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terça-feira, 27 de setembro de 2011

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE PSICOTRÓPICOS - 07/09/2011


Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
153/10.OGCVRL.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: COELHO VIEIRA
Descritores: CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE PSICOTRÓPICOS

Nº do Documento: RP20110907153/10.0GCVRL.P1
Data do Acordão: 07-09-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .

Sumário: A presença de produto psicotrópico no corpo do condutor, sem que resulte comprovada que aquela é perturbadora da aptidão física mental ou psicológica para a condução, não preenche o tipo de crime do artigo 292º/2 do C. Penal, antes e apenas os elementos da contra-ordenação prevista no artº 81º do C. da Estrada.

Reclamações:

Decisão Texto Integral: Proc. Nº 153/10.0GCVRL.P1

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

No Tribunal Judicial de Vila Real - 1º Juízo – foi exarada a seguinte:-

(…)

SENTENÇA

I. Relatório:
Para julgamento em processo comum, com intervenção do tribunal singular, O Ministério Público acusa:

B…, solteiro, empregado da construção civil, nascido a 17.03.1986, em França, filho de C… e de D…, antes e actualmente a residir em …, …, Suíça,

Imputando-lhe, pela prática dos factos descritos na acusação pública de fls. 36 e sgs., o cometimento, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sob efeito de substâncias psicotrópicas, p. e p. pelos art.ºs 69.º e 292.º, n.º2, do Código Penal.
*
A acusação pública foi recebida.
*
O arguido apresentou contestação, oferecendo o merecimento dos autos, e indicou prova testemunhal.
*
Realizou-se a audiência de julgamento, na ausência do arguido e com a sua anuência, tendo-se observado nela as formalidades legais, conforme se alcança da respectiva acta.
*
Mantém-se a validade e regularidade da instância, nada obstando ao conhecimento do mérito da causa.
**
II. Fundamentação:
II.A. Dos Factos:
II.A.1. Factos Provados:
Discutida a causa e com relevo para a boa decisão da causa, resultou provada a seguinte matéria de facto:

1. No dia 25.01.2010, pelas17h45, na …, em Vila Real, o arguido seguia ao volante do veículo ligeiro de passageiros de marca “Fiat” modelo “…” e de matrícula ..-..-DL.
2. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 1., o arguido foi submetido a análises para pesquisa de consumo de substância psicotrópicas no sangue, vindo as mesmas a indicar a presença de 22,68ng/ml de opiáceos e canabinóides e de 101,41 ng/ml de morfina.
3. O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente.
4. O arguido sabia que não podia conduzir veículo automóvel sob a influência de substâncias psicotrópicas.
5. O arguido sabia que o consumo de substâncias psicotrópicas põe em causa a segurança no exercício da condução e que tal é proibido e punido por lei.
Do julgamento:
6. A condução do arguido não apresentava à data referida em 1. sintomas ou sinais de este poder estar influenciado por marijuana, cocaína, opiáceos, anfetaminas ou outra substância psicotrópica.
Da situação pessoal e económica do arguido:
7. O arguido trabalha, actualmente, como estucador da construção civil na Suíça, para a
“E…”, auferindo Fr 3’900 + Fr 250.
8. O arguido, através da empresa referida em 11., desloca-se várias vezes e por longos períodos a França.
9. O arguido tem o 11.º Ano de Escolaridade.
10. O arguido encontra-se a viver na Suíça com familiares.
11. O arguido é conhecido como consumidor de drogas, tendo sido acompanhado pelo CRI de Vila Real até à sua ida para a Suíça.
12. O arguido esteve em Portugal pelo Natal e pelo funeral de um familiar e não apresentou sinais de consumo de produto estupefacientes.
13. O arguido tem o apoio da família.
14. O arguido tem pendente o processo crime n.º 169/10.6TBLMG, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Lamego, sendo-lhe imputada a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22/01, e de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º1, al. d), do RJAM, praticados entre Setembro de 2009 e Março de 2010.
15. O arguido não tem antecedentes criminais.
*
II.A.2. Factos Não Provados:
Discutida a causa e com relevo para a boa decisão da causa, não ficaram por demonstrar factos alegados pela acusação e-ou pela defesa ou até resultantes do próprio julgamento.
*
II.A.3. Da motivação do Tribunal acerca dos factos:
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………………………………………
………………………………………
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II.B. Do Direito:
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III. Da Decisão:
Face a todo o exposto, julga-se improcedente a acusação pública e, em consequência, decide-se:

a) Absolver o arguido B… do crime de condução de veículo sob influência de substâncias estupefacientes, previsto e punível pelos art.ºs 292.º, n.º 2, e 69.º, n.º 1, a), ambos do Código Penal de que vinha acusado.

