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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS QUESTÕES DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA PARA A VIDA DO MENOR - Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra - 18/10/2011


Acórdãos TRC
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
626/09.7TMCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: REGINA ROSA
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
QUESTÕES DE PARTICULARIDADE IMPORTÂNCIA PARA A VIDA DO MENOR

Data do Acordão: 18-10-2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DE FAMÍLIA E MENORES DE COIMBRA – 2º JUÍZO
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: LEI Nº16/08, DE 31.10; ARTºS 174º A 185º DA O.T.M. E 1905º A 1912º DO CC.

Sumário: I - O processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, regulado nos arts.174º a 185º da O.T.M. e 1905º a 1912º do C.C., abrange três questões: residência do menor, convívio deste com o progenitor não residente (regime de visitas), pensão de alimentos devida por este, e modelo do exercício das responsabilidades parentais – unilateral alternado/conjunto (arts.1906º/1, 2, 5 e 7 e 1905º).
II - Como regra, as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores (art.1906º/1-1ª parte); o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente (art.1906º/3-1ª parte).

III – Consideram-se “questões de particular importância”, entre outras: as intervenções cirúrgicas das quais possam resultar riscos acrescidos para a saúde do menor; a prática de actividades desportivas radicais; a saída do menor para o estrangeiro sem ser em viagem de turismo; a matrícula em colégio privado ou a mudança de colégio privado; mudança de residência do menor para local distinto da do progenitor a quem foi confiado.


Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

I- RELATÓRIO

I.1- F…requereu em 20.7.09, contra A…, regulação do exercício das responsabilidades paternais relativo à filha menor de ambos, L...

Em sede de conferência de pais, designada nos termos do art.175º da OTM, foi fixado um regime provisório e ambos os progenitores apresentaram alegações.

Juntos os relatórios sociais, realizou-se o julgamento em cinco sessões e, por último, proferiu-se sentença datada de 25.3.11, na qual se decidiu regular o exercício das responsabilidades parentais nestes termos:

a) – as responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida da menor serão exercidas em comum por ambos os progenitores;

b) – a criança fica entregue à mãe, ficando determinada a sua residência junto desta, a quem compete o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente da menor L…;

c) – o pai poderá estar com a menor em fins-de-semana alternados, indo buscá-la à creche/infantário que a mesma frequenta, sexta-feira a partir das 15 horas, e entregando-a no mesmo local segunda-feira até às 9h 30m. Quando a menor ingressar no ensino obrigatório o pai irá buscá-la ao estabelecimento de ensino que a mesma frequentar no final das actividades lectivas, entregando-a no mesmo local na segunda-feira antes do início das actividades lectivas;

d) – ...

e) – a menor passará o seu dia de aniversário com ambos os progenitores, almoçando com um e passando a noite com o outro, cabendo à progenitora a escolha nos anos pares e cabendo ao progenitor a escolha nos anos ímpares.

Quando a menor ingressar no ensino obrigatório este convívio não poderá prejudicar as actividades lectivas;

f) - a menor passará o dia e a noite de aniversário de cada um dos progenitores com o respectivo aniversariante. Quando a menor ingressar no ensino obrigatório este convívio não poderá prejudicar as actividades lectivas;

g) - …

h) - …

i) - …

j) - …

k) - …

l) - …

m) - …

n) - a menor passará quinze dias das férias escolares de verão com cada progenitor, devendo os progenitores fixar o período respectivo até 31 de Maio de cada ano, cabendo a escolha ao pai nos anos ímpares e à mãe nos anos pares;

o) - …

p) - o pai da menor pagará a título de alimentos à filha a quantia mensal de € 80,00 até ao último dia de cada mês, por depósito ou transferência bancária para conta cujo NIB será fornecido pela mãe ao pai, quantia esta actualizada anualmente em função da taxa média da inflação a publicar pelo INE para o ano anterior com início em Janeiro de 2012;

q) - os progenitores suportarão em partes iguais as seguintes despesas:

- a mensalidade da creche/infantário frequentada pela menor;

- o custo das consultas de pediatria;

- outras despesas de saúde excepcionais, como consultas médicas de especialista, intervenções cirúrgicas, tratamentos de ortodôncia, óculos e lentes de contacto;

- as despesas escolares de início de ano (livros e material escolar), quando a menor ingressar no ensino obrigatório;

- as despesas com actividades extra-curiculares em que ambos os progenitores acordem, mediante a exibição de documento comprovativo e no prazo de 30 dias .



