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segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

ALIMENTOS A FILHO MAIOR INCAPACIDADE PERMANENTE TRIBUNAL COMPETENTE - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - 15-11-2011


Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3759/10.3TCLRS.L1-7
Relator: MARIA JOÃO AREIAS
Descritores: ALIMENTOS A FILHO MAIOR
INCAPACIDADE PERMANENTE
TRIBUNAL COMPETENTE

Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 15-11-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE

Sumário: I - A competência material determina-se pelo pedido do autor – pela forma como o autor configura a sua pretensão, ou seja, pelo pedido e causa de pedir, tal como vem explicitado na petição inicial.
II - Formulando o autor um pedido de fixação de alimentos sem qualquer limitação temporal, fundamentado numa incapacidade permanente de prover ao seu sustento, encontramo-nos fora do âmbito da acção prevista na al. f), do art. 82º da Lei nº 3/99, de 13.01., encontrando-se excluída a competência dos tribunais de família.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção):

I - RELATÓRIO

A (…), instaura a presente Acção Especial de Alimentos a Filhos Maiores contra
B (…),
pedindo a condenação do réu a pagar à Autora a quantia de 400,00 € mensais a título de pensão de alimentos, a actualizar anualmente de acordo com a taxa de inflação anual indicada pelo INE e cujo pagamento deverá ser processado mediante desconto na pensão de reforma de velhice que o R. aufere na CNP.
Pelo juiz a quo, foi proferido despacho a julgar o Tribunal de Família e Menores absolutamente incompetente para conhecer da presente acção, indeferindo liminarmente a petição inicial.
Inconformado com tal decisão, o Réu dela interpôs recurso de apelação, concluindo a respectiva motivação, com as seguintes conclusões:
1. A recorrente instaurou uma acção especial de alimentos a filho maior, ao abrigo do disposto no art. 1412º do CPC.
2. O Juiz a quo identificou o objecto do litigio como uma obrigação de alimentos decorrente do art. 2009º do CC.
3. Sucede que a recorrente, apesar da sua maioridade, ainda está a completar a sua formação profissional.
4. Este facto, alegado e provado documentalmente na p.i., não foi tomado em conta pelo tribunal a quo, o que consubstancia um erro de julgamento – o pedido formulado emerge do disposto no art. 1880º do CC e não do art. 2009º do mesmo diploma.
5. O recurso ao procedimento estabelecido pelo DL 272/2011 revelar-se-ia improfícuo, por ser patente a impossibilidade de acordo entre as partes.
6. Não nos encontramos perante uma acção de alimentos a filho maior, com fundamento no art. 2009º do CC, para as quais os tribunais comuns são competentes, mas sim perante uma acção de alimentos a filho maior, com fundamento no art. 1880º do CC.
7. Pelo que o tribunal competente para apreciar o pedido é o Tribunal de Família de Loures, como decorre dos arts. 66º e 67º do CPC e 82º, nº1, al. e), da Lei nº 3/99, de 13 de Junho.
Citado o R. editalmente e o M.P., não foram apresentadas contra-alegações.
Dispensados que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no nº4 do art. 707º, do CPC, há que decidir.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.
Considerando que as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste tribunal, a questão a decidir é uma única: competência do tribunal em razão da matéria.

