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segunda-feira, 30 de setembro de 2013

CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL ESTALEIROS DE CONSTRUÇÃO - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - 11.09.2013


Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
347/11.0TTBRR.L2-4
Relator: FRANCISCA MENDES
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
ESTALEIROS DE CONSTRUÇÃO

Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11-09-2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S

Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA A DECISÃO

Sumário: Para estarem reunidos os elementos do ilícito contra-ordenacional previsto no art. 19º, nº2, alíneas d) e e) do Dec.Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, conjugado com o art.º 25.º, n.º 3, al. a), do mesmo diploma legal é necessário que o coordenador de segurança em projecto não tenha cumprido as obrigações ínsitas nas referidas alíneas do nº2 do art. 19 do Dec.Lei nº 273/2003.
(Elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa:
I-Relatório


No dia 14 de Janeiro de 2010 a Autoridade para as Condições de Trabalho lavrou auto de notícia, por no dia 26 de Fevereiro de 2009 a empresa AA – Construção Unipessoal, Lda, com sede na Rua (…), n.º (…), r/c, Barreiro, na qualidade de dona de obra, não ter diligenciado pela coordenação de segurança da obra, infringindo o disposto no art. 19º, nº2, d) e e) do Dec.Lei nº 273/2003, de 29/10.

De acordo com a entidade administrativa, no estaleiro de construção de um edifício com quatro pisos localizado na Urbanização (…), lote (…), Santo António da Charneca, Barreiro estavam a ser executados trabalhos sem que o coordenador de segurança em obra esteja a promover e verificar o cumprimento do plano de segurança e saúde.

Verificou ainda a entidade administrativa a existência de irregularidades, não se encontrando implementadas e a serem respeitadas as disposições regulamentares em matéria de segurança no trabalho, pelo que efectuou uma notificação para tomada de medidas referente às protecções colectivas existentes.

Em 26-02-2009 foi ainda determinada pela entidade administrativa, ao abrigo do disposto no art. 10º, nº1, d) do Dec.Lei nº 102/2000, de 2 de Junho, a suspensão imediata dos trabalhos que se encontravam a ser executados com utilização de um andaime sem reunir os elementos necessários para evitar o risco de queda em altura.

Pela entidade administrativa foi aplicada à arguida uma coima no montante de €9600 por violação do disposto no art. 19º, nº2, alíneas d) e e) do Dec.Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, conjugado com o art.º 25.º, n.º 3, al. a), do mesmo diploma legal.

A arguida impugnou a decisão o administrativa, alegando que a contra-ordenação prevista nos art.ºs 11.º, 21.º, 23.º e 24.º, do Decreto n.º 41821, de 11 de Agosto de 1958 deverá ser imputada à entidade executante e não à arguida ( na qualidade de dona da obra).

Mais alegou que não há prova que tenha praticado a contra-ordenação prevista no artigo 19.º, n.º 2, d) e e) do Dec.-Lei n.º 273/2003.

A arguida finalizou a impugnação judicial da decisão da entidade administrativa, pugnando pela sua absolvição ou, entendendo-se que praticou esta segunda contra-ordenação, que a coima seja reduzida e especialmente atenuada, tendo em conta a transitoriedade da infracção, o número de trabalhadores potencialmente afectados, as medidas adoptadas para sanar as irregularidades, a situação económica da arguida e o facto desta não ter retirado com a infracção qualquer benefício económico.

Em 08-11-2011, a Exmª juiz declarou nula a decisão administrativa, em virtude de tal decisão não resultar uma conduta negligente ou dolosa por parte da arguida e determinou o arquivamento dos autos.

O Ministério Público recorreu deste despacho.

Por Acórdão de 7 de Março de 2012, deste Tribunal da Relação de Lisboa, foi revogada a decisão recorrida.

Em 18 de Janeiro de 2013 foi realizada audiência de discussão e julgamento.

Em 25-01-2013, a Exmª juiz a quo proferiu sentença, mantendo a decisão da entidade administrativa.

Na referida sentença foram consignados os factos provados e não provados nos termos a seguir indicados.

“ Factos provados com relevância:

A. No dia 26 de Fevereiro de 2009, pelas 11h30m, no estaleiro de construção civil sito na Urbanização (…), lote n.º (…) Santo António da Charneca, Barreiro, encontrava-se em construção um edifício de quatro pisos, na fase de execução das alvenarias, rebocos e revestimentos da fachada.

B. Verificou-se que os trabalhos tiveram início em Maio de 2008 e que mantiveram até à data da realização da visita inspectiva, 26 de Fevereiro de 2009, um efectivo médio de oito trabalhadores, prevendo-se o seu terminus em Maio de 2009.