I.2- Apelou o requerente.

Alegando, conclui deste modo:

...

I.3- Contra-alegaram a requerida e o MºPº, defendendo ambos o improvimento do recurso e a manutenção da decisão recorrida.


Nada havendo a obstar ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTOS

II.1 - de facto



II.2 - de direito

A Lei nº16/08, de 31.10, aqui aplicável, que veio introduzir alterações ao regime jurídico do divórcio e suas consequências para os filhos, substituiu a anterior expressão “poder paternal” pela expressão “responsabilidade parental”, mudança de designação motivada, segundo o legislador, pela desadequação de um modelo implícito que apontava para o sentido de posse, num tempo em que se reconhece cada vez mais a criança como um sujeito de direitos. [1]

O processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, regulado nos arts.174º a 185º da O.T.M. e 1905º a 1912º do C.C., abrange três questões: residência do menor, convívio deste com o progenitor não residente (regime de visitas), pensão de alimentos devida por este, e modelo do exercício das responsabilidades parentais – unilateral alternado/conjunto (arts.1906º/1, 2, 5 e 7 e 1905º).

Percorrendo as transcritas conclusões, delas parece decorrer serem questões colocadas pelo recorrente as atinentes à determinação da residência da menor, modo de atribuição das responsabilidades parentais e prestação de alimentos.

Principia o recorrente por invocar a nulidade da sentença, nulidade considerada no art. 668º/1-c) do C.P.C., com fundamento na contradição dos factos com a decisão, pois que, face aos factos constantes dos pontos 16, 17, 18 e 24, deveria o tribunal ter fixado residência alternada, e responsabilidades parentais conjuntas quanto a questões de particular importância, e singulares no que respeita a actos da vida corrente da menor.

Ocorrerá essa nulidade quando o raciocínio do juiz aponta num sentido e no entanto decide em sentido oposto ou pelo menos em sentido diferente.

Como vem sendo regra nos recursos, confunde-se o erro de actividade (vício formal) que entra nas nulidades a que se refere o citado art.668º, com o erro de juízo ou de julgamento (vício substancial), que incide sobre o litígio propriamente dito e que só pode corrigir-se mediante recurso para o tribunal superior.

Percorrendo a sentença, não se pode dizer que a decisão tomada relativamente à guarda da menor e atribuições das responsabilidades parentais seja diferente do sentido apontado na fundamentação.

A sentença não padece da apontada nulidade.

É bom de ver pelas transcritas conclusões, que o que se invoca é erro de julgamento.

Vejamos então se o recorrente tem razão nas críticas que endereça à sentença.

Pelo art.1906º/5, o tribunal determinará a residência do menor e os direitos da visita de acordo com o interesse deste, ponderando os acordos dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro progenitor.

Entende o recorrente que a fixação da residência deve ser alternada em igual número de dias de vivência da filha L… com o pai e com a mãe. Do seu ponto de vista, a filha deverá relacionar-se igualmente com ambos mas de modo a que a vinculação se faça por igual e não maioritariamente a um só, para que no seu desenvolvimento haja igualdade de representação real e figurativa do pai e da mãe. Defende assim o recorrente, a chamada guarda conjunta ou alternada, ao invés da guarda única fixada na sentença.

A sentença não perfilhou este entendimento. Cremos que bem, pois quanto a nós a solução proposta não é a melhor para a criança.

Foi determinado que a guarda/residência da menor será a da mãe, fixando-se um regime de visitas com o progenitor não residente, que pouco se afasta daquele que por este é proposto. Porém, defende o pai que a filha fique entregue a ambos os progenitores, residindo alternadamente com cada um deles num esquema rotativo quinzenal.

Também nesta situação o tribunal deve decidir de acordo com o interesse da criança, “incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores” (art.1906º/7).

No caso em apreço, resulta do elenco factual que a L… tem presentemente 3 anos de idade e que desde o seu nascimento a figura de referência é a da mãe, que dela vem diariamente prestando os cuidados básicos, pois os pais cessaram então o curto (3 anos) relacionamento que mantinham. O pai visitava-a frequentemente nos primeiros meses de vida, e depois em períodos estipulados no regime provisório.