b) Absolver o arguido B… do pagamento das custas devidas pelo presente processo crime, atento o disposto nos art.ºs 513º e 514º a contrario do Código de Processo Penal.
*
Mais se declara, nos termos dos artigos 214º, 1, al. e) e 376º do C.P.P., a cessação imediata da medida de coação prestada pelo arguido.
*
Notifique.
Deposite a presente sentença na secretaria deste tribunal – art. 372.º, n.º 5, do CPP.
*
Vila Real, 24.03.2011.

(…)

XXX

Inconformada com esta decisão absolutória, o Digno Magistrado do MP veio interpor recurso, o qual motivou, aduzindo as seguintes:-

CONCLUSÕES:-
………………………………………
………………………………………
………………………………………
XXX

O Recorrente veio responder ao recurso do MP, defendendo a bondade da decisão e a consequente improcedência do recurso.

XXX

O Ilustre Procurador-Geral Adjunto emitiu douto Parecer, por via do qual entende que o recurso merece provimento.

Cumprido que se mostra o disposto no art. 417º nº 2, do CPP, verifica-se que não foi deduzida qualquer resposta.

XXX

COLHIDOS OS VISTOS LEGAIS CUMPRE DECIDIR:-

O TRP tem poderes de cognição de facto e de direito – art. 428º, do CPP.

As nulidades principais (art. 118º, do CPP) e os vícios da decisão enumerados nas als. a), b) e c) do nº 2, do art. 410º, do CPP são de conhecimento oficioso na 2ª instância.

A decisão recorrida não enferma de umas ou outros, nem tal vem suscitado pelo Digna Recorrente.

A questão nuclear que vem invocada é a de saber se existem, no caso, preenchidos todos os elementos essenciais do crime, ou não.

Desde já devemos referir que concordamos com a decisão recorrida e usamos, também da faculdade a que alude o disposto no art. 425º nº 5, do CPP.

Mas entendemos por útil e oportuno referir mais o seguinte:-

Deu-se como provado (cfr. ponto 6 dos factos provados na sentença) que:-

6. A condução do arguido não apresentava à data referida em 1. sintomas ou sinais de este poder estar influenciado por marijuana, cocaína, opiáceos, anfetaminas ou outra substância psicotrópica.

O Digno Recorrente não recorreu da matéria de facto na vertente do disposto no art. 412º ns. 3 e 4, do CPP o que facilmente se recolhe da atenta leitura das conclusões da motivação do recurso; e assim, não sendo caso de existência dos vícios da decisão acima aludidos, designadamente erro notório na apreciação da prova ou contradição insanável entre fundamentação (o que na aparência poderia resultar da comparação entre os factos provados em “2” e “6” e adiante também demonstramos, tal facto (para além da restante factualidade) está assente; aliás, a matéria de facto encontra-se devidamente fundamentada e motivada, com fundamentação jurídica, concisa, mas bem elaborada.