C. No momento da visita, encontravam-se no estaleiro dez trabalhadores, dois dos quais pertenciam à sociedade BB – Cofragens & Estruturas, Lda., encontrando-se esta no estaleiro na qualidade de entidade executante, três dos trabalhadores pertenciam à sociedade CC, Lda., da DD, Unipessoal, Lda., encontravam-se presentes dois trabalhadores, e da sociedade EE – Construções, Lda., encontravam-se três trabalhadores presentes em obra.

D. A arguida, que se encontrava no estaleiro de construção na qualidade de dono de obra, procedeu à nomeação como coordenador de segurança e saúde no trabalho em obra, FF.

E. A arguida foi notificada para a apresentação de alguns documentos, de entre os quais, os últimos três registos das actividades de coordenação e segurança e saúde.

F. A arguida não procedeu à entrega ou exibição dos referidos documentos até 5 de Março de 2008, conforme tinha sido solicitado pelo inspector autuante.

G. Verificou-se que não se encontravam a ser respeitadas algumas disposições regulamentares em matéria de segurança e saúde no trabalho, pelo que efectuou uma notificação para tomada de medidas no referente às protecções colectivas existentes, aos guarda-corpos colocados nas bordaduras das lages e caixas dos elevadores, pois estes encontravam-se mal executados, em número insuficiente e, nalguns casos, ausentes.

H. As bordaduras das lajes, em determinados casos, tinham protecções deficientes, noutros casos não tinham protecções contra o risco de queda.

I. Não foram implementadas as medidas de segurança necessárias à prossecução dos trabalhos de revestimento da fachada principal, uma vez que se utilizou um andaime

sem que este tivesse todos os elementos de protecção colectiva necessários, tendo os trabalhadores da sociedade EE – Construções, Lda. ficado expostos ao perigo de queda em altura de doze metros, a que os trabalhos se realizavam, o que levou à elaboração de uma suspensão imediata dos trabalhos que se encontravam a ser realizados com recurso a esse andaime.

J. O andaime utilizado pelos trabalhadores não tinha guarda-corpos, as pranchas de pé não preenchiam a base do andaime na sua totalidade, existindo, por consequência, zonas desprotegidas.

K. Verificou-se a probabilidade séria de lesão da vida, integridade física e saúde dos trabalhadores.

L. Não se verificou a garantia de implementação das medidas de segurança em obra.

M. Existiam várias bordaduras das lajes sem protecção colectiva contra o risco de queda em altura.

N. Os trabalhadores encontravam-se normalmente expostos ao risco de queda em altura.

O. Não foram respeitados os princípios gerais de prevenção.

P. A arguida, no mapa de quadro de pessoal de 2008, apresentou um volume de

negócios de € 924.082,81.

Q. A arguida iniciou a actividade em 1999.

R. A arguida, na sua qualidade de dono de obra, não agiu de forma diligente, uma vez que não garantiu a implementação das medidas de segurança, o que podia e deveria ter feito.

*

Factos não provados com relevância:

1. Os trabalhos decorriam sem que o coordenador de segurança e saúde em obra estivesse a promover e verificar pelo cumprimento do plano de segurança e saúde.

2. A coordenação de segurança não se encontrava efectivada.

3. Não se verificou a fiscalização das medidas de segurança em obra.

4. Logo que tomou conhecimento da infracção, o dono de obra sanou-a de imediato.”

*

A arguida recorreu da sentença proferida pelo Tribunal a quo e formulou as seguintes conclusões:

(…)

O Ministério Público respondeu, pugnando pela improcedência do recurso.

*

II- São as seguintes as questões objecto de recurso:

- Se estão reunidos os elementos objectivos e subjectivos do ilícito contra- ordenacional imputado à arguida;

- Se o montante da coima é ajustado ao caso concreto.


*

III- Apreciação


Vejamos, em primeiro lugar, se estão reunidos os elementos objectivos do ilícito imputado à arguida, na qualidade de dona de obra.

De acordo, com o disposto no art. 19º, nº2, do Dec-lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, o coordenador da obra deve no que respeita à execução desta:

- “ Verificar a coordenação das actividades das empresas e dos trabalhadores independentes que intervêm no estaleiro, tendo em vista a prevenção dos riscos profissionais” ( alínea d);

- “ Promover e verificar o cumprimento do plano de segurança e saúde, bem como das outras obrigações da entidade executante, dos sub-empreiteiros e dos trabalhadores independentes, nomeadamente no que se refere à organização do estaleiro, ao sistema de emergência, às condicionantes existentes no estaleiro e na área envolvente, aos trabalhos que envolvam riscos especiais, aos processos construtivos especiais, às actividades que possam ser incompatíveis no tempo ou no espaço e ao sistema de comunicação entre os intervenientes na obra:” ( alínea e).”

A violação destas obrigações constitui contra-ordenação muito grave e é imputável ao dono da obra ( art. 25º, nº 3, a) do referido Dec-lei nº 273/2003).

Conforme refere João Soares Ribeiro in “Contra-Ordenações Laborais”, 3ª edição, pag. 419, estamos perante obrigações de assegurar comportamentos de terceiros, dificilmente demonstráveis se considerarmos que são obrigações de meios e não de resultados.