Neste contexto, norteados pelo princípio do “melhor interesse da criança” nas relações parentais, ponderando a proximidade física diária entre mãe e filha, os fortes laços afectivos que naturalmente se criaram, entendemos que a situação de facto existente não deve ser alterada. A proposta do recorrente, sem dúvida bem intencionada, de a filha residir alternadamente com cada um dos progenitores iria criar certamente uma instabilidade na vida da criança e aumentar o conflito parental. Não descurando que ambos os pais são idóneos e que a L… mantém bom relacionamento com eles, nutrindo por eles afecto e relacionando-se bem com a esposa do pai, importa reter que este, pese embora seja um pai carinhoso, participativo e empenhado, não poderá dispensar a mesma atenção, os mesmos cuidados à filha como faz a mãe, pois estará mais absorvido com os gémeos recentemente nascidos.

Ao invés de se atender a critérios de igualdade formal, importa, sim, ter consideração pelo critério da figura primária de referência: a criança deve ser confiada à pessoa que cuida dela no dia-a-dia. Este critério da pessoa de referência na decisão da guarda dos filhos, é o mais correcto e conforme o interesse da criança, permitindo a continuidade da educação e das relações afectivas com quem está mais ligado física e emocionalmente.[2]

O superior interesse da menor, em função do qual o tribunal terá de decidir, aconselha que se invista num projecto de vida junto da mãe e família materna, na qual se sente integrada e apoiada.

Não se veja nisto qualquer menor consideração pelo requerente, pois do que se trata apenas é de resolver no melhor interesse da L…, a disputa entre os progenitores sobre o exercício das responsabilidades parentais no que se refere à residência/guarda física da filha e os direitos de visita, privilegiando-se a estabilidade dos seus vínculos afectivos e das suas rotinas diárias que sofreriam, por certo, forte abalo se a solução pela guarda conjunta fosse adoptada.

Correcta, foi, pois, a atribuição da guarda única à menor L…

Entende ainda o recorrente, que devem ser exercidas em comum por ambos os progenitores, as responsabilidades parentais referentes ás questões de particular importância, tais como as decisões sobre estabelecimentos de educação pré-escolar e de ensino, sobre a educação religiosa, saúde (não urgentes), actividades desportivas e lúdicas, e sobre o concelho de residência.

O tribunal atribuiu o exercício conjunto das responsabilidades parentais quanto ás questões de particular importância, não incluindo aqui as questões acima referidas que considerou como actos da vida corrente da L...

Como regra, as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores (art.1906º/1-1ª parte); o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente (art.1906º/3-1ª parte).

Até à Lei nº61/08 o princípio do exercício conjunto do poder paternal dependia do acordo dos pais. Presentemente, generalizou-se o exercício em comum das responsabilidades e conforme decorre do antes exposto, o princípio geral de exercício conjunto veio a ser imposto apenas quanto “ás questões de particular importância”, deixando-se a decisão exclusiva dos actos do dia-a-dia para o progenitor com quem o filho está.

O carácter indeterminado das noções de “acto de particular importância” e “actos da vida corrente”, levantando dúvidas de concretização, é susceptível de potenciar conflitos parentais e, consequentemente, a insegurança das crianças. Optou o legislador por não elencar as situações que cabem nesses actos, deixando tal tarefa aos tribunais e à doutrina.

Assim, consideram-se “questões de particular importância”, entre outras: as intervenções cirúrgicas das quais possam resultar riscos acrescidos para a saúde do menor; a prática de actividades desportivas radicais; a saída do menor para o estrangeiro sem ser em viagem de turismo; a matrícula em colégio privado ou a mudança de colégio privado; mudança de residência do menor para local distinto da do progenitor a quem foi confiado.[3]

No caso, como é patente, os pais divergem sobre quais as matérias enquadráveis nos referidos actos.

