que pudesse reclamar judicialmente o pagamento do valor que entende estar em falta. O mesmo vale para a hipótese vertente, em que, impugnado o despedimento mas improcedente a acção nessa parte, fora subsidiariamente pedido o valor das diferenças devidas pela compensação.
Improcede pois este fundamento do recurso.
Resta então analisar se o Sr. Juiz aplicou correctamente o direito ao considerar que a remuneração referida nos pontos 58 a 63 integra a retribuição base da A., sendo certo que nos termos do art. 401º nºs 1 e 2, aplicável por força do disposto no art. 404º, ambos do CT de 2003, a compensação devida ao trabalhador despedido com fundamento na extinção do posto de trabalho corresponde a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo e o proporcional, no caso de fracção de ano. Apesar de não constar da matéria de facto o valor da retribuição base da A., nem sequer se auferia diuturnidades, quantas e de que valor, sabemos que a R. não teve em conta no cálculo da compensação o valor da remuneração referida nos pontos 58 a 63 (cf. nº 70).
O Sr. Juiz considerou que esta remuneração, de início paga mensalmente e a partir de certa altura, semestralmente, sobre a qual incidiam descontos para a segurança social e retenção de IRS e cujo montante era actualizável na mesma percentagem do salário base, integra o conceito de retribuição a que aludem os nºs 1 e 2 do art. 249º, tanto mais que não foi elidida a presunção do nº 3, referindo-a ainda como estando associada ao desempenho de funções de direcção, conforme o comprova a coincidência entre o início do pagamento da mesma e o início da execução das aludidas tarefas, o que equivale a dizer que corresponde ao exercício da actividade da A., enquadrando-se, assim, no conceito de retribuição base a que alude a al. a) do nº 1 do art. 250º do CT. Daí que tenha concluído dever a mesma ser incluída no cálculo da compensação pelo despedimento, conforme dispõe o nº 1 do art. 401º.
A recorrente vem sustentar que os montantes semestrais que a A. recebia não tinham qualquer correspondência com o trabalho desempenhado, de acordo com o seu período normal de trabalho, não integravam, pois a retribuição base, embora possam ser considerados como retribuição.
Vejamos se lhe assiste razão.
Não pode oferecer dúvidas que os conceitos de retribuição e de retribuição base não se confundem nem se justapõem. O primeiro é mais amplo que o segundo, abarcando-o, como claramente decorre do disposto no art. 249º nºs 1 e 2. A presunção do nº 3 permite qualificar como retribuição qualquer prestação patrimonial do empregador ao trabalhador, se aquele não provar que a mesma não é contrapartida do trabalho ou não é obrigatória (que não resulta do contrato, das normas que o regem nem dos usos), mas não é aplicável à qualificação como retribuição base.
Portanto, pretendendo a A. que a compensação pelo despedimento por extinção do posto de trabalho fosse calculada com base num valor retributivo que inclua a remuneração que lhe era paga semestralmente, cabia-lhe, nos termos do art. 342º nº 1 do CC, o ónus de provar que tal prestação faz parte a sua retribuição base, dado esse ser um elemento constitutivo do direito que invoca (visto a lei determinar que a compensação corresponde a um mês de retribuição base e diuturnidade por cada ano completo de antiguidade …– art. 401º nº 1 e 2, aplicável ex-vi art. 404º).
É certo que o CT de 2003, procurando dar resposta às dificuldades[1] sentidas para a determinação das bases de cálculo de muitas das prestações devidas pelo empregador ao trabalhador, veio determinar no nº 1 do art. 250º que “quando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades” definindo no nº 2, para os efeitos do disposto no número anterior, cada uma destas prestações, sendo a retribuição base definida como “aquela que nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido”.
Assinala Monteiro Fernandes[2] “A definição não é das mais felizes, pois, bem vistas as coisas, permitiria cobrir, indistintamente, todo o conjunto dos valores que, nos termos do art. 249º, integram a retribuição tout court. É bem sabido que a definição em causa se reveste de grandes dificuldades, e o CT não podia evitá-las, dado o relevo que confere à noção. Será, talvez, preferível dizer que a retribuição base corresponde ao tipo e à duração normal do trabalho convencionado.”
Também João Leal Amado[3], embora reportando-se ao (correspondente) art. 262º do CT de 2009 refere “A formulação legal parece pouco esclarecedora, deixando de fora aquilo que, na lição de Jorge Leite[4], constitui o cerne da retribuição base, a saber, o seu carácter de contrapartida da ‘prestação standart’ isto é, de contrapartida da prestação laboral realizada em condições consideradas normais ou comuns. Assim, segundo Jorge Leite, deve entender-se por retribuição base ‘a prestação que, de acordo com o critério das partes, da lei, do IRC ou dos usos, é devida ao trabalhador com determinada categoria profissional pelo trabalho de um dado período realizado em condições consideradas normais ou comuns para o respectivo sector ou profissão.’
A retribuição base é afinal a parcela principal da retribuição e corresponde à contrapartida da actividade desempenhada (própria da categoria profissional) durante o período normal de trabalho, constando, regra geral de tabelas fornecidas pelos instrumentos de regulamentação colectiva ou pelos regulamentos internos. A regra é que tais tabelas definam as retribuições mensais, encontrando-se, na prática, institucionalizada a mensualização do salário, por ser a cadência que melhor se ajusta, quer à organização da vida empresarial, quer à satisfação das necessidades vitais dos trabalhadores e respectivas famílias.
Também assim era com a A., como nos dá conta o ponto 63: apesar de não ter sido dado como provado o salário mensal, sabemos que a A. auferia um salário mensal. Ora a própria circunstância de as prestações ora em causa serem pagas com uma periodicidade distinta do salário base, que era satisfeito mensalmente – mais precisamente semestral, sendo paga em Junho e em Dezembro - indicia que têm natureza distinta da de retribuição base ou principal, configurando mais propriamente um complemento ou suplemento. Atente-se ainda que na sentença mencionada no ponto 68, junta a fls. 102 e segs., era referido no respectivo ponto 28 da matéria de facto que a prestação semestral em causa era designada por “prémio ocasional”. É certo que o nomen atribuído pelas partes não é determinante. Em todo o caso, era à A. que cabia o ónus de alegar e provar os elementos de facto suficientes para convencer o tribunal de que a prestação em causa revestia a natureza de retribuição base ou principal e o que constatamos é que os elementos apurados não são bastantes para alicerçar essa conclusão.
Não acompanhamos, pois, a sentença recorrida quanto a esta apreciação, dando assim razão à recorrente, devendo pois revogar a sentença na parte em que condenou a 1ª R. a pagar à A. diferenças no valor da compensação devida pela extinção do posto de trabalho.