III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.
Competência do tribunal em razão da matéria.
“As causas que não sejam atribuídas por Lei a alguma jurisdição especial são da competência do tribunal comum” – art. 66º do C.P.C – ou dos Tribunais Judiciais, na terminologia da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais – art. 18º nº1 da Lei nº 3/99 de 13.01.
A competência concreta do tribunal comum em razão da matéria determina-se por exclusão.
“Só pode afirmar-se com segurança depois de ter-se percorrido o quadro dos tribunais especiais e de se ter verificado que nenhuma disposição da lei submete a acção em vista à jurisdição de qualquer tribunal especial[1]”.
A competência dos tribunais comuns constitui a regra e a competência dos tribunais especiais constitui a excepção.
No caso concreto, levanta-se a questão de saber se a competência material para a apreciação da presente acção pertence ao tribunal Comum ou ao tribunal de Família.
De harmonia com o disposto na al. f) do art. 82º da Lei nº 3/99 de 13.01, compete aos tribunais de família, nomeadamente:
“Fixar os alimentos devidos a menores e aos filhos maiores ou emancipados a que se refere o art. 1880º do Código Civil e preparar e julgar as execuções de alimentos”.
Dispõe o art. 1412º do CPC:
1 – Quando surja a necessidade de se providenciar sobre alimentos a filhos maiores ou emancipados, nos termos do art. 1880º do Código Civil, seguir-se-á, com as necessárias adaptações, o previsto para os menores.
2. Tendo havido decisão sobre alimentos a menores ou estando a correr o respectivo processo, a maioridade ou a emancipação não impedem que o mesmo se conclua e que os incidentes de alteração ou de cessação dos alimentos corram por apenso.
E, segundo o art. 1880º do Código Civil, se no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua formação profissional, manter-se-á a obrigação a que se refere o número anterior – obrigação dos progenitores de prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação – na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que a formação se complete[2].
O art. 2003º do CC, dá-nos a noção de alimentos:
1. Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário.
2. Os alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentando no caso de este ser menor.
O nº1, do art. 2009º do CC, procede à enumeração das pessoas que se encontram obrigadas a alimentos, pela ordem aí indicada, entre as quais se encontram os ascendentes.
Haverá, assim, que distinguir entre a recíproca obrigação geral de alimentos, que impende sobre os ascendentes e descendentes e que só termina à data da morte pois se destina à conservação da vida, e a obrigação unilateral e específica obrigação alimentar que os pais têm para com os filhos já maiores, cujo escopo é a realização integral do dever de educação e instrução, preparando-os para a vida, que cabe àqueles outros relativamente à pessoa dos filhos[3].
E, tal como, e bem, se afirma na sentença recorrida, ao pedido de fixação de alimentos a filho maior decorrentes da aplicação do art. 1880º do CC – e só a estes – cabe a tramitação prevista nos arts. 186º e ss., da OTM, devidamente adaptada, por força do art. 1412º do CPC.
Todas as demais acções de alimentos pelas quais se pretenda a fixação de alimentos a maiores, caberão aos tribunais de natureza civil residualmente competentes, seguindo a forma, sumária ou ordinária, consoante o valor.
Segundo o apelante, instaurou a presente acção especial de alimentos a filho maior ao abrigo do disposto no art. 1412º do CPC – não nos encontraríamos perante uma acção de alimentos a filho maior, com fundamento no art. 2009º do CC, para as quais os tribunais comuns seriam competentes, mas sim perante uma acção de alimentos a filho maior, com fundamento no art. 1880º do CC.
A jurisprudência e a doutrina são unânimes em considerar que a competência material se determina pelo pedido do autor – pela forma como o autor configura a sua pretensão, ou seja, pelo pedido e causa de pedir, tal como vem explicitado na petição inicial[4].
Vejamos, assim, os termos em que se encontra configurada a presente “acção especial de alimentos a filhos maiores, nos termos do art. 1412º do CPC”.
A autora intenta a presente acção, alegando, em síntese:
a autora, actualmente com 34 anos de idade, é filha do R. e da sua mulher;
aos seis meses de vida foi diagnosticada à autora uma paralisia cerebral em forma disquinética, sendo o seu grau de deficiência motora muito elevado (95%), sendo o seu grau de autonomia praticamente nulo;
a doença da A. e os cuidados especiais de que necessita, bem como o surgimento de problemas de saúde gravíssimos à mãe da A. fizeram com que esta tivesse de abdicar de uma profissão, para se dedicar em exclusivo à filha e ao restabelecimento da sua própria saúde;
desde há cerca de três anos que o R. deixou de prestar apoio financeiro à sua filha, deixando-a em situação de carência económica;
a A. vive com os subsídios que recebe da Segurança Social, no valor de 284,45 €;
é com esse dinheiro e com o auxílio da irmã da mãe, que a A. faz face às suas despesas no montante médio mensal de 586,25 €, com alimentação, água electricidade, telecomunicações, condomínio, médicos e medicação, e vestuário,
a A. suporta ainda as despesas de faculdade, tendo pago no ano lectivo de 2008/2009, a quantia de 900,00 € a título de propinas, não obstante lhe ter sido atribuída uma bolsa de estudos no valor de 139,60 €;
suportando ainda despesas com livros e demais material escolar, no valor médio de 25,00 €;
apesar de receber quantia não inferior a 1.239,04 € ilíquidos de pensão de velhice, desde que se reformou, deixou simplesmente de auxiliar a sua filha, de lhe prestar o apoio financeiro que ela carece para levar uma vida minimamente condigna;
sem o auxílio do R., a autora não tem possibilidade de prover ao seu sustento;
nos termos da al. c), do art. 2009º do CC, cabe ao seu pai, ora R., a prestação de alimentos.
Em consequência, pede a condenação do R. a pagar à Autora a quantia de 400,00 € mensais a título de pensão de alimentos a actualizar anualmente de acordo com a taxa de inflação anual indicada pelo INE.
Da conjugação do pedido por si formulado na presente acção com os factos em que faz assentar a sua pretensão, constata-se que, embora a autora faça referência, entre outras, às despesas que suporta com a faculdade (em propinas e livros), a sua pretensão de fixação de uma pensão de alimentos não se fundamenta no facto de não ter ainda terminado a sua formação profissional, mas essencialmente sua incapacidade, face à doença de que padece, para prover ao seu sustento.
De tal modo que, o seu pedido não passa pela fixação de uma pensão de alimentos durante o período em que durar a sua formação, mas pela fixação de uma pensão mensal, sem estabelecer qualquer limitação temporal.
E, independentemente de a qualificação jurídica efectuada pelas partes não vincular o tribunal, é a própria autora, que invoca como fundamento jurídico para a obrigação do pai a al. c), do art. 2009º, do CC (cfr., art. 40º da p.i.), segundo a qual os ascendentes se encontram vinculados à prestação de alimentos, pela ordem aí indicada.
Como se afirma no Acórdão deste Tribunal de 09-06-2011, a obrigação de alimentos a maiores ou emancipados tem de ser fixada na acção prevista no art. 1412º do CPC, mediante a alegação e prova dos pressupostos constantes do art. 1880º: a) não ter o requerente completado a sua formação profissional no momento da emancipação ou maioridade; b) ser razoável exigir dos pais o seu cumprimento; c) definição do tempo normalmente requerido para complemento da formação[5].
A ideia do art. 1880º do CC assenta em que, embora com a maioridade cesse o poder paternal e, consequentemente, o dever dos pais prestarem alimentos aos filhos (art. 1877º do CC), tal obrigação poder-se-á prolongar até completa formação profissional destes.
A obrigação excepcional prevista nesta disposição tem carácter temporário, definido pelo “tempo necessário” para completar a formação profissional do alimentando, e obedece a um critério de razoabilidade – é necessário que, nas circunstâncias concretas, seja justo e sensato exigir dos pais a continuação da contribuição a favor do filho, agora de maioridade[6].
Como já se referiu, há que proceder à distinção entre a obrigação de alimentos com escopo educativo e obrigação geral de alimentos que os ascendentes devem aos descendentes (direito a exigir alimentos aos seus ascendentes nos termos gerais do nº1 do art. 2003º do CC), sendo que, o direito a alimentos previsto no art. 1880º é atribuído àquele que, após completar dezoito anos, caso se encontre a completar a sua formação escolar e durante o tempo normal para a completar[7].
Concluindo, e pedindo-se na presente acção a fixação de uma pensão de alimentos sem qualquer limitação temporal com fundamento numa incapacidade permanente de prover ao seu sustento, encontramo-nos fora do âmbito da acção prevista na al. f), do art. 82º da Lei nº 3/99 de 13,01., encontrando-se excluída a competência do tribunal de Família e Menores, competência que recairá sobre os tribunais comuns.
A apelação terá, assim, de improceder.


IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 15 de Novembro de 2011

Maria João Areias
Luís Lameiras
Roque Nogueira
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[1] Cfr., Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil, Anotado e Comentado”, 2º Vol., 2ª ed., Coimbra Editora, pag 38.
[2] Segundo J. P. Remédio Marques, a obrigação de alimentos devidos ao menor não se extingue inelutavelmente com a maioridade – sendo os pais responsáveis pelo crescimento e desenvolvimento dos filhos, velando pela sua educação (art. 1787º, nº1 do CC), pode prolongar-se para além do termo da menoridade, precisamente porque, por via de regra, os filhos não desfrutam da necessária capacidade económica para inaugurarem ou prosseguirem os cursos universitários ou técnico-profissionais (cfr., “Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores)”, FDUC – Centro de Direito da Família, 2ª ed., Coimbra Editora, pag. 291 e 297.
[3] Cfr., neste sentido, “Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores)”, de J.P. Remédio Marques, pags. 291 e 292.
[4] Cfr., entre outros, José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, Coimbra Editora, 2ª ed., pag. 136, nota 4 ao art. 64º, e Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, pag. 91, e Acórdão do TRC de 02-03-2010, disponível in http://www.dgsi.pt.tjrc.
[5] Acórdão Relatado por Vaz Gomes, disponível in http://www.dgsi.pt/trl.
[6] Cfr., neste sentido, Acórdãos do STJ de 12-01-2010, relatado por Fonseca Ramos, de 13-07-2010, relatado por Garcia Calejo.
[7] Cfr., neste sentido, Ana Sofia Gomes, “Responsabilidades Parentais”, 2ª ed., QUID JURIS, pag. 41.

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/4a489c44536113918025796e00515ce3?OpenDocument&Highlight=0,alimentos

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