Em situações de falta de acordo, a noção de referência para decidir da importância de um acto, que exige intervenção judicial, deve ter um conteúdo uniforme e limitado, por razões de segurança jurídica e para reduzir a conflitualidade entre os ex-cônjuges.[4]

As “questões de particular importância” serão sempre acontecimentos raros. Os dois progenitores, assim, apenas terão a necessidade de cooperar episodicamente, e sempre à volta de assuntos que, por serem importantes para a vida do filho, porventura os chamarão à sua responsabilidade de pais.

Já as decisões sobre os “actos da vida corrente”, que serão mais frequentes e terão de ser mais rápidas, ficarão na esfera do progenitor com quem o filho vive, sem necessidade de procurar o consentimento do outro.[5]

À luz do exposto, parece-nos ter sido correcta a decisão da 1ª instância que não englobou no conceito de “questões de particular importância”, os actos relativos à vida da L… referidos pelo recorrente, considerando-os como “actos da vida corrente”.

Assim, temos para nós que a tomada de decisões quanto às actividades extra-curriculares de natureza cultural, desportiva e lúdica - desde que não comportem riscos para a integridade física da menor -; a escolha do concreto estabelecimento de ensino; a decisão (não urgente) sobre cuidados de saúde da menor; o local de residência ou mudança do mesmo desde que não seja para fora do país; a educação religiosa – salvo se os progenitores forem praticantes de diferentes religiões -, não são de considerar como actos de particular importância, mas antes actos correntes da vida da criança, que devem ser tomados pelo progenitor que dela cuida no dia-a-dia.

Impor o exercício conjunto nesses casos como pretende o recorrente, isso implicaria frequentes comunicações dos progenitores, algum dramatismo na sua resolução, maiores conflitos, mais incidentes de incumprimento, que em nada beneficiaria a criança, pelo contrário.

Por último, e no que respeita à prestação de alimentos, o recorrente entende que deve ser modificada a factualidade atinente aos rendimentos dos progenitores, alterando-se a redacção do ponto 20 e aditando-se um novo artigo (32), tudo isto com base nas declarações de IRS a eles respeitantes e referentes ao ano de 2008 (fls.147-161 e 174-184), e determinando-se que nenhum deles pagará qualquer quantia a título de alimentos à filha.

Nesta matéria (pontos 10 e 20), o tribunal assentou a sua convicção nesse meio probatório, na prova testemunhal que indica, no recibo de vencimento e contrato de trabalho da requerida. O recorrente sustenta que as ditas declarações impunham outra resposta.

Este aspecto traduz-se no apelo a que a Relação modifique a decisão de facto, exercendo os poderes decorrentes do art.712º/1-b), C.P.C..

Ora, para fazer aplicar esta seria necessário que se encontrassem nos autos documentos cuja força probatória plena não tenha sido abalada e que o tribunal tenha desprezado, o que não aconteceu.

Com efeito, as declarações de IRS referentes ao ano de 2008 figurando como sujeitos passivos os aqui recorrente e recorrida, são documentos particulares que provam as declarações neles constantes, sujeitos à livre convicção do julgador (arts.363º e 376º do C.C. e 655º/1,C.P.C.), impondo-se respeitar integralmente o princípio da plena liberdade de julgamento do tribunal da 1ª instância.

Concluindo, não há que alterar a matéria de facto nos termos pretendidos, mantendo-se o decidido quanto aos pontos factuais 10 e 20.

Posto isto, improcedem as conclusões do recurso e, consequentemente, este.



III - DECISÃO

Acorda-se, pelo exposto, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se na íntegra a sentença apelada.

Custas pelo apelante.

COIMBRA, 18-10-2011


Relator: Des. Regina Rosa
Adjuntos: Des. Artur Dias
Des. Jaime Ferreira

[1] Projecto de Lei nº 509/X (Deputados do PS) – exposição de motivos
[2] Cfr. Maria Clara Sottomayor, «Regulação das responsabilidades parentais nos casos de divórcio», 5ª ed., pág.57-61
[3] Cfr. Tomé d’Almeida Ramião, «O divórcio e questões conexas – regime jurídico actual», 3ª ed., pág.165
[4] Cfr. Maria Clara Sottomayor, ob. cit., pág.277
[5] Cfr. Guilherme de Oliveira, «A nova lei do divórcio», in «Lex Familiae», ano 7, nº3, 2010, pág.23.

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/de10af80401d246980257933004ed09f?OpenDocument

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