Decisão
Pelo exposto acordam os juízes deste tribunal e secção em julgar procedente o recurso, revogando a sentença, na parte em que condenou a apelante no pagamento à apelada da quantia de € 12.396,48 relativa a diferenças no valor da compensação pelo despedimento por extinção do posto de trabalho.
Custas pela apelada.

Lisboa, 27 de Junho de 2012

Maria João Romba
Paula Sá Fernandes
José Feteira
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[1] Como referia Bernardo Lobo Xavier na sua “Introdução ao estudo da retribuição no direito do trabalho português, in RDES Ano I (2ª Série) 1986, nº 1, pag. 65 e seg. “Uma definição do sistema de cálculos é coisa que está por fazer: de qualquer modo crê-se que, (…), em princípio os complementos são definidos por um cálculo que assenta na remuneração de base: aliás o conceito parece existir para isso mesmo” (pag. 97/98).
Noutra passagem (fls. 87), referindo-se à retribuição base afirmava “constitui naturalmente a remuneração fixada na tabela das convenções colectivas ou dos regulamentos da empresa, na base de um horário normal, para uma certa categoria profissional … A remuneração base tem carácter principal…”
[2] Direito do Trabalho, Almedina, 12ª ed. pag. 465, nota 1.
[3] Contrato de Trabalho, à luz do novo Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2009, pag. 304.
[4] Colectânea de Leis do Trabalho, pag. 89.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/fb1181fc5e32583880257a4500523714?OpenDocument

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