No caso em apreço o Tribunal a quo considerou não provado:

-Os trabalhos decorriam sem que o coordenador de segurança e saúde em obra estivesse a promover e verificar pelo cumprimento do plano de segurança e saúde;

- A coordenação de segurança não se encontrava efectivada;

- Não se verificou a fiscalização das medidas de segurança em obra.

À arguida foi imputada pela entidade administrativa a violação das indicadas obrigações por parte do coordenador de segurança.

Resulta da sentença em apreciação e da sua fundamentação que o Tribunal a quo considerou o depoimento do coordenador de segurança da obra que teria referido o cumprimento das indicadas obrigações e que teria avisado a arguida que as normas de segurança não estavam a ser cumpridas.

É certo que o dono da obra para cumprir as obrigações decorrentes do referido 19º, nº2, alíneas d) e e) do Dec.Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, conjugado com o art.º 25.º, n.º 3, al. a), do mesmo diploma legal não pode limitar a sua actuação à nomeação de um coordenador de segurança. É necessário que este cumpra as suas obrigações. Ora, no caso concreto não resultou provado que o referido coordenador não tivesse cumprido as suas obrigações.

Não estão, assim, reunidos os elementos do ilícito contra-ordenacional imputado à arguida.

O Dec-lei nº 273/2003, no art. 3º, consagra diversas definições, para efeitos de aplicação do mesmo diploma, e esclarece os conceitos de “dono da obra”, “empregador” e “entidade executante”.

De acordo com o disposto no art. 20º, d) deste diploma legal, cabe à entidade executante assegurar a aplicação do plano de segurança e saúde (…) por parte dos seus trabalhadores, de subempreiteiros e trabalhadores independentes:”

Ao dono da obra são também prescritas no mesmo diploma legal diversas obrigações, além das já indicadas, cuja violação poderá integrar ilícito contraordenacional de natureza muito grave (art. 25º, nºs1, 2 e 3, a), grave (art. 26º, a)) e leve (art. 27º). Destas obrigações, salientamos ainda que o dono da obra, tal como o coordenador de segurança, deverá promover a divulgação entre todos os intervenientes no estaleiro de informações sobre riscos profissionais e a sua prevenção (art. 19º. nº2, g) e 26º a)) e deverá assegurar a divulgação do plano de segurança e saúde e assegurar o cumprimento das regras de gestão e organização geral do estaleiro (art. 17º, c) e i)).

O regime da responsabilidade contra-ordenacional no planeamento, organização e coordenação da segurança, higiene e saúde no trabalho em estaleiros da construção continua a assegurar a transposição para o Direito interno da Directiva nº 92/57/CEE, do Conselho, de 24 de Junho.

Sem esquecer os princípios gerais que norteiam este diploma legal e as fortes razões de prevenção do flagelo dos acidentes de trabalho, verificamos que no caso concreto apenas foi imputada à arguida, na qualidade de dona da obra, a violação do disposto no art. 19º, nº2, alíneas d) e e) do Dec.Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, conjugado com o art.º 25.º, n.º 3, al. a), do mesmo diploma legal.

A indicada falta de garantia de implementação das medidas de segurança em obra (alíneas L) e R) dos factos provados) constitui matéria de facto conclusiva que dever-se-á considerar não escrita.

Dos factos provados resultam outras infracções que foram verificadas pela entidade administrativa (alíneas G a K dos factos provados), mas tais infracções não foram imputadas à arguida e a sua inserção em sede factos provados pela entidade administrativa visava sustentar que o coordenador de segurança não estava a cumprir as obrigações previstas no referido art. 19º, nº2, alíneas d) e e), o que não logrou provar.

O art. 25º, nº4 do Dec-lei nº 273/2003, de 29/10 qualifica como contra-ordenação muito grave a violação do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil aprovado pelo Dec. Nº 41821, de 11/08/1958 quando ocorre omissão de medidas de segurança colectiva contra o risco de queda em altura dos trabalhadores.

Conforme refere o Acórdão da Relação de Lisboa de 19/09/2012 ( www.dgsi.pt), a contra-ordenação muito grave tipificada no nº 4 do art. 25º do Dec-lei nº 273/2003 é imputável ao empregador ( ou a trabalhador independente) e não ao dono da obra.

Assim e por não terem sido apurados os elementos que integram o ilícito contra-ordenacional imputado à arguida, deverá a mesma ser absolvida.

*

IV-Decisão

Em face do exposto, o Tribunal julga procedente o presente recurso e revoga a decisão recorrida, absolvendo a arguida da contra-ordenação que lhe foi imputada.

Sem custas.



Lisboa, 11 de Setembro de 2013



Francisca Mendes

Maria Celina de J. de Nóbrega



http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/1d3002e3f9ae7c7580257be9003476f5?OpenDocument

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