(…)

A tipificação do crime de condução sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas ocorreu com a alteração legislativa ao art. 292 introduzida pelo art. único da L. 77/01.
No entanto e como contra-ordenação já a versão original do C. da Estrada, DL n.º 114/94, de 03 de Maio, no art. 87 previa e punia a “Condução sob o efeito do álcool ou de estupefacientes”, embora remetendo para diploma próprio a regulamentação do que era conduzir naqueles termos.
Também agora e no que respeita ao crime em causa temos de recorrer a diplomas próprios donde se possa retirar se o condutor se encontra sob a influência de estupefacientes ou psicotrópicas e, se está em condições de exercer a condução com segurança ou não.
Assim, que a Lei 18/2007 de 17 de Maio aprova o Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas e, a Portaria 902-B/2007 de 13 de Agosto regula o material a utilizar na recolha e transporte de amostras biológicas destinadas a determinar a presença de substâncias psicotrópicas e os procedimentos a aplicar na realização das análises e os tipos de exames médicos a efectuar para detecção dos estados de influenciado por álcool ou por substância psicotrópica.
A L. 18/2007, nos arts. 10 a 13, inseridos no capitulo “avaliação do estado de influenciado por substâncias psicotrópicas” prevê um exame prévio de rastreio e em caso de resultado positivo, um exame de confirmação, definidos em regulamentação.
Sendo que, nos termos do nº 5 do art. 12, “só pode ser declarado influenciado por substâncias psicotrópicas o examinado que apresente resultado positivo no exame de confirmação”.
A Portaria 902-B/2007 no Capitulo II regulamenta a avaliação do estado de influenciado por substâncias psicotrópicas.
O exame de confirmação considera-se positivo sempre que revele a presença de qualquer substância psicotrópica prevista no quadro 1 do anexo V, ou qualquer outra com efeito análogo, capaz de perturbar a capacidade física, mental ou psicológica do examinado para o exercício da condução de veículo a motor em segurança. Sendo que o quadro 2 prevê os valores de concentração para exame de rastreio de urina.
Efectuado o exame, indicando a secção III como deve ser feito, o médico deve preencher o relatório do exame modelo do anexo VII, sendo que do resultado desse exame, respondendo aos itens de: Observação geral; Estado mental; Provas de equilíbrio; Coordenação dos movimentos; Provas oculares; Reflexos; Sensibilidade e quaisquer outros dados que possam ter interesse para comprovar o estado do observado.

Só o relatório médico com esses itens preenchidos permitirá ao tribunal concluir se o examinado estava em condições de fazer o exercício da condução em segurança.
Para além da questão quantitativa abordada na sentença, tais requisitos essenciais não constam do competente relatório pericial ( cfr. fls. 26-27 ).

Que o arguido não estava “em condições de o fazer em segurança”, (relativamente ao exercício da condução) este exercício da condução, tem de ser facto apurado e, por conseguinte, constar da matéria de facto da acusação (“negrito nosso”).

No caso apenas se alegam e provam os factos dos itens 4 e 5.

Ora, também no entender deste TRP, aquela factualidade tem que ser “cirurgicamente” alegada, sob pena de a acusação não poder vingar.

Tal não ocorre no caso “sub-judice”.

Assim, também entendemos que a presença de produto psicotrópico no corpo do condutor, a mesma tem de ser “perturbadora da aptidão física, mental ou psicológica” para a condução.
Não se apurando tal facto, apenas fica demonstrado que o arguido se encontra sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, o que não preenche o tipo de crime do art. 292 nº 2 do CP, mas preenche os elementos da contra-ordenação prevista no art. 81 do C. Estrada, porque, para tal, basta conduzir sob a influência de produtos psicotrópicos, “É proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas”.

(…)

O art. 292 nº 2 do CP não prevê o típico crime de perigo comum. Não basta a presença de substância psicotrópica no corpo, é necessário que a mesma influencie e torne o condutor incapaz no caso concreto - e com o devido respaldo pericial -, de conduzir com segurança (e também independente do resultado danoso que possa haver). Diferente é a previsão do nº 1, em que basta a taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2g/l, independentemente da influência que essa taxa de álcool exerça no condutor, ou mesmo que não afecte as condições de condução com segurança.
Face ao exposto, entendemos não merecer provimento o recurso, antes se mantém a decisão recorrida.

(cfr. Ac. da RC, de 6/04/2011 (pesquisa “Google”).

(…)

Daqui se conclui que a decisão absolutória é de manter.
XXX
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão absolutória recorrida.

Sem tributação.

PORTO, 7/09/2011
José João Teixeira Coelho Vieira
José Carlos Borges Martins

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/93dfeffa02fa39ef80257910004660a9?OpenDocument

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